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O benefício previdenciário de valor mínimo como cálculo da renda familiar "per capita" para fins de concessão de benefício assistencial ao idoso

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Agenda 24/08/2010 às 09:56

3 O CÔMPUTO DA RENDA DO GRUPO FAMILIAR DO BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO IDOSO

Este último título trata da controvérsia propriamente dita deste trabalho. O critério da renda per capita do grupo familiar do interessa no benefício - ¼ do salário mínimo – é um dos requisitos legais para a concessão do benefício assistencial ao idoso. Todavia, dentre as inovações trazidas, o Estatuto do Idoso, Lei n° 10.741/2003, no parágrafo único do art. 34, estabeleceu que, na renda per capita do grupo familiar, para fins de concessão do benefício assistencial ao idoso, não será computado o valor de outro benefício assistencial ao idoso concedido a outro membro familiar também idoso.

Observando-se a disposição do Estatuto do Idoso, se a esposa do interessado no benéfico já percebe LOAS como idosa, esse benefício (de um salário mínimo) não será considerado no cômputo da renda per capita do grupo familiar para fins de concessão do outro benefício assistencial ao idoso. Com isso, é possível que um casal de idosos percebam tal benefício. Diferente é a hipótese da esposa do interessado que já receba benefício previdenciário, como aposentadoria por idade, por exemplo; nesse caso, se apenas o casal é o grupo familiar, o valor da aposentadoria supera a renda per capita de ¼ do salário mínimo, caso em que o benefício assistencial ao idoso é indevido.

É que o Estatuto do Idoso é claro quando afirma que não deve ser aferida a miserabilidade do interessado no benefício apenas quanto ao benefício assistencial ao idoso percebido por ente do grupo familiar, não abrangendo qualquer outro benefício previdenciário no valor de um salário mínimo.

No subtítulo seguinte, estuda-se o benefício previdenciário de valor mínimo como possibilidade de se enquadrar no parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso.

3.1 O benefício previdenciário de valor mínimo como cálculo da renda familiar per capita para fins de LOAS

Conforme dito acima, o Estatuto do Idoso é claro no sentido de que apenas o benefício assistencial ao idoso já concedido a qualquer membro da família não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS, não dando dúvidas ao intérprete.

Porém, há quem entenda que, quando outro membro integrante do grupo familiar do interessado no benefício assistencial ao idoso perceba algum benefício previdenciário de valor mínimo, tal benefício não será computado para os fins de cálculo da renda familiar per capita da LOAS. A Turma Nacional de Uniformização (TNU) tem adotado esse entendimento, dando uma interpretação sistemática do Estatuto do Idoso. Resumindo a defesa desse entendimento, explica João Ernesto Aragonés Vianna (2010, p. 37):

(...) O raciocínio adotado é o seguinte: se a percepção da LOAS independe de contribuição, porque se trata de benefício assistencial, com maior razão ainda deveria excluir-se benefício previdenciário de valor mínimo, para o qual exigiu-se contribuição do segurado, pois, do contrário, estar-se-ia beneficiando aquele que não contribuiu para o sistema de seguridade social em detrimento daquele que contribuiu.

Em situações desse jaez, quando o INSS detecta que membro do grupo familiar perceba algum benefício previdenciário, e se a renda per capita supera o requisito ¼ do salário mínimo, é bastante comum o indeferimento do benefício assistencial ao idoso. Não raro também é a procura ao Poder Judiciário, junto ao Juizado Especial Federal, visando a obtenção desse benefício, sendo que, com base no entendimento da TNU, é comum a condenação da autarquia previdenciária na obrigação de fazer consistente na concessão desse benefício.

