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A questão da maioridade penal e a FEBEM

Agenda 01/10/1999 às 00:00

Nos últimos dias assistimos várias fugas na FEBEM e tais episódios estimularam uma ampla discussão sobre os menores infratores e a questão da maioridade penal no Brasil.

Hoje a maioridade penal se dá quando a pessoa completa 18 anos, isto porque o critério adotado pelo legislador nacional, foi o critério etário, o qual estabelece uma idade definida como sendo um verdadeiro marco a dividir a compreensão das coisas, podendo ser responsabilizado por elas e, antes desse marco, como se não entendesse sua conduta.

Trata-se, na verdade de uma ficção, porquanto convencionou-se que exatamente a zero hora do dia do aniversário, no qual a pessoa completa 18 anos, como num passe de mágica, aquele indivíduo passa a compreender tudo o que faz, ao contrário do minuto anterior, quando ainda não havia completado a maioridade, não entendendo o que fizera.

Como salientei, trata-se de uma ficção jurídica, que já não atende a modernidade.

Nesse contexto, articula-se raciocínio pelo qual um jovem com 17 anos, ou até 16 anos, saberia muito bem o que está fazendo, de modo que a maioridade penal deveria ser rebaixada para aquelas idades, asseverando que um jovem de 16 anos e meio, que mata, deveria ser tratado como se adulto fosse, isto é, tratando-o como maior para efeitos penais e tal se daria com o rebaixamento da maioridade penal brasileira.

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Esse raciocínio traz o mesmo equívoco observado anteriormente, pois também, num passe de mágica o jovem com 15 anos, onze meses e vinte nove dias não entenderia sua conduta, ao passo que instantes depois, ao completar 16 anos, passaria a compreender o caráter criminoso de sua ação, permanecendo a ficção jurídica.

Alguns países que enfrentaram esse mesmo problema encontraram um critério talvez mais justo e adequado, a ensejar a possibilidade da verificação, caso a caso, se a criatura, quando do cometimento de um delito poderia entender o caráter criminoso daquela conduta, bastando para tanto uma verificação interdisciplinar, envolvendo aspectos psicológicos, psiquiátricos, sociológicos, jurídicos, etc. Assim, tais países fixaram uma idade como patamar mínimo, em idade bastante baixa, por exemplo 12 anos e a partir dessa idade base, poder-se-á atribuir responsabilidade penal, desde que o indivíduo entenda o que fez, verificação realizada naquele exame.

Dessa forma, poderão haver pessoas com a mesma idade cronológica contudo, com capacidade de entendimento diversas, a ensejar responsabilização também diferenciada. Trata-se do critério bio-etário ou bio-psicológico.

Inegável que nosso país com dimensões continentais não poderá er uma idade fixada cronologicamente para todos seus rincões, uma vez que não se compara o jovem de 15 anos de um grande centro, sujeito a todos os apelos tecnológicos, com um jovem de 15 anos nascido e criado nos bastidores do país, que não tem acesso a qualquer meio de informação, por exemplo, cortando cana de sol-a-sol, inegável que ambos trazem gigantesca diferença de compreensão, somente sanável por um exame apurado, jamais pela maioridade cronológica, que os iguala injustamente.


Essa questão da maioridade penal no Brasil, ainda será muito discutida, mas não se pode esquecer que o rebaixamento dessa idade implica no envio de seus contemplados para o sistema penitenciário, que certamente está tão necrosado, senão pior que o sistema FEBEM.

Qualquer alteração na maioridade penal haverá de ser conjugada com uma nova concepção de unidade de reeducação, pois caso contrário, estaremos varrendo a sujeira para debaixo do tapete.

Sobre o autor
Luiz Flávio Borges D'Urso

Advogado Criminalista, Mestre e Doutor em Direito Penal pela USP, Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção de São Paulo por três gestões (2004/2012), Presidente de Honra da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (ABRACRIM) e Presidente da Academia Brasileira de Direito Criminal (ABDCRIM).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

D'URSO, Luiz Flávio Borges. A questão da maioridade penal e a FEBEM. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 35, 1 out. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1653. Acesso em: 23 nov. 2024.

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