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A tutela jurisdicional por um meio ambiente de trabalho saudável

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10 – A TUTELA JURISDICIONAL DO MEIO AMBIENTE DE TRABALHO

Como já exposto, a preocupação com o meio ambiente ganhou relevante contexto após a promulgação da Constituição da República de 1988.

O art. 196 da CR/88 dispõe que "a saúde é direito de todos e dever do Estado" cabendo ao empresário o dever de manter o ambiente do trabalho saudável salvaguardando assim o direito do trabalhador à saúde.

Ademais, a Carta Magna atribuiu a competência ao Ministério Público, nos termos do seu art. 129, III, a promoção de "inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos".

O meio ambiente, também, foi inserido no art. 7º, caput, e inc. XXII, que dispõem, respectivamente, sobre os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais e a redução de riscos inerentes ao trabalho, através de normas de saúde, segurança e higiene, inclusive, art. 200, onde compete ao SUS, "colaborar na proteção do meio ambiente, nele inserido o do trabalho".

Contudo, a Constituição da República Federativa do Brasil, após a publicação da EC/45, concedeu à Justiça do Trabalho a competência da tutela jurisdicional relativa as demandas acerca do meio ambiente laboral . Vejamos:

Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

I as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

Sabe-se que a competência da Justiça do Trabalho foi significativa ampliada com a promulgação da Emenda Constitucional 45/2004, passando a contemplar todas as controvérsias oriundas e/ou decorrentes da relação de trabalho. Antes, tal competência era limitada às ações entre "trabalhadores e empregadores", ou seja, decorrentes da "relação de emprego" disciplinada pela CLT, e, "na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho".

O novo texto do art. 114 fez uso, apenas, da expressão relação de trabalho, cujo significado, bem mais amplo do que o de relação de emprego, o que já era pacífico tanto na doutrina quanto na jurisprudência trabalhista.

Com isso, a Justiça do Trabalho passou a ser competente para processar e julgar as ações sobre os autônomos, os trabalhadores eventuais, os estatutários, os cooperados, entre outros.

Neste contexto, a competência da Justiça do Trabalho não é mais limitada apenas àquelas ações relativas às relações de emprego, sendo que basta, então, que a causa de pedir e o(s) pedido(s) sejam oriundos ou decorrentes de uma relação de trabalho. Daí conclui-se que sendo o ambiente de trabalho o local onde as relações de trabalho se desenvolvem, é evidente que as ações sobre esse tema são da competência material da Justiça do Trabalho.

Vale salientar que antes mesmo da promulgação da Emenda Constitucional 45/2004, o Supremo Tribunal Federal já tinha entendimento pacificado, que o ambiente de trabalhão já seria competência da Justiça do Trabalho. Tal entendimento já constava na Súmula 736, aprovada na Sessão Plenária de 26.11.2003:

Compete à justiça do trabalho julgar as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores.

No mesmo sentido eram as reflexões de Raimundo Simão de Melo:

Ora, se o meio ambiente de trabalho seguro constitui direito fundamental/social dos trabalhadores, constitucionalmente assegurado, e, ao Ministério Público do Trabalho incumbe, perante a defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais garantidos (art. 83 e inciso III da Lei Complementar n. 75/93), dúvida não pode existir sobre a competência trabalhista no tocante à prevenção e reparação dos danos ao meio ambiente do trabalho (MELO, 1997, p.153).

No Brasil, a ação competente para esse tipo de demanda é a Ação Civil Pública que pode ser proposta por diversos entes, que visam uma condenação a uma obrigação de fazer ou não-fazer.

Embora o art. 7º, XXIX, da CR/88 tenha definido a prescrição bienal e quinquenal quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, Evanna Soares entende que é inaplicável tal prescrição nos casos de tutela jurisdicional pertinentes ao ambiente do trabalho:

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visto que os direitos pertinentes ao ambiente do trabalho extravasam o conceito de ‘créditos trabalhistas’, nada obstante se deva ressaltar que a adequação desse ambiente pode resultar em verbas a serem pagas ao trabalhador, como nos casos em que a sentença reconheça a existência de jornada de trabalho acima do limite legal, ou a exploração do trabalho em condições insalubres ou perigosas, e determine a sua adequação, sem prejuízo do pagamento dos adicionais de horas extras, e de insalubridade ou periculosidade aos obreiros prejudicados[...] o ambiente laboral não constitui um simples direito trabalhista, emergente do contrato de emprego, que se esgote no pagamento de uma prestação em pecúnia. Sua natureza [...] é de direito humano, consagrado na Constituição da República, que lhe deu ‘status’ de direito fundamental. Nestas condições, é insuscetível de prescrição. (SOARES, 2004, p. 161-162)

Na verdade estamos diante de um tipo de ação que deveria ser imprescritível, uma vez que o ambiente laboral somente se tornaria saudável quando fosse modificado por algum fator externo.

A justificativa para a imprescritibilidade das verbas decorrentes do ambiente incorreto de trabalho seria que a ação que visa à condenação do empregador ou do poder público para tornar um ambiente de trabalho saudável seria uma condenação de uma obrigação de fazer ou não-fazer e enquanto o ambiente laboral fosse desfavorável à prática de qualquer atividade, a contagem do prazo prescricional não se iniciaria, tudo isso tendo em vista que os malefícios à saúde do trabalhador.

