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A importância do controle social da prestação dos serviços públicos concedidos aos particulares

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Agenda 10/06/2010 às 00:00

4 – O Controle Social e a Lei de Defesa dos Usuários dos Serviços Públicos.

Demonstrada a importância do Controle Social da prestação dos Serviços Públicos concedidos aos particulares, cabe aqui traçar considerações sobre os pontos que a princípio destacam-se em importância na elaboração da Lei de Defesa dos Usuários dos Serviços Públicos e que muito contribuirão para o melhor entendimento do tema em comento.

Conforme já demonstrado item acima, a Emenda Constitucional nº 19/98 introduziu comando, no § 3º do art. 37 da Constituição, para elaboração de uma lei que irá disciplinar as formas de participação do usuário na administração direta e indireta, o que inclui a estruturação do Controle Social a ser exercido sobre a prestação dos serviços públicos concedidos ou permitidos aos particulares. A aludida lei deve seguir os critérios dispostos nos incisos I, II, e III do aludido § 3º. À luz desses critérios, passa-se a expor algumas considerações que pode ser entendida como essenciais para, de lege ferenda, serem abrigadas pela Lei de Defesa do Usuário de Serviços Públicos.

O primeiro critério a ser observado pela Lei (inciso I do aludido dispositivo constitucional) diz respeito às "reclamações relativas à prestação dos serviços públicos em geral, asseguradas a manutenção de serviços de atendimento ao usuário e a avaliação periódica, externa e interna, da qualidade dos serviços".

Segundo Gustavo Henrique Justino De Oliveira, "é por intermédio do processo que se concretiza a colaboração dos sujeitos interessados em um provimento administrativo". [18] Para que o Controle Social sobre os serviços públicos siga com propriedade o critério previsto no inciso I do §3º do art. 37 da CF, faz-se necessário que a participação do usuário se dê por meio de processo administrativo, ou melhor, que o cidadão usuário participe diretamente do processo administrativo que culminará nos contratos de concessão e permissão de serviço público.

Tal concepção parte da crescente valorização do processo administrativo como meio mais eficaz de controle da formação das decisões da Administração Pública. Carlos Ari Sundfeld enfatiza que

ao lado do estudo do ato administrativo, que propicia um controle do resultado da atividade estatal, (...) seu processo de formação torna-se juridicamente relevante, seja para que os indivíduos afetados possam intervir, seja como garantia de que os atos expressem não a vontade psicológica do agente, mas a vontade impessoal do ordenamento. [19]

Por fim, Gustavo Henrique Justino De Oliveira destaca a importância do estudo do processo administrativo, uma vez que este encurta a distância entre administração e cidadãos, legitima o poder, sistematiza as atuações administrativas, e emprega melhor desempenho e controle das suas atividades, além de justiça nas decisões. [20]

Torna-se, portanto, muito mais eficaz o controle a ser exercido na formação das decisões que vinculam a execução dos serviços públicos, do que só o controle da sua má execução por meio da fiscalização periódica e posterior. Daí que, no Controle Social em questão, não deve ser prevista somente a atuação dos usuários na fiscalização a posteriori, mas principalmente de forma antecipada através da participação nos processos que irão decidir a política de prestação dos serviços. Enfim, controle social e processo administrativo são institutos indissociáveis, sendo a participação dos usuários nesta fase inicial essencial para o controle efetivo da prestação dos serviços públicos.

O segundo critério a ser observado pela futura Lei de Defesa do Usuário, quando da estruturação do controle social, (art. 37, §3º, II) refere-se ao "acesso dos usuários a registros administrativos e a informação sobre os atos de governo, observado o disposto no art. 5º, X e XXXIII". Sandra Pires Barbosa diz que

é indiscutível que, para exercer qualquer controle sobre o governo, os cidadãos precisam ter acesso à informação. Noutras palavras, isso significa que os administrados tanto devem receber da mídia todo o tipo de informação ou até mesmo buscá-la em qualquer outra fonte, como também devem os órgãos públicos disponibilizar ao cidadão as informações existentes e arquivadas em suas repartições. Indiscutível é apenas, que quanto mais bem informada a população, terá ela melhores condições de exercer o controle sobre a atuação de seus administradores. [21]

