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Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) e agrobusiness.

Centralização administrativa em detrimento dos imperativos de precaução, publicidade e autonomia federativa no âmbito da política nacional de meio ambiente

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Agenda 16/10/2010 às 08:45

Instituiu-se um único órgão governamental com poderes para autorizar pesquisas, projetos e atividades e liberar o uso comercial de OGM e derivados no Brasil.

SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. A Origem da CTNBio no Âmbito da Ordem Jurídica Brasileira. 3. Os Bastidores da Tramitação da Nova Lei de Biossegurança em torno do Caráter Vinculativo atribuído às Decisões da CTNBio. 4. A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio – segundo a Lei 11.105/05: 4.1. Órgão do Ministério da Ciência e da Tecnologia, de composição colegiada multidisciplinar, e de caráter consultivo e deliberativo; 4.2. Competência Normativa atribuída à CTNBio; 4.3. Avaliação de risco e nível de biossegurança e expedição de Certificado de Qualidade em Biossegurança (CQB); 4.4. Competência para Expedir Decisões Técnicas, Fundamentação das Decisões tomadas pela CTNBio e Publicidade dos seus Atos; 4.5. CTNBio, tutela do meio ambiente e a natureza jurídica do seu parecer técnico; 4.6. Composição e requisitos subjetivos para indicação dos membros da CTNBio; 4.7. Representações governamentais das comunidades científicas e da sociedade civil; 4.8. A estrutura de funcionamento da CTNBio; 4.9. Quorum para instalação das reuniões e para deliberação do colegiado. 5. Inconstitucionalidades Observadas no Âmbito do capítulo 3º da Lei 11.105/05: 5.1. Afronta ao princípio federativo; 5.2. Prerrogativas do Estado Federal e licenciamento ambiental; 5.3. Da inobservância do princípio da precaução em razão da dispensa do estudo prévio de impacto ambiental. 6. Conclusão. 7. Bibliografia.


1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objetivo a análise e interpretação do cap. III da Lei 11.105/05 (nova Lei de biossegurança), aprovada pelo Congresso Nacional em 24 de março de 2005.

O estudo está dividido em quatro partes principais, sendo que na primeira delas, procurou-se identificar a origem histórica da CTNBio (objeto central dos dispositivos ora sob análise) no contexto da ordem jurídica brasileira. Buscou-se ressaltar as contradições e ambigüidades que marcaram o seu nascimento do ponto de vista normativo, assinalada por inconstitucionalidades formais subjetivas, vetos e ilegalidades.

Nesse processo, chamou-nos a atenção a obsessão de alguns segmentos dos Poderes Executivo e Legislativo, preocupados em atender o grande pleito das corporações transnacionais, ligadas à biotecnologia no país: a instituição de um único órgão governamental, com poderes vinculantes sobre toda a Administração Pública nacional para autorizar pesquisas, projetos e atividades e liberar o uso comercial de OGM e derivados no Brasil. Chegou-se, com esse intuito, ao extremo de autorizar-se tal prerrogativa por meio de um simples decreto expedido a pretexto de regular-se a Lei 8.974/95 (nossa primeira Lei de biossegurança).

Na segunda parte deste trabalho, procurou-se descrever a evolução da crise desencadeada pelo questionamento judicial dos poderes atribuídos à CTNBio, por meio do Decreto 1.754/95, bem como pela pressão - de produtores rurais e governadores - sobre o Poder Executivo, para que este encontrasse uma saída capaz de preservar os interesses econômicos daqueles que, ilicitamente, contrabandearam e plantaram sementes de soja transgênica.

Tais escaramuças político-legislativas (marcadas pela edição de várias MP’s "de ocasião") acabaram permitindo às forças pró-transgênicos no país convencerem o governo e o Congresso acerca da necessidade de se editar uma nova Lei de biossegurança, por meio da qual estas questões fossem reguladas de tal forma a afastar ao máximo a possibilidade de questionamento jurídico acerca do alcance e da legalidade dos dispositivos introduzidos com o objetivo de se garantir ampla discricionariedade decisional à CTNBio.

