1. INTRODUÇÃO
Afinal, a solução no combate à
criminalidade, em especial nos grandes centros urbanos, passa
pela redução da idade de imputabilidade penal hoje
fixada em 18 anos? Alguns setores dão tanta ênfase
a esta proposta que induzem a opinião pública a
crer que seria a solução mágica na problemática
da segurança pública, capaz de devolver a paz social
tão almejada por todos. A linha principal do argumento
é de que cada vez mais adultos se servem de adolescentes
como "longa manus" de suas ações criminosas,
e que isso impede a efetiva e eficaz ação policial.
Outros retomam o argumento do discernimento, que o jovem pode
votar aos 16 anos e que hoje tem acesso a um sem número
de informações que precipitam seu precoce amadurecimento
etc.
2. INIMPUTABILIDADE, NÃO IMPUNIDADE
A primeira distinção que impõe seja feita, frente ao torvelinho de idéias que são lançadas, é que é preciso estabelecer a necessária distinção entre inimputablidade penal e impunidade.
A inimputabilidade - causa de exclusão da responsabilidade penal - não significa, absolutamente, irresponsabilidade pessoal ou social.
O clamor social em relação ao jovem infrator - menor de 18 anos - surge da equivocada sensação de que nada lhe acontece quando autor de infração penal. Seguramente a noção errônea de impunidade se tem revelado no maior obstáculo à plena efetivação do ECA, principalmente diante da crescente onda de violência, em níveis alarmantes. A criação de grupos de extermínio, como pseudo-defesa da sociedade, foi gerada no ventre nefasto daqueles que não percebem que é exatamente na correta aplicação do ECA que está a salvaguarda da sociedade. Todo o questionamento que é feito por estes setores parte da superada doutrina que sustentava o velho Código de Menores, que não reconhecia a criança e o adolescente como sujeitos, mas mero objetos do processo. Daí crerem ser necessário reduzir a idade de imputabilidade penal para responsabilizá-los. Engano ou desconhecimento.
A circunstância de o adolescente não
responder por seus atos delituosos perante a Corte Penal não
o faz irresponsável. Ao contrário do que sofismática
e erroneamente se propala, o sistema legal implantado pelo Estatuto
da Criança e do Adolescente faz estes jovens, entre l2
e l8 anos, sujeitos de direitos e de responsabilidades e, em caso
de infração, prevê medidas sócio-educativas,
inclusive com privação de liberdade.
Muitas das críticas feitas à atual legislação da criança e do adolescente, ou os "arreganhos" dos adversários do ECA, assim definidos pelo Ministro Sepúlveda Pertence (1), podem ser dimensionadas nas palavras de Antônio Carlos Gomes da Costa (2): "vomitam aquilo de que não se alimentaram".
Diferentemente do que é bradado, a máxima
"com menor (3) não dá nada", está
em desacordo com o que preceitua nosso sistema. O Estatuto prevê
e sanciona medidas sócio-educativas (4) eficazes, reconhece
a possibilidade de privação provisória de
liberdade ao infrator, não sentenciado - inclusive em parâmetros
mais abrangentes que o CPP destina aos imputáveis na prisão
preventiva - e oferece uma gama larga da alternativas de responsabilização,
cuja mais grave impõe o internamento sem atividades externas.
3. PRIVAÇÃO DE LIBERDADE DO INFRATOR
A propósito dessa medida privativa de liberdade - internação na linguagem da lei -, o que a distingue fundamentalmente da pena imposta ao maior de l8 anos é que, enquanto aquela é cumprida no sistema penitenciário (5)- que todos sabem o que é, nada mais fazendo além do encarcerar - onde se misturam criminosos de toda espécie e graus de comprometimento - aquela há que ser cumprida em um estabelecimento próprio para adolescentes infratores, que se propõe a oferecer educação escolar, profissionalização, dentro de uma proposta de atendimento pedagógico e psicoterápico, adequados a sua condição de pessoas em desenvolvimento. Daí não se cogitar de pena, mas sim, medida sócio-educativa, que não pode se constituir em um simples recurso eufêmico da legislação.
