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Os tratados internacionais na vigência do Estado Novo

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Agenda 07/05/2011 às 17:55

Nessa época nebulosa, predominou no relacionamento do país com os demais Estados nacionais o nacionalismo estatal ante à atividade econômica, assim como a aversão brasileira ao fascismo externo.

RESUMO: O Estado Novo brasileiro, período histórico também conhecido como Terceira República, corresponde ao período no qual se manifestaram aspectos negativos para o país, por coincidir com o desencadeamento da Segunda Guerra Mundial, a censura, a tortura, a instituição da pena de morte e a personalidade do chefe maior da nação na pessoa de Getúlio Vargas que embora sereno, se revela como um verdadeiro ditador. Mais do que outros momentos da nossa história contemporânea, o Estado Novo aparece como uma época nebulosa, onde a ação nefanda de seus dirigentes o torna um dos mais obscuros da história do Brasil. No entanto, aspectos positivos aparecem e por este trabalho pretende-se apresentar, sem solução de continuidade, o relacionamento do país, nesse período, com os demais Estados nacionais, mediante a inclusão das normas de ordem econômica, política e jurídica oriundas dos Tratados e acordos internacionais, para, consectariamente, concluir-se pelo predomínio do nacionalismo estatal ante à atividade econômica, assim como a aversão brasileira ao fascismo externo.

Palavras-chaves: Estado Novo, integração econômica, Estado nacional.


1. Introdução

Após o término da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), começaram a se fortalecer na Europa as tendências políticas contrárias aos ideais burgueses nascidos no século XVIII representados pelo liberalismo e a democracia. A ideologia burguesa passou a ser criticada tanto pela direita (fascismo e nazismo) como pela esquerda (marxismo). A primeira crítica não era revolucionária e buscava através de um regime ultranacionalista, belicoso e ditatorial, uma saída para a crise do capitalismo de 1929, sem, contudo, o destruir. A segunda, revolucionária, preconizava a superação do capitalismo, com a tomada do poder pela classe operária e a transformação da sociedade, almejando o fim da propriedade privada dos meios de produção e da exploração do trabalho assalariado.

Apesar da inegável afinidade entre o regime instituído pelo golpe de 1937, e o regime dos Estados fascistas europeus, certas características peculiares destes não apareceram na formação do Estado Novo brasileiro. O golpe de 1937, não representou a vitória de um partido organizado (a participação dos integralistas era adjetiva), nem teve apoio ativo das massas. Careceu, por outro lado, de força e coerência ideológica. A instauração do Estado Novo foi um golpe de elites político-militares contra elites político-econômicas.

Nesse sentido, o governo brasileiro editou um decreto em 2 de dezembro de 1937, por meio do qual se dissolveu todos os partidos políticos, à consideração de que essas agremiações eram artificiosas combinações de caráter jurídico e formal e tinham objetivos meramente eleitorais.

Desse modo, a repugnância dirigia-se claramente aos partidos políticos tradicionais herdados da República Velha [01] - expressões dos interesses locais e incapazes, portanto, de promover a unidade nacional. Por isso, nesse decreto, se afirmou que os partidos não correspondiam aos reais sentimentos do povo brasileiro [02], pois não possuem conteúdo programático nacional [03].

No entanto, essa reclamação não se dirigia a Ação Integralista Brasileira e à Aliança Nacional Libertadora [04], pois ambas haviam superado os partidos até então existentes por trazerem "conteúdo programático nacional". Entretanto, contra a AIB e a ANL, as reclamações seriam outras: elas espelhavam ideologias e doutrinas contrárias aos postulados do novo regime. Assim, todos os partidos eram inadequados. A instauração do Estado Novo foi, então, a solução ideal, pois fora fundado em nome da nação para atender às suas aspirações e necessidades, devendo estar em contato direto com o povo. De sorte que, o pano de fundo da ideologia do Estado Novo foi o mito da nação e do povo, Na realidade, esse foi o momento em que, através da ditadura, se procurou suprimir os localismos e viabilizar um projeto realmente nacional.

A identificação entre nação e povo, e ambos com o ditador, sem a distância interposta dos partidos, o Estado Novo tinha a ilusão de que finalmente o povo governaria a si próprio e a nação se reencontraria. O ditador era então a encarnação viva do povo e da nação.

