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A concessão do repouso semanal remunerado no regime de revezamento de folgas

Agenda 20/03/2011 às 10:17

Alguns entendem que o descanso compreendido em qualquer dia da semana (segunda-feira a domingo) atende ao comando legal, outros ressalvam que entre dois repousos não pode ocorrer sete dias corridos de trabalho.

A problemática

O repouso semanal é um direito dos trabalhadores, previsto na Constituição Federal e legislação infraconstitucional. Enquanto a Constituição indica a preferência dos domingos para sua concessão, a CLT - Consolidação das Leis do Trabalho fixa, em seu art. 67, o domingo como dia do repouso, salvo as exceções de conveniência pública ou necessidade imperiosa de serviços. Nessas atividades, é obrigatória a elaboração de uma escala de revezamento de folga, mensalmente organizada.

A problemática surge nas hipóteses de revezamento de folga, quanto ao interregno no qual deve estar contemplado o repouso. Alguns entendem que o descanso compreendido em qualquer dia da semana (segunda-feira a domingo) atende ao comando legal, outros ressalvam que entre dois repousos não pode ocorrer sete dias corridos de trabalho, o que é possível no primeiro entendimento. Consensual é que a um RSR sempre correspondem seis dias efetivamente trabalhados, totalizando os sete que compõem a semana, senão não seria semanal.

Imagine-se, à guisa de exemplo, um empregador que na primeira semana programa a folga do empregado no domingo, na semana subseqüente na quinta feira, na terceira no sábado e na quarta semana na quarta-feira, conforme abaixo ilustrado. Teria ele concedido regularmente o RSR?

1ª SEMANA

01

02

03

04

05

06

07

             

RSR

2ª SEMANA

08

09

10

11

12

13

14

       

RSR

     

3ª SEMANA

15

16

17

18

19

20

21

           

RSR

 

4ª SEMANA

22

23

24

25

26

27

28

     

RSR

       

Para aqueles que defendem a impossibilidade de intervalo maior de seis dias, não. Ocorre que entre o repouso da segunda e terceira semana terá havido um intervalo de oito dias, enquanto o máximo seria de seis dias. Já o entendimento contrário advoga a regularidade na concessão, eis que o empregado repousou em todas as semanas.

Filiamo-nos à corrente que defende a regularidade da situação exposta. Entendemos que tanto a Constituição Federal como a legislação infraconstitucional fixou uma periodicidade semanal para concessão do repouso, restando como prazo máximo o último dia da semana, senão terá ocorrido fora desta. Assim a concessão antes do sétimo dia não descaracteriza sua referência semanal.

É também a posição dominante na doutrina e jurisprudência, conforme veremos adiante.


A legislação

A CLT fixa o domingo como dia de repouso semanal, conforme já visto. Decorrência lógica é que se inicia um novo período de sete dias (semana) na segunda-feira subseqüente, concedendo-se o descanso no sétimo dia (domingo), assim sucessivamente. Resta constatado que a semana referência para concessão do RSR é o conjunto de sete dias consecutivos da segunda-feira ao domingo. É a semana consagrada em nossos costumes e tradições. No futebol temos as rodadas de finais de semanas (sábado e domingo), no judiciário os plantões de fim de semana (não por acaso, sábado e domingo), a programação cultural de fim de semana, entre uma miríade de possíveis exemplos. Assim, em sentido contrário, sendo o domingo o último dia do final de semana, a segunda-feira é o primeiro. Não se olvide que os costumes e tradições são fontes de nosso direito.

Entendimento diverso quanto ao primeiro dia da semana, não consiste divergência substancial. Fundamental é o conceito de módulos semanais, seja com início nas segundas-feiras ou domingos.

Continuando, podemos afirmar que a semana constitui ao mesmo tempo período aquisitivo e concessivo do repouso semanal. A regra é o descanso no sétimo dia, o domingo que, por exceção, quando autorizado o trabalho nesse dia, deverá ser compensado com folga em outro dentro da semana.

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Assim, não há duvida quanto a natureza compensatória do repouso concedido fora do domingo [01]. Daí a consagrada denominação folga compensatória. Entendimento que desconsidera como referência o módulo semanal segunda-feira a domingo, despreza as característica compensatória e semanal, pois inicia nova contagem de sete dias a cada folga concedida, independente desta estar compreendida no meio ou final de semana.

Para maior clareza, retomemos a escala hipotética mencionada. A que períodos corresponderiam os RSR concedidos nos dias 11 e 20?

