CONCLUSÃO
Olhando atentamente o trajeto histórico do sindicalismo brasileiro ficamos surpresos com os diversos interesses, sejam eles coletivos ou individuais, de âmbito global, nacional, regional ou local, que convergem em sua direção, em todos os tempos, desde os mais supérfluos aos mais importantes, o que faz com que os sindicatos estejam sempre na pauta dos debates nacionais, ora se destacando como a principal vedete, ora sendo apenas coadjuvantes, mas o certo é que de alguma forma em todos os momentos e acontecimentos registra-se sua presença.
Essa dinâmica de direcionar interesses diversos ao sindicalismo nacional parece algo de nossa própria cultura, pois são comportamentos que se identificam desde o seu surgimento, quando existia apenas a filosofia sindical implantada em algumas organizações operárias que reuniam indistintamente operários de diversos ofícios e industriais com objetivo de defender os interesses imediatos e comuns, como salário e diminuição de horas de trabalho, procedidas das sociedades de resistência que surgiram dos primeiros centros ou ligas as quais foram se espalhado pelo Pais, porém dependentes da central estabelecida na grande cidade, paralelamente existiam as uniões autônomas que tinham caráter beneficentes, que ora apoiavam greves, ora faziam manifestações políticas.
Essa forma de olhar os sindicatos com interesses diversos também se fixou no próprio Estado Brasileiro, que já no Decreto-Lei nº 19.770 de 19 de maio de 1931, promulgado por Getúlio Vargas, batizado de “Lei dos Sindicatos” implantou a unicidade sindical, o enquadramento sindical, o sistema confederativo, a proibição de filiação de sindicato a entidade internacional sem autorização do Ministério do Trabalho, proibição de sindicalização para funcionários públicos e empregados domésticos, concepção de sindicatos como órgãos de colaboração do Governo, com estatutos padronizados, dependendo do conhecimento do Estado, com apresentação de relatórios de suas atividades.
A Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-lei nº 5.453 em 31 de maio de 1943, sob argumento do Governo de aperfeiçoar o sistema legal sobre relações coletivas do trabalho, manteve os componentes mais negativos do modelo anterior especialmente a feição de órgão colaborador do Governo, e a submissão quase absoluta à autoridade do Ministério do Trabalho. Essas ações caracterizavam um Governo que tentava organizar o povo para evitar que o povo se organizasse, mas sempre priorizando seus interesses.
Não foi diferente o comportamento do Governo dos militares, aproximadamente 30 anos depois, pois entendendo ser os sindicatos uma sociedade subversiva, buscou controlá-los e as lideranças acabaram reduzidas, porém a estrutura sindical foi mantida, e numa tentativa clara de organizar os sindicatos para controlá-los, 10 anos depois, acabou cedendo espaços até então limitados às instituições, o que levou a criação de centrais sindicais como a CUT em 1983 e a CGT em 1986.
A Constituição Federal de 1988 é vista como um marco na democratização do sistema sindical brasileiro, pois conquistou autonomia de organização interna, afastou a interferência e a intervenção do Estado, criou estabilidade para o dirigente sindical. Porém deixou a desejar em muito, pois manteve a contribuição compulsória e a competência normativa da justiça do trabalho, vestígio do sindicalismo arcaico, mas tanto os avanços, bem como os retrocessos mantidos na mencionada Carta é fruto de debates em todos os segmentos da sociedade, logo são democráticos, pois representam os interesses da vontade da maioria, a qual também preferiu manter parte da estrutura sindical que temos até hoje, como a unicidade sindical, a base territorial, sindicalização por categoria, o sistema confederativo, função assistencial e isenção política, que foram criada em 1931, pelo Decreto-Lei nº 19.770.
Vale lembrar que o mencionado Diploma Máximo foi inspirado numa ânsia democrática que assolava toda sociedade brasileira, razão pela qual, leva-nos a concluir que tanto no que consideramos como avanços, bem como o que julgamos retrocesso, mesmo que tenha havido intensos debates nas bases, houve interesse do Estado, pois a mudança geral da estrutura sindical que já havia sido implantada há aproximadamente 65 anos, levaria à acirradas críticas ao Estado que se julgou incompetente durante anos.
O capitalismo representado pelo empresariado também tem sempre demonstrou interesse com relação aos sindicatos, quase sempre se aliando ao Estado incentivando e apoiando as reformas que possam provocar descentralização ou fragilidade na atuação e representação sindical.
Isto vem acontecendo de maneira mais acentuada, após as transformações políticas provocadas pelo fim do conflito entre bloco socialista, liderado pela União Soviética e capitalismo, liderado pelos Estados Unidos, quando esse último, considerado vencedor, iniciou uma ampla divulgação da ideologia do capitalismo, se aliando aos Estados, pregando a “desregulação” ou “desregulamentação”, mais conhecida como terceirização e a flexibilização.
Durante esse período, adjetivado de globalização, o capitalismo ficou sem fronteiras, buscando sem limites o lucro da produção, as empresas multinacionais se deslocavam com muita facilidade entre nações que ofereciam incentivos fiscais e mão de obra mais barata, investiram em tecnologia para a produção de bens e serviços que reduzissem o trabalho humano, ou que até mesmo viessem a substituir postos de trabalho; internamente ocorreu uma migração de empresas para outras unidades da federação que lhes proporcionassem melhores oportunidades de aumentar o lucro, como isenção de impostos, mão de obra barata e trabalhadores inexperientes com relação as questões sindicais. Eram claras as evidencias desse movimento para acabar com o papel dos sindicatos de perseguir e promover os interesses dos trabalhadores e que por pouco não conseguiu, mesmo assim restarando grandes conseqüências, pois ocorreu uma onda de descoletividade e diminuição do número de filiados de todo prejudicial aos sindicatos.