Com esse propósito, a Carta Outorgada em 1937 caracterizou-se pelo predomínio do poder Executivo, considerado o órgão supremo do Estado [05], usurpando até mesmo as prerrogativas do Poder Legislativo. Por meio dessa Carta Constitucional, o presidente da República foi definido como a autoridade suprema do Estado, que coordena a atividade dos órgãos representativos, de grau superior, dirige a política interna e a externa, promove ou orienta a política legislativa nacional, e superintende a administração do País [06].

Conforme o texto constitucional o Presidente da República passou a ter completo controle sobre os estados, podendo a qualquer tempo nomear interventores. Como não bastasse, Instituiu-se o estado de emergência, que permitia ao presidente suspender as imunidades parlamentares, prender, exilar e invadir domicílios; para completar, instaurou-se novamente a pena de morte e legalizou-se a censura para os meios de comunicação -- jornais, rádio e cinema. O mandato presidencial foi dilatado para seis anos.

O poder Legislativo seria composto pelo presidente da República, pelo Conselho Nacional (que substituiu o Senado) e pelo Parlamento Nacional (Câmara dos Deputados).

O Parlamento Nacional, com três a dez representantes por estado, seria eleito por voto indireto (vereadores das Câmaras Municipais e dez eleitores por voto direto).

O Conselho Nacional seria composto por um representante de cada estado, eleito pelas Assembleias Estaduais, e por dez membros nomeados pelo presidente, com mandatos de seis anos.

Sob inspiração do Estado corporativo do regime fascista italiano, a nova Constituição criou o Conselho da Economia Nacional, composto pelos representantes da produção - indicados por associações profissionais e sindicatos reconhecidos por lei -, com representação partidária de empregados e sob a presidência de um ministro de Estado. O Conselho da Economia Nacional tinha a função de assessoria técnica, visando obter a colaboração das classes, a racionalização da economia e a promoção do desenvolvimento técnico. Tudo isso significava também que o Estado iria intervir e dirigir a economia nacional.

A Carta Outorgada de 1937 deveria ter sido submetida a um plebiscito, como previa o seu texto, mas o ditador se fez por esquecer esse compromisso.

Outrossim, criou-se o Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP), em 1938 com a finalidade de dar ao Estado um aparato burocrático racionalizador da administração pública. Em suma, tratava-se de modernizar a burocracia.

Segundo Hélio de Alcântara Avellar [07], esse órgão tinha a função de pôr fim ao caráter político do recrutamento do funcionalismo, partindo do imperativo técnico da neutralidade do serviço e do servidor público, além de generalizar o sistema de mérito, isto é, o recrutamento dos servidores passou a ser feito mediante a avaliação da capacidade, através de concursos e provas de habilitação.

Como visto, todos os ramos da atividade estatal, seja no campo político, administrativo, social, econômico e jurídico, se submetiam ao controle do governo. Daí porque dizer-se que o Estado Novo assumiu o caráter de estado totalitário [08].

Essa situação já se retratava com a edição da Constituição de 1934, decorrente da chegada de Getúlio Vargas ao poder, foi marcada pela falsa harmonia entre o liberalismo e o intervencionismo, trazendo dispositivos consagrados pelo Direito Internacional Público após a Primeira Guerra Mundial.

Na época o Brasil qualificou os atos de guerra definidos como crime, obrigando os dirigentes da política internacional a examinar todas as consequências de um eventual decreto de combate. Impediu-se a guerra de conquista e a declaração de guerra antes da aplicação da arbitragem. Assim sendo, pode-se falar em ausência de inovação substancial em relação aos diplomas constitucionais anteriores.

A dissolução do Congresso Nacional com a construção do Estado Novo balizou a Constituição de 1937, a qual situou o país no mundo precedente à Segunda Grande Guerra, influenciado pelos regimes totalitários. É de fácil compreensão, destarte, o abandono do ‘recurso prévio do arbitramento’ para a solução dos conflitos internacionais e da ‘proibição da guerra de conquista’. Entra em vigor algo absolutamente contrário ao que dispunha a Carta de 1934, sendo possível especular-se sobre a ampliação forçada do território nacional, de forma implícita, já que as guerras de conquista eram repelidas pelo Direito Internacional Público.


