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Comentários sobre a licença para acompanhamento de cônjuge no serviço público federal: Lei nº 8.112/90

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Agenda 04/06/2010 às 00:00

4 – CONCLUSÃO

Entende-se que as normas legais devem ser interpretadas de forma sistemática, sempre tendo como ponto de partida a Constituição Federal, a fim de conferir a maior amplitude e coerência a todo o ordenamento jurídico.

Mesmo levando-se em consideração a possível faculdade por parte da administração na concessão da licença, bem como para a concessão do exercício provisório, caberia neste caso a análise quanto à proporcionalidade da decisão. Ao se buscar o fim público de continuidade na prestação do serviço aos administrados, ter-se-ia que analisar a adequação de medida negatória da licença, caso a caso. Não há que se falar nesse ponto sobre uma supremacia do interesse público sobre o interesse particular do servidor ou de seu cônjuge, como uma regra.

As medidas judiciais têm reconhecido o caráter discricionário do ato de concessão de exercício provisório. Muitas vezes interpretadas pela a administração de forma não condizente com as normas e princípios constitucionais, e de forma a deixar a lógica de lado, essas decisões, mesmo que careçam de clareza ou que se vislumbre ambigüidade, deixam de determinar o exercício provisório em função da discricionariedade administrativa dos Órgãos em que o servidor pleiteia exercer provisoriamente suas atividades. Isto por quê é o Órgão que irá recepcionar o servidor que deverá ter um espaço físico para alocá-lo, que deverá ter uma atividade para que ele exerça, que deverá analisar se há compatibilidade entre as atividades que o servidor exercia em seu Órgão de origem e as atividades da função que ocupará provisoriamente. As decisões consultadas no TRF4 e no STJ são neste sentido, mesmo que se exija um olhar sistêmico e integrativo para que alcancem a máxima efetividade da ESPECIAL PROTEÇÃO que o Estado deve conferir à família.

A Administração tem que pesar qual interesse público merece maior aplicabilidade, se o interesse administrativo de não se arcar com remuneração de servidor, ou o interesse público de se ter um servidor exercendo suas atividades em local onde haja carência de mão de obra. Ainda, deve analisar o Serviço Público como um sistema fechado, tendo o sentimento de cooperação com os demais Órgãos ou entes da Administração para garantir o fim público de continuidade dos serviços e de eficiência em sua prestação.

Ademais, como as decisões judiciais do STJ, seguidas pelos TRF’s, têm seguido a linha de entendimento de se tratar de um direito subjetivo dos servidores públicos civis federais, no âmbito administrativo o lógico seria não se impor óbices, visando não dispender verbas públicas com o litígio judicial.

Princípios que regulam as relações de emprego também devem ser utilizados para a finalidade de se garantir a máxima eficácia do art. 226 da Constituição, vez que exercem a função de baliza orientadora para aplicação do Direito. A única interpretação conforme a Constituição do art. 84 do estatuto possível é a que confere ao dispositivo mencionado o sentido de se tratar de um direito subjetivo do servidor, que tem o poder de escolha sobre o melhor momento para exercê-lo. Sem essa proteção o servidor fica exposto ao arbítrio do administrador, que pode se utilizar de sua "discricionariedade" acerca dos direitos dos servidores para penalizá-lo. A baliza proporcionada pelos princípios trabalhistas funcionaria com dupla função, quais sejam, proteger o servidor do arbítrio do administrador e uniformizar as decisões do Órgão sobre tais direitos, evitando tratamentos desiguais para situações semelhantes no mesmo quadro de servidores.


