Tem se tornado uma constante a discussão sobre a necessidade de se minorar o rigorismo quanto a pena e sua execução nos casos de delitos que não imponham grave ameaça ou violência à pessoa, por razões até de Política Criminal, como própria válvula de escape na sugestão e tentativa de resolução do problema carcerário no Brasil.
Exemplo disso, vê-se a partir da edição da Lei nº 9.099/95, que deu definição e instituiu mecanismos processuais e medidas despenalizadoras, (composição civil dos danos, a transação penal e o sursis processual), pelo surgimento da figura dos "delitos de menor potencial ofensivo", o que possibilitou promover, de um lado a satisfação social, pela prestação jurisdicional efetiva, ante tais reprimendas, se assim pudermos considerá-las, haja vista o real conteúdo penal que possuem, sem ter de submeter o infrator necessariamente a "contaminação" do fadado sistema penitenciário brasileiro.
Pelo menos nisso merece aplausos o legislador, em reconhecer a fragilidade e inoperância desse sistema no sentido de não só reprimir o delinqüente, mas aos "trancos e barrancos", procurar compensar as inúmeras falhas desse insólito sistema no aprimoramento da legislação penal, principalmente quanto a delitos que efetivamente não merecem o castigo de privação do "ius libertatis", ainda que com isso chegue a sacrificar ou polemizar determinados institutos de direito penal.
É o caso da Lei nº 9.605/98, editada com o escopo de consolidar a legislação ambiental esparsa, reprimindo penal e administrativamente as atividades lesivas ao meio ambiente.
Críticas estão sendo alvejadas por renomados juristas, no sentido de que a lei em referência não prospera em seu conteúdo, quando por exemplo, responsabiliza penalmente a pessoa jurídica, ou tipifica culposamente o ato de "destruir, danificar, lesar ou maltratar plantas de ornamentação em propriedade privada alheia (.art. 49).", assim como, ao estabelecer reprimenda mais elevada (art.32, pena - detenção de três meses a um ano e multa), àquele que "maltrata animais silvestres ou domesticados, nativos ou exóticos", ao passo que ao próprio ser humano, a lei penal prevê a magra pena de detenção de dois meses a um ano ou multa ao delito de maus tratos.(art. 136, CP)
Todavia, vejamos com bons olhos o novo diploma legal, pois antes mesmo da edição da Lei nº 9.714/98, que alterou o art. 43 e 44 do Código Penal, acrescentando as penas restritivas de direito "prestação pecuniária" e "perdimento de bens e valores", bem como a hipótese de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos aos delitos com pena não superior a 4 (quatro) anos, a Lei em análise já contemplava tal possibilidade, em seus arts. 7º e 8º, o que segundo a regra geral de analogia, aplicar-se-iam aos demais delitos a partir de sua entrada em vigor até 25.11.98, data da edição da Lei nº 9.714/98, que passou a regular esses casos.
Ademais, o combatido texto legal trouxe à tona dispositivo claro, atinente a suspensão da pena, assim encartado:
"Art. 16. Nos crimes previstos nesta Lei, a suspensão condicional da pena pode ser aplicada nos casos de condenação a pena privativa de liberdade não superior a três anos."
Ora, de acordo com a regra geral de direito penal contida no art. 77, o sursis é aplicável nos casos de crimes com pena privativa de liberdade não superior a dois anos, com isso, inarredável o conteúdo mais benéfico do art. 16 da lei em comento, apesar do seu caráter específico, quer dizer, a priori, só aplicável aos delitos ambientais.
O instituto do "sursis" é único por definição e está disposto na Parte Geral do nosso Código Penal, razão porque aplicável a toda e qualquer norma legal que tipifique conduta penal, mesmo que em norma extravagante ou especial. Tanto é que deve ser reconhecido obrigatória e indistintamente pelo juiz na sentença, seja qual for o delito (eleitoral, militar, previdenciário, comum, ambiental, etc..). O mais importante é o fato de ser direito subjetivo do acusado, ainda que revel, nesse sentido: STF, RTJ 94/141.
Assim, não resta dúvida que a matéria concernente a suspensão da pena, tratando-se de delitos com pena privativa de liberdade não superior a três anos, como veio a estabelecer essa nova lei ambiental, no tocante ao prazo, derrogou o art. 77 da lei substantiva penal pátria.
Não obstante isso, é bom frisar que doutrinariamente procede essa afirmação, pois, cuida-se de questão submetida a notória aplicação do princípio da "novatio legis in melius", assentada no próprio ordenamento penal em seu art. 2º, sem esquecer que o sentido teleológico desse novel intento legal, conduz ao caminho da extensão dos seus efeitos jurídicos, haja vista não se tratar de regra sujeita a interpretação restritiva.
Concluo por assim dizer que a Lei nº 9.605/98, no geral, foi positiva, porque deixou o campo exclusivo da abstração (normalmente predominante entre as normas) e procurou com essa e outras inovações, trazer melhor exequibilidade no tratamento das sanções penais, naquelas situações delituosas não enquadradas como de grave ameaça ou violência à pessoa, estando, assim, em substancial consonância com a problemática penitenciária do país que em tais casos, não mais salvaguarda o intuito preventivo repressivo da pena, mediante a privação da liberdade do criminoso.