2. A formação do Estado Novo - aspectos históricos.

Desde a Constituinte de 1933 e a promulgação da Constituição de 1934, o tenentismo [09] estava em declínio. Esse movimento, um dos mais radicais e reformistas da República Velha, foi também a mais séria tentativa de superar o domínio das oligarquias estaduais. Todavia, ideologicamente, o tenentismo era desprovido de coerência; da mesma forma, não tinha nenhum programa político suficientemente claro, que mobilizasse setores significativos da sociedade para a reorganização do país.

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Em 1934, o tenentismo já tinha deixado de existir como movimento organizado. Em seu lugar, novas organizações políticas começaram a surgirem influenciadas pelos acontecimentos na Europa que, em seguida, culminaram com a eclosão da Segunda Guerra Mundial.

Esses acontecimentos enraizados na Europa decorreram de duas tendências políticas (ultra-reacionária e revolucionária) que estavam em luta acirrada durante o período entreguerras e refletiram-se no Brasil com a formação da Ação Integralista Brasileira (tendência fascista) e da Aliança Nacional Libertadora (tendência esquerdista). Ambos os partidos eram bem diferentes daqueles até então existentes, pois tinham um programa político bem delineado e haviam superado os antagonismos regionais, substituindo-os pelos antagonismos de classes. Portanto, já não eram agrupamentos políticos de defesa de um estado ou outro, de uma região ou outra. Ao contrário, defendiam claramente os pontos de vista de uma classe, independentemente da área geográfica.

No bojo dos acontecimentos europeus surgiu o integralismo - movimento tributário do fascismo italiano que, doutrinariamente, preconizava a formação de um governo ditatorial ultranacionalista, com base na hegemonia de um único partido, a Ação Integralista Brasileira (AIB), obediente a um único chefe.

Os fundamentos doutrinários da AIB encontravam-se no Manifesto à Nação Brasileira (1932), de autoria de Plínio Salgado, ex-integrante do Partido Republicano Popular. Nele, o autor fazia a defesa da "Pátria, Deus, Família", isto é, do "chauvinismo", da "civilização cristã" e do "patriarcalismo".

A Aliança Integralista Brasileira encontrava apoio na oligarquia tradicional, na alta hierarquia militar, no alto clero, em suma, nos setores mais conservadores da sociedade dominante época.

Tal como o seu modelo europeu, a AIB utilizava-se do ódio aos comunistas para elevar a tensão emocional de seus partidários. O "perigo vermelho [10]" era visto por toda a parte, o que mantinha a permanente vigilância e o fervor partidário.

Entre 1932 e 1935, quando os efeitos da crise de 1929 (grande depressão) se faziam sentir com intensidade e as agitações esquerdistas começavam a tomar corpo, os integralistas formaram, como na Itália, grupos paramilitares que agiam com violência para dissolver as manifestações esquerdistas.

A Aliança Nacional Libertadora, frente antifascista – fortaleceu-se com a ascensão do totalitarismo de direita, quase por toda parte, o que motivou a formação de frentes antifascistas, com predomínio dos partidos comunistas em todos os países. Aliás, a Terceira Internacional (Komintern) - reunião dos partidos comunistas de todo o mundo - preconizava essa tática na luta antifascista, isto é, aglutinava todos aqueles que, por uma razão ou outra eram contrários ao fascismo. Surge, então, o Partido Comunista do Brasil, fundado no início dos anos 20, que adotou essa mesma linha.

A formação da frente anti-integralista resultou na Aliança Nacional Libertadora. Luís Carlos Prestes [11], que rompera com o tenentismo para converter-se ao marxismo, foi eleito presidente de honra da ANL, passando, assim, rapidamente à cúpula dirigente do Partido Comunista do Brasil.

A Aliança Nacional Libertadora cresceu vertiginosamente, despertando, em conseqüência, o receio das camadas dirigentes. O próprio presidente Getúlio Vargas, a fim de fortalecer o seu poder, serviu-se da ANL. Depois, através de intervenção policial, invadiu suas sedes e mandou prender seus líderes. Enfim, impediu a atuação da ANL na legalidade, forçando-a a passar para a clandestinidade.

Por causa da repressão da polícia, o PCB, movido pela ala radical, acabou optando pelo método insurrecional, dando origem à intentona comunista.