Pretendeu-se demonstrar como, ao longo desse processo, as várias correntes de opinião foram se postando e organizando suas alianças, bem como as contradições e ambigüidades de um governo composto por grupos e facções representativos de todos os interesses em conflito - resultando em verdadeira esquizofrenia administrativa e legislativa.

Ao final deste movimento, constatou-se a vitória do lobby pró-transgênicos no âmbito do Congresso Nacional, com a edição de uma nova Lei de biossegurança, que acentuou de forma ainda mais radical os poderes atribuídos à CTNBio, em detrimento de todo o sistema nacional de proteção ao meio ambiente.

Na terceira parte do texto, passou-se a uma interpretação jurídico-dogmática dos principais dispositivos do capítulo III da Lei 11.105/05, analisando-se detalhadamente os aspectos referentes à sua composição, competências, estrutura organizativa e procedimental. Buscou-se também apontar algumas de suas contradições, ambigüidades e insuficiências, bem como alguns acertos pontuais.

Já na quarta e última parte, abordaram-se as inúmeras inconstitucionalidades identificadas ao longo dos dispositivos do capítulo III da Lei 11.105/05. Discutiram-se as aludidas inconstitucionalidades em bloco, identificando duas violações fundamentais: 1) a inobservância em relação ao disposto no art. 23 caput, inciso VI, que prevê a atribuição de uma competência comum à União, Estados, Distrito Federal e Municípios para "proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas" - manifestação por excelência do princípio federativo, desrespeitado pela lei, na medida em que obriga os Estados e Municípios a se sujeitarem às determinações da CTNBio (órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia pertencente ao Poder Executivo da União); 2) desrespeito ao art. 225, caput, § 1º, e inciso IV da CF/88 que, ao estabelecer que "todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações", instituiu aquilo que Canotilho denominou por "justiça intergeracional", incumbindo ao Poder Público (em todas as suas instâncias e dimensões político-administrativas) o poder-dever de "exigir, na forma da lei, para a instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade".

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Dispositivos introduzidos no art. 10, caput e § único, e art. 14, incisos IV, VIII, XX, e §§ 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, e 6º, da Lei 11.105/05, violam de forma expressa tais mandamentos constitucionais (sob o pretexto de regulamentá-los), em flagrante desrespeito aos princípios democrático (dispensa de audiências públicas), da precaução (dispensa a critério da CTNBio da realização do Estudo Prévio de Impacto Ambiental) e da publicidade (publicação parcial e resumida ["extratos"] dos pareceres técnicos deliberativos emitidos pela CTNBio).

Buscou-se, através deste singelo trabalho, oferecer alguma contribuição para o debate acerca destas questões, de extraordinária relevância para a sociedade brasileira. Isto porque não afetam apenas nossos interesses contemporâneos, mas os de todos aqueles que em um futuro não muito longínquo serão diretamente beneficiados ou punidos pelas conseqüências das escolhas que estamos a fazer no presente.


2. A ORIGEM DA CTNBio NO ÂMBITO DA ORDEM JURÍDICA BRASILEIRA:

O capítulo III da Lei 11.105/05 trata da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio.

Desde os primórdios das discussões no Congresso Nacional acerca de uma legislação que regulamentasse aspectos ligados à biossegurança no país – e que culminou na edição da Lei 8.974/95 -, aventou-se sobre a conveniência de se constituir uma comissão na qual estivessem representados todos os órgãos da União envolvidos na questão, além de representantes da comunidade científica no país.

Tratar-se-ia de uma comissão de alto nível, formada por técnicos e cientistas de indiscutível competência e representatividade, com a função de assessoramento, para análise e aprovação de eventos relacionados com engenharia genética, organismos geneticamente modificados (OGM) e seus derivados.

Buscava-se, pois, reconhecer a importância política e econômica que o tema vinha conquistando em âmbito global e os complexos desdobramentos que o desenvolvimento dessa matriz tecnológica poderia implicar para a humanidade em geral, e para a nossa sociedade em particular.

