Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

A teoria do diálogo das fontes

Exibindo página 2 de 2
Agenda 16/01/2011 às 11:14

CONCLUSÃO

Do desenvolvimento do tema, foram extraídas as seguintes conclusões:

1. As Fontes do Direito, em linhas gerais, podem ser classificadas como Formais Estatais (lei e jurisprudência) e Formais não Estatais (doutrina, costumes e negócios jurídicos), as quais, não raras vezes, podem entrar em rota de colisão entre si, colocando em risco os objetivos do Direito: a segurança jurídica, a paz e bem comum.

2. Para a solução de conflitos normativos (antinomias) emerge a Teoria do Diálogo das Fontes, oriunda do Direito Alemão, que permite ao operador do Direito examinar as leis que incidem na espécie, com vagar e sensibilidade, para adotar a solução jurídica que mais se revele adequada no caso, eliminando decisões incoerentes ou insensatas.

3. Para que esta solução jurídica se revele razoável, prudente e justa, o intérprete e aplicador do Direito deve perscrutar, sempre, o núcleo de proteção que reveste e caracteriza o bem jurídico em conflito, sempre a partir das regras e princípios Constitucionais.

4. A Teoria do Diálogo das Fontes não se confunde com os critérios tradicionais de solução de conflitos (temporal, hierárquico e especial), na medida em que pode contrariá-los, como por exemplo, ao aplicar uma regra prevista no Código Civil em uma relação de Consumo. A rigor, aproxima-se dos métodos sistemático e teleológico da Hermenêutica Jurídica, porém se manifesta de modo mais avançado, sem tantos freios literais e mais voltada à concretização da essência material do bem jurídico respectivo. Em suma, permite a melhor solução jurídica para o caso concreto.

5. Sua aplicação reafirma e confirma a distinção formulada pela doutrina entre texto e norma. Aquele de conotação hipotética e abstrata; esta, específica e concreta. Da mesma forma, enaltece a atividade judiciária, fazendo do juiz não um aplicador mecânico de dispositivos legais, mas um mediador esclarecido entre a lei e a vida em sociedade; entre o Direito e a Justiça.

6. A decisão judicial (norma jurídica individual) firmada a partir do Diálogo das Fontes não se operacionaliza de maneira arbitrária ou aleatória pelo julgador, mas com base nas premissas, valores e fundamentos presentes na Constituição, o que deve ficar expresso em seu conteúdo (CF/88, art. 93, inc. IX).

7. A Teoria do Diálogo das Fontes emerge como mais um instrumento a serviço da boa interpretação e aplicação do Direito, com o escopo de concretizar os Direitos Fundamentais, presentes na Carta Magna, bem como fins sociais a que ela se dirige.


REFERÊNCIAS

BELLINETTI, Luiz Fernando. Sentença Civil. Perspectivas conceituais no ordenamento jurídico Brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 59.

BITTAR, Eduardo C. B. e ALMEIDA, Guilherme Assis de. Curso de Filosofia do Direito. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2010.

BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. Tradução de Maria Celeste Coreiro Leite dos Santos. 10ª ed. Brasília: UNB, 1999.

CARNEIRO, Maria Francisca. Direito, Estética e Arte de Julgar. Porto Alegre: Nuria Fabris, 2008.

________________________ et al. Teoria e Prática da Argumentação Jurídica. Lógica. Retórica. 2ª ed. Curitiba: Juruá, 2002.

CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário, Linguagem e Método. 2ª ed. São Paulo: Noeses, 2008.

COELHO, L. Fernando. Lógica Jurídica e Interpretação das Leis. Rio de Janeiro: Forense, 1979.

DWORKIN, Ronald. Taking Rights Seriously. Cambridge: Harvard University Press, 1978.

FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito. Técnica, Decisão, Dominação. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 1994.

GODOY, Cláudio Bueno de. Código Civil Comentado. Doutrina e jurisprudência. Org. Min. Cezar Peluso, São Paulo: Manole, 2006.

