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Considerações sobre a fase de habilitação no procedimento licitatório à luz das exigências editalícias

Agenda 20/08/2010 às 13:23

Segundo a definição dada por Celso Antônio Bandeira de Mello, licitação é "o procedimento administrativo pelo qual uma pessoa governamental, pretendendo alienar, adquirir ou locar bens, realizar obras ou serviços, outorgar concessões, permissões de obra, serviço ou de uso exclusivo de bem público, segundo condições por ela estipuladas previamente, convoca interessados na apresentação de propostas, a fim de selecionar a que se revele mais conveniente em função de parâmetros antecipadamente estabelecidos e divuldados." [01] (destacou-se)

Desse conceito, verifica-se a indispensabilidade da confecção do instrumento convocatório para a realização do certame, denominado por Hely Lopes Meirelles como "lei interna da licitação", que traz as regras regedoras do certame, vinculando a Administração Pública e os concorrentes. O renomado autor leciona:

"Nada se pode exigir ou decidir aquém ou além do edital, porque é a lei interna da concorrência e da tomada de preços e segundo as condições, estabelecidas na convocação licitatória, é que os interessados deverão apresentar suas propostas, obedecendo, tanto na forma quanto no conteúdo, as especificações do órgão que promove a licitação. Em tema de proposta nada se pode oferecer, considerar, aceitar ou exigir além ou aquém do edital ou do convite. (...) o que faltar na proposta conduzirá à sua desclassificação." [02] (destacou-se)

Em pensamento uníssono, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem entendido:

"ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. LICITAÇÃO. FASE DE HABILITAÇÃO. COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS DE QUALIFICAÇÃO TÉCNICA.

1. Se a licitante não demonstrou, da forma prevista no Edital de convocação, o cumprimento dos requisitos relativos à qualificação técnica, não tem direito líquido e certo a ser habilitada no certame.

2. Recurso ordinário a que se nega provimento."

Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, Classe: ROMS - RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – 18240 Processo: 200400682387 UF: RS Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA Data da decisão: 20/06/2006 Documento: STJ000696608 Data da publicação: 30/06/2006

"PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. LICITAÇÃO. PRINCÍPIO DA VINCULAÇÃO AO ATO CONVOCATÓRIO. CLÁUSULAS EDITALÍCIAS. DESCUMPRIMENTO PELA LICITANTE. DESCLASSIFICAÇÃO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO.

1. A apresentação de documentos inidôneos pela licitante na fase de habilitação autoriza sua desclassificação do certame, nos termos da Lei n. 8.666/93, por desrespeitar as cláusulas do edital que, subsumindo-se em disciplina das regras de fundo e procedimentais da licitação, estabelece vínculo entre a Administração e os interessados com ela em contratar.

2. Não havendo nos autos elementos probatórios hábeis para demonstrar a suposta lesão a alegado direito líquido e certo, mostra-se inviável o cabimento da ação mandamental.

3. Recurso ordinário não-provido."

Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, Classe: ROMS - RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – 15901 Processo: 200300202760 UF: SE Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA Data da decisão: 15/12/2005 Documento: STJ000668951 Data de publicação: 06/03/2006. (destacou-se)

A fase de habilitação visa aferir se a pessoa interessada em contratar com a Administração preenche os requisitos e as qualificações para a adequada execução do objeto licitado, tendo por fim garantir o adimplemento das obrigações firmadas no contrato administrativo. Essa fase é de observância impositiva, devendo o agente público reclamar documentos conforme o objeto licitado, não podendo haver exigências desarrazoadas ou desproporcionais (como garantia ao princípio da igualdade), conforme indica o Manual de Orientações Básicas das Licitações e Contratos do Tribunal de Contas da União:

"É dever da Administração, ao realizar procedimentos licitatórios, exigir documentos de habilitação compatíveis com o ramo do objeto licitado, especialmente aqueles que comprovem a qualificação técnica e a capacidade econômico-financeira para participar de licitação na Administração Pública.

