Ao contrário do que pode parecer, o título deste artigo não tem a finalidade de estimular a adoção de um comportamento inseguro de avanço do sinal vermelho do semáforo. Minha intenção é abordar a questão da "segurança pública" versus "segurança do trânsito", já que muitos condutores, com medo de serem assaltados ao aguardarem a abertura do semáforo (especialmente no período noturno), costumam desrespeitar a ordem de parada obrigatória (sendo, inclusive, uma das mais frequentes alegações recursais).
A proposital menção ao (aparente) antagonismo entre "segurança pública" e "segurança do trânsito" objetiva, de pronto, chamar a atenção para o fato de que é preciso conciliar tais expressões, já que o trânsito, como utilização da via pública, somente pode ser considerado seguro, se as pessoas nele inseridas sentirem-se verdadeiramente seguras. Aliás, o artigo 144 da Constituição Federal e o artigo 1º, § 2º, do Código de Trânsito Brasileiro guardam uma estreita relação, ao estabelecerem que a segurança pública (CF) e o trânsito em condições seguras (CTB) constituem direitos de todos e deveres dos órgãos públicos competentes, com a peculiar diferença de que o texto constitucional prescreve tratar-se de direito e RESPONSABILIDADE de todos.
No trânsito, é necessário, por certo, que cada um assuma sua parcela de responsabilidade para a garantia do direito coletivo. Ignorar a sinalização de trânsito, sob o pretexto de estar cuidando de sua própria segurança, pode ser uma conduta necessária à sobrevivência, mas isso não significa que devemos aceitar comportamentos imprudentes, inseguros e que coloquem em risco a vida de outras pessoas.
Como, então, deve o condutor se comportar, na terrível escolha da exposição aos perigos do trânsito e aos perigos no trânsito? Com a crescente violência urbana, é seguro ficar com o veículo imobilizado em um cruzamento semaforizado, quando não há veículos na via perpendicular? E, ainda, o semáforo deve ser obedecido mesmo no período noturno? Começarei respondendo esta última pergunta, para, no decorrer de minha exposição, apresentar algumas dicas que considero apropriadas para um comportamento seguro.
A sinalização semafórica faz parte do conjunto de sinais de trânsito previstos no Anexo II do Código de Trânsito Brasileiro e prevalece sobre todos os outros (artigo 89, inciso II, do CTB). No Manual Brasileiro de Sinalização de trânsito (iniciado pela Resolução n. 180/05), o CONTRAN pretende tratar mais detalhadamente desta sinalização viária em seu Volume V, que, até o presente momento, não foi publicado, vigendo, por ora, somente as especificações determinadas pelo item 4 do Anexo II.
O semáforo possibilita o controle dos deslocamentos, alternando o direito de passagem, suas cores são padronizadas internacionalmente e sua origem remonta ao século XIX, tendo o primeiro equipamento sido instalado na cidade de Londres, em 1868. Atualmente, três cores são usualmente utilizadas: verde, amarelo e vermelho, cujos significados estão expressamente previstos no CTB:
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verde: indica permissão de prosseguir na marcha, podendo o condutor efetuar as operações indicadas pelo sinal luminoso, respeitadas as normas gerais de circulação e conduta;
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amarela: indica "atenção", devendo o condutor parar o veículo, salvo se isto resultar em situação de perigo; e
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vermelha: indica obrigatoriedade de parar.
O avanço do sinal vermelho configura infração de trânsito de natureza gravíssima, prevista no artigo 208 do CTB, não havendo diferenciação quanto ao horário, para a caracterização da infração, ou seja, a multa será cabível a todo condutor que desrespeitar a cor vermelha do semáforo, independente do horário.
Em relação às formas de comprovação da infração, estabelece o artigo 280, § 2º, do CTB, a possibilidade de se utilizar, além da declaração da autoridade ou do agente de trânsito, a constatação por equipamento eletrônico previamente regulamentado pelo CONTRAN. No caso do avanço do sinal vermelho do semáforo, valem, atualmente, as regras da Resolução n. 165/04 (que versa sobre os sistemas automáticos não metrológicos de fiscalização), complementadas pela Portaria do DENATRAN n. 016/04.
