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Contratações motivadas por licitações desertas e fracassadas

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Agenda 14/02/2011 às 17:23

3) Requisitos para realizar a contratação direta prevista no inciso V do artigo 24 da Lei 8.666/93

Partindo da premissa que as linhas anteriores já discorreram o suficiente sobre os efeitos da ausência de interessados e da não habilitação e classificação de todos os licitantes e de todas as suas propostas numa licitação anterior que será sucedida por uma contratação direta, passamos a analisar apenas os demais requisitos exigidos pelo inciso V do artigo 24 da Lei das licitações e contratações públicas.

Hely Lopes Meirelles, em obra atualizada por José Emanuel Burle Filho, Carla Rosado Burle e Luís Fernando Pereira Franchini, enfatiza de forma sintética aquilo que poderíamos chamar de diretriz básica para a contratação direta que se dê com fulcro no inciso V do artigo 24 da Lei de licitações e contratos:

"O que não poderá é contratar diretamente com quem não apresente os requisitos exigidos para a habilitação ou em condições mais favoráveis ao contratado ou menos vantajosas para o serviço público do que estabelecidas no instrumento convocatório inicial.

Se comparecer apenas um licitante, qualificado para o contrato, a Administração não pode adjudicar-lhe o objeto pretendido. O essencial é que este único pretendente tenha condições para contratar, segundo as exigências do edital, no que tange a capacidade jurídica, regularidade fiscal, capacidade técnica e idoneidade financeira, que hão de ser verificadas antes da contratação, e que o contrato seja vantajoso para a Administração." (Hely Lopes Meirelles in Licitação e Contrato Administrativo, 15ª edição, atualizada por José Emanuel Burle Filho, Carla Rosado Burle e Luís Fernando Pereira Franchini, São Paulo: Malheiros, 2010, pág. 148)

Além desta necessária obediência aos MESMOS parâmetros da licitação fracassada anterior, a contratação direta fundamentada no inciso V do artigo 24 da Lei de licitações e contratações públicas deverá afastar, de forma comprovada, os prejuízos que seriam advindos da realização de um novo certame. Neste toar, vejamos a lição de Diógenes Gasparini:

"A nova licitação, no entanto, pode ser prejudicial à Administração Pública em face do tempo demandado para sua realização, causando-lhe um acréscimo no valor do contrato (prejuízo financeiro) ou atraso na prestação do serviço ou utilização da obra (prejuízo administrativo). Daí a razão dessa hipótese de licitação dispensável. Assim, caracterizada a situação de deserção e demonstrado o efetivo prejuízo financeiro ou administrativo, a contratação poderá ser celebrada sem licitação. Mas isso não é tudo, pois o inciso em apreço exige para essa contratação a observância das mesmas condições da licitação havida como deserta (prazo de início, de conclusão, de entrega, condições de execução e de pagamento). Qualquer alteração que se fizer nas condições do edital ou do contrato para facilitar a contratação direta acarretará a nulidade do ajuste decorrente e a responsabilidade dos seus causadores." (Diógenes Gasparini in Direito Administrativo, 15ª edição, atualizada por Fabrício Motta, São Paulo: Saraiva, 2010, pág. 580)

Reforçando a lição de Diógenes Gasparini trazemos a opinião de Ronny Charles Lopes de Torres que ressalta a importância de a contratação direta ocorrida após a licitação fracassada, além de manter as mesmas condições do ato convocatório anterior, ser fundamentadamente uma alternativa mais vantajosa para a Administração no sentido de evitar prejuízos com a realização de uma nova licitação:

"... a hipótese de dispensa exige a manutenção das mesmas condições e, inclusive, a justificativa da autoridade competente a qual aponte os prejuízos advindos de uma nova tentativa de certame." (Ronny Charles Lopes de Torres in Leis de Licitações Públicas Comentadas, 2ª edição, Salvador: Juspodivm, 2009, pág. 111)

Sobre a natureza do prejuízo a ser evitado com a realização da dispensa de licitação autorizada pelo inciso V do artigo 24 da Lei 8.666, Marçal Justen Filho nos brinda com importante esclarecimento:

"Os prejuízos a que se refere o inciso não têm natureza idêntica aos do inc. IV. Se o inc. V estabelecesse requisitos idênticos aos do inciso IV, seria inútil e desnecessário. Não se exige um prejuízo irreparável ou a periclitação da integridade ou segurança de pessoas etc. O vocábulo ‘prejuízo’ apresenta, naquele dispositivo, significação muito mais ampla do que possui no inciso V. Essa situação pode permitir, em grande parte dos casos, a utilização da cotação eletrônica, sujeita à disciplina do art. 4º, § 2º, do Dec. Fed. Nº 5.450/2005" (Marçal Justen Filho in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 12ª edição, São Paulo: Dialética, 2008, pág. 298)

Jorge Ulisses Jacoby Fernandes traça um panorama com exemplos práticos acerca da questão do prejuízo na realização de um novo certame e da manutenção das condições originais referentes à dispensa de licitação aludida no inciso V do artigo 24 do Estatuto de licitações e contratos:

"... é preciso que fique caracterizado o risco a pessoas ou a bens, potencialmente aferível no momento da dispensa, não atribuível à desídia do agente público.

Em regra, efetivamente, a possibilidade de risco não pode ser imputável ao administrador, vez que, se não tivesse se caracterizado o desinteresse, a Administração teria contratado regularmente o objeto. Trata, portanto, o dispositivo de fato alheio ao interesse ou previsibilidade da Administração que, uma vez caracterizado, autoriza a contratação direta. Na justificativa, deverá o administrador indicar os riscos cuja ocorrência temia, sendo em princípio dispensável a prova de suas assertivas, que se devem cercar de razoabilidade lógica.

Nesse ponto em particular, diferentemente do art. 24, inciso IV, parece possível sustentar que a iminência da devolução dos recursos não aplicados por término do exercício financeiro podem justificar a satisfação desse requisito.

Tal posição repousa no fato de que o inciso IV reporta-se a prejuízo à segurança de pessoas e bens, públicos ou privados, e que o inciso V estabelece como requisito para sua aplicação que a licitação não possa ser repetida sem prejuízo para a Administração. Ora, devolver recursos financeiros no final do exercício, traz prejuízos para a Administração, se o objeto estiver fazendo falta à boa e regular marcha administrativa, mas não é, por si só, motivo suficiente para acarretar prejuízo à segurança de pessoas e bens.

(...)

Necessário se faz, ainda, que a contratação direta, com dispensa do processo licitatório, contribua significativamente para evitar ou minimizar o risco referido anteriormente

.

Tendo já, ao tempo da dispensa, ocorrido o fato-risco temido pelo agente, ou em mais nada ajudando a contratação para evitá-lo, não subsiste o interesse jurídico que ampara a dispensa de licitação

. Ocorre, na prática, que, ao tempo da contratação, o risco já se tinha consumado ou evitado, e o agente da Administração procede à licitação, em atenção, em atenção a despacho autorizador, numa conduta, agora, sem amparo em lei.

Não advindo da contratação direta a possibilidade de evitar ou diminuir significativamente o prejuízo, é incabível a dispensa com fulcro nesse dispositivo.

(...)

Impõe a lógica jurídica que a Administração mantenha as condições ofertadas e exigidas na licitação anterior, pois, se houver qualquer alteração, ficará irremediavelmente comprometido o requisito ‘ausência de interesse’ em participar da licitação

.

Efetivamente, não pode a Administração alterar as exigências estabelecidas para a habilitação, tampouco as ofertas constantes do convite ou edital."

(Jorge Ulisses Jacoby Fernandes in Contratação Direta sem Licitação, 7ª edição, 2ª tiragem, Belo Horizonte: Fórum, 2008, págs. 353/354)

E esta manutenção das condições ofertadas e exigidas no certame anterior na dispensa de licitação fundamentada no inciso V do artigo 24 da Lei Federal nº 6.437/77 é severamente cobrada pelo Tribunal de Contas da União, conforme podemos conferir nos arestos abaixo disponibilizados:

"... no caso de contratações realizadas por dispensa de licitação, fundamentadas no art. 24, inciso V, da Lei nº 8.666/93, observem o atendimento de todas as condições estabelecidas no edital ou no convite da licitação, de acordo com o disposto no mesmo inciso. (Processo nº 013.992/96-1. Decisão nº 103/1998 - Plenário)