GRAU, Eros Roberto. Ensaio e Discurso sobre a Interpretação/Aplicação do Direito. Malheiros: São Paulo, 2002.

IHERING, Rudolf Von. A Luta pelo Direito. Tradução de Pietro Nasseti. 2ª ed. São Paulo: Martin Claret, 2009.

KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Tradução de João Baptista Machado. 6ª ed. São Paulo: Martins Fontes.

MARQUES, Cláudia Lima. Superação das antinomias pelo Diálogo das Fontes: o modelo brasileiro de coexistência entre o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil de 2002. Revista da Escola Superior da Magistratura de Sergipe, Aracaju, SE, v. 7, p. 15-54, 2004.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992.

MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. São Paulo: Atlas, 2006.

NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. Doutrina e jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2002.

PRUX, Oscar Ivan. A Possibilidade de um Diálogo das Fontes entre o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil. Jornal Estado do Paraná, Cad. Direito & Justiça, 27 maio 2007.

REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 1988.

ROHDEN, Humberto. Einstein – o enigma do universo. São Paulo: Martin Claret, 2007.

STRECK, Lênio. Verdade e Consenso. Constituição, Hermenêutica e Teorias Discursivas da Possibilidade à Necessidade de Respostas Corretas em Direito. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.

VAZ, Anderson Rosa. Introdução ao Direito. Curitiba: Juruá, 2008.


NOTAS

  1. Dworkin chega a defender a existência de apenas uma resposta correta (one right answer), mesmo nos chamados casos difíceis (hard cases). DWORKIN, Ronald. Taking Rights Seriously. Cambridge: Harvard University Press, 1978, p. 279-290.

  2. A expressão é de Lênio Streck. STRECK, Lênio. Verdade e Consenso. Constituição, Hermenêutica e Teorias Discursivas da Possibilidade à Necessidade de Respostas Corretas em Direito. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 572.

  3. VAZ, Anderson Rosa. Introdução ao Direito. Curitiba: Juruá, 2008, p. 227.

  4. NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. Doutrina e jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 37.

  5. FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito. Técnica, Decisão, Dominação. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 1994, p. 311.

  6. Nas palavras de Ihering: "O fim do direito é a paz, o meio de que se serve para consegui-lo é a luta". IHERING, Rudolf Von. A Luta pelo Direito. Tradução de Pietro Nasseti. 2ª ed. São Paulo: Martin Claret, 2009, p. 27.

  7. Nesse ponto, concorda-se, como se vê, com o pensamento de Eduardo C. B. Bittar e Guilherme A. de Almeida, para quem: "O Direito deve ser o veículo para a realização da justiça. Em outras palavras, a justiça deve ser a meta do Direito". BITTAR, Eduardo C. B. e ALMEIDA, Guilherme Assis de. Curso de Filosofia do Direito. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 526.

  8. Sobre o tema, Anderson Rosa pondera: "autores de escol, como Paulo de Barros Carvalho, Miguel Reale, José Oliveira Ascensão e João Baptista Machado, mesmo reconhecendo a importância da ‘comunis opinio doctorum’ para a fundamentação do ordenamento jurídica, não consideram que a doutrina possa ser chamada de fonte de direito, sob o argumento que a doutrina não vincula o julgador." E prossegue: "não parece assistir razão a esse entendimento, notadamente quando se considera que doutrina, produto da atividade do jurista, tem função criptonormativa, isto é, tem a função de orientar a conduta dos indivíduos em sociedade". VAZ, Anderson Rosa. Op. cit., p. 252.

  9. BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. Tradução de Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos. 10ª ed. Brasília: UNB, 1999, p. 92.

  10. MARQUES, Cláudia Lima. Superação das antinomias pelo Diálogo das Fontes: o modelo brasileiro de coexistência entre o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil de 2002. Revista da Escola Superior da Magistratura de Sergipe, Aracaju, SE, v. 7, p. 15-54, 2004.

