"A doutrina da separação dos poderes, ao propor-se como
objectivo fundamental a limitação do poder político, assume-se como tema
recorrente do pensamento ocidental, desde a Antiguidade Clássica".
PIÇARRA, Nuno. A separação dos poderes como doutrina e princípio
constitucional: um contributo para o estudo das suas origens e evolução.
Coimbra: Coimbra, 1989, p. 31.
A doutrina, no entanto, reconhece antecedentes a John Locke, tais como
Harrington e Bolingbroke: "Bolingbroke (1678-1751) foi reputado por Schmitt
como ‘o autor efetivo da doutrina teórico-constitucional do equilíbrio dos
Poderes’, [...]". FERREIRA, Pinto. Curso de direito constitucional.
São Paulo: Saraiva, 2001, p. 87.
O próprio Montesquieu, no entanto, já prevê a complexidade do tema:
"Não existe palavra que tenha recebido tantos significados e tenha marcado
os espíritos de tantas maneiras quanto a palavra liberdade". MONTESQUIEU. O
Espírito das Leis. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 165.
"em vez de partir do direito que fundamentava a liberdade, ele
partiu do poder que a ameaçava; em vez de se interrogar sobre a origem do
poder, interrogou-se sobre seus efeitos. Ele foi, sem dúvida, o primeiro autor
a falar no poder como uma coisa, separável de direito e de fato tanto de
sua origem como de seu fim, separável de direito e de fato do homem que detém
ou o procura". MANENT, Pierre. História intelectual do liberalismo:
dez lições. Rio de Janeiro: Imago, 1990, p. 86.
"Para que não se possa abusar do poder, é preciso que, pela
disposição das coisas, o poder limite o poder. Uma constituição poderá ser
tal que ninguém seja obrigado a fazer as coisas a que a lei não obriga e a
não fazer aquelas que a lei permite". MONTESQUIEU. O Espírito das Leis.
Op. Cit., p. 166-7.
"na famosa expressão de Lord Acton, ‘todo poder corrompe’,
inclusive o democrático". FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de
direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 132.
MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Op. Cit., p. 166.
Reforça o comentário de Pierre Manent: "no capítulo III do livro XI,
intitulado ‘O que é liberdade’, Montesquieu nos adverte: ‘a liberdade
política não consiste em se fazer o que se quer... É preciso ter em mente o
que é a independência e o que é a liberdade. A liberdade é o direito de
fazer tudo o que as leis permitem...’ [...] e se a lei proibir tudo ou quase
tudo? A solução dessa contradição encontra-se na concepção que Montesquieu
tem da lei: num regime livre, isto é, baseado na separação dos poderes, as
leis tendem necessariamente a ‘permitir’ ao cidadão um grande número de
coisas [...], tendem a ampliar a esfera de sua ‘independência’."
MANENT, Pierre. História intelectual do liberalismo: dez lições. Op.
Cit., p. 93.
MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Op. Cit., p. 166.
Piçarra conclui: "Montesquieu apresenta a idéia de liberdade ligada
intimamente à de legalidade". PIÇARRA, Nuno. A separação dos poderes
como doutrina e princípio constitucional: um contributo para o estudo das
suas origens e evolução. Op. Cit., p. 90.
PIÇARRA, Nuno. A separação dos poderes como doutrina e
princípio constitucional: um contributo para o estudo das suas origens e
evolução. Op. Cit., p. 185.
MANENT, Pierre. História intelectual do liberalismo: dez
lições. Op. Cit., p. 94. Parece que nenhum autor considera que na
esfera não legislada tudo volta ao estado de natureza, assim, se Hobbes tiver
razão, dentro dos limites da não-lei, haverá guerra; ou ainda, se a lei só
proteger um grupo, o grupo não protegido pela lei ficará a mercê do domínio
alheio, pois travará uma guerra desigual, sem poder atacar (porque a lei
proíbe) e sem poder defender (porque a lei proíbe).
"Sobre a separação de poderes, convertida em dogma do Estado
liberal, assentavam os constituintes liberais a esperança de tolher ou
imobilizar a progressiva democratização do poder, sua inevitável e total
transferência para o braço popular". BONAVIDES, Paulo. Ciência
política. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 142.