... abstenha-se de efetuar compra direta de combustível por dispensa de licitação, sem observar as condições preestabelecidas nas licitações anteriores, às quais não acudirem interessados. (Processo nº 400.047/95-0. Acórdão nº 142/1996 – 2ª Câmara)

... é ilegal a aquisição direta de bens sem a manutenção das condições preestabelecidas no instrumento convocatório da licitação anterior, tais como apresentação de documentos e prazo de entrega de quinze dias. (Processo nº 825.028/95-7. Decisão nº 35/1996 – 1ª Câmara)"

(Jurisprudência extraída de: Jorge Ulisses Jacoby Fernandes in Vade-Mécum de Licitações e Contratos, 2ª edição, 2ª tiragem, Belo Horizonte: Fórum, 2005, págs. 434/435)

Para finalizar, trazemos a didática lição de Joel de Menezes Niebuhr a qual reputamos como definitiva acerca da matéria:

"... o dispositivo em comento só justifica a contratação direta se a realização de nova licitação pública impuser prejuízo para a Administração. Nesse ponto residem as maiores dificuldades com relação ao inciso, dado que, evidentemente, não basta alegar qualquer sorte de prejuízo. Isso porque a realização de licitação pública sempre implica algum dispêndio e, por corolário, poder-se-ia dizer, algum prejuízo. Algum embargo, requer-se prejuízo qualificado, não o pretensamente decorrente da própria licitação. Sob essa luz, é necessário que a repetição da licitação inviabilize ou provoque gravame a algum bem jurídico visado pela Administração.

Sem embargo, se a Administração opta por repetir a licitação e se, mesmo assim, o novo certame fracassa, já não resta dúvida de que se deve proceder à dispensa, haja vista que foge da razoabilidade obrigá-la a realizar infinitas licitações diante da situação reveladora de limitações do próprio mercado. A repetição da licitação, por mais de uma vez, desnuda o prejuízo previsto no inciso em apreço.

Outrossim, o inciso V do artigo 24 da Lei nº 8.666/93 autoriza a dispensa desde que o contrato a ser celebrado seja fiel a todas as condições preestabelecidas na licitação fracassada. Como observa Carlos Ari Sundfeld: ‘Isso evita a instauração de certame sob condições contratuais inviáveis no mercado com o objetivo oculto de chegar a uma licitação fracassada, liberando o agente inescrupuloso para contratar com sua empresa preferida, já agora em condições diferentes, que outras empresas aceitariam, se lhes tivessem sido oferecidas

É comum que a licitação fracasse por causa das condições entabuladas pela Administração no edital, assaz das vezes por demais onerosas. Em vista dessas condições, ninguém se propõe a participar da licitação. Nesse contexto, a dispensa só é lícita se o contrato a ser firmado guardar as mesmas condições da licitação, o que requer a aceitação, do contratado, das aludidas condições. Já não é lícito ao agente administrativo realizar a licitação sob condições tais que acabam por gerar o fracasso, afastando interessados, e, depois, pretender travar negociações diretas com possíveis interessados, mas em outros termos. Se as condições atenuadas, por dedução lógica, é imperativo que se faça nova licitação." (Joel de Menezes Niebuhr in Licitação Pública e Contrato Administrativo, Curitiba: Zênite, 2008, págs. 83/84)

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4) A previsão contida no inciso VII do artigo 24 da Lei de Licitações e Contratos como espécie de licitação fracassada e os requisitos para se realizar uma contratação direta nos casos em que ela ocorrer

Quando num certame licitatório a Administração verifica que as propostas de todos os disputantes (por conluio ou caso fortuito) foram apresentadas com preços acima do estimado para a contratação, o inciso VII do artigo 24 da Lei Federal nº 8.666/93 autoriza a realização de uma dispensa de licitação nos seguintes moldes:

"quando as propostas apresentadas consignarem preços manifestamente superiores aos praticados no mercado nacional, ou forem incompatíveis com os fixados pelos órgãos oficiais competentes, casos em que, observado o parágrafo único do art. 48 desta Lei (vide nota 03) e, persistindo a situação, será admitida a adjudicação direta dos bens ou serviços, por valor não superior ao constante do registro de preços, ou dos serviços;"