As exigências não podem ultrapassar os limites da razoabilidade e estabelecer cláusulas desnecessárias e restritivas ao caráter competitivo. Devem restringir-se apenas ao necessário para cumprimento do objeto licitado." [03]

Hely Lopes Meirelles, ao tratar sobre o assunto, tece críticas à burocracia exacerbada:

"A orientação correta nas licitações é a dispensa de rigorismos inúteis e de formalidades e documentos desnecessários à qualificação dos interessados. Daí por que a lei (art. 27) limitou a documentação, exclusivamente, ao comprovantes de capacidade jurídica, regularidade fiscal, capacidade técnica e idoneidade econômico-financeira. Nada mais se pode dos licitantes na fase de habilitação. Reconhecimentos de firmas, certidões negativas, regularidade eleitoral, são exigências impertinentes que a lei federal dispensou nessa fase, mas que a burocracia ainda vem fazendo ilegalmente, no seu vezo de criar embaraço aos licitantes. É um verdadeiro estrabismo público, que as autoridades superiores precisam corrigir, para que os burocratas não persistam nas suas distorções rotineiras de complicar aquilo que a legislação já simplificou. Os bons contratos, observe-se, não resultam das exigências burocráticas, mas, sim, da capacitação dos licitantes e do criterioso julgamento das propostas." [04]

Dessa forma, a Comissão instalada para licitação deve, com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, verificar se os documentos apresentados atingem os fins colimados pelo edital, com vistas à proceder a habilitação da empresa concorrente.

O Superior Tribunal de Justiça teve a oportunidade de apreciar questão semelhante, levando a Primeira Seção às seguintes decisões:

"ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. LICITAÇÃO. SERVIÇOS DE RADIODIFUSÃO. HABILITAÇÃO. DOCUMENTOS. INTERPRETAÇÃO. CLASSIFICAÇÃO. MANUTENÇÃO.

- A impetrante alega que a comissão de licitação, ao habilitar a proposta da concorrente que teria deixado de apresentar documentos exigidos no edital ou fazê-los de forma irregular, acabou por violar o princípio da vinculação ao instrumento convocatório.

- Os documentos exigidos pelo edital foram apresentados com teor válido e interpretados equivocadamente pelo concorrente, ou foram supridos por outros com mesma finalidade e mesmo valor probatório, razão pela qual inexistiu a alegada violação.

- "O interesse público reclama o maior número possível de concorrentes, configurando ilegalidade a exigência desfiliada da lei básica de regência e com interpretação de cláusulas editalícias impondo condição excessiva para a habilitação."(Resp 5.601/DF, Rel. Min. Demócrito Reinaldo).

-Mandado de segurança denegado."

Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, Classe: MS - MANDADO DE SEGURANÇA – 7814, Processo: 200100962456 UF: DF Órgão Julgador: PRIMEIRA SEÇÃO Data da decisão: 28/08/2002 Documento: STJ000455977 Data de Publicação: 21/10/2002 (destacou-se)

"ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO PÚBLICA. EXPLORAÇÃO DE SERVIÇOS DE RADIODIFUSÃO SONORA. HABILITAÇÃO. DOCUMENTAÇÃO SUFICIENTE PARA A COMPROVAÇÃO SOLICITADA NO EDITAL. MANDADO DE SEGURANÇA DENEGADO.

- Mandado de segurança impetrado com o objetivo de reverter a decisão que negou provimento aos recursos administrativos interpostos contra a habilitação de empresa concorrente, sob o

argumento de haver irregularidades nos documentos por ela apresentados.

- A documentação apresentada pela empresa impugnada foi suficiente para atender à finalidade editalícia, não havendo lacunas, o que se comprova com a apresentação posterior de documentação na formatação exigida pela impetrante.

- Segurança denegada."

Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, Classe: MS - MANDADO DE SEGURANÇA – 7816, Processo: 200100962683 UF: DF Órgão Julgador: PRIMEIRA SEÇÃO Data da decisão: 09/05/2002 Documento: STJ000449269 Data da Publicação: 16/09/2002

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A lei confere à Administração, na fase interna do procedimento, a prerrogativa de fixação das condições a serem estabelecidas no instrumento convocatório, seguindo critérios de conveniência e oportunidade de acordo com o objeto a ser licitado e sempre balizados pelo interesse público e normas cogentes.