No entanto, no âmbito puramente normativo, a implementação de tal comissão não se deu sem grandes sobressaltos. Uma vez aprovada no Congresso Nacional a Lei 8.974/95, resolveu o Presidente da República, vetar o artigo que instituía a CTNBio sob o argumento de que se havia incorrido em inconstitucionalidade formal subjetiva - na medida em que a propositura de lei que implica na criação de cargos públicos é de iniciativa do Poder Executivo (art. 61, § 1º, II, "a", da CF/88), e o referido projeto de lei, teve origem no Congresso Nacional.

Gerou-se então uma situação paradoxal: inúmeros dispositivos da supracitada lei faziam referência explícita à CTNBio, conferindo a essa instância um papel de grande destaque para a obtenção dos propósitos que justificaram a edição da norma.

Todavia, em decorrência do veto presidencial, foi suprimido exatamente o trecho que a instituía como órgão técnico de assessoramento.

Recriou-se então uma figura jurídica relativamente recorrente em nossa história legislativa, algo que poderíamos alegoricamente denominar por uma norma "mula-sem-cabeça".

Tal situação, por esdrúxula, acabou ocasionando algo ainda mais bizarro: decidiu o Presidente da República, por intermédio do Decreto 1.754/95, ao regulamentar a Lei 8.974/95, re-introduzir os dispositivos anteriormente vetados, instituindo, na prática, a famigerada figura do decreto autônomo, por meio do qual passou a regulamentar diretamente – sem autorização legislativa – o art. 225, § 1º, V, da CF/88.

Chegou-se assim a um resultado deveras heterodoxo. Buscou-se corrigir uma inconstitucionalidade inserindo-se outra. Posteriormente, o Presidente da República tentou dar trato à bola, editando a MP 2.137/00, reeditada com alterações pela MP 2.191/01, na tentativa de minimizar o deslize preteritamente cometido.

Mas assim não ocorreu. Quando da edição da MP 2.137/00, o seu art. 1º – A, estabelecia que "fica criada, no âmbito do Ministério da Ciência e Tecnologia, a CTNBio, instância colegiada multidisciplinar, com a finalidade de prestar apoio técnico consultivo e de assessoramento ao Governo Federal na formulação, atualização e implementação da Política Nacional de Biossegurança".

Nesses termos, fica patente que o parecer técnico conclusivo formulado pela CTNBio seria meramente opinativo, na medida em que originário de um órgão técnico consultivo, destituído de competência para expedir registros.

Entretanto, qual não foi a surpresa dos demais órgãos governamentais envolvidos na questão e de instituições representativas da sociedade civil voltadas para a defesa do meio ambiente quando, em reedições posteriores, a MP alterou a redação do § 1º do art. 7º da Lei 8.974/95, para estabelecer que "o parecer técnico prévio conclusivo da CNTBio vincula os demais órgãos da Administração, quanto aos aspectos de biossegurança do OGM por ela analisados, preservadas as competências dos órgãos de fiscalização de estabelecer exigências e procedimentos adicionais específicos às suas respectivas áreas de competência legal".

Ora, concebida com o objetivo de estabelecer uma instância de alto nível para a defesa dos interesses da sociedade, na tutela de bens indisponíveis, como a vida, a saúde e, sobretudo, o meio ambiente – para a presente e para as futuras gerações -, seria até compreensivo a atribuição de um efeito vinculante ao parecer prévio da CTNBio quando seu conteúdo fosse negativo.

Ou seja, todas as vezes que, por razões de segurança em matéria de OGM e derivados, se indeferisse a pesquisa ou a comercialização de tais agentes, os Ministérios e demais órgãos da administração pública estariam necessariamente impossibilitados de seguir adiante na avaliação desses produtos, projetos ou atividades.

Por ser prévio, o parecer, quando negativo, fixaria de saída a inexistência ou inobservância de aspectos ou procedimentos tidos como imprescindíveis para se seguir na avaliação e subseqüente autorização e registro pelos órgãos estatais competentes.

Porém, ao determinar-se que tal parecer vincularia também os casos de liberação, impedindo os demais órgãos da administração pública de se manifestarem sobre aspectos de biossegurança relativos à sua área de competência, suprimindo-se inclusive a competência comum constitucionalmente conferida pela CF/88 aos demais entes da federação para protegerem o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas (art. 23, VI, da CF/88), transpareceu para a comunidade em geral, para os formadores de opinião e entidades representativas da sociedade civil que a real motivação de tal inovação residia, exclusivamente, no atendimento de um antigo pleito das empresas de biotecnologia: a instituição de um único órgão de deliberação sobre OGM no país.

