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Competência para aplicação da penalidade do art. 7º da Lei nº 10.520/2002 (Lei do Pregão)

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Agenda 19/01/2011 às 12:27

1.Introdução

O artigo 7º da Lei nº 10.520, de 2002 (Lei do Pregão), instituiu nova modalidade de sanção na seara das licitações e contratos administrativos, nos seguintes termos:

Art. 7º Quem, convocado dentro do prazo de validade da sua proposta, não celebrar o contrato, deixar de entregar ou apresentar documentação falsa exigida para o certame, ensejar o retardamento da execução de seu objeto, não mantiver a proposta, falhar ou fraudar na execução do contrato, comportar-se de modo inidôneo ou cometer fraude fiscal, ficará impedido de licitar e contratar com a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios e, será descredenciado no Sicaf, ou nos sistemas de cadastramento de fornecedores a que se refere o inciso XIV do art. 4º desta Lei, pelo prazo de até 5 (cinco) anos, sem prejuízo das multas previstas em edital e no contrato e das demais cominações legais.

Da leitura do dispositivo legal percebe-se que o legislador não previu qual a autoridade competente para sua aplicação.

Diante da lacuna legal, para saber qual será essa autoridade competente, necessário utilizar, subsidiariamente, as normas insertas na Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, em razão do disposto no artigo 9º da Lei nº 10.520, de 2002 [01]

Assim, o cerne da questão é perquirir o alcance da norma do artigo 87 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos, especialmente no que tange à aplicação das penalidades de "suspensão" (inc. III) e "declaração de inidoneidade" (inc. IV) de licitar e contratar com a Administração Pública, e saber se tal interpretação pode ser transportada para a exegese do dispositivo normativo da Lei do Pregão acima mencionado, para fins de se verificar, a partir destas conclusões, qual é a autoridade competente para aplicação da penalidade do artigo 9º da Lei do Pregão.


2. Da interpretação do artigo 87 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos

A respeito da hermenêutica do artigo 87 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos, há três correntes principais sobre o tema, conforme noticia José dos Santos Carvalho Filho [02]:

Questão que tem sido freqüentemente discutida reside nos efeitos derivados das sanções de suspensão temporária de licitar e impedimento de contratar com a Administração (art. 87, III, Estatuto) e de declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração (art. 87, IV). Há três correntes de pensamento.

Para grande parte dos especialistas, o efeito é restritivo, vale dizer limita-se ao ente federativo em que a sanção foi aplicada, invocando-se duas razões: 1ª) a autonomia das pessoas da federação; 2ª) a ofensa ao princípio da competitividade, previsto no art. 3º, § 1º, I, do Estatuto.

Outra corrente, no entanto, advoga o entendimento de que o efeito sancionatório é restritivo para a suspensão e extensivo para a declaração, ou seja, neste último caso, deve a sanção ser recepcionada por entidade federativa diversa. O argumento tem amparo no fato de que no art. 87, III, o Estatuto alude à Administração – definida no art. 6º, XII, como sendo órgão, entidade ou unidade administrativa pela qual a Administração Pública opera e atua concretamente -, ao passo que no art. 87, IV, refere-se à Administração Pública – definida no art. 6º, XI, como sendo a administração direta e indireta dos diversos entes federativos.

Na verdade, não conseguimos convencer-nos, data venia, de qualquer dos pensamentos que concluem no sentido restritivo dos efeitos punitivos. Parece-nos que o efeito deva ser sempre extensivo. Em primeiro lugar, não conseguimos ver diferença de conceituação naqueles incisos do art. 6º, já que o que podemos constatar é apenas uma péssima e atécnica definição de Administração Pública; com efeito, nenhuma diferença existe entre Administração e Administração Pública. Além disso, se um contratado é punido por um ente federativo com a aplicação de uma daquelas sanções, a razão só pode ter sido a inexecução total ou parcial do contrato, isto é, inadimplemento contratual, como está afirmado na lei (art. 87). Desse modo, não nos parece fácil entender por que tal infração também não acarretaria riscos para as demais entidades federativas no caso de alguma delas vir a contratar com a empresa punida. (...) Para nós não há lógica em tal solução, porque a Administração Pública é uma só, é uma, é um todo, mesmo que, em razão de sua autonomia, cada pessoa administrativa tenha sua própria estrutura.