Como exemplo prático e bastante comum na Administração Pública, a exigência editalícia de um engenheiro especializado na área de Engenharia de Segurança do Trabalho (Decreto 99.530/86 e Lei nº 7.410/85), com comprovação do seu vínculo com a empresa licitante, registro no CREA e atestados de capacidade técnica e operacional, em uma determinada obra pública, está baseada em exigências legais voltadas à segurança do meio ambiente de trabalho, em que estão submetidos os obreiros, e à proteção de terceiros. A área da segurança e medicina do trabalho visa oferecer condições de proteção à saúde do trabalhador no local de trabalho, estando as empresas empregadoras compelidas a observar as obrigações estatuídas no artigo 157 da Consolidação das Leis do Trabalho. Dentre essas obrigações, ressalta-se a mantença dos Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT), de acordo com o regramento da Norma Regulamentadora nº 4 da Portaria 3.214/78. O SESMT deve ser dimensionado segundo o nível de risco a que estão submetidos os obreiros na prestação do serviço.

Ressalte-se que, principalmente na concorrência, modalidade de licitação adequada para contratações de grande vulto, não se deve desprezar os requisitos mínimos previstos no edital, conforme leciona José dos Santos Carvalho Filho:

"Exatamente porque os recursos financeiros a serem empregados pela Administração são mais elevados, essa modalidade é a que apresenta, em seu procedimento, maior rigor formal e exige mais ampla divulgação. Por isso, dela podem participar quaisquer interessados que demonstrem possuir os requisitos mínimos de qualificação fixados no edital." [05] (destacou-se)

O objetivo de uma Comissão de Licitação na elaboração de um edital, ao estabelecer algumas exigências, eleitas como indispensáveis, é assegurar a regular execução do contrato com cláusulas fundamentais para o adimplemento das obrigações, nos termos do artigo 37, XXI, da CRFB/88, que dispõe:

"Ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações." [06] (destacou-se)

Dessa forma, a Administração pode exercer o seu poder discricionário a fim de estabelecer os requisitos caso a caso, conforme a necessidade do objeto e segundo os princípios e dispositivos norteadores do Direito Administrativo. Tal fato é corroborado pelo veto do Presidente da República Itamar Franco ao § 1º, inciso II, letras "a" e "b", do artigo 30 da Lei nº 8.666/93 (Lei nº 8.883/94), o qual colocaria limites à aludida discricionariedade, como leciona o ilustre Marçal Justen Filho, ao mencionar que:

"(...) o veto foi motivado pelo entendimento de que os limites previstos nos dispositivos vetados seriam muito amplos e propiciariam exigência de excessivo rigor para participação em licitações", ressaltando " que tais limites produziriam sensível alteração nas práticas usualmente adotadas pela Administração, impedindo exigências encontradiças nas licitações" [07]

Em entendimento uníssono, Hely Lopes Meirelles, in verbis:

"A comprovação da capacidade técnico-operacional continua sendo exigível, não obstante o veto aposto à letra ‘b’ do § 1° do art. 30. Na verdade, o dispositivo vetado impunha limitações a essa exigência e a sua retirada do texto legal deixou a critério da entidade licitante estabelecer, em cada caso, as exigências indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações, exigências, essas, que devem ser pertinentes e compatíveis com o objeto da licitação"." [08] (destacou-se)

O Tribunal de Contas da União, através do Enunciado de Decisão nº 351, assim se posicionou:

"A proibição de cláusulas ou condições restritivas do caráter competitivo da licitação não constitui óbice a que a Administração estabeleça os requisitos mínimos para participação no certame considerados necessários à garantia da execução do contrato, à segurança e perfeição da obra ou do serviço, à regularidade do fornecimento ou ao atendimento de qualquer outro interesse público (fundamentação legal, art. 3º, § 1º, inciso I, Lei 8.666/1993)." (destaca-se)

Em assuntos semelhantes, o Superior Tribunal de Justiça decidiu:

"RECURSO ESPECIAL - MANDADO DE SEGURANÇA - LICITAÇÃO - ARTIGO 30, II, § 1º DA LEI N. 8.666/93 - CERTIFICAÇÃO DOS ATESTADOS DE QUALIFICAÇÃO TÉCNICA - AUSÊNCIA DE REGISTRO NO CREA - VIOLAÇÃO À LEI DE LICITAÇÃO.