  11. Ibidem.

  12. Ibidem.

  13. MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. São Paulo: Atlas, 2006, p. 402-403.

  14. Nesta conformação, o seguinte julgado: TJ-SP – Ap. Cível nº 7.347.215-4 – Rel. Des. Candido Alem – julg. em 04/05/2010, que, em sua fundamentação, fez constar: "Também não é caso de prescrição ou decadência pelas regras do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que a jurisprudência praticamente unânime aplica à matéria as normas do Direito Civil, por serem mais favoráveis ao consumidor efetuando o chamado "diálogo das fontes".

  15. Nesse linha: "CONTRATO DE SEGURO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. PRÊMIO PARCELADO. ATRASO. NEGATIVA DE PAGAMENTO DA COBERTURA SECURITÁRIA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E NOVO CÓDIGO CIVIL. DIÁLOGO DE FONTES. INTELIGÊNCIA DO ART. 763. DO CÓDIGO CIVIL. MORA EX PERSONA. PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ, RAZOABILIDADE. EQUILÍBRIO CONTRATUAL. SUSPENSÃO DA GARANTIA. CANCELAMENTO AUTOMÁTICO DA COBERTURA. IMPOSSIBILIDADE. INDENIZAÇÃO DEVIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. A regra do art. 763. do Código Civil, que cria cláusula resolutiva expressa do negócio jurídico, impedindo que o segurado receba a indenização, há que ser interpretada em consonância com os princípios da boa-fé, da razoabilidade e do equilíbrio contratual, travando-se o diálogo com o Código de Defesa do Consumidor. 2. O simples atraso de parcelas do prêmio conduz à suspensão da garantia, havendo a necessidade de interpelação, uma vez que se trata de mora ‘ex persona’, por se tratar de negócio socialmente sensível. Mero atraso não basta para desconstituir a relação contratual." (TJ-PR – Ap. Cível nº 327.427-1 - Rel. Des Wilde de Lima Pugliese. – julg. em 09/03/2006).

  16. A aplicação da Teoria do Diálogo das Fontes não se limita às relações de consumo. Já existem julgados, por exemplo, que deixam de conferir efeito suspensivo em embargos à execução fiscal, com base nas disposições do CPC, após as alterações da Lei 11.382/2006, em relação ao art. 739-A, no CPC, não aplicando, pois, o princípio da especialidade no que alude à Lei 6.830/1980. Nesse sentido: STJ – AgRg no Ag 1276180/RS, Rel. Min. Castro Meira – 2ª Tuma – julg. em 06/04/2010.

  17. CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário, Linguagem e Método. 2ª ed. São Paulo: Noeses, 2008, p. 168.

  18. GRAU, Eros Roberto. Ensaio e Discurso sobre a Interpretação/Aplicação do Direito. Malheiros: São Paulo, 2002, p. 63.

  19. Ibidem, p. 63-64 .

  20. REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 1988, p. 85.

  21. Idibem, p. 298.

  22. KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Tradução de João Baptista Machado. 6ª ed. São Paulo: Martins Fontes, p. 264.

  23. Ibidem, p. 264.

  24. MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992, p. 59.

  25. COELHO, L. Fernando. Lógica Jurídica e Interpretação das Leis. Rio de Janeiro: Forense, 1979, p. 137.

  26. PRUX, Oscar Ivan. A Possibilidade de um Diálogo das Fontes entre o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil. Jornal Estado do Paraná, Cad. Direito & Justiça, 27 maio 2007.

  27. Ratifique-se: "a norma do escalão superior não pode vincular em todas as direções (sob todos os aspectos) o ato através do qual é aplicada. Tem sempre de ficar uma margem, ora maior ora menor, de livre apreciação, de tal forma que a norma do escalão superior tem sempre, em relação ao ato de produção normativa ou de execução que a aplica, o caráter do de um quadro ou moldura a preencher por este ato." KELSEN, Hans. Op. cit., p. 388.