São adeptos da concepção restritiva doutrinadores de escol como Hely Lopes Meirelles [03], Toshio Mukai [04], Jessé Torres Nunes [05] e Carlos Ari Sundfeld [06], conforme retratado por Sandro Luiz Nunes [07]:

O primeiro a ser citado, é Hely Lopes Meirelles para o qual a declaração de inidoneidade só opera efeitos em relação à Administração que a declara, pois que sendo uma restrição a direito não se estende a outras Administrações. Outro mencionado é Toshio Mukai o qual entende que a eficácia de tais sanções é restrita a entidade política que a aplicou. Argumenta, ainda, Toshio Mukai que o âmbito de competência do agente que aplica a sanção é que delimita sua extensão.

(...)

Carlos Ari Sundfeld, apesar de entender que a Lei nº 8.666/93 estabelece as normas gerais em matéria punitiva, acredita que as sanções de inidoneidade ou suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração devem ser impostas por agentes políticos da União, Estado, Distrito Federal ou Município, impedindo a contratação ou habilitação do apenado apenas pelos entes administrativos da mesma unidade federativa responsável pela aplicação da penalidade. Fundamenta-se, para tanto, no princípio da estrita legalidade. Na sua opinião à mingua de disposição legal expressa acerca da extensão dos efeitos da declaração de inidoneidade às entidades e órgãos de outras unidades da Federação, deve-se restringi-la à esfera de governo competente para a aplicação da sanção. Ainda no seu entendimento, nada impede, porém, que a legislação específica de outras unidades federativas preveja a vedação de participação em suas Licitações de empresas ou profissionais considerados inidôneos ou suspensos por atos oriundos de outras esferas de governo.

(...)

Também Jessé Torres Pereira Júnior entende que o tratamento dado à inidoneidade pela legislação anterior indica que a declaração produz efeitos apenas no âmbito da esfera de atuação do declarante.

Já a concepção ampliativa é adotada, dentre outros, por Marçal Justen Filho e José dos Santos Carvalho Filho, conforme se depreende do seguinte excerto do artigo de lavra de Alexandre Wagner Nester [08]:

3. Irrelevância da menção pela lei a "Administração" e "Administração Pública"

É irrelevante o fato de constar no inciso III o termo "Administração" e no inciso IV o termo "Administração Pública", porquanto as duas expressões se equivalem. A Administração é uma só, de modo que a sanção aplicada por um órgão ou entidade vale para os demais.

Seria ilógico admitir que uma empresa sancionada com base no inciso III deve ser considerada suspensa – inidônea – para licitar com um determinado órgão (da Administração direta) ou entidade da Administração indireta e, ao mesmo tempo, livre para contratar com os outros órgãos e entidades.

Da mesma forma, não seria correto afirmar que uma empresa sancionada com base no inciso III deve ser considerada suspensa – ou inidônea – para contratar com órgãos e entidades da Administração Pública do Paraná, por exemplo, e, ao mesmo tempo, livre para contratar com órgãos e entidades da Administração Pública de Santa Catarina.

Qualquer afirmação nesse sentido acarretaria verdadeiro esvaziamento dos efeitos da sanção. Bastaria à empresa sancionada contratar com outro órgão, ou mudar de Estado, para evitar a eficácia da penalidade.

Parece evidente, portanto, que ambas as sanções valem para todos os órgãos e entidades da Administração, de qualquer esfera da federação.

4. A impossibilidade de se estabelecer uma diferença de grau entre as sanções do art. 87.

Rigorosamente, pela redação da lei não é possível estabelecer uma diferença de grau entre as duas figuras – muito embora tenha se tornado usual aplicar a suspensão do direito de licitar para as infrações mais brandas e a declaração de inidoneidade para as mais reprováveis.

Conforme explica MARÇAL JUSTEN FILHO, isso decorre da impossibilidade material de se identificar os pressupostos práticos de imposição de cada uma dessas sanções (Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 13ª ed. São Paulo: Dialética, 2009, p. 857) – afinal, como já observado, ambas se aplicam em caso de ‘inexecução parcial ou total do contrato’, tal como previstono caput do art. 87. E isso conduz a um impasse insolúvel acerca da avaliação da gravidade das duas sanções: se não é possível identificar os respectivos pressupostos de aplicação, como então afirmar qual se destina a punir condutas mais graves?