O artigo 30, inciso II, § 1º da Lei de Licitações, determina a comprovação de aptidão técnica, no caso de licitações pertinentes a obras e serviços, por atestados fornecidos por pessoas jurídicas de direito público ou privado, devidamente certificados pela entidade profissional competente.

In casu, porém, a empresa recorrida foi excluída de processo licitatório, na fase de habilitação, por não ter registrado no CREA o atestado, fornecido por pessoa jurídica de direito privado, que comprovava a execução de estrutura metálica com vão livre superior a vinte metros, conforme determinava o Instrumento Editalício.

É certo que o edital pode estabelecer exigências que particularizem as diretrizes elencadas pela lei, para que seja realmente aferida a capacidade técnica e operacional das empresas candidatas à execução da obra ou serviço. Não se pode, todavia, admitir a faculdade de excluir disposições legais que têm por finalidade justamente a garantia das informações apresentadas pelas licitantes por órgão oficial.

A presunção de autenticidade de documento fornecido por empresa particular é meramente iuris tantum e cede em face de lei que determina a certificação por entidade profissional, com status de representante da categoria e, portanto, em condições de aferir questões alusivas à capacitação técnica.

Recurso especial provido."

Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL – 324498, Processo: 200100567135 UF: SC Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA, Data da decisão: 19/02/2004 Documento: STJ000539502 Data de Publicação: 26/04/2004,

"ADMINISTRATIVO - LICITAÇÃO PÚBLICA - SERVIÇOS DE LEITURA DE HIDRÔMETROS E ENTREGA DE CONTAS - EDITAL - EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE EXPERIÊNCIA ANTERIOR - CAPACITAÇÃO TÉCNICA - ARTIGO 30, § 1º, I, E § 5º DA LEI N. 8.666/93 - RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO.

É certo que não pode a Administração, em nenhuma hipótese, fazer exigências que frustrem o caráter competitivo do certame, mas sim garantir ampla participação na disputa licitatória, possibilitando o maior número possível de concorrentes, desde que tenham qualificação técnica e econômica para garantir o cumprimento das obrigações.

Dessarte, inexiste violação ao princípio da igualdade entre as partes se os requisitos do edital, quanto à capacidade técnica, são compatíveis com o objeto da concorrência.

In casu, a exigência, prevista no edital, de apresentação de atestados que comprovem a experiência anterior dos participantes na prestação dos serviços objeto de licitação não é abusiva ou ilegal, pois é uma forma de demonstrar sua capacidade técnico-operacional segundo os critérios discricionariamente estabelecidos pela Administração para a execução a contento dos serviços.

"A ausência de explícita referência, no art. 30, a requisitos de capacitação técnico operacional não significa vedação à sua previsão. A cláusula de fechamento contida no § 5º não se aplica à capacitação técnico-operacional, mas a outras exigências" (Marçal Justen Filho, in "Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos", 8ª ed., Ed. Dialética, São Paulo, 2000, p. 335).

Recurso especial não conhecido."

Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL – 361736, Processo: 200101164320 UF: SP Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA Data da decisão: 05/09/2002 Documento: STJ000478775 Data de Julgamento: 31/03/2003,

"ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. LICITAÇÃO. DISPOSIÇÕES EDITALÍCIAS. C.F., ARTIGO 37, XXI. LEIS NºS 8666/93 (ARTS. 3º, § 1º, I, E 7º, § 5º) E 8883/94. SEGURANÇA DENEGADA.

1. O interesse público reclama, além do suporte técnico-operacional compatível para a realização das obras ou serviços especializados, outros requisitos ditados no chamamento editalício.

2. Exigência editalícia orientada pelo interesse público no cumprimento das obrigações. Legalidade.

3. Recurso sem provimento."

Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, Classe: ROMS - RECURSO ORDINARIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – 9687 Processo: 199800304100 UF: PR Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA Data da decisão: 12/06/2001 Documento: STJ000459917 Data da Publicação: 11/11/2002 (destacou-se)

O artigo 3º, § 1º, I, da Lei nº 8.666/93 estabelece a proibição ao agente público em "admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato", em prol do princípio da igualdade (art. 37, XXI, da CRFB/88) a que o certame encontra-se vinculado. Nesse sentido, é pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:

"LICITAÇÃO PÚBLICA. AQUISIÇÃO DE BENS OU SERVIÇOS. PREFERENCIA EM RAZÃO DA ORIGEM. CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ART. 9. I. DECRETO 3.149, ART. 37, INC. VI, E PARAGRAFOS 2., 3., 4. E 6, REDAÇÃO DO DECRETO 3.776/80 E DECRETO 3.149/80, ART-28, PAR-1., ITEM 6, E PAR-8., ACRESCENTADOS PELO DECRETO 3.985/81.