Para Joel de Menezes Niebuhr, esta hipótese regulada pelo inciso VII do artigo 24 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos também se caracteriza como uma espécie de "licitação fracassada" (embora diferente da que é referida no inciso V da Lei 8.666) conforme podemos ver abaixo in verbis:

"Note-se que essa hipótese de dispensa também incide sobre licitações fracassadas, na mesma linha do inciso V do mesmo artigo 24. Ou seja, procede-se à licitação, que não logra os resultados esperados, em razão do que se contrata diretamente, por meio de dispensa. A diferença entre os incisos V e VII reside nisto: este se refere à situação específica de licitação fracassada, pertinente aos casos em que os preços ofertados são manifestamente superiores aos praticados no mercado; enquanto aquele abrange todas as demais hipóteses de licitação fracassada, quais sejam, repita-se: a) ninguém participa da licitação, b) todos os participantes são inabilitados, c) ou todas as propostas dos participantes habilitados são desclassificadas porque incompatíveis com o edital ou porque consignam preços inexeqüíveis. Em síntese, o inciso VII focaliza hipótese específica de licitação fracassada, cujo preço ofertado é manifestamente superior ao praticado no mercado; já o inciso V disciplina os demais casos." (Joel de Menezes Niebuhr in Dispensa e Inexigibilidade de Licitação Pública, São Paulo: Dialética, 2003, págs. 292/293)

Jorge Ulisses Jacoby Fernandes expõe didaticamente as diferenças entre as dispensas de licitação autorizadas pelos incisos V e VII do artigo 24 da Lei nº 8.666 (reforçando-se assim, pelo menos no nosso entendimento, a tese de Joel de Menezes Niebuhr):

"a) inciso V:

- a licitação foi fracassada, não importando a causa da desclassificação: preços superiores, inferiores, inabilitação, etc.;

- há risco de prejuízo na repetição da licitação;

- não é obrigatório pedir novas propostas.

b) inciso VII:

- a licitação foi fracassada pela apresentação reiterada de propostas com preços superiores;

- não é necessária a caracterização de risco para a Administração na repetição;

- é obrigatório, em princípio, pedir novas propostas."

(Jorge Ulisses Jacoby Fernandes in Contratação Direta sem Licitação, 7ª edição, 2ª tiragem, Belo Horizonte: Fórum, 2008, pág. 377)

Já sobre os pressupostos para se implementar uma dispensa de licitação com fulcro no inciso VII do artigo 24 da Lei Federal nº 8.666/93, eis a lição de Marçal Justen Filho:

"A dispensa de licitação se admite desde que a Administração localize alguém disposto a contratar por valor inferior àquele que foi obtido na licitação anterior.

(...)

O dispositivo se reporta ao art. 48, § 3º, que faculta a concessão aos licitantes de nova oportunidade para formular propostas, quando todas tiverem sido desclassificadas. No prazo de oito dias, os licitantes deverão formular novas propostas que não apresentem os defeitos das anteriores. Se, concedidas duas oportunidades, os interessados insistirem com ofertas superiores ao admissível, caracteriza-se a inutilidade da competição. (...)

A contratação sem licitação autorizada no inc. VII pressupõe a verificação de três condições. A primeira reside na apresentação de propostas inadmissíveis; a segunda reside no insucesso da providência do art. 48, § 3º (SE REPUTAR-SE CABÍVEL SUA APLICAÇÃO); a terceira, na existência de particular disposto a contratar pelo preço adequado

.

De qualquer modo, o excesso dos preços somente autorizará contratação direta se existir viabilidade de contratação que observe os limites de preços. Aplicam-se, aqui, as razões expostas a propósito do inc. V. A Administração não poderia invalidar a licitação sob fundamento de os preços serem abusivos e efetivar contratação por preços superiores aos limites indicados na Lei." (Marçal Justen Filho in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 12ª edição, São Paulo: Dialética, 2008, págs. 300/301)

Atente-se que, na lição de Marçal Justen Filho, sendo TODAS as propostas dos disputantes do certame apresentadas num patamar SUPERIOR aos preços praticados no mercado, a Administração PODE (vez que não está obrigada) aplicar o § 3º do artigo 48 da Lei 8.666. Mas, aplicando ou não o excogitado § 3º do artigo 48, a dispensa de licitação autorizada no inciso VII do Estatuto de Licitações e Contratos Públicos SÓ PODERÁ SER EFETIVADA JUNTO A UM PARTICULAR QUE ACEITE CONTRATAR POR PREÇO ADEQUADO AO MERCADO.