A resposta não se extrai do texto legal. Ou seja, de acordo com a redação atual da lei, não é possível diferenciar quando cabe a suspensão do direito de licitar e quando se aplica a declaração de inidoneidade.

5. A verdadeira distinção entre as duas punições

A verdadeira distinção entre as duas punições reside no prazo: enquanto a suspensão do direito de licitar é por prazo determinado de dois anos, a declaração de inidoneidade tem prazo de duração indeterminado, pois vigora por tanto tempo quando perdurar os motivos que lhe deram causa.

Em tese, portanto, a declaração de inidoneidade pode ser até mais branda do que a suspensão do direito de licitar, na medida em que o particular sancionado pode providenciar a regularização da situação que acarretou a sanção em prazo inferior a dois anos.

Outra diferença consiste na competência para aplicação: a suspensão do direito de licitar é aplicada pela autoridade competente do órgão contratante, enquanto que a declaração de inidoneidade compete à autoridade máxima do órgão ou entidade.

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Este posicionamento foi acolhido por diversos tribunais pátrios [09], em especial o Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. SANÇÃO IMPOSTA A PARTICULAR. INIDONEIDADE. SUSPENSÃO A TODOS OS CERTAMES DE LICITAÇÃO PROMOVIDOS PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA QUE É UNA. LEGALIDADE. ART. 87, INC. II, DA LEI 8.666/93. RECURSO IMPROVIDO.

I - A Administração Pública é una, sendo, apenas, descentralizada o exercício de suas funções.

II - A Recorrente não pode participar de licitação promovida pela Administração Pública, enquanto persistir a sanção executiva, em virtude de atos ilícitos por ela praticados (art. 88, inc. III, da Lei n.º 8.666/93). Exige-se, para a habilitação, a idoneidade, ou seja, a capacidade plena da concorrente de se responsabilizar pelos seus atos.

III - Não há direito líqüido e certo da Recorrente, porquanto o ato impetrado é perfeitamente legal.

IV - Recurso improvido.(RMS 9707/PR; DJ 20/05/2002; P. 115)

ADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA – LICITAÇÃO – SUSPENSÃO TEMPORÁRIA – DISTINÇÃO ENTRE ADMINISTRAÇÃO E ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - INEXISTÊNCIA – IMPOSSIBILIDADE DE PARTICIPAÇÃO DE LICITAÇÃO PÚBLICA – LEGALIDADE – LEI 8.666/93, ART. 87, INC. III.

- É irrelevante a distinção entre os termos Administração Pública e Administração, por isso que ambas as figuras (suspensão temporária de participar em licitação (inc. III) e declaração de inidoneidade (inc. IV) acarretam ao licitante a não-participação em licitações e contratações futuras.

- A Administração Pública é una, sendo descentralizadas as suas funções, para melhor atender ao bem comum.

- A limitação dos efeitos da "suspensão de participação de licitação" não pode ficar restrita a um órgão do poder público, pois os efeitos do desvio de conduta que inabilita o sujeito para contratar com a Administração se estendem a qualquer órgão da Administração Pública.

- Recurso especial não conhecido.(REsp. 151567/RJ; DJ 14/04/2003 p. 208)

Finalmente, a posição intermediária, restritiva quanto à penalidade de "suspensão" e ampliativa quanto à de "declaração de inidoneidade", é defendida por diversos doutrinadores como Maria Sylvia Zanella Di Pietro [10]:

O inciso IV do artigo 87, ao falar em inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública, parece estar querendo dar maior amplitude a essa penalidade, já que remete o intérprete, automaticamente, ao artigo 6º, XI, que define Administração Pública de forma a abranger ‘a administração direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, abrangendo inclusive as entidades com personalidade de direito privado sob controle do poder público e das fundações por ele instituídas ou mantidas.