O critério de distinguir pela origem, naturalidade, ou sede, não tem legitimidade para justificar a desigualação de empresas que concorram com outras em igualdade de categoria, condições e preço. Dispositivos. estaduais que atentam contra o art-9., I, da Constituição Federal. Representação de inconstitucionalidade julgada procedente, em parte."

Rp 1103/RJ - RIO DE JANEIRO Relator(a): Min. RAFAEL MAYER Julgamento: 26/08/1982 Órgão Julgador: TRIBUNAL PLENO Data da Publicação: 08/10/1982 (destacou-se)

Salienta-se ser a licitação um conjunto de atos administrativos vinculados à lei, ficando a conduta do agente público necessariamente a esta adstrita, em apreço ao princípio da legalidade, vedada qualquer ação não autorizada ou que venha subverter o ordenamento jurídico. Assim, o administrador público somente poderá atuar quando a lei permitir, diferente do particular garantido constitucionalmente pelo princípio da autonomia da vontade. Alude-se, ainda, o princípio da inalterabilidade do edital, que vincula a Administração às regras dispostas no edital.

O princípio da legalidade se relaciona com diversos outros princípios que permeiam o Direito Administrativo, estando inserido nesse meio o princípio da supremacia do interesse público. O administrador, ao agir em consonância com a lei, mesmo perseguindo um fim estatal imediato (interesse público secundário), está atuando em prol da satisfação do interesse da coletividade (interesse público primário). Assim, no transcorrer de um procedimento administrativo licitatório, como o certame em análise, a observância à Lei nº 8.666/93 e ao instrumento convocatório evidencia o respeito aos princípios da licitação, em especial da isonomia, da moralidade, da finalidade, da indisponibilidade do interesse público e do julgamento objetivo, sem prejuízo da eficiência.

"ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. DESCUMPRIMENTO DE REGRA PREVISTA NO EDITAL LICITATÓRIO. ART. 41, CAPUT, DA LEI Nº 8.666/93. VIOLAÇÃO. DEVER DE OBSERVÂNCIA DO EDITAL.

I - Cuida-se, originariamente, de Mandado de Segurança impetrado por SOL COMUNICAÇÃO E MARKETING LTDA, contra ato do Senhor Presidente da Comissão Especial de Licitação da Secretaria de Serviços de Radiodifusão do Ministério das Comunicações, que a excluiu da fase de habilitação por ter entregue a documentação exigida para essa finalidade com 10 (dez) minutos de atraso.

II - O art. 41 da Lei nº 8.666/93 determina que: "Art. 41. A Administração não pode descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada."

III - Supondo que na Lei não existam palavras inúteis, ou destituídas de significação deontológica, verifica-se que o legislador impôs, com apoio no Princípio da Legalidade, a interpretação restritiva do preceito, de modo a resguardar a atuação do Administrador Público, posto que este atua como gestor da res publica. Outra não seria a necessidade do vocábulo "estritamente" no aludido preceito infraconstitucional.

IV - "Ao submeter a Administração ao princípio da vinculação ao ato convocatório, a Lei nº 8.666 impõe o dever de exaustão da discricionariedade por ocasião de sua elaboração. Não teria cabimento determinar a estrita vinculação ao edital e, simultaneamente, autorizar a atribuição de competência discricionária para a Comissão indicar, por ocasião do julgamento de alguma das fases, os critérios de julgamento. Todos os critérios e todas as exigências deverão constar, de modo expresso e exaustivo, no corpo do edital."(in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Editora Dialética, 9ª Edição, pág. 385)

V - Em resumo: o Poder Discricionário da Administração esgota-se com a elaboração do Edital de Licitação. A partir daí, nos termos do vocábulo constante da própria Lei, a Administração Pública vincula-se "estritamente" a ele."