Não podemos descartar os diversos interesses pessoais das próprias lideranças sindicais, falemos aqui daqueles sindicalistas que não tem compromisso com a categoria, e direcionam a instituição de maneira viável às conquistas de seus interesses, como é o caso daqueles que buscam se perpetuarem no poder apenas para continuar gozando da estabilidade provisória e da intransferibilidade garantidas pela Lei Máxima, e assim se mantendo empregado no local de sempre, por outro lado temos também aqueles que buscam a oportunidade para usufruir do fácil acesso as arrecadações financeiras, chamadas de custeio sindical, que pasmem, são isentas da fiscalização do Tribunal de Contas da União – TCU.
Por outro lado os sindicatos sempre ocuparam de uma maneira ou de outra um papel de destaque perante a sociedade, tanto que muitos dos seus representantes se utilizam do fácil acesso a comunidade para promoverem suas idéias políticas sociais e até partidárias e que quase sempre dão certo, haja vista que hoje temos no cargo máximo do País uma liderança política cuja história está diretamente ligada a sua militância juntos aos sindicatos.
No atual momento o assunto que tem levado os sindicatos às pautas dos debates é o desmembramento sindical, tem despertado interesses de todos os envolvidos no processo: o Estado com elaboração de Leis, o Capital com a sua busca obsessiva pelo lucro e os próprios representantes do movimento sindical que tentam se manterem no poder gozando dos benefícios da instituição.
Sobre o mencionado assunto, encontramos pareceres diversos, tanto favoráveis, imparciais, como contrários, o certo é que todos avaliam de acordo com os interesses que defendem. Mas no geral, uns entendem ser o desmembramento sindical uma conseqüência ainda da chamada “crise mundial”, outros avaliam como sendo uma crítica ao sistema da unicidade sindical que se perpetua desde 1931, outros, por sua vez, acreditam ser uma adaptação dos sindicatos a nova conjuntura política e social do mercado de trabalho.
Comungamos com essa última por entendermos que o mercado de trabalho, nos últimos anos, tem ficado dinâmico, em razão das profundas mudanças que tem acontecido com o mundo do trabalho, pois além do aumento da oferta de trabalho e a acessão considerável da formalidade do trabalhador que passou a ter o registro na carteira de trabalho, o investimento do capital em novas tecnologias levando a criação de novos postos de trabalho e o surgimento de novas profissões, o que provocou a mudança de trabalhadores para outras profissões, bem como a entrada de novos trabalhadores no mercado e algumas profissões agregadas a um sindicato, que aos poucos foram se especificando de tal maneira que se individualizaram das demais, sendo possível a criação de uma nova entidade diferente daquela pré-existente, os trabalhadores das empresas que migraram para outra unidades da federação, com a pretensão de aumentar seus lucros, usufruindo da isenções fiscais e pagando barato pela mão de obra local, foram adquirindo consciência dos seus direitos enquanto trabalhadores conseqüentemente aos poucos foram se agregarem criando sindicatos locais para ficarem mais fortes e poderem discutir e lutar por seus interesses dentro de suas realidades.
O Governo ao promulgar a Lei nº 11.648 em 31 de março de 2008, que dispõe sobre o reconhecimento formal das centrais sindicais, acabou criando um incentivo a mais para o desmembramento sindical, haja visto que o artigo 2º prevê como requisitos pra o exercício das atribuições e prerrogativas a filiação de, no mínimo, cem sindicatos, distribuídos nas cinco regiões do País; filiação em pelo menos três regiões do País de, no mínimo, vinte sindicatos em cada uma; filiação de sindicatos em, no mínimo, cinco setores de atividades econômicas e filiação de sindicatos que representem, no mínimo, 7% (sete por cento) do total de empregados sindicalizados em âmbito nacional, sendo que esse último índice será de 5% (cinco por cento) do total de empregados sindicalizados em âmbito nacional no período de vinte e quatro meses a contar da data da publicação dessa Lei.
Diante destes requisitos, se não houver agregação de sindicatos à algumas centrais sindical é provável que três das seis centrais, já existentes, não participem do bolo da contribuição sindical, que é repassado para as centrais sindicais, na ordem de 10% (dez por cento) conforme previsto no artigo 589 letra “b” da CLT, que foi alterado pelo artigo 5º da mencionada Lei.
Assim as centrais sindicais passam a ter interesse em desmembrar sindicatos para que possam agregar a nova instituição ao seu quadro e continuar recebendo receitas que segundo dados mais recentes é da ordem de R$ 74 milhões.
A Portaria Ministerial nº 186 de 2008 do Ministério do Trabalho e Emprego também contribui para a criação de novas instituições sindicais através do desmembramento, pois a mesma não prevê todas as hipóteses em que o registro deve ser indeferido, por violação às hipóteses constitucionais e à liberdade sindical coletiva de organização, como se vê do artigo 5º, que não prevê o indeferimento do pedido quando houver coincidência, mesmo que parcial, de categoria ou de base territorial com entidade sindical já registrada, mas somente se houver coincidência total, ou quando a base que for requerida englobar a sede de sindicatos já registrados.
Assim, acreditamos que o desmembramento sindical tem acontecido em razão das situações se apresentarem favoráveis, ora proporcionado pelas Leis promulgadas pelo próprio Estado, ora para sanar as injustiças que foram criadas para favorecer o lucro maior do capital, ora para favorecer a representatividade dos próprios sindicatos que tiveram suas estrutura bastante abaladas nos últimos anos.
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