Segundo uma corrente, da qual divergimos, o repouso do dia 11 corresponderia ao período de 08 a 11, iniciando-se uma nova contagem, na qual o prazo limite para novo repouso seria o dia dezoito. Não há, portanto, vinculação a qualquer semana (módulo de sete dias), mesmo porque é obvio que a seqüência de quatro dias (08 a 11) não constitui uma semana. Registre-se que, havendo revezamento de folga, invariavelmente os intervalos entre estas serão diferentes de seis dias.

A leitura que tais intérpretes fazem da CF e legislação infraconstitucional é que todo empregado tem direito a um descanso de vinte e quatro horas, imediatamente após quaisquer seis dias contínuos de trabalho.

Diferentemente, a leitura que fazemos é de que todo empregado tem direito a um descanso de vinte e quatro horas dentro de cada módulo semanal. Assim, os repousos mencionados corresponderiam às semanas de 08 a 14 e 15 a 21, respectivamente.

A lei 11.603, de 05.12.2007, por sua vez, dispõe que no comércio em geral o repouso semanal remunerado deve coincidir, pelo menos uma vez no período máximo de três semanas, com o domingo. Decorrência lógica é que, adotada a tese do repouso obrigatório após quaisquer seis dias corridos, necessariamente o empregador estará incorrendo em irregularidade quando da concessão do repouso no domingo, haja vista que na semana anterior este terá ocorrido o mais tardar no sábado, transgredindo-se assim o limite de seis dias. No caso, a compatibilização da lei à tese, implicaria necessariamente na concessão de repouso semanal(?) adicional na segunda semana, ônus que a legislação não impôs ao empregador.

Esclarecedoras são as redações das convenções 14 e 106 da OIT - Organização Internacional do Trabalho [02].

Transcrevemos o disposto no artigo 2º. da Convenção 14:

ARTIGO 2º

1. Todo o pessoal ocupado em qualquer estabelecimento industrial, público ou privado, ou nas suas dependências, deverá, ressalvadas as exceções previstas nos artigos presentes, ser beneficiado, no correr de cada período de sete dias, com um repouso, ao menos de 24 horas consecutivas. (grifo nosso)

...

Já a Convenção 106, dispõe, em seus artigos VI e VII:

Artigo VI

1. Todas as pessoas às quais se aplica a presente convenção terão direito, sob ressalva das derrogações previstas nos artigos seguintes, a um período de repouso semanal, compreendendo um mínimo de vinte e quatro horas consecutivas, no decorrer de cada período de sete dias. (grifo nosso).

...

Muito embora as Convenções mencionadas sejam dirigidas a uma parcela dos trabalhadores, é pertinente a menção, dada a perfeita compatibilidade com nosso sistema de repouso, bem como a clareza da redação.

Notem-se na convenção 14 e 106 os termos no correr e no decorrer, que significam nada mais que durante. Quisesse dar outro sentido usaria os termos ao término ou no fim, como se queira. Utiliza também a expressão de cada período de sete dias e não do período de sete dias, indicando claramente a noção de módulos semanais.Reitere-se que a convenção neste aspecto não inovou em nosso ordenamento jurídico, sendo perfeitamente compatível com as normas e costumes vigentes.

Importante contribuição para a elucidação da polêmica constituía o Precedente Administrativo nº 46 do Ministério do Trabalho e Emprego - Departamento de Fiscalização do Trabalho [03]. Os Precedentes Administrativos orientam a ação dos Auditores Fiscais do Trabalho no exercício de suas atribuições.

PRECEDENTE ADMINISTRATIVO Nº 46

JORNADA. DESCANSO SEMANAL REMUNERADO. PERIODICIDADE. O descanso semanal remunerado deve ser concedido ao trabalhador uma vez em cada semana, entendida esta como o período compreendido entre segunda-feira e domingo. Inexiste obrigação legal de concessão de descanso no dia imediatamente após o sexto dia de trabalho, sistema conhecido como de descanso hebdomadário. REFERÊNCIA NORMATIVA: Art. 11 do Decreto nº 27.048, de 12 de agosto de 1949. (grifo nosso).

Muito embora consoante com a jurisprudência e doutrina dominantes, o Precedente foi cancelado em 03/08/2009 [04].

Jurisprudência e doutrina

Mauricio Godinho Delgado leciona que deve ser observado para concessão do RSR o módulo semanal, dentro do qual o domingo poderia ser compensado [05].