Esta é a posição do Tribunal de Contas da União [11]:

Existem duas interpretações possíveis para o dispositivo: a de que o termo ‘Administração’ refere-se apenas ao órgão que aplica a penalidade e aquela que o DNER apresenta em sua justificativa, de que o impedimento abrangeria todos os órgãos da Administração Pública na esfera do órgão sancionador. O responsável traz em sua defesa a tese do Administrativista Marçal Justen Filho (...)

4.3 Não é esse o entendimento do Tribunal, conforme podemos observar das Decisões 369/99, 226/00 e 352/98 do Plenário. Desta última, proferida no Processo TC 017.801/95-8, destaco três fortes argumentos para combater a tese acima:

As sanções elencadas no art. 87 da Lei nº 8.666/93 encontram-se em escala gradativa de gravidade: advertência, multa, suspensão do direito de licitar e declaração de inidoneidade. Percebe-se a intenção do legislador de distinguir as duas últimas figuras, de forma a permitir ao administrador que penalize uma falta não tão grave apenas com a suspensão do direito de licitar e contratar com a Administração por prazo não superior a dois anos. Por outro lado, a sanção mais grave seria declarar o licitante inidôneo para contratar com a Administração Pública. O legislador utilizou os conceitos da própria Lei, art. 6º, incisos XI e XII, para definir a abrangência das duas sanções: a primeira aplica-se apenas à Administração como órgão, entidade ou unidade da administrativa que atua concretamente, e a segunda aplica-se à administração direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Tais dispositivos cuidam de restrição de direitos, pelo que devem ser interpretados de forma restritiva. Não se permite estender a lei penal, aplicá-la por analogia ou paridade, reprimindo ações e aplicando penas sem fundamento legal específico e prévio. A impropriedade de termos ou lapso na redação não se presume, deve ser demonstrada cabalmente, sob pena de se praticar a injustiça.

O art. 97 da Lei comprova a diversidade de abrangência das duas sanções, suspensão do direito de licitar e declaração de inidoneidade. É crime ‘admitir à licitação ou celebrar contrato com empresa ou profissional declarado inidôneo’, para o qual existem penas de 6 meses a 2 anos e multa. Essa constatação ratifica o entendimento de que o impedimento de licitar ou contratar com alguém apenado com a sanção do art. 87, inciso III, restringe-se ao órgão ou entidade que aplicou a sanção, já que não há quaisquer óbices a que outros órgãos venham a fazê-lo. (Decisão 36/2001 – Plenário)

Entendo, com Maria Sylvia Zanella Di Pietro e TCU, que está mais consentânea com o ordenamento jurídico esta última posição. Afinal, é princípio de hermenêutica de que a lei não contém palavras inúteis. Assim, a conceituação prevista no artigo 6º da Lei nº 8.666, de 1993, não pode ser ignorada na interpretação do artigo 87 do mesmo diploma legal.


3. Da natureza da penalidade de "impedimento" da Lei do Pregão

Fixada a interpretação do artigo 87 da Lei nº 8.666, de 1993, cumpre perquirir a influência desta exegese em cotejo com a hermenêutica do artigo 7º da Lei nº 10.520, de 2002.

Cumpre desde já asseverar a complexidade da matéria, havendo, também neste ponto, diversos posicionamentos a respeito do tema.

A título de ilustração, Paulo Sérgio de Monteiro Reis [12] defende a tese de que "Temos, então, em nosso ordenamento jurídico, além da Lei nº 8.666/93, a Lei nº 10.520/2002, ambas de igual poder normativo (duas leis ordinárias) e ambas legislando sobre normas gerais de licitação e contratação, nos termos da Constituição Federal. Tratando-se de diplomas legislativos de mesmo nível e sendo ambas da categoria de leis especiais sobre licitações e contratos, suas disposições são complementares e devem ser observados no conjunto. No entanto, quando for registrada qualquer contradição entre elas, a supremacia será sempre da norma mais recente relativamente àquela mais antiga, ficando esta derrogada do ordenamento jurídico, quer essa revogação se faça de forma explícita, quer implicitamente." Conclui o autor, em razão dessa premissa, que "no caso específico da penalidade de suspensão temporária do direito de participar de licitações e de ser contratado, prevalecem as disposições do art. 7º da Lei nº 10.520/2002 em relação às do art. 87, inc. III da Lei nº 8.666/93, qualquer que seja a modalidade de licitação ou de contratação sem licitação da qual decorreu o inadimplemento".