Muito embora haja decisões sufragando o entendimento acima, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem entendido de maneira diversa:

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ASSISTÊNCIA SOCIAL. PREVISÃO CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO RECEBIDO POR PARENTE DO AUTOR. CÔMPUTO DO VALOR PARA VERIFICAÇÃO DE MISERABILIDADE. IMPOSSIBILIDADE. ART. 34 DA LEI Nº 10.741/2003. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA AO BPC. ART. 20, § 3º, DA LEI Nº 8.742/93. POSSIBILIDADE DE AFERIÇÃO DA MISERABILIDADE POR OUTROS MEIOS. PRECEDENTES. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. O benefício de prestação continuada é uma garantia constitucional, de caráter assistencial, previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelo art. 20 da Lei nº 8.742/93, que consiste no pagamento de um salário mínimo mensal aos portadores de deficiência ou idosos que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida pelo núcleo familiar. 2. O art. 34 da Lei nº 10.741/2003 veda o cômputo do valor do benefício de prestação continuada percebido por qualquer membro da família no cálculo da renda per capita mensal. 3. A Terceira Seção deste Superior Tribunal consolidou o entendimento de que o critério de aferição da renda mensal previsto no § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 deve ser tido como um limite mínimo, um quantum considerado insatisfatório à subsistência da pessoa portadora de deficiência ou idosa, não impedindo, contudo, que o julgador faça uso de outros elementos probatórios, desde que aptos a comprovar a condição de miserabilidade da parte e de sua família. 4. Recurso especial a que se dá provimento." (REsp nº 841.060/SP, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJ 25/6/2007)

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LOAS. ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI N.º 10.741/2003. ESTATUTO DO IDOSO. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. REQUISITOS. PREENCHIMENTO. REEXAME DE PROVA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N.º 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1. É firme o entendimento no âmbito desta Corte Superior no sentido de que o art. 34, parágrafo único, da Lei n.º 10.741/2003 deve ser interpretado restritivamente, ou seja, somente o benefício assistencial porventura recebido por qualquer membro da família pode ser desconsiderado para fins de averiguação da renda per capita familiar, quando da concessão do benefício assistencial a outro ente familiar. 2. No caso concreto, as instâncias ordinárias consideraram a Autora hipossuficiente já com a inclusão da renda de um salário mínimo referente à aposentadoria percebida por um dos membros da família. Assim, modificar o entendimento adotado pelas instâncias ordinárias demandaria, invariavelmente, o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, o que é vedado pela Súmula n.º 7 do Superior Tribunal de Justiça. 3. Inexistindo qualquer fundamento relevante que justifique a interposição de agravo regimental ou que venha a infirmar as razões consideradas no julgado agravado, deve ser mantida a decisão por seus próprios fundamentos. 4. Agravo regimental desprovido.

(STJ - AGRESP 200700321590 AGRESP - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL - 926203  Relator(a)LAURITA VAZ-  Órgão julgadorQUINTA TURMA - DJE DATA:06/04/2009)

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ASSISTÊNCIA SOCIAL. PREVISÃO CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO RECEBIDO POR PARENTE DO AUTOR. CÔMPUTO DO VALOR PARA VERIFICAÇÃO DE MISERABILIDADE. IMPOSSIBILIDADE. ART. 34 DA LEI Nº 10.741/2003. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA AO BPC. ART. 20, § 3º, DA LEI Nº 8.742/93. POSSIBILIDADE DE AFERIÇÃO DA MISERABILIDADE POR OUTROS MEIOS. PRECEDENTES. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. O benefício de prestação continuada é uma garantia constitucional, de caráter assistencial, previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelo art. 20 da Lei nº 8.742/93, que consiste no pagamento de um salário mínimo mensal aos portadores de deficiência ou idosos que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida pelo núcleo familiar. 2. O art. 34 da Lei nº 10.741/2003 veda o cômputo do valor do benefício de prestação continuada percebido por qualquer membro da família no cálculo da renda per capita mensal. 3. A Terceira Seção deste Superior Tribunal consolidou o entendimento de que o critério de aferição da renda mensal previsto no § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 deve ser tido como um limite mínimo, um quantum considerado insatisfatório à subsistência da pessoa portadora de deficiência ou idosa, não impedindo, contudo, que o julgador faça uso de outros elementos probatórios, desde que aptos a comprovar a condição de miserabilidade da parte e de sua família. 4. Recurso especial a que se dá provimento.