É praticamente impossível ao cidadão controlar a atuação de entes da administração que não possuem uma gestão transparente e que não prestam conta de suas atividades. Como controlar a execução dos serviços de uma empresa concessionária ou permissionária que sonega aos seus usuários qualquer tipo de informação, impossibilitando verificar se as tarifas estão condizentes com os custos, por exemplo, ou se os serviços que estão discriminados na conta de pagamento foram realmente utilizados? Com efeito, é o pleno exercício do direito à informação que viabiliza o controle social, constituindo-se, na verdade, instrumento essencial para consecução de tal fim.

O terceiro e último critério balizados da futura Lei de Defesa dos Usuários de Serviço Publico previsto na Constituição pátria pode ser considerado o mais eficiente e não por coincidência o mais polêmico meio de controle da qualidade do serviço público por parte do cidadão usuário. Trata-se do inciso III, §3º, do art. 37 da Constituição que traz a obrigação de se disciplinar a "representação contra o exercício negligente ou abusivo de cargo, emprego ou função na administração pública".

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Carlos Alberto Menezes Direito enfatiza a força e os poderosos efeitos que este inciso trouxe ao Ordenamento Jurídico pátrio: "o que se poderá dizer de uma lei garantindo ao usuário do serviço público direito de representação contra o exercício negligente ou abusivo de cargo, emprego ou função na administração pública? É evidente que está nas mãos do Congresso Nacional uma responsabilidade maior, à medida que a Constituição criou um mecanismo de controle da qualidade do serviço público". [22]

Alguma dúvida do poder e da dificuldade em se criar esta forma de "representação" contra o uso negligente ou abusivo de todos os agentes públicos a serviço da Administração? Este inciso não abrangeria os próprios legisladores? Não seria este seria um dos motivos que contribuíram para a não publicação desta lei até os dias de hoje? Isto tudo são meras especulações, mas que não podem ser desconsideradas devido a força que traz este inciso. Daí a sua polêmica e sua evidente dificuldade de implementação.

Por fim, além da necessidade de se consagrar estes três critérios apontados pelo art. 37, §3º, da Constituição Federal, a futura Lei de Defesa dos Usuários de Serviços Públicos deve dispor sobre os graus de intensidade ou níveis de profundidade dos mecanismos participativos na concessão e fiscalização dos Serviços Públicos, ou melhor, se a lei irá determinar que os resultados desta participação popular seriam vinculantes ou não-vinculantes para a Administração Pública. [23]

Ou seja, sabe-se que o controle social não é capaz, por si só, de curar todos os atos de improbidade e falta de eficiência na gestão da coisa pública. O controle social depende dos mecanismos tradicionais de controle (interno, externo e jurisdicional) para se tornar eficaz. Contudo, resta saber qual será o grau de vinculação da participação popular na execução e na fiscalização dos serviços públicos, que será previsto na futura Lei de Defesa do Usuário de Serviços Públicos.

A participação da sociedade realizando o chamado "Controle Social" pode ter lugar na fase preparatória ou pré-decisional, na fase decisória e na fase sancionatória do processo de concessão ou permissão dos Serviços Públicos aos particulares sem qualquer prejuízo da sua realização. Se realizado na fase preparatória terá o mérito de possibilitar uma ampla instrução e participação do cidadão interessado desde o início do processo de delegação do serviço. Se inserido na fase processual de decisão, levando-se em conta que a atividade da administração será discricionária torna-se mais um elemento de limitação da liberdade de atuação do administrador. Se por fim ficar estabelecido que o Controle Social será inserido somente na fase sancionatória do processo de concessão, este controle tomará o papel de auxiliador da fiscalização, onde deverão ser previstos meios de atuação conjuntos com as agências reguladoras do setor competente. [24] Ainda há a possibilidade do cidadão participar em todas estas fases conjuntamente. Resta saber qual será a melhor opção do legislador e o seu grau de vinculação no processo decisório da concessão ou permissão.