Joel de Menezes Niebuhr, diverge de Marçal Justen Filho apenas no que toca à aplicação do disposto no art. 48, § 3º da Lei 8.666 antes da contração direta autorizada pelo inciso VII do artigo 24 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos, para ele, tal aplicação não é uma faculdade e sim obrigatória antes da promoção da dispensa da licitação:

"Constatado que os preços propostos em licitação pública consigam valores acima dos praticados no mercado, antes de se proceder à dispensa, é obrigatório dar cumprimento ao § 3º do artigo 48 da Lei nº 8.666/93, isto é, conceder aos licitantes o prazo de 8 (oito) dias úteis – que pode ser reduzido para 3 (três) dias úteis nos casos de licitações realizadas sob a modalidade convite – para que apresentem novas propostas, evidentemente, dessa vez, com preços compatíveis com os praticados no mercado. Se, ao final dos 8 (oito) dias úteis, os licitantes não apresentarem novos preços ou se apresentarem novos preços mas ainda acima dos práticos no mercado, todos eles devem ser desclassificados, declarando-se fracassada a licitação.

Se a situação chegar a esse ponto, será dada à Administração a faculdade de dispensar a licitação. Veja-se que, mesmo diante desse quadro, a dispensa não é obrigatória, pois incerta no inciso VII do artigo 24, cujo caput apregoa que a licitação é dispensável e não dispensada. Portanto, encerrada a licitação, a autoridade competente deve decidir se procede a nova licitação ou se firma de uma vez o contrato, valendo-se da dispensa prevista no inciso VII do artigo 24." (Joel de Menezes Niebuhr in Licitação Pública e Contrato Administrativo, Curitiba: Zênite, 2008, pág. 85)

Elucidando a questão, Jorge Ulisses Jacoby Fernandes envergando posicionamento do TCU esclarece que é inevitável que se aplique o art. 48, § 3º da Lei 8.666 antes da contração direta autorizada pelo inciso VII do artigo 24 da mesma lei, sendo um "verdadeiro dever para o Administrador" adotar tal providência:

"A Lei nº 8.666/93 inovou apenas uma expressão no texto legal do Decreto-Lei nº 2.300/86, para incluir, entre vírgulas, ‘persistindo a situação’, querendo com isso erigir em condição a obrigatoriedade de a Administração, em qualquer caso, exigir a reapresentação das propostas como condição de validade para a contratação direta."

(Jorge Ulisses Jacoby Fernandes in Contratação Direta sem Licitação, 7ª edição, 2ª tiragem, Belo Horizonte: Fórum, 2008, pág. 363)

Em sucessivo, eis o posicionamento do Tribunal de Contas da União referido pelo autor:

"Acórdão 1315/2004 – Plenário

Processo 001.919/2004-9

Ministro Relator LINCOLN MAGALHÃES DA ROCHA

Ementa

Representação formulada por licitante. Possíveis irregularidades praticadas no âmbito do Banco do Brasil SA. Contratação de empresa com dispensa de licitação. Conhecimento. Procedência parcial. Determinação. Juntada dos autos às contas anuais. Remessa de cópia à Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça.

44.6 Desta forma, a única alegação aceitável pela Administração seria a apresentação de propostas de preços menores e compatíveis com o mercado nacional, atitude esta que não encontrou amparo em nenhuma das empresas concorrentes, que, ao contrário, fizeram-se representar por ofertas ainda maiores.

(...)