  28. Ibidem, p. 388.

  29. GODOY, Cláudio Bueno de. Código Civil Comentado. Doutrina e jurisprudência. Org. Min. Cezar Peluso, São Paulo: Manole, 2006, p. 594.

  30. Ao discorrer sob o tema, após lançar o sugestivo título "A inexpugnável subjetividade", Maria Francisca Carneiro et al anotam: "mesmo as posturas positivistas admitem que o conhecimento, tido genericamente em suas diferentes áreas, implica uma triagem com maior ou menor grau de discricionariedade de informações. A própria eleição de matérias de estudo e, mais adiante, a delimitação dos temas de pesquisa, contêm, as mais das vezes, elementos subjetivos individuais do pesquisador". CARNEIRO, Maria Francisca; SEVERO, Fabiana Galera e ÈLER, Karen. Teoria e Prática da Argumentação Jurídica. Lógica. Retórica. 2ª ed. Curitiba: Juruá, 2002, p. 50.

  31. Foi a intuição que levou Einstein à formulação da Teoria da Relatividade, a qual não encontrava respaldo ou coerência na física Newtoniana. Sobre o tema, as palavras de Luiz Fernando Bellinetti: "e nem se diga que a intuição não é um indicativo aceitável. Há alguns dados relevantes que a privilegiam: algumas das mais significativas criações humanas, tal como a teoria da relatividade, derivaram em grande parte da intuição. Holton, citado por Bernstein (cf. As ideias de Einstein, p. 86) afirma que Einstein, mesmo em face dos experimentos que pareciam desmentir sua teoria não abriu mão de suas ideias, confiando que estava certo, sendo posteriormente demonstrado que estavam erradas as conclusões tiradas das mencionadas experiências e corretas as teorias de Einstein". BELLINETTI, Luiz Fernando. Sentença Civil. Perspectivas conceituais no ordenamento jurídico Brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 59.

  32. Ainda no tocante à intuição, Huberto Rohden cita Einstein: "Não existe nenhum caminho lógico para o descobrimento dessas leis elementares; o único caminho é o da intuição (There is only the way of intuition)". ROHDEN, Humberto. Einstein – O Enigma do Universo. São Paulo: Martin Claret, 2007, p. 26.

  33. CARNEIRO, Maria Francisca. Direito, Estética e Arte de Julgar. Porto Alegre: Nuria Fabris, 2008, p. 21.

  34. Este também é o entendimento de L. Fernando Coelho: "a primeira tarefa do juiz será então, de maneira serena e equilibrada, captar a valoração independente da regra de direito, utilizando-se dos processos comuns de interpretação, que são todos válidos desde que associados; mas essa captação se integra com a apreciação que ele faz do caso concreto, quando resplandece a missão mais importante do juiz – fazer Justiça!" COELHO, L. Fernando. Op. cit., p. 227.


Abstract: This article aims to comment about the Theory of the Dialogue of Sources. It begins with an analysis of what is meant by sources of law, pointing to possible conflicts among them, especially among laws (antinomies). In the following, after to present the classical methods for solution of antinomies, begins to consider the matter itself, informed its origin, its justifications and foundations, as well as how to operationalize it. This way, highlights the role of the judge in the interpretation and application of law, and the possibility of judicial decision more adequate to this case, from the essential core of the legal point in conflict obtained on the basis of Constitutional assumptions.

Key words : Dialogue of Sources – Antinomies – Text and Norma – Interpretation and Application of Law.

Sobre o autor
José Ricardo Alvarez Vianna

Juiz de Direito no Paraná. Doutor pela Universidade Clássica de Lisboa. Mestre pela UEL. Professor da Escola da Magistratura do Paraná.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIANNA, José Ricardo Alvarez. A teoria do diálogo das fontes. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2755, 16 jan. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18279. Acesso em: 22 dez. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!