Notas

  1. Ar. 84 da lei 8.112/90 "Poderá ser concedida licença ao servidor para acompanhar cônjuge ou companheiro que foi deslocado para outro ponto do território nacional, para o exterior ou para o exercício de mandato eletivo dos Poderes Executivo e Legislativo."
  2. Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
  3. ÁVILA, Humberto. A distinção entre princípios e regras e a redefinição do dever de proporcionalidade. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ - Centro de Atualização Jurídica, v. I, nº. 4, julho, 2001. Disponível em: <http://www.direitopublico.com.br>. Acesso em: 23 de março de 2010. Pg 19, citando: Sobre esse uso de postulados, em vez de princípios, sobretudo: ALEXY, Robert. Juristische Interpretation. In: Recht, Vernunft, Diskurs. Frankfurt am Main, 1995, p. 75. CANARIS, Claus-Wilhelm. Systemdenken und Systembegriff in der Jurisprudenz. Berlin, Duncker und Humblot, 1983, pág. 16. Conferir: BYDLINSKY, Franz. Fundamentale Rechtsgrundsätze. Springer, Wien, 1988. ESSER, Josef. Vorverständnis und Methodenwahl in der Rechtsfindung; Rationalitätsgrundlagen richterlicher Entscheidungspraxis, 2. ed. 1972. ESSER, Josef. Grundsatz und Norm in der richterlichen Fortbildung des Privatrechts, 4. ed. 1990. LARENZ, Karl. Methodenlehre der Rechtswissenschaft. 6. ed. München, Beck, 1991, p. 437 ss. ENGISCH, Karl. Logische Studien zur Gesetzesanwendung, 3. ed., Heidelberg, 1963, p. 15 ss. KAUFMANN, Arthur. Rechtsphilosophie, 2. ed. 1997, p. 127 ss. Sobre os postulados ético-políticos, ver: ISENSEE, Josef. Gemeinwohl und Staatsaufgaben im Verfassungsstaat, in: Handbuch des Staatsrechts, Bd. III, § 57 Rn. 30.
  4. Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...]
  5. Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas.
  6. [...]

    § 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir. [...]

  7. Art. 36. Remoção é o deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede.
  8. Parágrafo único. Para fins do disposto neste artigo, entende-se por modalidades de remoção:

    I - de ofício, no interesse da Administração;

    II - a pedido, a critério da Administração;

    III - a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração:

    a)para acompanhar cônjuge ou companheiro, também servidor público civil ou militar, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que foi deslocado no interesse da Administração;

    b)por motivo de saúde do servidor, cônjuge, companheiro ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, condicionada à comprovação por junta médica oficial;

    c)em virtude de processo seletivo promovido, na hipótese em que o número de interessados for superior ao número de vagas, de acordo com normas preestabelecidas pelo órgão ou entidade em que aqueles estejam lotados.

  9. APELAÇÃO CÍVEL Nº 2008.72.11.000177-6/SC; RELATOR: Des. Federal VALDEMAR CAPELETTI; APELANTE: ANDRHEI CASTILHO SIMIONI; EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. LICENÇA PARA ACOMPANHAR CÔNJUGE. ART. 84 DA LEI N. 8.112/90. 1. "Em face do princípio insculpido no art. 226 da Constituição Federal, tem o Estado interesse primário na preservação da família, pois, considerando que é sobre esta que se assentam as colunas econômicas e que se arrimam as bases morais da sociedade, sua própria sobrevivência dependerá da proteção fornecida à entidade familiar" (REsp 770.458/RS, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 29/05/2008, DJe 04/08/2008). 2 Preenchidos os requisitos legais previstos no art. 84 da Lei n. 8.112/90, impõe-se a concessão de licença para acompanhar cônjuge. 3. Apelo provido.
  10. ADM. - RECURSO ESPECIAL - SERVIDORA PÚBLICA - CONCESSÃO DE LICENÇA PARA ACOMPANHAMENTO DE CÔNJUGE - ART. 84, § 2º, DA LEI 8.112/90 - PREVISÃO LEGAL - ATO VINCULADO - AUSÊNCIA DO PODER DISCRICIONÁRIO - PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS - MANUTENÇÃO DO DEFERIMENTO. 1 - Tendo a servidora, ora recorrida, preenchido os requisitos necessários à concessão da licença, não há porquê se falar infringência à lei federal, já que a norma contida no art. 84, da Lei nº 8.112/90 não se enquadra no poder discricionário da Administração, mas sim nos direitos elencados do servidor. 2 - As considerações feitas pelo v. acórdão a quo, são suficientes, por si só, à embasar a decisão. 3 - Recurso conhecido, porém, desprovido. (STJ, Quinta Turma, REsp 287867/PE, Rel. Ministro Jorge Scartezzini, public. no DJ em 13/10/2003, p. 398)
  11. PROC. CIVIL E ADM. ART. 535 DO CPC. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚM. N. 284/STF. LICENÇA PARA ACOMPANHAMENTO DE CÔNJUGE. CONCESSÃO. ATO VINCULADO. PREENCHIMENTO. REQUISITOS.1. A afirmação genérica de que ocorreu ofensa ao art. 535, II, do CPC, por negativa de prestação jurisdicional, atrai a Súmula n. 284/STF. 2. O requisito primordial para a concessão da licença para acompanhamento de cônjuge é o deslocamento para outro ponto do território nacional ou exterior, ou ainda, para exercício de mandato eletivo dos Poderes Executivo e Legislativo. 3. Preenchidos os requisitos estabelecidos no art. 84 da Lei n. 8.112/90, a licença deve ser concedida, pois se trata de direito do servidor, em que a Administração não realiza juízo de conveniência e oportunidade. Precedentes. 4. Recurso especial improvido. (STJ, Quinta Turma, REsp 960332/RS, Rel. Ministro Jorge Mussi, public. no DJe em 03/08/2009)
  12. ADMINISTRATIVO. SERVIDORA PÚBLICA. LICENÇA PARA ACOMPANHAR CÔNJUGE NO EXTERIOR. ARTIGO 84 DA LEI 8.112/90. PODER-DEVER DA ADMINISTRAÇÃO. AUSÊNCIA DE DISCRICIONARIEDADE. INEXISTÊNCIA DE INTERESSE PÚBLICO, FACE A AUSÊNCIA DE REMUNERAÇÃO. PREENCHIDOS OS REQUISITOS A LICENÇA DEVE SER CONCEDIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
  13. I - O requisito fulcral para a concessão da licença pleiteada é tão somente o deslocamento do cônjuge para outro ponto do território nacional ou exterior, ou ainda, para exercício de mandato eletivo dos Poderes Executivo e Legislativo.