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão do Plenário, diante das razões expostas pelo Relator, em:

9.1. conhecer da presente Representação, com fundamento no art. 237, inciso VII, do Regimento Interno, para, no mérito, considerá-la parcialmente procedente;

9.2. determinar ao Banco do Brasil S/A, no âmbito das licitações e contratações vindouras, que exija da empresa contratada por meio de dispensa de licitação, com fulcro no art. 24, inciso VII, da Lei nº 8.666/93, a comprovação das condições de habilitação e da proposta estipuladas no edital da licitação precedentes à qual a contratação direta se vincula, salvo motivo devidamente comprovado;"

Já sobre a questão da definição do que seriam preços manifestamente superiores aos praticados no mercado nacional, trazemos à baila à lição de Marçal Justen Filho:

"Observe-se que a Lei se vale de expressão destinada a qualificar o preço superior. Exige que a melhor proposta consigne preço manifestamente superior aos do mercado. Logo, não se submete ao regime do inc. VII as situações em que a diferença é de pequena monta ou irrelevante. Anote-se que a Lei não quis estabelecer uma regra-padrão, aplicável a todos os casos. É que cada mercado e cada produto tem suas características. Em alguns setores, altamente competitivos, uma diferença de 5% é manifestamente superior. Em outros casos, a diferença de 5% pode ser reputada como irrelevante." (Marçal Justen Filho in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 12ª edição, São Paulo: Dialética, 2008, pág. 301)

Por fim, anote-se a posição de Diógenes Gasparini, a qual com a devida vênia, não aderimos, mas que, dada a sua peculiaridade, merece ser transcrita:

"... pode a entidade competente contratar sem licitação sempre que todas as propostas apresentadas forem classificadas por conterem preços excessivos e os licitantes não apresentarem outras, no prazo de oito dias úteis, escoimadas desse vício. A contratação, nesses casos, há de ser feita por preços não superiores aos consignados no registro de preços. Sem a observância desses requisitos a contratação direta será ilegal. A falta de registro de preços impede a dispensa, e a licitação deve ser repetida. Se puder ser utilizado registro de preços de entidade congênere, não há ausência de registro de preços e o problema não se coloca." (Diógenes Gasparini in Direito Administrativo, 15ª edição, atualizada por Fabrício Motta, São Paulo: Saraiva, 2010, pág. 582)   

Não entendemos como correta esta exigência proposta pelo autor de que a Administração só possa promover a contratação direta autorizada pelo inciso VII do artigo 24 da Lei 8.666 quando se valer de registro de preços próprio ou emprestado de entidade congênere, dentre outros motivos, em virtude de a mesma não estar sendo cobrada pelos órgãos de controle externo. Para exemplificar, trazemos à baila decisões do Tribunal de Contas de Pernambuco que não exigiram a necessidade de que a Administração possua registro de preços para poder promover a dispensa de licitação consignada no inciso VII do artigo 24:

"DECISÃO T.C. Nº 0389/02

PROCESSO T.C. Nº  0001335-3 - PRESTAÇÃO DE CONTAS DO CONVÊNIO Nº 027/98, CELEBRADO ENTRE A SECRETARIA ESTADUAL DE EDUCAÇÃO E ESPORTES E A PREFEITURA MUNICIPAL DA ESCADA, QUE TEVE COMO OBJETIVO A COOPERAÇÃO TÉCNICO- FINANCEIRA PARA ATENDER ÀS UNIDADES ESCOLARES DE ENSINO FUNDAMENTAL DO CITADO MUNICÍPIO, ATRAVÉS DO "PROJETO GESTÃO EDUCACIONAL COMPARTILHADA: REDE PÚBLICA ÚNICA".

RELATOR: AUDITOR ADRIANO CISNEIROS, CONSELHEIRO EM EXERCÍCIO

Decidiu a Primeira Câmara do Tribunal de Contas do Estado, à unanimidade, em sessão ordinária realizada no dia 02 de abril de 2002,

CONSIDERANDO que as falhas constantes no Relatório de Auditoria não comprometem a presente prestação de contas, porém, devem ser observadas para que não se repitam em futuros convênios,

Julgar REGULAR, COM RESSALVAS, a presente prestação de contas, quitando-se, em conseqüência, os responsáveis.