É por conta da fiscalização eletrônica que algumas pessoas imaginam ser permitido o avanço do sinal vermelho do período noturno, tendo em vista ser comum que os órgãos de trânsito deixem o equipamento desligado à noite, justamente para evitarem as constantes reclamações daqueles que buscam se justificar da infração cometida com a alegação de iminente ocorrência de roubo, durante a imobilização em obediência ao sinal semafórico. Esta decisão do órgão de trânsito, todavia, não quer dizer que o semáforo não vale, mas apenas que a fiscalização fica limitada à constatação visual pelo agente de trânsito. Se, desta forma, o agente encontrar-se no local e elaborar o auto de infração, a multa será aplicada normalmente, não havendo garantia de que o frequente argumento recursal seja aceito pelos julgadores (neste caso, o êxito dependerá de eventuais provas apresentadas).
Outra prática comum dos órgãos de trânsito tem sido a alteração da programação semafórica, em determinados cruzamentos, no período noturno, a fim de deixar todos os semáforos com a cor amarela intermitente (condição denominada por alguns de semáforo embandeirado). Trata-se de possibilidade expressamente prevista no Anexo II do CTB, em seu item 4.2.1., que versa sobre a sinalização semafórica de advertência, nos seguintes termos: "no caso de grupo focal de regulamentação, admite-se o uso isolado da indicação luminosa em amarelo intermitente, em determinados horários e situações específicas. Fica o condutor do veículo obrigado a reduzir a velocidade e respeitar o disposto no artigo 29, inciso III, alínea ‘c’" (preferência de quem vem à direita, em cruzamentos não sinalizados).
Oportuno ressaltar que somente é prevista a posição de AMARELO intermitente, não existindo base legal para o VERMELHO intermitente, como têm optado alguns órgãos de trânsito.
Ressalvados, portanto, os semáforos de regulamentação com a cor amarela intermitente, o condutor é obrigado, a qualquer tempo, a obedecer plenamente às indicações luminosas dos demais equipamentos, interrompendo a marcha quando se deparar com a fase vermelha. Chegamos, destarte, ao impasse mencionado no início: como conciliar a necessidade de obediência à sinalização semafórica com o sentimento de insegurança, em especial nas grandes cidades?
A verdade é que, via de regra, o motorista utiliza essa argumentação, mas não tem um comportamento seguro como um todo: deixa os vidros do veículo abertos, as portas destrancadas e os objetos de valor à mostra, permanece desatento ao que acontece ao seu redor, entre outras negligências, ou seja, facilita a atuação dos assaltantes. É comum, inclusive, que, mesmo vendo que o semáforo está fechado (ou prestes a fechar), o condutor permaneça com a velocidade em que se encontra, chegando rapidamente ao cruzamento, para, somente aí, "lembrar-se" de que está numa posição fragilizada, sujeito à abordagem dos meliantes.
À noite, com o número de veículos reduzido e o tráfego menos intenso, é relativamente simples controlar a velocidade do veículo. O ideal é que o motorista, ao perceber que terá que aguardar a abertura do semáforo que se encontra à sua frente, reduza a velocidade de seu veículo de maneira a atingir o cruzamento somente quando a fase verde tiver se iniciado. Posso garantir, por experiência própria, que, na completa maioria das vezes, é possível adotar o comportamento sugerido, administrando-se a velocidade conforme as cores do semáforo.
Com a atenção redobrada e a velocidade controlada, evita-se, com muito mais facilidade, as abordagens inesperadas, o que ainda pode ser complementado por outras condutas seguras, como manter os vidros fechados e os objetos de valor em local seguro (como o porta-luvas ou atrás do banco); utilizar as faixas de trânsito centrais (pois as laterais são as mais visadas); e deixar sempre uma distância de segurança do veículo à frente.
Assim, o condutor demonstrará que, realmente, preocupa-se com a sua segurança, em vez de estar interessado apenas em chegar mais rápido ao seu destino, com desrespeito à sinalização viária.
Concluindo (e complementando o título deste texto): À noite, não pare no semáforo vermelho... adote um comportamento seguro e passe somente no verde!!