[...] Ocorrência Semanal do Descanso – Prevê a ordem jurídica uma periodicidade máxima semanal para o descanso. Nessa linha, o tipo legal do d.s.r. supõe que, a cada módulo semanal de labor cumprido. . . terá direito o trabalhador a uma porção igual de 24 horas consecutivas de descanso. ... A jurisprudência, assim, tem admitido a folga compensatória no caso do d.s.r. apenas no tocante à incidência de folga aos domingos (folga que poderia ser compensada por outro dia livre ao longo da semana) – mas não no sentido de acatar-se descansos por periodicidades superiores à semana laborada (por exemplo, dois descansos após doze dias de labor; neste caso, um dos d.s.rs. não foi respeitado). (grifo nosso)

Não se confunda, nos ensinamentos de Mauricio Godinho Delgado, a hipótese de eventual fixação do descanso na segunda-feira em um módulo semanal e posteriormente domingo no módulo seguinte, com a fixação de módulo superior a uma semana para concessão do d.s.r.. Esta última poderia acarretar situações onde o descanso semanal não é observado, como por exemplo, quando concedido na segunda e terça-feira da primeira semana, suprimido na subseqüente e, novamente concedido de forma dobrada na segunda e terça-feira da terceira semana. Neste caso o d.s.r. da segunda semana não teria sido observado. Entendimento diverso tiraria a lógica de toda a exposição do ministro Godinho, o que não lhe faria justiça.

Arnaldo Sussekind leciona que o descanso deve ocorrer no máximo no sétimo dia de uma semana [06]

[...] Mas, nessa escala, o repouso semanal deverá ser garantido após o período máximo de seis dias, não podendo ser concedido, em determinada semana, depois de sete dias de trabalho.(grifo nosso).

Sérgio Pinto Martins menciona como equivocada a idéia de que o repouso semanal deva ocorrer no máximo a cada seis dias [07]:

[...] Como já vimos, o repouso semanal deve ser remunerado. Nesse período, o trabalhador não presta serviços ao empregador. Isso ocorre de preferência aos domingos e, também, nos feriados, sendo incorreto dizer que seria um intervalo a cada seis dias de trabalho, justamente, porque o descanso pode não recair no domingo, porém em outro dia da semana (folga compensatória). (grifo nosso)

No mesmo sentido apresentamos excertos de decisões do TST, cujos trechos que reputamos relevante grifamos.

III - REPOUSO SEMANAL REMUNERADO. SUPRESSÃO POR NORMA COLETIVA.

RAZÕES DE NÃO-CONHECIMENTO.

A par do prestígio reconhecido às convenções e acordos coletivos, a iterativa e notória jurisprudência deste Tribunal Superior do Trabalho, aliás, consagra o entendimento de que o repouso semanal de vinte e quatro horas consecutivas, previsto no referido artigo, é direito de todo trabalhador, a ser gozado dentro da semana, assim considerada de sete dias.(TST-RR- 56600-43.2008.5.03.0037, Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, 6ª Turma, DJ 12/03/2010)

FOLGAS EM RODÍZIO . O artigo 7º, inciso XV da Carta da República, dispõe ser direito do trabalhador o repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos. Referido instituto tem previsão ainda na CLT, nos artigos 67 e seguintes e na Lei nº 605/49. De modo que, ainda que se tratasse de sistema de rodízio (fato não demonstrado nos autos, segundo o acórdão recorrido) seria de se exigir o gozo da folga dentro da semana, assim compreendido o período de sete dias. Portanto a concessão do descanso à cada oito dias, importa no seu pagamento, em dobro, como restou deferido. Recurso conhecido por divergência jurisprudencial e improvido. (TST-RR-703.235/2000.5, Rel. Min. Renato de Lacerda Paiva, 2ª Turma, DJ 21/05/2004)

DA DOBRA DAS FOLGAS OCORRIDAS APÓS O SÉTIMO DIA. A lei obriga que durante a semana civil (dentro de 7 dias que compreendem uma semana), preferencialmente no domingo, seja concedido o repouso semanal remunerado. Procedimento em contrário afronta o artigo 1 o da Lei nº 605/49, bem como o inciso XI do artigo 7º da Constituição Federal em vigor. As normas de repouso são de ordem pública e não permitem tergiversações, não havendo, portanto, ofensa ao dispositivo legal apontado. Agravo a que se nega provimento (TST-AIRR-3.059/2000-024-15-00.6, Rel. Min. Rider de Brito, 5ª Turma, DJ 06/02/2004).

O que o judiciário tem combatido, e com razão, é a supressão do repouso em qualquer dos módulos semanais, mediante fixação de período aquisitivo do repouso superior a sete dias. Não por acaso, nos deparamos sempre com a expressão dentro da semana ou durante a semana.