Outrossim, que a atual Administração do Município adote as seguintes recomendações:

1.Fazer a prestação de contas de convênios, fornecendo todos os elementos necessários à sua análise, fazendo integrar os documentos relacionados no artigo 116 da Lei nº  8666/93, e, em  especial, o plano de trabalho, plano de aplicação dos recursos financeiros e o conjunto de metas a serem atingidas;

2.Obedecer aos termos para a liquidação da despesa pública, e, em especial, ao disposto nos §§ 1º e 2º do artigo 63 da Lei nº 4.320/64;

3.Que, através de sua Comissão de Licitação, solicite em Edital e exija dos licitantes os comprovantes de regularidade com a Seguridade Social e o FGTS, nos termos do artigo 195 da Constituição Federal c/c as Leis Federais nº 8.036/90(artigo 27) e nº 8.212/91 (artigo 47);

4.Atentar para o fato de que a licitação é um procedimento administrativo constituído de atos jurídicos de natureza vinculada, o que exige formalidade na sua realização. Assim sendo, não demonstrada a regularidade do cometimento de atos intermediários, todo o procedimento licitatório torna-se viciado, ficando irregular o seu resultado;

5.Que a Comissão Permanente de Licitação, ao proceder um certame público para transporte de estudantes, atente para as especificidades do Código Brasileiro de Trânsito, no tocante ao veículo a ser utilizado e, também, a pessoa do condutor, visto que assim dispõe o referido diploma legal:

"Artigo 138 - O condutor de veículo destinado à condução de escolares deve satisfazer aos seguintes requisitos:

I.  Ter idade superior a vinte e um anos;

II. Ser habilitado na categoria D;

III.(vetado)

IV. Não ter cometido nenhuma infração  grave  ou  gravíssima,  ou  ser  reincidente em infrações médias durante os doze últimos meses;

V. Ser  aprovado  em  curso  especializado, nos termos da regulamentação do CONTRAN."

6.A Comissão de Licitação deve realizar constante pesquisa de mercado evitando, assim, a compra de insumos e/ou a realização de serviços com preços manifestamente superiores aos do mercado;

7.Que a Procuradoria Geral do município envide esforços e vigilância no sentido de que os contratos mantidos entre a municipalidade e os prestadores de serviço de transporte de estudantes obedeçam às determinações da Lei nº 8666/93 e do Código Brasileiro de Trânsito.

DECISÃO T.C. Nº  1523/01

PROCESSO TC Nº 0000420-0 - PRESTAÇÃO DE CONTAS DO CONVÊNIO Nº 027/98, CELEBRADO ENTRE A SECRETARIA DE EDUCAÇÃO E ESPORTES DO ESTADO DE PERNAMBUCO E A PREFEITURA MUNICIPAL DA ESCADA, QUE TEVE COMO OBJETIVO A COOPERAÇÃO TÉCNICO-FINANCEIRA, PARA ATENDER ÀS UNIDADES ESCOLARES DE ENSINO FUNDAMENTAL DO CITADO MUNICÍPIO, ATRAVÉS DO "PROJETO GESTÃO EDUCACIONAL COMPARTILHADA: REDE PÚBLICA ÚNICA".

RELATOR: CONSELHEIRO ROLDÃO JOAQUIM.

Decidiu a Primeira Câmara do Tribunal de Contas do Estado, à unanimidade, em sessão ordinária realizada no dia 25 de outubro de 2001,

CONSIDERANDO o disposto no artigo 71, inciso II, da Constituição Federal;

CONSIDERANDO a existência de diversas falhas de ordem formal,

Julgar REGULAR, COM RESSALVAS, a presente prestação de contas, quitando-se, em conseqüência, os responsáveis.

Outrosssim, que a Administração do Município  observe as seguintes recomendações:

•  ao fazer a prestação de contas de convênio, fornecer todos os elementos necessários à sua análise, fazendo integrar os documentos relacionados no artigo 166 da Lei nº 8.666/93, e, em especial, o plano de trabalho, plano de aplicação  dos recursos financeiros e o conjunto de metas a serem atingidas;

•  evidar meios a fim de manter integrado e em pleno funcionamento um sistema de controle interno,  nos termos em que dispõe o artigo 74 de nossa Carta Magna, com o fim de resguardar a boa e regular aplicação dos recursos da execução do objeto do convênio, realizando, inclusive, fiscalização local periódica;  

•  obedecer  aos  termos para liquidação da despesa pública e, em especial, ao disposto nos §§ 1º e 2º do artigo 63 da Lei nº 4.320/64;  