Vale registrar também a existência de tese que, com base na teoria do diálogo das fontes e nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, propõe uma aplicação coordenada das duas normas – Lei nº 10.520, de 2002, e Lei nº 8.666, de 1993, - para fins de aplicação de sanções, tendo em vista que as duas são normas gerais sobre licitações públicas.

Não obstante os diversos posicionamentos acerca do tema, a Leinº 10.520, de 2002, apesar de sua natureza de norma geral, no sentido de ser observada por todas as esferas de Governo (municipal, estadual, distrital e federal), é sim específica no que tange à matéria por ela tratada, tendo em vista sua aplicação restrita ao Pregão. Neste passo, o legislador previu expressamente a utilização da Lei nº 8.666, de 1993, apenas em caráter subsidiário, quando se tratar da modalidade licitatória denominada Pregão (artigo 9º da Lei nº 10.520, de 2002), o que demonstra, ao meu sentir, que não se pretendeu a aplicação "simultânea" das duas normas em apreço, mas apenas possibilitar a integração (eventual) da Lei do Pregão utilizando-se subsidiariamente a Lei de Licitações.

Isso quer dizer que não há possibilidade de aplicação das penalidades insertas nos incisos III e IV do artigo 87 da Lei de Licitações no âmbito do Pregão, posto que as finalidades de sua aplicação se equivalem à penalidade inserta especificamente para este tipo de procedimento licitatório (Pregão). O que se analisará, com base no uso da analogia destes dispositivos, é apenas o âmbito de abrangência e competência para aplicar a penalidade especificamente prevista na Lei do Pregão (artigo 7º da Lei do Pregão).

Assim, conforme já esposado alhures, para efeito de interpretação do artigo 7º da Lei do Pregão, quanto à competência para a aplicação das penalidades ali previstas e sua respectiva abrangência, socorre-se ao artigo 87 da Lei de Licitações, em caráter subsidiário, usando-se da analogia.

Neste passo, e tendo em vista a adoção da tese intermediária sufragada pelo TCU, cumpre analisar se a penalidade denominada de "impedimento" pela Lei do Pregão se amolda mais à penalidade de "suspensão" ou, ao contrário, se é mais assemelhada à de "declaração de inidoneidade" da Lei nº 8.666, de 1993.

Partindo da premissa de que, em verdade, as penas de "suspensão" e "declaração de inidoneidade" da Lei de Licitações diferem, substancialmente, apenas em relação ao seu prazo e âmbito de abrangência e, ainda, em razão da autoridade competente para aplicar a penalidade, força é concluir que a penalidade de "impedimento" da Lei do Pregão (art. 7º) assemelha-se, à "suspensão" da Lei nº 8.666, de 1993, por não atingir toda a Administração Pública (Municípios, Estados, Distrito Federal e União – mas apenas o ente federativo de onde se originou a sanção) e por possuir prazo máximo determinado, tal como ocorre na "suspensão".

Confira-se, a respeito da matéria, a doutrina de Marçal Justen Filho [13]:

A utilização da preposição ‘ou’ indica disjunção, alternatividade. Isso significa que a punição terá efeitos na órbita interna do ente federativo que aplicar a sanção. Logo, e considerando o enfoque mais tradicional adotado a propósito da sistemática da Lei n. 8.666, ter-se-ia de reconhecer que a sanção prevista no art. 7º da Lei do Pregão consiste em suspensão do direito de licitar e contratar. Não é uma declaração de inidoneidade. Portanto, um sujeito punido no âmbito de um Município não teria afetada sua idoneidade para participar de licitação promovida na órbita de outro ente federal.

No mesmo sentido, o magistério de Fabrício Motta [14]:

Sem tomar posicionamento a respeito da celeuma, no tocante à questão que nos interessa diretamente, ou seja, a abrangência da penalidade prevista no art. 7º da Lei n. 10.520/02, há que se destacar que o impedimento de licitar e contratar referir-se-á à União, Estados, Distrito Federal ou Municípios, de acordo com a expressa dicção legal. O uso da conjunção alternativa ‘ou’, somando à referência à entidade política, parece espancar as dúvidas tocantes à eventual extensão da sanção a todas as esferas.