Neste sentido fazem-se notáveis as deliberações
tomadas quando da Primeira Reunião de Cúpula do
Poder Judiciário Sobre Infância e Juventude, em Porto
Alegre, no início de 1995 (6), quando, presentes os representantes
de todos os Tribunais do País, juntamente com o Ministro
da Justiça Nelson Jobim (7) e Ministros de Cortes Superiores,
foi afirmada a prioridade do Judiciário na plena efetivação
do ECA, inclusive com a criação de internatos adequados,
em uma política nacional que priorize este segmento estratégico
ao desenvolvimento da Nação. A propósito,
apenas para citar dois exemplos em extremos do País, os
Estados de Roraima (8) e do Rio Grande do Sul (9) têm, aquele
já concluído, e este em fase de execução,
interessantíssimos projetos de construção
de unidades para internamento de adolescentes infratores, nos
exatos termos preconizados pelo ECA.
4. MEDIDA SÓCIOEDUCATIVA x PENA
O argumento de que cada vez mais os adultos se servem
de adolescentes para a prática de crimes e que por isso
faz-se necessária a redução da idade de imputabilidade
penal, se faz curioso. Ora, se pretende estender ao "mandado"
o mesmo sistema que não alcança o "mandante"?
Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas
a este cominadas (10), regra geral do concurso de agentes. Se
a questão for de eficácia de sistema; porque o mandante
(de regra "pior" que o executor direto) não é
responsabilizado? Aliás, reprimido o mandante se exclui
a demanda. Na verdade o argumento dos arautos do rebaixamento
se faz falacioso. O Estatuto oferece amplos mecanismos de responsabilização
destes adolescentes infratores, e, o que se tem constatado, em
não raras oportunidades, é que, enquanto o co-autor
adolescente foi privado de liberdade, julgado e sentenciado, estando
em cumprimento de medida, seu parceiro imputável muitas
vezes sequer teve seu processo em juízo concluído,
estando freqüentemente em liberdade (11).
5. UMA JUSTIÇA INSTANTÂNEA
Quanto à eficácia e eficiência de ação na área infracional não há como deixar de mencionar os extraordinariamente positivos resultados que vem sendo obtidos no projeto "Justiça Instantânea", implantado no Juizado da Infância e Juventude de Porto Alegre, e em vias de ser estendido às maiores Comarcas do Interior. Neste projeto, Polícia, Ministério Público, Defensoria e Judiciário funcionam em unidade integrada, no mesmo prédio, dando solução quase imediata às situações de flagrância trazidas pela Polícia Militar ou pela própria Polícia Civil. O adolescente é ouvido pelo Delegado, forma-se o procedimento, submetido ao Promotor, com assistência de advogado, e, feita a representação, é imediatamente apresentado a Juízo, ouvindo-se vítima e testemunhas, se for o caso. Ali, de regra, são imediatamente solucionados, com sentença (12).
O funcionamento adequado de um sistema de infância e juventude, preventivo - com ação eficaz dos Conselhos Tutelares (13) - e repressivo, há de fazer parte de uma política de ação. O resultado que se constata em Porto Alegre é a redução da reincidência e até mesmo uma mudança no perfil da "clientela" do Juizado, com muitos jovens de classe média sendo trazidos a Juízo, fato que raramente se cogitava na época da Justiça de Menores, tachada como um Juizado para os pobres (14).
A ação efetiva de todos os agentes envolvidos com a questão infracional passa, necessariamente, por um comprometimento de todos os atores deste processo, desde Polícia, em uma ponta, até o Juiz, na outra. Para isso há de existir decisão política e engajamento de todos os poderes, Executivo, Legislativo e Judiciário, fazendo valer a prioridade absoluta preconizada no art. 227 da Constituição Federal. O Estatuto é uma receita que a nós cumpre aviar (15).