•  que a Prefeitura Municipal da Escada, através de suas comissões de licitação, descreva o objeto da licitação com clareza e precisão, a fim de que haja elementos suficientes para a perfeita definição das aquisições ou dos serviços pretendidos pela Administração, criando, assim, condições iguais de participação dos interessados na competição;

•  atentar para o fato de que a licitação é um procedimento administrativo constituído de atos jurídicos de natureza vinculada, o que exige formalidade na sua realização. Assim sendo, não demonstrada a regularidade do cometimento de atos intermediários, todo o procedimento licitatório fica viciado, tornando irregular o seu resultado;  

•  que a Comissão de Licitação realize constante pesquisa de mercado, a fim de que não permita a compra de insumos e/ou realização de serviços com preços manifestamente superiores aos de mercado"


5) Conclusão

À luz do que foi exposto, em especial em razão da não-uniformidade do entendimento mantido pelos Tribunais de Contas do Brasil, resta patente que o Administrador Público deve cercar-se de cautelas quando da realização da contratação direta após a ocorrência de uma licitação deserta ou de uma licitação fracassada, devendo estar ciente qual é o posicionamento do Tribunal de Contas ao qual ele está submetido e tomando algumas medidas simples que, no nosso entendimento, servem para fundamentar suas decisões: 1º) Sempre formalizar por escrito e em autos apartados os processos de dispensa de licitação; 2º) Comprovar documentalmente por meio de parecer(es) técnico(s) a serem acostados no processo de dispensa de licitação que haverá prejuízo ou o mesmo será demasiadamente aumentado pela demora decorrente da realização de uma nova licitação e 3º) Comprovar documentalmente por meio de parecer(es) técnico(s) (se possível com cálculos planilhas orçamentárias) a serem acostados no processo de dispensa de licitação que a contratação direta evitará prejuízo ao Erário.

Por fim, é indispensável que o Administrador, ao promover a contratação direta, MANTENHA TODAS as condições ofertadas na licitação que restou deserta ou fracassada.


Notas

(Nota 01) Guia Valor Econômico de Licitações, por Cristine Prestes e Henrique Gomes Batista, São Paulo: Globo, 2004, págs. 13, 18, 20 e 21.

(Nota 02) Fazem referência à expressão licitação frustrada como sinônimo de licitação deserta, dentre outros: Lucas Rocha Furtado in Curso de Licitações e Contratos Administrativos, Belo Horizonte: Fórum, 2007, pág. 79 e Ronny Charles Lopes de Torres in Leis de Licitações Públicas Comentadas, 2ª edição, Salvador: Juspodivm, 2009, pág. 111, curiosa, contudo, é o uso da expressão por Flávio Amaral Garcia in Licitações e Contratos Administrativos, 2ª edição, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, pág. 39, vez que ali o autor menciona licitação frustrada como hipótese apartada de dispensa de licitação, fulcrada no inciso VII do artigo 24 da Lei Federal nº 8.666/93.

(Nota 03) O inciso reporta-se ao parágrafo único do art. 48 que, nos termos da Lei Federal nº 9.648/98, teve sua numeração alterada, passando a ser o § 3º do artigo 48 da Lei Federal nº 8.666/93. Eis a redação do citado dispositivo: § 3º Quando todos os licitantes forem inabilitados ou todas as propostas forem desclassificadas, a administração poderá fixar aos licitantes o prazo de oito dias úteis para a apresentação de nova documentação ou de outras propostas escoimadas das causas referidas neste artigo, facultada, no caso de convite, a redução deste prazo para três dias úteis.

Sobre o autor
Aldem Johnston Barbosa Araújo

Advogado em Mello Pimentel Advocacia. Membro da Comissão de Direito à Infraestrutura da OAB/PE; Autor do livro "Processo Administrativo e o Novo CPC - Impactos da Aplicação Supletiva e Subsidiária" publicado pela Editora Juruá; Articulista em sites, revistas jurídicas e periódicos nacionais; Especialista em Direito Público.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAÚJO, Aldem Johnston Barbosa. Contratações motivadas por licitações desertas e fracassadas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2784, 14 fev. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18497. Acesso em: 23 dez. 2024.

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