Desta forma, conclui-se que a prescrição existe, mas em termos práticos não tem valor, uma vez que somente quando o meio ambiente laboral se tornar saudável ou deixar de apresentar riscos à saúde e à vida do trabalhador a ação perderia o seu objeto.


11 – CONSIDERAÇÕES FINAIS:

A história do enriquecimento humano demonstra que o trabalhador foi explorado pela busca incansável do capital, o que levou ao trabalhador a "comercializar" sua saúde em troca de adicionais que não compensam as perdas ocasionadas.

A saúde e a vida que são tratados pela Constituição de 1988, como bens indisponíveis, de garantia geral a todos os seres humanos, confirmada pela Declaração Universal dos Direitos Humanos que garante a igualdade, liberdade e a vida como direitos gerais a todos os indivíduos.

O meio ambiente do trabalho, é o local onde se desenrola boa parte da vida do trabalhador, e a sua qualidade depende de inúmeros fatores químicos, biológicos, físicos, climáticos e comportamentais que interagem de forma a prejudicar ou beneficiar a vida do trabalhador.

Como desdobramento do direito humano à vida, o meio ambiente do trabalho também é considerado como um direito humano e como tal deve ser preservado. Desta forma, o meio ambiente laboral merece especial atenção do legislador, que tem o dever jurídico de protegê-lo e do empregador. Além disso, o meio ambiente laboral sadio e ecologicamente equilibrado é direito fundamental dos trabalhadores de terceira geração.

Uma tentativa do legislador brasileiro foi à criação de adicionais de insalubridade e periculosidade como forma de compensação, mas que desestimulam o empregador a manter os trabalhadores em ambientes saudáveis.

Os valores destes adicionais são tão baixos, que para o empregador é mais vantajoso arcar com o pagamento do que adequar o ambiente laboral, uma vez que essa adequação necessitaria gastos vultosos. Torna-se mais cômodo ao empregador fornecer simples EPIs, ou às vezes nem mesmo fornecê-lo, analisando a monetarização do risco.

O meio de garantia a um efetivo meio ambiente de trabalho é a tutela jurisdicional através da ação civil pública julgada pela Justiça do Trabalho, visando à adequação do ambiente laboral livre de riscos ao trabalhador.

Infelizmente este poderoso instrumento dado à coletividade não tem sido utilizado com freqüência, o que acaba por retratar uma faceta nada agradável de nossa sociedade, que é a de assistir passivamente a determinadas condutas lesivas ao seu interesse.

No entanto, nos poucos casos em que a tutela jurisdicional é requerida e tem sido de grande valia para a defesa de um meio ambiente de trabalho saudável e de proteção à saúde do trabalhador.

Assim, aguardamos ansiosamente o dia em que a coletividade se utilizará com maior freqüência das tutelas jurisdicionais de forma a fazer o cumprimento da legislação. Além disso, esperamos que os sindicatos, as entidades e associações de classe, o Ministério Público do Trabalho, bem como o Poder Judiciário possam atuar de forma a concretizar o direito fundamental ao meio ambiente de trabalho.


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Notas

  1. Importa esclarecer que a terminologia "direitos de primeira, segunda e terceira gerações" é duramente criticada por diversos autores já que estes direitos se completam, expandem-se, acumulam-se não se substituem ou se sucedem.
  2. http://www.itcilo.it/actrav/osh_es/m%F3dulos/com/app.htm acessado em 11 de maio de 2009 às 20:04
Sobre os autores
César Leandro de Almeida Rabelo

graduação em Administração de Empresas pela Universidade FUMEC (2000) e graduação em Direito pela Universidade FUMEC (2007). Especialista em Docência no Ensino Superior pela PUC/MG e em Direito Material e Processual do Trabalho pelo CEAJUFE (2010). Atualmente é advogado supervisor da Universidade FUMEC e professor na Faculdade de Ciências Humanas de Itabira - FUNCESI e Faculdade Del Rey em Belo Horizonte. Mestre em Direito Público pela Universidade FUMEC (2012). Experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Público, Privado, Trabalhista e Processual. Professor de Prática Real Cível e Penal, previdenciário, processo civil e processo coletivo.

Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas

Coordenadora do Curso de Direito da Faculdade Del Rey – Uniesp - Professora de Direito da PUC MINAS e Faculdades Del Rey – UNIESP. Professora-tutora do Conselho Nacional de Justiça – CNJ. Servidora Pública Federal do TRT MG – Assistente do Desembargador Corregedor. Doutora e Mestre em Direito Privado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Gama Filho. Especialista em Educação à distância pela PUC Minas. Especialista em Direito Público – Ciências Criminais pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus. Bacharel em Administração de Empresas e Direito pela Universidade FUMEC.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RABELO, César Leandro Almeida; VIEGAS, Cláudia Mara Almeida Rabelo. A tutela jurisdicional por um meio ambiente de trabalho saudável. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2893, 3 jun. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19243. Acesso em: 23 dez. 2024.

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