6. O MÓDULO DE INTERNAMENTO
Outra questão que tem sido levantada se refere ao módulo máximo de internamento de um adolescente infrator, fixado em três anos, com limite em 21 anos de idade para sua liberação. A matéria, embora admita avaliação (16), merece algumas reflexões frente ao conjunto do sistema penal do imputável, apresentado como solução ao controle da criminalidade. Deve-se considerar, por exemplo, que, para um adulto permanecer três anos "fechado", sem perspectiva de alguma atividade externa, sua pena deverá situar-se em um módulo não inferior a dezoito anos de reclusão, eis que cumpridos 1/6 da pena (que são os mesmos três anos (17) a que se sujeita o adolescente) terá direito a benefício (18). Não se pode desconsiderar, no caso do adolescente, que três anos na vida de um jovem de 16 anos representa cerca de 1/5 de sua existência, em uma fase vital, de transformações, na complementação da formação de sua personalidade, onde se faz possível a fixação de limites e valores.
Mesmo aqueles jovens de remoto prognóstico
de recuperação merecem tal oportunidade, até
porque, adequadamente tratados, são animadores os resultados
obtidos. A experiência que se tem tido nestes mais de seis
anos de Estatuto da Criança e do Adolescente é altamente
satisfatória, a ponto de se poder afirmar que em um índice
de 70 a 80% dos jovens adequadamente atendidos nas medidas sócio-educativas
que lhe são impostas, obtém plenas condições
de uma completa integração social ao final.
7. O ADOLESCENTE E O VOTO
Outro argumento utilizado na justificação da redução da idade diz respeito ao fato de o jovem poder votar, escolhendo desde Presidente da República até Vereador.
Dizer-se que se o jovem de l6 anos pode votar e por isso pode ir para a cadeia é uma meia-verdade (ou uma inverdade completa). O voto aos l6 anos é facultativo, enquanto a imputabilidade é compulsória. De resto, a maioria esmagadora dos infratores nesta faixa de idade sequer sabem de sua potencial condição de eleitores; falta-lhes consciência e informação.
A questão de fixação de idade determinada para o exercício de certos atos da cidadania decorre de uma decisão política e não guarda relações entre si, de forma que a capacidade eleitoral do jovem aos dezesseis anos - FACULTATIVA - se faz mitigada. Nossa legislação, a exemplo das legislações de diversos países, fixa em 21 anos de idade a maioridade civil. Antes disto, por exemplo, não há casamento sem autorização dos pais (19), e sómente após se faz apto a praticar, sem assistência, atos da vida civil.
A propósito a legislação brasileira fixa diversos parâmetros etários, não existindo uma única idade em que se atingiria, no mesmo momento, a "maioridade absoluta". Um adolescente pode trabalhar a partir dos 14 anos e, no plano eleitoral, estabelece que o cidadão para concorrer a vereador deve ter idade mínima de 18 anos; 21 anos para Deputado, Prefeito ou Juiz de Paz; 30 anos para Governador, e 35 anos para Presidente, Senador ou Ministro do STF ou STJ (20). Não há critério subjetivo de capacitação e sim decisão política. Tanto é assim que Jesus Cristo, que morreu aos 33 anos, a par de sua indiscutível capacidade e discernimento, no Brasil não poderia exercer a Presidência da República.
Assim, mesmo sendo discutível a decisão
constituinte de outorgar o voto facultativo aos 16 anos, o fato
de per se não leva à conclusão que o adolescente
nesta idade deva ser submetido a outro tratamento que não
aquele que o Estatuto lhe reserva em caso de crime - mesmo eleitoral.
8. A REDUÇÃO DE IDADE PARA CONCESSÃO DA CARTEIRA NACIONAL DE HABILITAÇÃO
Quanto à Carteira de Motorista, tão reclamada pelos jovens filhos da burguesia, o que há a ser dito é que as medidas sócio-educativas do ECA são tão ou mais eficazes e rigorosas que as penas que o atual sistema penal reserva aos autores de crimes culposos no trânsito maiores de l8 anos (21). Não há necessidade de redução da imputabilidade penal para responsabilizá-los, como sustentam alguns, que postulam, como condição à redução de idade para concessão da CNH, o rebaixamento de idade de imputabilidade penal.
Na forma em que vem sendo conduzida esta questão, inclusive pelo teor de veto lançado pelo ex-presidente Itamar Franco a projeto aprovado no Congresso relativamente ao rebaixamento de idade para obtenção da Carteira de Motorista, neste País onde se afirma mata-se cerca de 50 mil pessoas ao ano em acidentes de trânsito, a idéia é de poder entregá-la para os filhos dos ricos - afinal, no Brasil automóvel ainda é privilégio -, para poder lançar os filhos dos pobres na cadeia.