A rebelião eclodiu prematuramente (23/11/1935) ocasião em que o batalhão militar em levante se uniu aos populares, organizando o Comitê Popular Revolucionário. A repressão foi imediata, com o apoio da Polícia Militar e de fortes contingentes armados enviados pelos fazendeiros. Dois dias depois a insurreição foi esmagada.

Em 1932 explodiu a chamada "revolução constitucionalista" de 9 de julho em São Paulo. Aquela "revolução" não passou de uma revolta patrocinada pela oligarquia paulista a pretexto de exigir do governo federal a reconstitucionalização do país. De fato, os coronéis ansiavam por reassumir o poder através de eleições controladas por eles. Contudo, a Era Vargas foi o ponto final na política da República Velha.

O movimento foi derrotado. Vargas se sentiu pressionado a conceder a realização das eleições para uma Assembleia Constituinte em 5 de maio de 1933. A Constituição entrou em vigor em 16 de julho de 1934, juntamente a isso o Congresso realizou eleições indiretas e Vargas seguiu no poder, agora como presidente constitucional.

O período é marcado por polarização ideológica, de um lado a ANL (Aliança Nacional Libertadora) que integra comunistas, liberais, socialistas e cristãos, de um lado, e a AIB (Ação Integralista Brasileira), movimento inspirado pelo nazi-fascismo.

A ANL é posta fora da lei em 11 de julho de 1935. Sua extinção provocou a reação de setores militares identificados com seu programa político. Nesse contexto eclodiu em novembro de 1935 a chamada "Intentona Comunista" liderada por Luis Carlos Prestes [12], esta, contudo, se limitou ao levante de algumas guarnições militares. Contava com o apoio do Kremlin [13], mas com escasso apoio popular no Brasil e violenta repressão por parte do Estado varguista, foi sufocado sem grande dificuldade.

Durante a preparação do golpe, a pretexto de combater os levantes comunistas, Getúlio Vargas decretou estado de sítio [14], que se prolongou até o ano de 1937. Era o que Vargas necessitava para conduzir o país à ditadura. Era um pretexto, porque Getúlio Vargas sabia de antemão dos planos insurrecionais do Partido Comunista do Brasil através de elementos da polícia infiltrados no partido. E serviu-se do levante comunista - mal concebido, mal planejado e mal executado, sem a mínima chance de vitória - para atingir objetivos pessoais. Utilizando o argumento da "ameaça comunista", preparou, pacientemente, seu próprio caminho.

As eleições marcadas para 1938 estavam se aproximando. A oligarquia paulista lança candidatura própria e o próprio governo indicara seu candidato. Vargas, entretanto, concebe a idéia de permanecer no poder e fecha o regime inaugurando o Estado Novo a pretexto de deter os planos de um golpe por parte dos comunistas, que queriam lançar o país a uma Guerra.

Por outro lado, nenhum dos partidários getulistas estavam em seus planos, pois ele, Getúlio Vargas, repita-se, pretendia continuar no poder. E tinha fortes argumentos para isso; contava com o apoio do chefe do estado-maior do Exército e do general Dutra, seu ministro da Guerra.

Nessa época o Congresso Nacional, sentindo as manobras golpistas de Vargas o impediu de renovar o estado de sítio. Para forçar a situação, Vargas simulou a farsa do Plano Cohen [15], de autoria duvidosa: tratava-se de um plano supostamente comunista, que visava ao assassinato de personalidades importantes a fim de tomar o poder. Segundo a versão dos interessados na farsa, o documento fora descoberto e entregue a Góis Monteiro [16] pelo capitão Olímpio Mourão Filho, membro integralista. O denominado Plano Cohen foi dado por Góis Monteiro, responsável pela divulgação alarmista por toda a imprensa.

Diante da ameaça vermelha [17], o governo pediu o estado de guerra [18], e o Congresso concedeu. Criaram-se assim as condições para o golpe. Getúlio buscou e conseguiu o apoio do governador de Minas, Benedito Valadares; no nordeste, a missão chamada Negrão de Lima [19], conseguiu a adesão de vários estados.