Fácil é perceber, portanto, o poderoso instrumento que a Emenda Constitucional nº 19/98 dispôs a favor dos usuários de Serviços Públicos e o tamanho da responsabilidade que pesa sobre os ombros do legislador infraconstitucional. Cabe, portanto, a eles a missão árdua de sistematizar o preceito constitucional acima, tomando todas as medidas cabíveis, de modo que confira a efetividade necessária, e que não se imponham tantos empecilhos ao seu exercício, restando por torná-lo inócuo ao cidadão brasileiro.


5. Conclusão.

O grande desafio é desvendar como se dará o Controle Social da prestação dos serviços públicos, apontado por vários autores (ao lado do controle de resultados) como o grande viabilizador da administração pública gerencial, e como será feita a sua estruturação no Ordenamento Positivo brasileiro. Trata-se de debruçar esforços para evitar que os preceitos preconizados pela reforma administrativa de 1998 se tornem letra morta na Constituição, como poderá ser o caso do aludido § 3º do art. 37, que até os dias de hoje ainda não foi instituída.

A participação popular na administração pública por meio do Controle Social resgata o princípio da cidadania, atualmente balizado pela "ideia de participação". O Controle Social evidencia a "noção do cidadão colaborador, atuante, cooperador na gestão da coisa pública, ideia que se coaduna perfeitamente com a noção de participação administrativa". [25]

Ligada, invariavelmente, à noção de cidadania está a democracia participativa ou democracia direta. O art. 1º da Constituição da República ao qualificar o Estado Federal como Estado Democrático de Direto "foi responsável pela atribuição aos cidadãos de um direito de primeiríssima grandeza, de importância inquestionável, o direito de participação nas decisões estatais. (...) Concebida como a possibilidade de intervenção direta ou indireta do cidadão na gestão da Administração Pública, de caráter consultivo ou deliberativo, a participação popular na Administração Pública – ou participação administrativa – é considerada um dos principais meios para tornar efetiva a democracia administrativa". [26]

Contudo, é notório no país, infelizmente, o desprezo com que são tratadas a noção de cidadania e de democracia tanto pela administração quanto pelos administrados. O Controle Social traz em seu bojo a possibilidade de mudar tão impregnada concepção. Segundo Juarez Freitas, o aludido controle "acarreta um notabilíssimo avanço pedagógico, propiciador, a longo prazo, de funda mudança de mentalidade" dos administrados. [27]

É claro que só a promulgação de leis não será capaz de mudar de imediato a mentalidade do público-usuário. Esse é mais um problema sociológico do que jurídico. Contudo, é evidente que o cidadão, a partir do momento que se der conta que está munido de vários mecanismos legais, que consagram a noção de cidadania e de democracia participativa, e que sua opinião poderá efetivamente influir nas decisões estatais que restringem a sua esfera individual, não irá, de maneira alguma, deixar de exercê-los. A partir desse momento o usuário estará convencido de que "pode e deve exigir a prestação de serviços públicos tão bons, eficientes e módicos como os que têm se acostumado a exigir dos prestadores privados no regime de competitividade da economia de mercado". [28]

Com o cidadão agindo dessa maneira, será cada vez mais difícil ao administrador público e principalmente as empresas concessionárias se absterem da vontade dos cidadãos usuários quando de sua atuação. É fácil concluir, portanto, que o Controle Social, e a valorização da cidadania acarretada, concedem "maior legitimidade e eficiência à ação estatal – pois as decisões públicas compartilhadas com os seus destinatários são cumpridas com mais empenho e com menos resistência". [29] Daí, a relevância do tema em questão, e a importância de se pensar um Controle Social da prestação dos Serviços Públicos forte, coeso, inteligente, flexível, e principalmente efetivo e respeitado pelos Administradores Públicos e pelos particulares incumbidos deste tão honroso munus público.


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Sobre o autor
Edgard Marcelo Rocha Torres

Procurador da Fazenda Nacional, especialista em direito Público pelo CAD/UGF, pós graduando em direito internacional pelo CEDIN/FMC

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TORRES, Edgard Marcelo Rocha. A importância do controle social da prestação dos serviços públicos concedidos aos particulares. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2535, 10 jun. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/15011. Acesso em: 26 dez. 2024.

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