9. O DISCERNIMENTO
Outro ponto objeto da argumentação pelo rebaixamento diz respeito ao discernimento. De que o jovem de hoje, mais informado, amadurece mais cedo.
Ninguém discute a maior gama de informações ao alcance dos jovens. A televisão hoje invade todos os lares com suas informações e desinformações, trazendo formação e deformação.
Considerando o desenvolvimento intelectual e o acesso médio à informação, é evidente que qualquer jovem, aos 16, l4 ou 12 anos de idade é capaz de compreender a natureza ilícita de determinados atos. Aliás, até mesmo crianças pequenas sabem que não se pode matar, que machucar o outro é "feio" ou que não é permitido tomar para si o objeto do outro. O velho Catecismo Romano já considerava os sete anos como a "idade da razão", a partir da qual é possível "cometer um pecado mortal". Esse raciocínio sobre o discernimento, levado às últimas conseqüências, pode chegar à conclusão de que uma criança, independentemente da idade que possua, deva ser submetida ao processo penal e, eventualmente, recolhida a um presídio, desde que seja capaz de distinguir o "bem" do "mal".
O que cabe aqui examinar é a modificabilidade do comportamento do adolescente, e sua potencialidade para beneficiar-se dos processos pedagógicos, dada sua condição de pessoa em desenvolvimento.
A experiência dos Juizados da Infância e da Juventude no Rio Grande do Sul tem demonstrado que, aplicadas com seriedade as medidas constantes do Estatuto, diversos adolescentes, internados por infrações gravíssimas, como homicídio e latrocínio, têm logrado efetiva recuperação, após um período de internação. Progressivamente, esses jovens têm passado da privação total de liberdade à semi-liberdade e à liberdade assistida. Muitos passam algum tempo prestando serviços à comunidade, numa forma de demonstrar a si próprios e à sociedade que são capazes de atos construtivos e reparadores.
O Brasil já mandou para o sistema criminal adolescentes. Maria Auxiliadora Minahim (22), em seu interessantíssimo "Direito Penal da Emoção" (23), onde destaca que a inimputabilidade dos menores de 18 anos é uma conquista que cumpre ser defendida, citando Bento Faria, ao comentar o Código Penal pátrio de 1890, em seu art. 30 (onde se fixa a inimputabilidade dos jovens até 14 anos) traz o relato de uma série de decisões dos tribunais, de mandar soltar meninos recolhidos em prisões de adultos por falta de instituições adequadas.
O jovem de 1890 teria maior ou menor discernimento que hoje? Se a matéria evoluiu para uma atenção diferenciada, em um País em que as diferenças sociais são abissais, isso revela uma evolução de política criminal, conceito dissociado da idéia de discernimento (24).
A opção por um tratamento diferenciado ao jovem infrator - conceituado como "delinqüente" na linguagem dos opositores do ECA - resulta de uma disposição política do Estado, na busca de uma cidadania que se perdeu - ou jamais foi conquistada.
Revela a história que a preocupação
oficial sobre a questão do jovem, como sujeito de um direito
diferenciado, encontra precedente histórico apenas em 1896,
em Nova Iorque, quando foi registrado o primeiro processo judicial
efetivo tendo como causa maus-tratos causados a uma menina de
nove anos de idade pelos seus próprios pais. A parte que
propôs a ação foi a Sociedade Para a Proteção
de Animais, de Nova Iorque. Dessa sociedade é que surgirá
a primeira liga de proteção à infância
(25).
10. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em suma. O "arsenal" de recursos postos à disposição da sociedade pelo Estatuto da Criança e do adolescente prescinde da anacrônica proposta de redução da idade de imputabilidade penal para o enfrentamento da questão atinente à criminalidade juvenil.
Para tanto o que necessitamos é de compromisso com a efetivação plena do Estatuto da Criança e do Adolescente em todos os níveis - sociedade e Estado (26) - fazendo valer este que é um instrumento de cidadania e responsabilização - de adultos e jovens.