"A primeira tese defendida, com vigor, pelas empresas de biotecnologia, e com apoio do Ministério da Agricultura (não importa de qual governo), pretende estabelecer um único órgão de deliberação sobre OGMs no país, para que seus pareceres conclusivos e decisões tenham efeito vinculante sobre todos os órgãos da Administração Federal ou Estadual, inclusive quanto a eventual dispensa de Estudo Prévio de Impacto Ambiental (EPIA)". [01]

Neste ponto ficou clara a existência de um profundo conflito de interesses que opõe, de um lado, os movimentos ambientalistas e de defesa do consumidor, apoiados por diversos órgãos governamentais tradicionalmente alinhados com preocupações preservacionistas (como o Ministério do Meio Ambiente) e, de outro, órgãos governamentais como o Ministério da Agricultura e um seleto grupo de corporações transnacionais, que atuam globalmente em regime de oligopólio no âmbito do chamado complexo agro-industrial (CAI), e que no país, têm como sua mais ilustre representante a empresa norte-americana Monsanto. [02]

O complexo agro-industrial [03] é um dos grandes beneficiados no âmbito do mercado mundial da chamada "revolução tecno-científica".

Sua gênese se deu em meados dos anos 70, quando uma singular combinação de novas tecnologias, boa parte delas desenvolvidas no contexto da corrida armamentista, travada durante a chamada "guerra-fria" - tais como, a informática, a automação e a biotecnologia associada à produção de novos materiais - combinaram-se, para produzir um verdadeiro salto de qualidade no âmbito da produção econômica mundial.

Em meio aos desequilíbrios provocados pela crise do petróleo, o sistema produtivo global serviu-se dessa nova dinâmica tecnológica para iniciar a transição de uma sociedade industrial para uma nova forma de organização da produção e do consumo, que vêm sendo designada por sociedade pós-industrial ou "sociedade informacional". [04]

Enquanto a produtividade no interior da sociedade industrial teria sido marcada por um paradigma "quantitativo", cuja característica principal foi a busca permanente pela redução do tempo de trabalho necessário para se produzir uma dada mercadoria (aquilo que Marx denominou por "mais-valia"), no âmbito da sociedade pós-industrial, tal paradigma tornou-se "qualitativo", representado pelo uso intensivo do conhecimento na produção, voltada para a "inovação permanente dos produtos".

O processo de acumulação de capital governa-se agora pela capacidade para "sucatear" hoje, a inovação introduzida no mercado ontem. Aquilo que Shumpeter, já no início do século XX, havia previsto sob a designação de "destruição criativa".

Se este princípio vale para as três matrizes tecnológicas acima referidas, no ramo da biotecnologia [05] ela possui um significado especial: aqui o desejo do capital para realizar-se no mercado com o máximo de rapidez, atropelando-se, sucessivamente, pela introdução de inovações formuladas a partir da manipulação de matéria orgânica por meio da engenharia genética, com a produção de organismos geneticamente modificados (OGM) e seus derivados, colide com o legítimo interesse da sociedade em se proteger contra as perniciosas e imprevisíveis conseqüências que poderão advir da liberação, no meio ambiente, desses novos agentes.

Isto porque os mesmos não foram ainda devidamente expostos a processos de verificação de sua segurança e conveniência, em flagrante desrespeito ao "princípio da precaução" – viga mestra de todo o direito ambiental internacional, desde a Conferência a Conferência de Estocolmo em 1972, e recentemente (11/09/2003) reafirmado pelo Protocolo de Cartagena.

Diante da constatação deste conflito entre sociedade civil (não apenas no Brasil, mas em âmbito mundial) e grandes corporações transnacionais articuladas em torno do complexo agro-industrial, caberia, em princípio, ao Estado, mediar tal litígio, defendendo de forma ampla os interesses da sociedade.