Os movimentos antagônicos apelaram para as Forças Armadas, pedindo a manutenção da legalidade, inutilmente, pois Getúlio Vargas, já havia determinado fosse redigida a nova Constituição. Constituição que veio a ser outorgada por decreto, instituindo o Estado Novo e como tal, se revela como uma verdadeira ditadura.

A pretexto de se colocar fim às agitações da época, Vargas decretou o fechamento do Congresso e anunciou a nova Constituição. Em 2 de dezembro de 1937, os partidos foram dissolvidos. Era o início do Estado Novo.

No dia 10 de novembro de 1937 Vargas deu o golpe ordenando o cerco do Congresso Nacional, determinando o seu fechamento e fazendo um pronunciamento onde anunciava a promulgação de uma nova Constituição que substituiria à de 1934. Tal Constituição já estava sendo elaborada a algum tempo inspirara na Constituição autoritária da Polônia, e como tal, naturalmente ficou conhecida como "A Polaca".

Essa Carta constitucional previa a extinção dos partidos políticos, colocando na ilegalidade inclusive a Ação Integralista Brasileira. Esta por sua vez tentou o golpe, tomando de assalto o Palácio Guanabara [20] no Rio de Janeiro em 11 de maio de 1938. Foi frustrada em seus propósitos.

Além da extinção dos partidos políticos, uma série de medidas foram tomadas para reprimir as oposições, tais como a nomeação de interventores para os Estados, censura aos meios de comunicação realizada pelo DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda). Este órgão também cuidava de difundir a ideologia do Estado Novo, censurando, arquitetando a propaganda do governo e exercendo o controle sobre a opinião pública.

Nos atos preparatórios do Golpe Getulista, segundo Edgard Carone [21] (1982:17),

as relações entre Integralismo e o presidente da República sempre foram pela força da própria doutrina do Signa, isto é, as de respeito do primeiro pelo segundo e de acatamento do segundo pelo primeiro. Éramos a única força nacional organizada; éramos um milhão e meio de brasileiros que opunham uma barreira ao comunismo e combatiam o partidarismo regionalista; éramos a inspiração criadora de fortes sentimentos cívicos e tudo isso coincidia com a linha política do presidente da República.

Nas horas de grandes manifestações coletivas dos cultos partidários, eram os integralistas que realizavam as apoteoses máximas da Pátria e que aclamavam as autoridades constituídas. Nas horas de perigo, eram os integralistas que, civis ou militares, estavam invariavelmente alertas.

A influência do integralismo na sociedade brasileira e nas Forças Armadas atingira amplíssimas áreas e tocava às profundidades dos corações. Os comunistas e os governadores dos Estados bem o sentiam. Desencadeava-se uma propaganda tenaz contra os princípios ensinados pelo Integralismo; os mesmo princípios políticos que serviam em grande parte à nova estrutura constitucional do país.

Do que foi até aqui abordado, o Estado Novo foi se estruturando com o tempo e as circunstâncias, não seguindo a um plano pré-estabelecido, o que ocorreu segundo o novo equilíbrio e desequilíbrio dos grupos que apoiaram o golpe que vão dos militares aos civis, os das diversas oligarquias ou dos integralistas. De sorte que é errado pensar-se que os fatores do golpe estivessem previamente preparados para organizar o Estado ditatorial [22].

A extinção dos partidos políticos, que era medida já realizada desde 10 de novembro de 1937, foi um decreto destinado a acabar com as pressões organizatórias dos partidários da ditadura a atingir, também, diretamente, os integralistas, que sonhavam em se tornar o Partido Único, o Partido Oficial do regime.

Conforme alhures expendido, com a outorga da Constituição de 1937, instaurou-se no Brasil um novo regime que apesar da inegável afinidade entre esse regime, instituído pelo golpe e o regime dos Estados fascistas europeus, certas características peculiares destes não apareceram na formação do Estado Novo. O golpe de 1937, segundo Locardes Sola [23],

não representou a vitória de um partido organizado (a participação dos integralistas era adjetiva), nem teve apoio ativo das massas". Careceu, por outro lado, de força e coerência ideológica. A instauração do Estado Novo foi - na opinião da mesma autora - "um golpe de elites político-militares contra elites político-econômicas.