A opção por um tratamento diferenciado ao jovem infrator - "delinqüente" na linguagem dos opositores do ECA - resulta de uma disposição política do Estado, na busca de uma cidadania que se perdeu - ou jamais foi conquistada.
Penso restar demonstrado que inimputabilidade penal não é sinônimo de impunidade ou irresponsabilidade. O Estatuto da Criança e do Adolescente oferece uma resposta aos justos anseios da sociedade por segurança e, ao mesmo tempo, busca devolver a esta mesma sociedade pessoas capazes de exercer adequadamente seus direitos e deveres de cidadania.
Como já foi possível expressar em
outra oportunidade: Reformar a Constituição Federal
para reduzir a idade de imputabilidade penal, hoje fixada em 18
anos, significa um retrocesso, um desserviço, um verdadeiro
atentado. A criminalidade juvenil crescente há de ser combatida
em sua origem - a miséria e a deseducação
. Não será jogando jovens de 16 anos no falido sistema
penitenciário que se poderá recuperá-los.
Mesmo aqueles de difícil prognóstico recuperatório
a sociedade tem o dever de investir, máxime porque a porcentagem
daqueles que se emendam - dentro de uma correta execução
da medida que foi aplicada - faz-se muito maior e justifica plenamente
o esforço. Não for pensado assim, amanhã
estar-se-á questionando a redução da idade
de imputabilidade penal para doze anos, e depois para menos, quem
sabe, até que qualquer dia não faltará quem
justifique a punição de nascituros, preferencialmente
se pobres... (27)
- Discurso proferido por ocasião da lançamento do CD-ROM Direitos da Criança e Do Adolescente, em Brasília, em iniciativa conjunta da UNICEF, Fundação Banco do Brasil e AJURIS
- Pedagogo, Consultor da UNICEF, ex-presidente da CBIA
- Em uma viagem, por acaso, caiu em minhas mãos um jornal
de grande circulação do Estado do Paraná.
Naquela interminável jornada, na busca de passar o tempo,
não só li aquilo que normalmente me interessa em
um jornal, como acabei me deparando com a indefectível
página policial dos periódicos, local antigamente
destinado às tragédias do cotidiano. Digo antigamente
porque hoje o jornalismo se faz quase sómente de desgraças,
não escapando dessas nem as futilidades das colunas sociais.
A manchete da página policial, porém, por seu conteúdo ideológico, até hoje me serve como exemplo emblemático de parcela significativa de nossa cultura brasileira: "Menor assalta criança na frente da escola". Menor era o infrator; criança, a vítima.
Nisso pode ser resumida toda a dificuldade para completa efetividade da doutrina da proteção integral preconizada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Ainda se raciocina no sentido de que crianças são os filhos bem nascidos e menores são os outros: Os pobres, os negros, os meninos de rua, os excluídos. - Ver "Adolescentes em Confronto com a Lei : O ECA como instrumento de Responsabilização ou a eficácia das Medidas Sócio-Educativas "- AJURIS 67/60.
- "A organização penitenciária brasileira é um instrumento de degradante ofensa às pessoas sentenciadas. O condenado é exposto a penas que não estão no Código Penal, geradas pela promiscuidade e pela violência. O sistema penitenciário subverte as funções da pena. Assim, deixa de cumprir sua meta básica, que é a de ressocialização" - Ministro José Celso de Mello Filho, à VEJA, p.11,em 5 de março de 1997.
- A Reunião de Cúpula sobre o Novo Direito da Infância e da Juventude, realizada em Porto Alegre de 22 a 24 de março de 1995, representou episódio inédito na história do Poder Judiciário brasileiro .
- A pauta do Novo Direito da Infância, advindo da Doutrina
da Proteção Integral da Infância preconizada
pelas Nações Unidas, fez convergir as presenças
dos ocupantes dos mais elevados postos administrativos e políticos
do Judiciário nacional .
Ministros do Supremo Tribunal Federal, Ministros do Superior Tribunal de Justiça, Presidentes dos Tribunais de Justiça, Corregedores-Gerais de Justiça e Presidentes de Associações de Magistrados, após refletirem sobre as inovações da ordem jurídica de proteção à infância, selaram compromisso com a efetividade prática do novo modelo .
