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À noite, não pare no semáforo vermelho...

Agenda 09/09/2010 às 14:57

Ao contrário do que pode parecer, o título deste artigo não tem a finalidade de estimular a adoção de um comportamento inseguro de avanço do sinal vermelho do semáforo. Minha intenção é abordar a questão da "segurança pública" versus "segurança do trânsito", já que muitos condutores, com medo de serem assaltados ao aguardarem a abertura do semáforo (especialmente no período noturno), costumam desrespeitar a ordem de parada obrigatória (sendo, inclusive, uma das mais frequentes alegações recursais).

A proposital menção ao (aparente) antagonismo entre "segurança pública" e "segurança do trânsito" objetiva, de pronto, chamar a atenção para o fato de que é preciso conciliar tais expressões, já que o trânsito, como utilização da via pública, somente pode ser considerado seguro, se as pessoas nele inseridas sentirem-se verdadeiramente seguras. Aliás, o artigo 144 da Constituição Federal e o artigo 1º, § 2º, do Código de Trânsito Brasileiro guardam uma estreita relação, ao estabelecerem que a segurança pública (CF) e o trânsito em condições seguras (CTB) constituem direitos de todos e deveres dos órgãos públicos competentes, com a peculiar diferença de que o texto constitucional prescreve tratar-se de direito e RESPONSABILIDADE de todos.

No trânsito, é necessário, por certo, que cada um assuma sua parcela de responsabilidade para a garantia do direito coletivo. Ignorar a sinalização de trânsito, sob o pretexto de estar cuidando de sua própria segurança, pode ser uma conduta necessária à sobrevivência, mas isso não significa que devemos aceitar comportamentos imprudentes, inseguros e que coloquem em risco a vida de outras pessoas.

Como, então, deve o condutor se comportar, na terrível escolha da exposição aos perigos do trânsito e aos perigos no trânsito? Com a crescente violência urbana, é seguro ficar com o veículo imobilizado em um cruzamento semaforizado, quando não há veículos na via perpendicular? E, ainda, o semáforo deve ser obedecido mesmo no período noturno? Começarei respondendo esta última pergunta, para, no decorrer de minha exposição, apresentar algumas dicas que considero apropriadas para um comportamento seguro.

A sinalização semafórica faz parte do conjunto de sinais de trânsito previstos no Anexo II do Código de Trânsito Brasileiro e prevalece sobre todos os outros (artigo 89, inciso II, do CTB). No Manual Brasileiro de Sinalização de trânsito (iniciado pela Resolução n. 180/05), o CONTRAN pretende tratar mais detalhadamente desta sinalização viária em seu Volume V, que, até o presente momento, não foi publicado, vigendo, por ora, somente as especificações determinadas pelo item 4 do Anexo II.

O semáforo possibilita o controle dos deslocamentos, alternando o direito de passagem, suas cores são padronizadas internacionalmente e sua origem remonta ao século XIX, tendo o primeiro equipamento sido instalado na cidade de Londres, em 1868. Atualmente, três cores são usualmente utilizadas: verde, amarelo e vermelho, cujos significados estão expressamente previstos no CTB:

O avanço do sinal vermelho configura infração de trânsito de natureza gravíssima, prevista no artigo 208 do CTB, não havendo diferenciação quanto ao horário, para a caracterização da infração, ou seja, a multa será cabível a todo condutor que desrespeitar a cor vermelha do semáforo, independente do horário.

Em relação às formas de comprovação da infração, estabelece o artigo 280, § 2º, do CTB, a possibilidade de se utilizar, além da declaração da autoridade ou do agente de trânsito, a constatação por equipamento eletrônico previamente regulamentado pelo CONTRAN. No caso do avanço do sinal vermelho do semáforo, valem, atualmente, as regras da Resolução n. 165/04 (que versa sobre os sistemas automáticos não metrológicos de fiscalização), complementadas pela Portaria do DENATRAN n. 016/04.

É por conta da fiscalização eletrônica que algumas pessoas imaginam ser permitido o avanço do sinal vermelho do período noturno, tendo em vista ser comum que os órgãos de trânsito deixem o equipamento desligado à noite, justamente para evitarem as constantes reclamações daqueles que buscam se justificar da infração cometida com a alegação de iminente ocorrência de roubo, durante a imobilização em obediência ao sinal semafórico. Esta decisão do órgão de trânsito, todavia, não quer dizer que o semáforo não vale, mas apenas que a fiscalização fica limitada à constatação visual pelo agente de trânsito. Se, desta forma, o agente encontrar-se no local e elaborar o auto de infração, a multa será aplicada normalmente, não havendo garantia de que o frequente argumento recursal seja aceito pelos julgadores (neste caso, o êxito dependerá de eventuais provas apresentadas).