Das razões de ordem fisiológica

Embora reconheçamos no repouso semanal também o fundamento fisiológico, além do social e econômico, é razoável supor que tal aspecto foi considerado na elaboração da legislação, não podendo posições destituídas de suporte científico, amparar-se na tese de suposto desgaste do trabalhador, para dar sentido diferente ao comando legal. Nessa linha, ressalte-se que a norma tem caráter geral e, tantas outras regras inerentes a situações peculiares que acarretam desgaste ao trabalhador visam dar proteção específica [08], com intervalos especiais e jornadas reduzidas, possibilitando a equiparação em normas protetoras de alcance geral, como repouso semanal e férias. Não se olvide quanto à possibilidade de estabelecimento de condições especiais de concessão do repouso, mediante negociação coletiva ou mesmo por disposições das Normas Regulamentadoras expedidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego.

Para argumentação, tomemos como referência as normas que regulam as férias anuais remuneradas, instituto por natureza de ordem de saúde e segurança, sem desprezo aos aspectos de ordem social e econômica. Muito embora tenha se estabelecido um módulo de doze meses como referencial aquisitivo, a legislação estende o gozo para até doze meses após o período vencido. Ainda que se possa questionar quanto ao aspecto fisiológico, se o prolongado período concessivo é o ideal, fato é que o legislador assim o entendeu, cabendo a eventuais considerações científicas, ou de outra natureza, propor o debate e alteração legislativa.

Ainda que se possa invocar a favor da tese do repouso no máximo após quaisquer seis dias trabalhados, a interpretação mais favorável ao trabalhador, não nos parece ser o caso. Citemos o exemplo de algumas atividades [09] que, com ênfase no aspecto social do descanso semanal, promovem a alternância dos descansos entre os sábados e domingos, o que nos parece plenamente consoante com a aspiração legislativa [10] e favorável aos trabalhadores destes setores. Tal prática restaria impossibilitada, haja vista que entre o sábado de uma semana e o domingo da semana posterior, ocorre um intervalo de sete dias sem descanso.


Conclusão

A legislação, doutrina e jurisprudência dominante são no sentido de que o repouso semanal deve ser concedido a cada semana no domingo, iniciando-se na segunda feira subseqüente um novo módulo semanal, obviamente de sete dias. Nas atividades com autorização para o trabalho aos domingos, este deve ser compensado mediante folga em outro dia dentro da semana, ocorrendo então entre dois descansos, intervalos irregulares, maiores ou menores que seis dias.

Em situações peculiares, instrumentos coletivos podem fixar condições especiais, sempre observando a concessão do repouso dentro dos sete dias de cada módulo semanal, cuja supressão é vedada por normas imperativas indisponíveis.


Notas

  1. A súmula 146 do TST, por exemplo, dispõe sobre trabalho em domingo não compensado.
  2. A Convenção n. 14, de 1921, aplicável às empresas, públicas ou privadas, da indústria da construção e do transporte, e a Convenção n. 106, de 1957, relativa aos estabelecimentos comerciais, instituições e serviços administrativos, públicos ou privados.
  3. O citado departamento aprovou o Precedente Administrativo nº. 46, por meio do Ato Declaratório nº. 4, de 21 de fevereiro de 2002.
  4. Ato Declaratório n.º 10, de 03 de agosto de 2009
  5. Delgado, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho.São Paulo:LTr.2006. p. 940.
  6. Sussekind, Arnaldo. Instituições de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2005. P. 837
  7. Martins, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. São Paulo:Atlas,2005. P. 552
  8. Turnos ininterruptos de revezamento, telefonistas, Telemarketing, trabalhos em mecanografia, serviços de mecanografia, para citar alguns.
  9. A prática é comum nas empresas de telemarketing, muitos setores do comércio, entre outros.
  10. A legislação aspira sempre a coincidência do descanso com o domingo. Na Constituição Federal, preferencialmente aos domingos; na CLT aos domingos, salvo exceções; na lei 11603/2007, coincidir pelo menos 1 vez no período máximo de 3 semanas, com o domingo; na Portaria 417/1966, em um período máximo de sete semanas, coincidência com o domingo.
Sobre o autor
Osvaldo Dias Correa Filho

Auditor Fiscal do Trabalho, Bacharel em Direito e em Administração de Empresas.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CORREA FILHO, Osvaldo Dias. A concessão do repouso semanal remunerado no regime de revezamento de folgas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2818, 20 mar. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18715. Acesso em: 22 dez. 2024.

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