Nesse sentido, o decreto de 2 de dezembro de 1937, que dissolveu todos os partidos, é bem elucidativo, na medida em que, pelas razões do decreto, os partidos políticos eram "artificiosas combinações de caráter jurídico e formal" e tinham "objetivos meramente eleitorais". A crítica dirigia-se claramente aos partidos tradicionais herdados da República Velha - expressões dos interesses locais e incapazes, portanto, de formar a "nação". Por isso no decreto se afirmou que os partidos não correspondiam "aos reais sentimentos do povo brasileiro", pois "não possuem conteúdo programático nacional". Essa última reclamação não era aplicável, no entanto, à AIB e à ANL, pois ambas haviam superado os partidos até então existentes por trazerem "conteúdo programático nacional". Entretanto, contra a a esses partidos, as acusações seriam outras: eles espelhavam ideologias e doutrinas contrárias aos postulados do novo regime. Assim, uma vez que todos os partidos eram inadequados, a instauração do novo regime foi a solução ideal, pois fora fundado em nome da nação para atender às suas aspirações e necessidades, devendo estar em contato direto com o povo.

Portanto, o pano de fundo da ideologia do Estado Novo foi o mito da nação e do povo, duas entidades abstratas que por si sós não significam absolutamente nada. Na realidade, esse foi o momento em que, através da ditadura, se procurou suprimir os localismos e viabilizar um projeto realmente nacional.

Identificando nação e povo, e ambos com o ditador, sem a distância interposta dos partidos, o Estado Novo tinha a ilusão de que finalmente o povo governaria a si próprio e a nação se reencontraria. O ditador era então a encarnação viva do povo e da nação.

Para justificar a edição do referido decreto, embora amparado no artigo 180 da Constituição ditatorial, considerou-se que além de outros objetivos, tinha por finalidade instituir um regime de paz social e de ação política construtiva, considerando-se, ainda, que o sistema eleitoral então vigente, era inadequado às condições da vida nacional, uma vez que baseado em artificiosas combinações de caráter jurídico formal, fomentava a proliferação de partidos, com o fito único e exclusivo de dar às candidaturas e cargos eletivos aparência de legalidade. Por esse mesmo decreto, considerou-se, ainda, que a multiplicidade de arregimentações partidárias, com objetivos meramente eleitoreiros, ao invés de atuar como fator de esclarecimento e disciplina da opinião, serviu para criar uma atmosfera de excitação e desassossego permanentes, nocivos à tranquilidade pública e sem correspondência nos reais sentimentos do povo brasileiro. e que os partidos políticos até então existentes não possuíam conteúdo programático nacional ou esposavam ideologias e doutrinas contrárias aos postulados do novo regime, pretendendo a transformação radical da ordem social, alterando a estrutura e ameaçando as tradições do povo brasileiro, em desacordo com as circunstâncias reais da sociedade política e civil. Por fim, considerou-se que o novo regime, fundado em nome da Nação, para atender às suas aspirações e necessidades, deve estar em contato direto com o povo, sobreposto às lutas partidárias de qualquer ordem, independendo da consulta de agrupamentos, partidos ou organizações, ostensiva ou disfarçadamente destinados à conquista do poder público.

Nesse intere, o integralismo, também, foi considerado contrário aos interesses do Novo regime, uma vez que composto de diversas facções e, ideologicamente, de diversas tendências. Dessa forma, a composição plural como resultado do seu crescimento e das consequentes combinações entre diferentes grupos que formaram a Ação Integralista Brasileira, dele fizeram parte.

Diante dessas circunstâncias, a Constituição de 1937, segundo o seu preâmbulo, se justifica para atender às legítimas aspirações do povo brasileiro, à paz social, profundamente perturbada por conhecidos fatores de desordem resultantes da crescente agravação dos dissídios partidários que uma notória propaganda demagógica procura desnaturar em luta de classes e de extremação de conflitos ideológicos, tendentes, pelo seu desenvolvimento natural, a resolver-se em termos de violência, colocando a Nação sob a funesta iminência da guerra civil.

Ainda de acordo com o preâmbulo, a Carta ditatorial visava atender ao estado de apreensão criado no país pela infiltração comunista que se torna dia a dia mais extensa e mais profunda, exigindo remédios de caráter radical e permanente e que sob as instituições anteriores, não dispunha o Estado de meios normais de preservação e de defesa da paz, da segurança e do bem estar do povo.