Ao comemorar-se o 5° ano de vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente, a magistratura brasileira pode proclamar que não se faz alheia aos problemas sociais que tanto afligem nossa Nação, e que, respondendo à altura os reclamos na sociedade civil, encontra-se a serviço da cidadania para levar às últimas conseqüências práticas as transformações trazidas pelo novo ordenamento . - Quando da Reunião de Cúpula do Poder Judiciário sobre infância e juventude, o Ministro Nelson Jobim foi interrompido em sua fala pelos aplausos de uma platéia que lotava o salão de eventos do Plaza São Rafael, ficava a convicção de que não se tornaria a discutir a questão da imputabilidade penal aos menores de l8 anos na atual reforma constitucional. Os aplausos daquele qualificado auditório ao Ministro aconteceram quando este afirmou a posição do Ministério da Justiça e do próprio Governo Federal de que não há o que ser alterado na Constituição brasileira sobre este tema, que resta muito bem equacionado no plano legal.
- Centro Sócio - Educativo Homero de Souza Cruz Filho - O adolescente autor de ato infracional grave passou a receber atenção do governo. A iniciativa possibilita uma prática educativa de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente.
- O Governo do Estado do Rio Grande do Sul desenvolve a construção de dez unidades de internamento para adolescentes infratores, nas sedes dos Juizados Regionais da Infância e Juventude, em cidades-pólo no Estado, permitindo que o adolescente privado de liberdade afaste-se o mínimo possível de sua realidade social e familiar . Estão em andamento as obras em Caxias do Sul, Santa Maria e Porto Alegre, havendo projetos licitados de outras sete unidades.
- Art. 29 do Código Penal que consagra a Teoria Unitária em nosso sistema penal.
- Zero Hora divulgou em 06.09.94, que adolescentes participam de l0% dos delitos da Grande Porto Alegre. A propósito, a estatística não inclui apenas autores dos atos infracionais, mas também como vítimas. Ora, o percentual destes no montante da população é de cerca de 40%. Se estes se envolvem em l0% dos delitos, é porque os 90% dos crimes são de adultos, o que permite concluir que a lei penal para o adulto não é remédio suficiente. Ou em resumo, querem estender ao adolescente um modelo que não está dando certo com o adulto.
- De 08.05.1996 a 28.02.l997 foram iniciados na "Justiça Instantânea" 2.145 procedimentos. Destes, 1.472 foram concluídos no mesmo dia ( 68,62%); 458 ( 21,35 % ) tiveram tramitação parcial - vítima e testemunhas ouvidas em outro dia - e 215 ( 10,03 % ) foram remetidos à tramitação normal. Dos adolescentes julgados, 67 foram encaminhados à abrigo, pois não foram localizadas suas famílias, e 185 receberam medida de internamento.
- Instituições centenárias não podem tutelar o Conselho Tutelar: é preciso detectar os erros para apoiar a instituição na busca do bom caminho. No trabalho comunitário é que se irá poder precocemente constatar o flagelo da violência no seio da família. Hoppe, Marcel - A questão da Violência, in Indiferença, Derrube este Muro - Seminário da Criança e do Adolescente, Promoção da Associação dos Procuradores do Município de Porto Alegre, anais publicados em Janeiro de 1996.
- Por ocasião do III Seminário Latino Americano do Avesso ao Direito, tratando da evolução da doutrina da situação irregular à da proteção integral da criança e do adolescente, em São Paulo, entre 19 e 23 de outubro de 1992, a Oficina sobre Justiça da Infância e Juventude, entre outras conclusões, apresentou: os sistemas de justiça "tutelar", por estarem baseados na doutrina da situação irregular, não atendem às expectativas dos povos da América Latina, permanecendo em todos os países a justiça de menores como uma justiça de menor importância. Pelo anterior sistema - da doutrina da situação irregular, que norteava o velho Código de Menores, os juizados estavam reduzidos a meros instrumentos de controle da pobreza.
- Marcel Hoppe, Juiz da Infância e Juventude em Porto Alegre foi responsável pela reestruturação do Juizado da Infância e Juventude da Capital e se constitui em uma das maiores autoridades na matéria em nosso País.