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Outra prática comum dos órgãos de trânsito tem sido a alteração da programação semafórica, em determinados cruzamentos, no período noturno, a fim de deixar todos os semáforos com a cor amarela intermitente (condição denominada por alguns de semáforo embandeirado). Trata-se de possibilidade expressamente prevista no Anexo II do CTB, em seu item 4.2.1., que versa sobre a sinalização semafórica de advertência, nos seguintes termos: "no caso de grupo focal de regulamentação, admite-se o uso isolado da indicação luminosa em amarelo intermitente, em determinados horários e situações específicas. Fica o condutor do veículo obrigado a reduzir a velocidade e respeitar o disposto no artigo 29, inciso III, alínea ‘c’" (preferência de quem vem à direita, em cruzamentos não sinalizados).

Oportuno ressaltar que somente é prevista a posição de AMARELO intermitente, não existindo base legal para o VERMELHO intermitente, como têm optado alguns órgãos de trânsito.

Ressalvados, portanto, os semáforos de regulamentação com a cor amarela intermitente, o condutor é obrigado, a qualquer tempo, a obedecer plenamente às indicações luminosas dos demais equipamentos, interrompendo a marcha quando se deparar com a fase vermelha. Chegamos, destarte, ao impasse mencionado no início: como conciliar a necessidade de obediência à sinalização semafórica com o sentimento de insegurança, em especial nas grandes cidades?

A verdade é que, via de regra, o motorista utiliza essa argumentação, mas não tem um comportamento seguro como um todo: deixa os vidros do veículo abertos, as portas destrancadas e os objetos de valor à mostra, permanece desatento ao que acontece ao seu redor, entre outras negligências, ou seja, facilita a atuação dos assaltantes. É comum, inclusive, que, mesmo vendo que o semáforo está fechado (ou prestes a fechar), o condutor permaneça com a velocidade em que se encontra, chegando rapidamente ao cruzamento, para, somente aí, "lembrar-se" de que está numa posição fragilizada, sujeito à abordagem dos meliantes.

À noite, com o número de veículos reduzido e o tráfego menos intenso, é relativamente simples controlar a velocidade do veículo. O ideal é que o motorista, ao perceber que terá que aguardar a abertura do semáforo que se encontra à sua frente, reduza a velocidade de seu veículo de maneira a atingir o cruzamento somente quando a fase verde tiver se iniciado. Posso garantir, por experiência própria, que, na completa maioria das vezes, é possível adotar o comportamento sugerido, administrando-se a velocidade conforme as cores do semáforo.

Com a atenção redobrada e a velocidade controlada, evita-se, com muito mais facilidade, as abordagens inesperadas, o que ainda pode ser complementado por outras condutas seguras, como manter os vidros fechados e os objetos de valor em local seguro (como o porta-luvas ou atrás do banco); utilizar as faixas de trânsito centrais (pois as laterais são as mais visadas); e deixar sempre uma distância de segurança do veículo à frente.

Assim, o condutor demonstrará que, realmente, preocupa-se com a sua segurança, em vez de estar interessado apenas em chegar mais rápido ao seu destino, com desrespeito à sinalização viária.

Concluindo (e complementando o título deste texto): À noite, não pare no semáforo vermelho... adote um comportamento seguro e passe somente no verde!!

Sobre o autor
Julyver Modesto de Araujo

Mestre em Direito do Estado pela PUC/SP. Especialista em Direito Público pela Escola Superior do Ministério Público de São Paulo. Oficial da Polícia Militar do Estado de São Paulo, tendo realizado diversas atividades relacionadas ao policiamento de trânsito, de 1996 a 2008, entre elas Conselheiro do CETRAN/SP, de 2003 a 2008. Coordenador e Professor dos Cursos de Pós-graduação do CEAT - Centro de Estudos Avançados e Treinamento / Trânsito (www.ceatt.com.br). Presidente da ABPTRAN - Associação Brasileira de Profissionais do Trânsito (www.abptran.org). Autor de livros e artigos sobre trânsito.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAUJO, Julyver Modesto. À noite, não pare no semáforo vermelho.... Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2626, 9 set. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17371. Acesso em: 22 dez. 2024.

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