Ressalve-se os poderes de prerrogativa já previstos por Locke:
"muitos assuntos há o que a lei não pode prover por meio algum, e estes
devem necessariamente ser entregues à discrição daquele que tem nas mãos o
poder executivo, para que regule conforme o exigirem o bem público". LOCKE,
John. Segundo tratado sobre o governo. São Paulo: Abril Cultural, 1978,
p. 98.
MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Op. Cit., pp. 167-8.
MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Op. Cit., pp. 167-8.
Aristóteles, analisando as constituições da Antigüidade,
identificou que o governo exercia três espécies de funções ou poderes:
"destas três partes uma trata da deliberação sobre assuntos públicos; a
segunda trata das funções públicas (...); a terceira trata de como deve ser o
poder judiciário". ARISTÓTELES. Política. Brasilia:
Editora da UnB, 1985, p. 152.
LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo. Op. Cit.,
pp. 93 e 98.
Real, executiva, representativa de duração, representativa de
opinião e judiciária.
"A continuação se expõe uma nova divisão tripartida: a
decisão política conformadora ou fundamental (policy determination); a
execução da decisão (policy execution) e o controle político (policy
control)". LOEWENSTEIN, Karl. Teoria de la constitucion.
Barcelona: Ariel, 1970, p. 62.
KELSEN, Hans. Teoria general del Estado.
Barcelona: Labor, 1934, pp. 301-2. O Autor
complementa na mesma obra: "Para penetrar na
medula da verdade que contém esta velha distinção, há que romper previamente
com os dois erros que a envolvem como uma casca. Em primeiro lugar, não há que
identificar o conceito de criação de Direito expressado no conceito de
legislação, legis latio, com a atividade de certos órgãos
historicamente individualizados que realizam uma tarefa especializada,
confundindo-se deste modo o conceito de Direito com o de ‘lei’. Mas, em
segundo termo, urge advertir que a antítese entre legislação e jurisdição,
isto é, entre criação e aplicação do Direito, não é absoluta, mas
relativa" [p. 302]. "Por esse motivo, o ato de jurisdição é
criação, produção ou posição de Direito como o ato legislativo, e um e
outro não são senão duas etapas diferentes do processo de criação do
jurídica. [...] Todo o processo de criação jurídica constitui uma sucessão
continuada de atos de concreção e individualização crescentes do
Direito" [p. 305]. "A legislação é aplicação do Direito o mesmo
que a jurisdição é criação jurídica – apesar de que a doutrina
tradicional contraponha ambos os conceitos como criação e aplicação,
respectivamente" [p. 305]. KELSEN, Hans. Teoria general del Estado. Op.
Cit., pp. 302-5.
"Sobre a base da antítese fundamental afirmada pela teoria
dominante entre a atividade livre e a atividade vinculada do Estado, pode se
admitir uma quarta função estatal ou, pelo menos, um domínio
particularíssimo dentro da administração: o ‘governo’. [...] A intenção
notória de todas estas especulações é a seguinte: lançar a idéia, e
fundamentá-la ‘teoricamente’ na medida do possível, de que aquela
atividade que se chama ‘governo’ de um Estado está fora do alcance de toda
qualificação jurídica; isto é, que o ‘governo’ se move no âmbito que
escapa à regulação do Direito". KELSEN, Hans. Teoria general del
Estado. Op. Cit., p. 319.
DI RUFFIA, Paolo Biscaretti. Direito constitucional
(Instituições de Direito Público). São Paulo: Revista dos Tribunais, 1984,
p. 159.
Deve-se advertir, no entanto, que a legislação como expressão da
soberania é uma característica exclusivamente moderna e que é gradativamente
que as instituições políticas e jurídicas vão se moldando no novo
paradigma. "Somente a partir do século XVII, à medida da complexidade das
relações sociais e da correlativa necessidade de regulamentação jurídica,
é que a legislação parlamentar, já independente de precedentes, começou a
adquirir um papel importante no sistema jurídico-político". PIÇARRA,
Nuno. A separação dos poderes como doutrina e princípio constitucional: um
contributo para o estudo das suas origens e evolução. Op. Cit., p. 45.