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    III - Ademais, o art. 84 do Estatuto dos Servidores está situado em seu Título III, qual seja "Dos Direitos e Vantagens". A norma contida em todos os demais dispositivos que se encontram nesse mesmo título diz respeito a direitos dos servidores, sobre os quais a Administração possui pouco ou nenhum poder discricionário. O legislador, pelo menos no capítulo em que tratou de concessão de licenças, quando quis empregar caráter discricionário, o fez expressamente, como no art. 91 do mesmo Diploma Legal.

    IV - O art. 84 da Lei nº 8.112/90 contém norma permissiva, cuja interpretação mais adequada é a de que carrega um poder-dever por parte da Administração. Logo, preenchendo-se os requisitos, o requerente faz jus à licença requerida.

    V - Recurso especial conhecido e desprovido.

    (REsp 422.437/MG, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 15/03/2005, DJ 04/04/2005 p. 335)

  14. DIREITO ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. REMOÇÃO PARA ACOMPANHAR CÔNJUGE. SITUAÇÃO CONSOLIDADA NO TEMPO. PREJUÍZO PARA A ADMINISTRAÇÃO. INEXISTÊNCIA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E IMPROVIDO.

Em face do princípio insculpido no art. 226 da Constituição Federal, tem o Estado interesse primário na preservação da família, pois, considerando que é sobre esta que se assentam as colunas econômicas e que se arrimam as bases morais da sociedade, sua própria sobrevivência dependerá da proteção fornecida à entidade familiar. 2. Hipótese em que, embora a mudança de domicílio da esposa do recorrido tenha se dado em razão de primeiro provimento de cargo público municipal, deve a situação já consolidada no tempo ser preservada, em face da ausência de prejuízo para a Administração e da necessidade de preservação da unidade familiar. 3. Recurso especial conhecido e improvido. (REsp 770.458/RS, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 29/05/2008, DJe 04/08/2008)

Sobre o autor
Andrhei Castilho Simioni

Técnico Judiciário do TRE-SC, estudante de Direito nas Faculdades OPET em Curitiba/PR

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SIMIONI, Andrhei Castilho. Comentários sobre a licença para acompanhamento de cônjuge no serviço público federal: Lei nº 8.112/90. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2529, 4 jun. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14966. Acesso em: 23 dez. 2024.

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