(RESP 200600803718 RESP - RECURSO ESPECIAL - 841060Relator(a) MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA Sigla do órgão STJ Órgão julgador SEXTA TURMA Fonte DJ DATA:25/06/2007 PG:00319).

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS. ART. 20, § 3º, DA LEI Nº 8.742/93. REEXAME DO CONJUNTO PROBATÓRIO. SÚMULA Nº 7 DO STJ. ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DO ESTATUTO DO IDOSO. NÃO INCIDÊNCIA. ANÁLISE DE DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. I - Se o v. acórdão hostilizado, com base no material cognitivo constante dos autos, consignou que a autora não faz jus ao benefício assistencial pleiteado, rever tal decisão implicaria reexame de prova, o que não é possível na instância incomum (Súmula 7-STJ). II - O cônjuge da autora não recebe benefício da assistência social, não se aplicando o parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso. III - Não cabe o exame de matéria constitucional em sede de recurso especial, conquanto se admite apenas a apreciação de questões referentes à interpretação de normas infraconstitucionais. Agravo regimental desprovido.

(STJ - AGRESP 200601553710 - AGRESP - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL - 868590 - Relator(a) FELIX FISCHER Sigla do órgão STJ

Órgão julgador QUINTA TURMA Fonte DJ DATA:05/02/2007 PG:00370).

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A doutrina possui entendimento contrário à interpretação sistemática do Estatuto do Idoso. Segundo André Studart Leitão (2008, p. 462 e 463):

(...)

Por esse critério, estende-se a concessão do benefício a pessoa que não as previstas na lei, sem a correspondente fonte de custeio total. Portanto, viola princípio constitucional expresso (regra a contrapartida). Desde já criticamos tal postura que, ao argumento de se interpretar a legislação, cria norma jurídica de alcance geral, o que deve ser evitado diante das atribuições jurisdicionais (já que o Poder Judiciário funciona, conforme entendimento majoritário, como legislador negativo e não positivo).

(...)

Desse modo, a exclusão do valor de um salário mínimo, nos termos da legislação vigente, somente alcança a pessoa idosa que receba benefício assistencial e, ainda assim, para a concessão de outro benefício assistencial nas mesma condições (ou seja, para outra pessoa idosa).

(...).

No mesmo sentido, manifesta-se Hermes Arrais Alencar (2007, p. 538):

(...)

A exclusão, em nosso sentir (n° 3 acima) [aposentadoria por idade de 1 salário mínimo] do valor de benefício previdenciário da renda familiar não se mostra devida.

Diversamente do benefício assistencial, a aposentadoria por idade é definitiva, não ensejando revisões administrativas periódicas (sopesa tranqüilidade ao grupo familiar).

Diversamente de benefício assistencial, a aposentadoria por idade enseja a concessão de abono anual (ainda que mensalmente apresente o mesmo valor – 1 sm – resulta o benefício previdenciário, anualmente, valor superior).

Diversamente do benefício assistencial, a aposentadoria é intransmissível, após o óbito do titular do benefício, ao cônjuge supérstite, por intermédio da pensão por morte (neste ponto reside ponto de confronto incomparável frente ao benefício assistencial).

Esses pontos evidenciam os motivos pelos quais o legislador não contemplou o benefício previdenciário, e que nos fazem crer como correta a escolha do legislador.

(...).

De fato, a doutrina acima apontada e o STJ parecem possuir entendimento razoável no sentido de que não pode se dar uma interpretação extensiva ao Estatuto do Idoso, de forma que o benefício previdenciário de valor mínimo não deve ser computado no cálculo da renda per capita do grupo familiar do interessado no benefício assistencial ao idoso. Deveras, como os recursos do Estado são escassos, não se pode conceder o benefício assistencial em situações fora dos requisitos legais.