"No sistema jurídico-político de então, a legislação era uma atividade
excepcional de natureza muito específica: <até à Idade Moderna a lei
declarava-se, clarificava-se mas não se fazia – a legislação fazia parte do
processo judicial>. O próprio Parlamento inglês formou-se a partir da Cúria
Regis, órgão de natureza jurisdicional, e nunca veio a perder totalmente
essa natureza". PIÇARRA, Nuno. A separação dos poderes como doutrina
e princípio constitucional: um contributo para o estudo das suas origens e
evolução. Op. Cit., p. 45.
MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Op. Cit., p. 172.
"Desta forma, o poder de julgar, tão terrível entre os homens, como não
está ligado nem a certo estado, nem a certa profissão, torna-se, por assim
dizer, invisível e nulo". MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Op.
Cit., p. 169.
MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Op. Cit., pp. 172 e
175.
"O corpo dos nobres deve ser hereditário." MONTESQUIEU. O
Espírito das Leis. Op. Cit., p. 172.
"Todos os cidadãos, nos diversos distritos, devem ter o direito
a dar seu voto para escolher seu representante; exceto aqueles que estão em tal
estado de baixeza, que se considera que não têm vontade própria".
MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Op. Cit., p. 171.
"Chamo faculdade de impedir ao direito de anular uma resolução
tomada por outrem; o que era o poder dos tribunos de Roma". MONTESQUIEU. O
Espírito das Leis. Op. Cit., p. 172.
MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Op. Cit., p. 172.
"Na Idade Média, a tradição da constituição mista tinha sido
utilizada para defender a limitação do poder real pelos direitos das ordens ou
estamentos". PIÇARRA, Nuno. A separação dos poderes como doutrina e
princípio constitucional: um contributo para o estudo das suas origens e
evolução. Op. Cit., p. 41.
PIÇARRA, Nuno. A separação dos poderes como doutrina e
princípio constitucional: um contributo para o estudo das suas origens e
evolução. Op. Cit., p. 44. "Nas condições políticas medievais,
a teoria da constituição mista pouco mais terá sido do que uma tradição
literária que só ocasionalmente moldou a vida política do tempo. Quando assim
aconteceu, constituição mista tornou-se sinônimo de imitação ou moderação
do poder monárquico através da intervenção (fundamentalmente direito de
assentimento) dos estamentos e/ou dos seus órgãos representativos nas leis
fundamentais e nas decisões políticas, nomeadamente de caráter financeiro e
fazendário". PIÇARRA, Nuno. A separação dos poderes como doutrina e
princípio constitucional: um contributo para o estudo das suas origens e
evolução. Op. Cit., p. 42.
PIÇARRA, Nuno. A separação dos poderes como doutrina e
princípio constitucional: um contributo para o estudo das suas origens e
evolução. Op. Cit., p. 45.
MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Op. Cit., passim, especialmentep. 168-9.
"Tudo estaria perdido se o mesmo homem, ou o mesmo corpo dos
principais, ou dos nobres, ou o do povo, exercesse os três poderes: o de criar
leis, o de executar as resoluções públicas, e o de julgar os crimes ou as
querelas entre os particulares". MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Op.
Cit., p. 168.
"Nas repúblicas da Itália, onde estes três poderes estão
reunidos, se encontra menos liberdade do que nossas monarquias".
MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Op. Cit., p. 168.
MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Op. Cit., p. 168.
MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Op. Cit., p. 168. É
o que Pierre Manet também destaca: "O que convém apreender,
principalmente, é que Montesquieu realmente só considera dois poderes,
o legislativo e o executivo. Decerto, ele faz uma distinção geral entre três
poderes: esses dois e o judiciário. Mas o judiciário só tem importância
política real nos regimes em que os dois primeiros poderes se confundem: ‘Na
maioria dos reinos da Europa, o governo é moderado, porque o príncipe, que
detém os dois primeiros poderes, deixa a seus súditos o exercício do
terceiro". MANENT, Pierre. História intelectual do liberalismo: dez
lições. Op. Cit., p. 87.
PIÇARRA, Nuno. A separação dos poderes como doutrina e
princípio constitucional: um contributo para o estudo das suas origens e
evolução. Op. Cit., p. 50.