Estes interesses, por sua vez, passariam tanto pela defesa do meio ambiente, preservando-o para o presente e para as futuras gerações (art. 225, caput, da CF/88), quanto pelo investimento científico e tecnológico indispensável para o desenvolvimento sócio-econômico da sociedade brasileira, preservando-a de uma indesejável defasagem tecnológica capaz de nos marginalizar ainda mais no âmbito da chamada divisão internacional do trabalho - como também, de uma perversa dependência tecnológica em relação às grandes corporações econômicas, que possuem os seus centros de decisão e interesse localizados no exterior.

Nesses termos, a configuração normativa da CTNBio possui indiscutível importância, na medida em que aponta o sentido em que a correlação de forças no campo dos poderes Executivo e Legislativo se afirmam.

Ao mesmo tempo, sinalizam para a sociedade civil os novos desdobramentos de sua luta de resistência contra a imposição dos interesses econômicos, em detrimento dos imperativos da preservação ambiental, no bojo do Poder Judiciário, que escudado na Constituição, também vem se transformando em todo o mundo, na mais importante trincheira nesta verdadeira guerra pela soberania ambiental no planeta.

"A intensidade dessa polêmica e o amplo espectro dos interesses difusos e privados aí presentes, as evidentes dificuldades e tropeços das autoridades públicas na condução dos processos decisórios e a freqüente transposição da disputa para o campo legal, por outro lado, vêm suscitando uma reflexão teórica que forçosamente transcende o campo disciplinar das ciências naturais, como a genética e a biologia molecular, para repercutir no campo do Direito, das Ciências Sociais e da Filosofia. Em torno da temática dos transgênicos, da biossegurança e da biotecnologia, instaura-se um fecundo debate multidisciplinar sobre paradigmas científicos, direitos ambientais, direitos do consumidor, ética e democracia, questionando-se e remanejando-se os papéis que devem assumir a comunidade científica, o Estado, o Mercado e a Sociedade Civil na Era Tecnológica [...] São muitos os casos em que a polêmica referente à liberação de transgêncios para cultivo e consumo acaba nas barras dos tribunais. A França, alguns anos depois de haver sido a responsável pelo pedido de liberação de um tipo de milho transgênico na União Européia, apela para a Corte Suprema, desejosa de furtar-se à obrigação de aceitar a sua comercialização em seu território. Nos EUA, o processo movido por uma ampla coalizão de entidades civis contra a FDA (Food and Drugs Agency), acusada de descumprir suas obrigações legais de examinar a segurança dos alimentos transgênicos, já resultou em liberação de extensa documentação do órgão, por ordem judicial. Há processos judiciais em andamento em todos os continentes e todos movidos por entidades da sociedade civil. Alguns deles, com apoio dos seus Ministérios Públicos". [06]

Ou seja, a análise e interpretação do capítulo III, da Lei 11.105/05, deve reconhecer a extrema complexidade política que atuou como pano de fundo no processo de elaboração da norma, atentando para os diversos conflitos de interesses que nela se expressaram, e também às diversas contradições entre os entes responsáveis pelo exercício do poder político-estatal, no âmbito do sistema de freios e contra-pesos e da divisão territorial do poder político, típicos do Estado Federal.

Por isso, antes mesmo de iniciarmos o trabalho de interpretação dogmático-normativo da referida norma, entendemos oportuna uma breve recuperação histórica do processo político-legislativo que caracterizou a revogação da Lei 8.974/95 pela norma ora em vigor.

Sobre o autor
José Carlos Evangelista de Araújo

Advogado. Graduado em Direito e Mestre em Educação pela Universidade Federal de Uberlândia. Mestre em Direito Constitucional e Doutorando em Direito Administrativo pela PUC-SP. Professor de Direito Constitucional, leciona também Direito Administrativo, Direito Internacional Público e Privado nos cursos de Direito e Relações Internacionais das Faculdades de

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAÚJO, José Carlos Evangelista. Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) e agrobusiness.: Centralização administrativa em detrimento dos imperativos de precaução, publicidade e autonomia federativa no âmbito da política nacional de meio ambiente. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2663, 16 out. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17530. Acesso em: 22 nov. 2024.

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