O respeito à disposição do Estado do Idoso, art. 34, parágrafo único, de forma a não interpretá-lo ampliativamente, e sim, literalmente, é uma questão de segurança jurídica, a expectativa do cidadão em ver os dispositivos legais ser aplicados devidamente. Se fosse intenção do legislador incluir no dispositivo benefícios previdenciários de valor mínimo, certamente teria feito quando da edição da norma, ou por meio de alterações legislativas, conforme previsão do art. 117 do Estatuto do Idoso.

Como o parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso é bastante claro, não há necessidade de utilização de aprofundada hermenêutica para se identificar qual a intenção do legislador. Uma simples interpretação literal do ordenamento jurídico denota com clareza que a exceção em apreço deve ser conferida apenas ao benefício assistencial ao idoso.

Observando-se os efeitos práticos das decisões da TNU, percebe-se que o poder público incorre em sérios prejuízos, dado que não são poucas as pessoas que almejam o benefício em estudo. Apenas para argumentar, o índice de concessão administrativa dos benefícios assistenciais e previdenciários é bem superior ao do indeferimento, fato desconhecido pela população. Dessa forma, se toda ação for julgada procedente, chegar-se-á ao ponto de que qualquer pessoa hipossuficiente receberá um benefício do INSS.

Talvez o problema objeto deste artigo jurídico se resolveria com a majoração do salário mínimo até um valor digno, cumprindo a finalidade inserida no art. 6º, IV, da Constituição, conforme muito bem asseverado por José Renato Rodrigues, no artigo "O benefício assistencial previsto na Lei nº 8.742, de 07 de dezembro de 1993 e o posicionamento do Supremo Tribunal Federal", transcrito no título pretérito.

Se a medida mais acertada fosse a ampliação da concessão do benefício assistencial, talvez a controvérsia fosse sanada com a alteração da Lei nº 8.742/93, majorando a renda per capita do grupo familiar de ¼ do salário mínimo, ou até mesmo fazendo excluir da renda do grupo familiar a percepção do ente familiar de outros benefícios com valor de um salário mínimo.

No entanto, tais alterações iriam na contramão do avanço natural da sociedade, que, aos poucos, caminha para uma maior qualificação e aumento das condições financeiras. Basta ver que o pobre de outrora não é de hoje.

Na verdade, a presente discussão não é simples e depende de inúmeros critérios não restritos apenas à seara jurídico, pois demanda um exame apurado acerca das condições atuais da sociedade brasileira. Talvez por isso é que a legislação em comento ainda não foi modificada.

Por fim, considerando todas as dificuldades apontadas, parece ser mais seguro optar pelo que está disposto na legislação aplicável, já que é do legislador o juízo de seletividade e de distributividade, sob pena de afronta aos princípios da prévia fonte de custeio, da isonomia, da legalidade e, quiçá, da separação dos poderes. Não cabe ao Judiciário substituir a competência do legislador e instituir critérios diversos da legislação aplicável para o fim de conceder o benefício, sobretudo porque a concessão a quem não faz jus é uma injustiça para com aquele que realmente possui direito, além de causar despesa indevida ao Erário, afetando a receita-despesa.

Merece atenção o fato de que o benefício assistencial não exige contribuição do cidadão, nem prévias inscrição e filiação à Previdência Social, nem o cumprimento do período legal de carência. E como não são poucas as pessoas que necessitam desse benefício, mais do que nunca seus requisitos devem ser observados, evitando-se a concessão indevida a outrem.

Sobre o autor
Ronnie Leal Campos

Procurador Federal. Especialista em Direito Público pela UNB.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAMPOS, Ronnie Leal. O benefício previdenciário de valor mínimo como cálculo da renda familiar "per capita" para fins de concessão de benefício assistencial ao idoso. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2610, 24 ago. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17249. Acesso em: 22 dez. 2024.

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