Segundo Joel Menezes Niebuhr [15]:

Perceba-se que o legislador, ao dispor da amplitude das sanções administrativas, utilizou a conjunção alternativa ‘ou’, o que significa que o impedimento de contratar abrange apenas ao ente federativo que aplicou a penalidade, sem estender-se aos demais. Noutras palavras, empresa impedida de participar de licitação pela União, pode participar, livremente, de licitações nos Estados, Distrito Federal e Municípios.

Sandro Luiz Nunes assevera [16]:

A extensão da aplicação da penalidade restou bem caracterizada no art. 7º da lei n. 10.520/02, o que atendeu aos princípios gerais do direito sancionador inserido no ordenamento jurídico pela Lei n. 8.666/93, qual seja, a de que a penalidade de suspensão do direito de licitar e contratar está limitado ao ente político a qual se encontra vinculado o órgão licitante ou contratante que impõe a penalidade nas hipóteses mencionadas.

(...)

Ao meu sentir, assiste razão a corrente doutrinária ao argumento de que a penalidade de suspensão do direito de licitar é restrita ao ente político que o aplicou, situação de que se coaduna com a sistemática adotada pela Lei n. 8.666/93 quanto a aplicação de idêntica penalidade às demais modalidades licitatórias.

Não há razão para tratamento desigual, afinal, suspender o direito de licitar é menos grave que a aplicação da sanção de inidoneidade, logo, não há motivos para se igualar a extensão da penalidade administrativa.

Além disso, a competência exclusiva [17]do Ministro de Estado para aplicar a sanção prevista no inciso IV, artigo 87, da Lei nº 8.666, de 1993 (declaração de inidoneidade), está prevista expressamente no texto legal (art. 87, § 3º, da Lei nº 8.666, de 1993), o que não ocorre em relação ao artigo 7º da Leinº 10.520, de 2002, não cabendo ao intérprete atribuir competências a Ministros de Estado sem previsão legal que autorize, mesmo porque a regra geral, inserta no artigo 17 da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, é no sentido de que, inexistindo regra específica, o processo administrativo deve iniciar-se perante a autoridade de menor grau hierárquico, o que afastaria a competência do Ministro de Estado em aplicar penalidades diversas das de declaração de inidoneidade, por ser esta a única modalidade de sanção prevista expressamente pela lei como sendo de sua competência. Assim, também por este prisma verifica-se maior similitude entre as penalidades de "impedimento" e "suspensão" porque ambas prescindem da atuação do Ministro de Estado.

Observe-se, ainda, o fato de que na presença de duas leis gerais (no sentido da necessidade de sua observância por todos os entes federados), em que se previu cinco espécies de penalidades (advertência, multa, suspensão temporária, declaração de inidoneidade – na Lei nº 8.666, de 1993 – e impedimento – no artigo 7º da Leinº 10.520, de 2002), para apenas uma delas asseverou o legislador a competência do Ministro de Estado para sua aplicação, não havendo motivo, repita-se a exaustão, para que o intérprete alargue esta competência a outras hipóteses não contempladas em lei, o que macularia, em última instância, o princípio da legalidade que rege a conduta da Administração Pública.

Destarte, conclui-se que a penalidade de "impedimento" prevista na Lei do Pregão tem natureza similar à da penalidade de "suspensão" prevista no artigo 87, III, da Lei nº 8.666, de 1993, devendo esta última ser utilizada como parâmetro para a interpretação do artigo 7º da Lei nº 10.520, de 2002.

Sobre o autor
Marcelo Lopes Santos

Procurador da Fazenda Nacional, lotado na Coordenação Jurídica de Licitações e Contratos da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional em Brasília/DF. Especialista em Direito Público. Ex-Procurador Federal, ex-Analista Judiciário do Superior Tribunal de Justiça, ex-Advogado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Marcelo Lopes. Competência para aplicação da penalidade do art. 7º da Lei nº 10.520/2002 (Lei do Pregão). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2758, 19 jan. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18300. Acesso em: 23 dez. 2024.

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