Com o apoio das Forças Armadas e cedendo às aspirações da opinião nacional, umas e outras, justificadamente, apreensivas diante dos perigos que ameaçavam a unidade e da rapidez com que se vem processando a decomposição das instituições civis e políticas, pela Constituição, resolveu-se assegurar à Nação a sua unidade, o respeito à sua honra e à sua independência, e ao povo brasileiro, sob um regime de paz política e social, as condições necessárias, ao seu bem estar e a sua prosperidade.

Com esse espectro Getúlio Vargas manteve-se firme à frente do Estado angariando o apoio popular, sobretudo da classe trabalhadora, vindo a se fortalecer ainda mais quando, no curso do Estado Novo, em 1943 editou a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) que garantia a estabilidade do emprego depois de dez anos de serviço, descanso semanal, regulamentação do trabalho de menores, da mulher e do trabalho noturno; a criação da Previdência Social e a instituição da carteira profissional para maiores de 16 anos que exercessem um emprego; a jornada de trabalho foi fixada em 8 horas de trabalho, antiga reivindicação dos trabalhadores brasileiros.

Vargas objetivava com a política trabalhista, favorável aos operários, conquistar o apoio das massas populares ao governo. Tal política, paternalista e populista, buscava, ainda, anular as influências da esquerda, desejando transformar o operariado num setor sob seu controle, para ser usado pelo jogo do poder. A mesma política foi praticada à mesma época por Juan Domingo Perón na Argentina e Lázaro Cárdenas, no México.

Antes, porém, em 19 de março de 1931 foi criada a Lei de Sindicalização no Brasil, pela qual os estatutos dos sindicatos deveriam, a partir dessa medida, ser aprovados pelo ministério do Trabalho. Enfim, Vargas assumia o controle do movimento operário nos moldes da Carta del Lavoro de Benito Mussolini na Itália.

No campo da economia, a crise internacional de 1929 que, como vimos, atingiu em cheio a economia brasileira, diminuindo nossas exportações, aumentando nossos estoques de café e baixando o preço do produto. Por pressão dos coronéis paulistas, Vargas criou em 1931 o Conselho Nacional do Café que implementou a "política de sustentação" através da compra e queima dos excedentes que estavam estocados em depósitos do governo. Mesmo assim, houve a redução dos preços do produto no mercado internacional.

As dificuldades enfrentadas pelo setor agrícola conduziram o governo a investir no desenvolvimento industrial como saída para a nossa dependência externa.

A Segunda Guerra Mundial reduziu a oferta de artigos industrializados. Isso obrigou a substituição destas importações, fomentando o desenvolvimento das indústrias locais. Implementa-se ainda uma política de exploração das riquezas nacionais, com o Estado participando das atividades econômicas principalmente aquelas vitais que precisam de estímulo governamental para desenvolver-se, como a siderurgia e a do Petróleo.

As medidas econômicas tinham características nacionalistas, como a criação da Companhia Siderúrgica Nacional, que iniciou a construção da Usina de Volta Redonda com financiamentos norte-americanos. Isso se deu principalmente devido ao estreitamento das relações entre o Brasil e os Estados Unidos da América em 1942, para fazer face ao esforço de guerra. Neste mesmo ano veio ao Brasil uma Missão Técnica estadunidense que trabalhou em projetos como a Companhia Vale do Rio Doce, que explorava e exportava minérios, e a Hidrelétrica de Paulo Afonso. Vargas cria também o Conselho Nacional do Petróleo que objetivava diminuir a dependência brasileira do combustível, controlando o refino e a distribuição.

Contrariamente ao que todos os governantes fizeram antes dele e vêm fazendo depois dele, o governo Vargas conquistou a vinda de técnicos estrangeiros para incrementar a nossa economia. Todos os outros governantes brasileiros antes e depois de Vargas colocaram, em maior ou menor grau, a economia brasileira a serviço de interesses estrangeiros.

Em troca da ajuda norte-americana, o Brasil deu o seu apoio aos aliados na Segunda Guerra Mundial, rompendo relações diplomáticas com as nações do Eixo [24]. O afundamento de navios mercantes brasileiros por submarinos alemães – reza a lenda que teriam sido navios estadunidenses usando bandeiras nazistas para forçar o Brasil a ingressar na Guerra ao lado dos Estados Unidos, contrariamente ao que Perón, por exemplo, na Argentina fez, adotando a neutralidade e aproveitando para crescer. De todo o modo, sob Vargas, o Brasil se aproveitou muito bem da situação para desenvolver-se.