"Como haveria neste Estado dois poderes visíveis, o poder
legislativo e o poder executivo, e todo cidadão tem sua vontade própria e faz
valer quando quer sua independência, a maioria das pessoas tem mais afeição
por um destes poderes do que pelo outro, pois que a maioria normalmente não tem
eq6uidade nem bom senso suficientes para ter igual afeição por ambas. [...] O
ódio que existiria entre os dois partidos persistiria porque seria sempre
impotente. Como estes partidos são compostos por homens livres, se um deles
sobressaísse demais, o efeito da liberdade faria com que fosse rebaixado,
enquanto os cidadãos, como mãos que socorrem o corpo, viriam erguer o outro.
[...] esta é a grande vantagem que este governo teria sobre as antigas
democracias nas quais o povo tinha um poder imediato; pois, quando os oradores o
agitavam, tais agitações sempre surtiam efeito". MONTESQUIEU. O
Espírito das Leis. Op. Cit., pp. 332-3.
MANENT, Pierre. História intelectual do liberalismo: dez
lições. Op. Cit., p. 95.
"E aqui se revela a função histórica do princípio. Nascido na
véspera da grande Revolução democrática, em uma época em que o povo
começava a ganhar terreno visivelmente contra o poder ilimitado do monarca, e
em que a massa de súditos reclama cada vez mais energicamente uma
participação na legislação, foi concedida esta, isto é, a criação de
normas gerais, a uma representação popular, ainda que sempre em união do
monarca, reservando-se ademais a este a execução. E desde o momento que o
princípio em questão declarou a execução – contradizendo seu conceito e
natureza – como uma função independente da legislação, quis se assegurar
uma situação independente do parlamento ao órgão encarregado da execução,
quis-se buscar refúgio para o princípio monárquico, lançado já na
defensiva. [...] O dogma constitucional da separação de poderes não podia
realizar com o êxito que o teve a função descrita (compreensível unicamente
pela situação histórica de defensor do princípio monárquico que já se
batia em retirada), mas porque, em parte ao menos, coincidia com a idéia da
divisão do poder, diái que respondia a um instinto primário das massas
submetidas: a desconfiança contra um governo pertencente a uma classe social de
interesses opostos aos seus, acessível só em muito pequena escala às
influências da massa; portanto, à aspiração crescente de evitar a formação
de círculos de competência dotados de demasiado poder. Seguramente, era um
mal-entendido – como se tema assinalado em tempos recentes – considerar
essencialmente democrático o princípio da separação de poderes; mas tampouco
é um princípio marcadamente autocrático, pois o último queria por nas mãos
do monarca todo o poder indivisível, assim como o primeiro queria vê-lo nas
mãos do povo. Mas a democracia mesma não pode eliminar por completo a
contraposição entre governantes e governados: não já em princípio, mas sim
em sua estrutura real". KELSEN, Hans. Teoria general del Estado. Op.
Cit., p. 337-8.
"Sem a separação de poderes, ter-se-ia a vitória do princípio
democrático, como expôs mais tarde Rousseau. Montesquieu advogava o princípio
liberal, abraçava a solução intermediária, relativista, que, de um lado,
afastava o despotismo do rei, e, de outro, não entregava o poder ao povo".
BONAVIDES, Paulo. Do Estado liberal ao Estado social. Rio de Janeiro:
Forense, 1980, p. 45
MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Op. Cit., p. 170-1.
"O liberalismo plenamente constituído, e ele só foi plenamente
constituído em termos doutrinários com Montesquieu, fundamenta-se em duas
idéias: a idéia de representação e a da divisão dos poderes". MANENT,
Pierre. História intelectual do liberalismo: dez lições. Op. Cit.,
p. 96.
Doutor em Direito pela Faculdade de Direito do recife (UFPE), Mestre em Direito pela Universidade de Brasília (UnB) e Professor Adjunto do Departamento de Ciências Jurídicas da UFPI
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)
MATOS, Nelson Juliano Cardoso. Montesquieu e a Constituição da Inglaterra.: Três teorias da separação de poderes. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2874, 15 mai. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19114. Acesso em: 22 dez. 2024.