VI - Recurso Especial provido.

Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL – 421946, Processo: 200200335721 UF: DF Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA Data da decisão: 07/02/2006 Documento: STJ000667751 Data de publicação: 06/03/2006

A ausência de algum documento exigido no edital enseja a emanação do ato administrativo de inabilitação do concorrente, tendo respaldo nos artigos 30 e 41 da Lei nº 8.666/93 e princípios da vinculação ao instrumento convocatório, julgamento objetivo, isonomia e indisponibilidade do interesse público.

Dessarte, equivocado avocar o princípio da proporcionalidade frente à inobservância de uma exigência editalícia, pois haveria a tentativa de burla ao artigo 41 da Lei 8.666/93. Segundo os ensinamentos de Hely Lopes Meirelles, "Não se pode exigir ou deixar de exigir, ou permitir, além ou aquém do que for fixado no edital."

A seguir, transcreve-se o aresto do Superior Tribunal de Justiça, no qual é tratada a importância do princípio da legalidade na modalidade concorrência:

"RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. LICITAÇÃO. CONCORRÊNCIA PÚBLICA. SERVIÇOS DE CONFECÇÃO, DISTRIBUIÇÃO E CONTROLE DE SELOS DE FISCALIZAÇÃO DE ATOS NOTARIAIS E REGISTRAIS. IMPUGNAÇÃO DE EDITAL. INOCORRÊNCIA DE NULIDADE. PRESERVAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, IGUALDADE E COMPETITIVIDADE. INTERPRETAÇÃO DO ART. 30, II, § 1º, DA LEI Nº 8.666/93.

1. Recurso ordinário em mandado de segurança interposto contra v. acórdão que denegou segurança referente à aduzida ilegalidade de exigências contidas em edital de licitação pública.

2. Não se comete violação ao art. 30, II, da Lei nº 8.666/93, quando, em procedimento licitatório, a Administração Pública edita ato visando a cercar-se de garantias o contrato de prestação de serviços de grande vulto e de extremo interesse para os administrados.

3. Tendo em vista o elevado montante dos valores objeto de futura contratação, é dever do administrador público realizar todas as etapas do processo seletivo do prestador de serviço com grande cautela, pautando-se rigorosamente pelos preceitos legais aplicáveis, especialmente o art. 30, § 1º, da Lei nº 8.666/93, e outros pertinentes.

4. "O exame do disposto no art. 37, XXI, da Constituição Federal, em sua parte final, referente a "exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações" revela que o propósito aí objetivado é oferecer iguais oportunidades de contratação com o Poder Público, não a todo e qualquer interessado, indiscriminadamente, mas, sim, apenas a quem possa evidenciar que efetivamente dispõe de condições para executar aquilo a que se propõe" (Adilson Dallari).

5. Recurso não provido."

Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, Classe: ROMS - RECURSO ORDINARIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – 13607 Processo: 200101010297 UF: RJ Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA Data da decisão: 02/05/2002 Documento: STJ000436161 Data da Publicação: 10/06/2002 (destacou-se)

Caso a Comissão de Licitação formada admitisse a ausência da documentação exigida no edital, estaria afrontando os princípios da igualdade (por dispensar documento exigido a outra empresa concorrente), da legalidade e da vinculação ao instrumento convocatório.


Notas

  1. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 12 ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 456.

  2. MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contrato Administrativo. 12º ed., São Paulo, 1999, p. 112.

  3. _______. Manual de Orientações Básicas das Licitações e Contratos do Tribunal de Contas da União. 3 ed. Brasília: TCU, 2006, p. 116.

  4. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 26 ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 276-277.

  5. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 15 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 227.

  6. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Lex: Vade Mecum RT. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

  7. JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: Dialética, 2009, p.318.

  8. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 26º ed., São Paulo: Malheiros, 2001, p. 282-283.

Sobre o autor
Márcio Roberto Martins Santos

Bacharel em Direito, Pós-Graduado em Direito Público e Assessor Jurídico da Procuradoria Regional do Trabalho da 1ª Região

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Márcio Roberto Martins. Considerações sobre a fase de habilitação no procedimento licitatório à luz das exigências editalícias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2606, 20 ago. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17227. Acesso em: 22 dez. 2024.

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