- Os índices de recuperação e não reincidência em infratores sujeitos a internamento autorizam um juízo otimista em relação ao módulo máximo de privação de liberdade fixado no ECA.
- No episódio do homicídio da atriz Daniela Perez, o acusado condenado recebeu pena pouco superior a dezenove anos, pelo que, cumpridos pouco mais de tres anos, poderá ver progredido seu regime prisional. A considerar ainda que um condenado entre 18 e 21 anos de idade, que não era o caso daquele, tem a seu favor a atenuante prevalente da minoridade, que sempre lhe reduz a pena. Portanto o módulo de tres anos de internamento a que se submete o adolescente, com possibilidade de exclusão de qualquer atividade externa, não está em desacordo com a realidade penal brasileira.
- Art.. 37 da LEP. No sistema penal brasileiro (arts. 112, da LEP, e 33, do CP) cumpridos 1/6 da pena, o condenado preenche requisito objetivo que o habilita à progressão de regime ( de fechado para semi-aberto, por exemplo). Assim, não é exagero afirmar que, para um adulto permanecer três anos em regime fechado, privado de liberdade sem atividades externas, há de receber pena não inferior a dezoito anos. A insuceptibilidade de progressão, mesmo nos chamados "crimes hediondos" , por inconstitucionalidade, divide a jurisprudência, e no RS o entendimento prevalente nas Varas de Execução Criminal é pelo cabimento da progressão.
- Chega ser contraditório não poder casar sem autorização dos pais e poder ser preso.
- Arts. 14, § 3º, 101 e 104, parágrafo único, da CF.
- Homicídio Culposo ou Lesões Corporais culposas resultam em penas de detenção, normalmente convertidas em prestação de serviço à comunidade ou outra pena alternativa. O ECA dispõe de medidas sócio-educativas similares aptas a darem uma resposta tão ou mais eficaz no plano da responsabilização dos agentes. No plano da responsabilidade civil a questão prescinde de discussão, estando disciplinada no Código Civil.
- Professora da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, Mestra e Doutora em Direito Penal pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.
- Direito Penal da Emoção - A inimputabilidade do menor. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 1992.
- A exposição de motivos ao CP de 1940 tachava os menores de 18 de imaturos (item 19) . Já a Exposição de Motivos da Nova Parte Geral (1984) afirma tratar-se de opção (a inimputabilidade) apoiada em critérios de política criminal, em seu item 23.
- Hoppe, Marcel. A questão da Violência, in Indiferença, op. cit..
- "A aceitação de práticas de violência contra as crianças, vem a dar causa ao extermínio, que não é contra a infância em geral mas contra os menores. No ano de 1989, morreram no Brasil 400.000 crianças por causas evitáveis. Deodato Rivera afirma que não houve nenhuma manifestação maior da sociedade e pergunta: "O que aconteceria se fosse noticiada a morte de 400.000 bezerros?". Seria o caos econômico. Seria a falência da estrutura. A imprensa noticia todo o dia a violência física: a violência urbana. Assunto permanente é a superlotação de presídios. Presídios são interditados. Presídios são abertos. Trocam-se agentes penitenciários por brigadianos (PMs). O povo reclama: "Falta policiamento". Os policiais rebatem: "Não temos condições para atender, faltam verbas, faltam veículos. Não há nada". Mesmo nos Estados Unidos, com seu enorme potencial econômico, o enfrentamento do problema se revelou ineficaz. Ali, como aqui, tenta-se combater as conseqüências do problema, ocorre o aumento do tamanho do governo. A doença com mais serviço médico. O crime com mais aparato policial. O incêndio com mais bombeiros. Agora naquele país está ocorrendo exatamente o inverso. Na Califórnia, Flórida, Ilinois, está se trabalhando na prevenção, A conclusão de que para 1 kg necessário a correção basta aplicar 1 grama na prevenção. Atender o social é prevenir o jurídico. A atuação dos Conselhos Tutelares é exatamente necessária para esse desiderato. As pessoas precisam saber que essa nova instituição tem finalidades específicas e não é subordinada a nenhuma outra. A sua intervenção eficaz é capaz de resolver precocemente os problemas"- Hoppe Marcel, A Questão da Violência, op. cit..
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