O Brasil declara guerra à Alemanha em 22 de agosto de 1942, enviando a FEB (Força Expedicionária Brasileira) para lutar na Itália. Sua participação não foi tão relevante para a vitória dos aliados, mas foi importantíssima para o final do autoritarismo no Brasil. Pracinhas que foram à Europa lutar contra regimes autoritários, voltam ao Brasil e aqui encontram um regime autoritário! Getúlio demonstrou-se favorável em 1943 à redemocratização do país, mas só quando a guerra tivesse se encerrado.

Em outubro de 1943 políticos de Minas Gerais, elaboram um manifesto repudiando o Estado Novo, o chamado "Manifesto dos Mineiros". Em 1944 começam a chegar relatórios sobre as tropas brasileiras na guerra que davam conta do desejo de redemocratização do país.

Em 28 de fevereiro de 1945 a Constituição de 1937 recebeu um ato adicional que possibilitava fixar a realização de eleições presidenciais.

Nesse período também se criaram três partidos políticos, a UDN (União Democrática Nacional) conservadora, direitista e anti-Vargas, o PSD (Partido Social Democrático) e o PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), criados sob a inspiração de Vargas.

Em 22 de abril de 1945, foi concedida a anistia a todos os presos políticos que se opunham ao regime e a 28 de maio foi fixada a data das eleições para 2 de dezembro daquele ano.

A oposição temia que Getúlio inviabilizasse a realização das eleições presidenciais, como já fizera pelo menos duas vezes, em 1934 e 1938. Progredia a conspiração que desejava depor Getúlio Vargas, o que efetivamente ocorre a 29 de outubro de 1945, quando tropas do Exército cercam o Catete [25] e o obrigaram a renunciar. A presidência foi ocupada interinamente pelo presidente do Supremo Tribunal Federal e Vargas foi para o autoexílio.

Com isso, a aspiração da volta do país a um regime identificado com esse ambiente surgiu espontânea e sua solução seguiu um processo de orientação política cuidada e serenamente desenvolvida. O Chefe da Nação, a quem devemos consignar o primeiro tributo para a justiça histórica, apreendeu esse problema e acompanhou--lhe a progressiva marcha até que atingisse ao seu máximo de desenvolvimento na fase de debate e encaminhamento de solução, como atualmente o encontramos, com as liberdades plenamente asseguradas, a opinião agindo pelas suas vozes e forças, e as autoridades supremas do Estado comprometidas em configurarem os anseios e o pensamento da nação em fórmulas legais respeitáveis, que a todos venham satisfazer e amparar no plano prático do gozo da liberdade e do pleno exercício dos direitos políticos.

A opinião nacional encontra-se, portanto, e com razão, empolgada pela satisfação e confiança que todos marcham ao encontro de soluções para os problemas nacionais.

Na perspectiva de campanha e competições livres, mister se faz reafirmar que as democracias vivem mais de sua substância do que de suas formas. A substância será sempre o homem, com aquilo de esse4ncial que representa na vida coletiva os anseios de liberdade, a defesa dos seus justos interesses, o estímulo de sua vida em grêmio e as aspirações fecundas pela cultura e pelo ideal de perfeição. A fórmula é simplesmente a concretização destes imperativos nas expressões objetivas de lei, com seus ditames e garantias reguladoras.

Sobre o autor
José James Gomes Pereira

Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Piauí. Curso de Formação de Oficiais pela APMPE em Paudalho, Pernambuco. Especialista em Direito Processual Penal pela Universidade Federal do Ceará. Desembargador no e. Tribunal de Justiça do Estado do Piauí. Especialista em História Política do Piauí pela Universidade Estadual do mesmo estado. Professor Universitário. Mestre pela Universidade Católica de Brasília – UCB. Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universida del la Museo Argentino - UMSA e Pós-Doutorando em Direito Constitucional. Università deglí Studí Messína. Itália.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, José James Gomes. Os tratados internacionais na vigência do Estado Novo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2866, 7 mai. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19066. Acesso em: 23 nov. 2024.

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