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Eutanásia : morte digna ou homicídio?

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Agenda 10/01/2012 às 13:56

CONCLUSÃO

Em vista as exposições realizadas observou-se que o conceito de vida e morte têm relevância para o Direito. São fatos jurídicos que remetem a implicações civis e penais, constituem e descontinuem relações jurídicas, apenas para exemplificar.

Várias teorias tentam explicar uma definição para o início da vida. Embora não se tenha chegado a um consenso, restou explicitado que em relação à personalidade jurídica, prevalece o entendimento doutrinário de que esta se inicia com o nascimento com vida, mas com base na legislação pátria o nascituro tem seus direito protegidos desde a concepção.

A morte, por sua vez, mesmo vista como fase final da vida humana, em referência ao princípio da dignidade da pessoa humana, é necessário que a mesma seja cercada do mesmo respeito dado se vivo estivesse o indivíduo. Apesar de ser uma certeza para cada ser humano, há dificuldade em se aceitar a morte como processo natural da existência humana. Diante da evolução tecno-científica e evolução da própria Medicina tem-se prolongado o momento da morte, muitas vezes, às custas de grande sofrimento.

Antigamente muitos eram os critérios de se determinar a morte de um indivíduo. Na atualidade prevalece o critério de coma aperceptivo com ausência de atividade motora supra-espinal e apnéia. Portanto, verifica-se morte encefálica quando há dano permanente ao conteúdo encefálico.

A eutanásia é uma prática utilizada desde épocas mais remotas, embora com nome diverso do conhecido hoje. Muitos povos, como comunidades pré-celtas e celtas, gregos, romanos entre outros já a praticava. Contudo somente a partir da Idade Contemporânea percebe-se um acirramento nas discussões a respeito da eutanásia.

O momento decisivo para este acirramento foi a reconstrução dos direitos humanos que veio a se constituir em um referencial para a ordem internacional contemporânea. Desde então se formou uma consciência de que qualquer discussão que envolva o ser humano não pode ser apartada destes direitos sob pena de descaracterizá-lo enquanto pessoa humana.

Oportunamente foi realizada uma relação entre o direito à vida e o direito à morte digna. Esta relação foi feita com o puro propósito de se chamar atenção de que os formalistas de plantão estão mais preocupados em aplicar e cumprir o "dura Lex sed Lex ", do que propriamente dar um "olhar de misericórdia" e compaixão aos problemas alheios.

Enfatize-se que no presente estudo o conceito de eutanásia foi tratado de várias formas desde a sua concepção inicial. Antes vista apenas morte doce, morte serena, morte piedosa. Depois passou a ser considerada morte sem dor, morte digna entre outros, para os chamados "pacientes terminais" sem nenhuma perspectiva de cura, mas que estão vivendo momentos de grande sofrimento e agonia.

Entre tantas outras modificações, foram criados diversos termos, inclusive relacionando-os como classificação da eutanásia e finalmente houve a criação do termo ortotanásia, refutando-se que este não é a mesma coisa de eutanásia, logo não seria crime. Por consequência, a ortotanásia, na opinião daqueles que a defende, não é uma conduta lícita e deve ser praticada para evitar o prolongamento daquele indivíduo que não tendo chance de cura, encontra-se ligado a aparelhos, sendo vítimas de especulações de outros humanos.

Demonstrou-se a existência de diversas classificações para a eutanásia. O estudo, porém, adotou a classificação observando os critérios da intenção, eutanásia ativa e efeito da ação, eutanásia passiva. Respeitou-se, porém, a classificação elaborada à luz de certos aspectos definidos pelos estudiosos e pelos doutrinadores.

Contudo, entendeu-se que as classificações encontradas na literatura não respondem aos questionamentos dos profissionais da área de saúde e nem os operadores de Direito. Além disso, não trazem solução para a discussão que permeia o tema. De fato, são eloquentes as classificações, mas elas se tornam confusas à medida que a classifica a eutanásia contrariando suas próprias definições adotadas para a expressão eutanásia. Assim, o presente estudo adotou a classificação de eutanásia ativa e eutanásia passiva.

Foram abordados alguns posicionamentos favoráveis e contrários a respeito da eutanásia. Notou-se que os argumentos são fortes e de certa forma válidos. Contudo mostram-se extremamente carregados de convicções pessoais e muito distanciados da realidade vivida pelos doentes que enfrentam longo processo de morte e do morrer. Percebeu-se que alguns desses posicionamentos, embora defendendo a dignidade da pessoa humana, têm preocupação apenas formalista.

Enfocou-se a participação do Conselho Federal de Medicina defensora do reavivamento do "casamento" entre ciência e humanidade para que cada indivíduo tenha um tratamento de acordo com suas necessidades. Para tanto, adota a distinção entre eutanásia e ortotanásia, defendendo que os médicos precisam aceitar a morte como uma fase natural do ser humano. Portanto, precisam evitar a obstinação terapêutica e proporcionar conforto para que seus " pacientes" possam ter uma morte tranquila, sem dor.

Retomou-se o posicionamento do Direito Penal brasileiro através de uma rápida visitação histórica, constatando-se, porém, que o mesmo mantém posição contrária à eutanásia.

A proposta inicial era demonstrar se a eutanásia seria morte digna ou homicídio. Todavia restou evidenciado que é possível fazer uma interpretação tendo como fundamento a dignidade da pessoa humana, estendendo essa dignidade ao momento final do indivíduo.Apesar disso, a eutanásia é tida como crime no ordenamento pátrio, passível de ser punida como homicídio, ainda que exista a possibilidade de se atribuir atenuantes ao criminoso.

Além disso, ficou demonstrado, durante o estudo, que a legislação pátria carece de reformas. Reformas em consonância com a realidade vivida por seres humanos comuns, simples mortais, aqueles que lutam por um ideal, que lutam pela sobrevivência diante da selvageria que tem sido viver neste País, onde índio e mendigo têm base valorativa diferenciada.

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Apesar das nuances relatadas, o objetivo de se estudar eutanásia foi alcançado. Devendo-se enfatizar que é difícil em um único estudo trazer todo o assunto que versa sobre este tema devido à imensa polêmica que o mesmo envolve.

Assim, foi traçada uma linha de abordagem visando proporcionar uma visão das discussões existentes em torno do processo de morte e o morrer do ser humano. Para isso, foram utilizados conceitos, observações e posicionamentos de vários autores consagrados na doutrina nacional e alguns na doutrina estrangeira, além de periódicos e materiais selecionados em meio eletrônico. Muitas vezes foi necessário manter textos na íntegra visando não macular o real sentido que o autor pretendeu dar às suas colocações.

Frise-se que o presente estudo foi baseado em conceitos e em opiniões de vários autores, conforme a bibliografia que segue. Defende-se que o valor deste trabalho talvez esteja em reavivar uma discussão, que mesmo antiga, ainda não encontrou um lugar de relevância que merece, afinal trata-se de uma fase importante e inerente ao ser humano.

Diante das constatações feitas, é necessário refletir sobre a ortotanásia diante da exposição dos motivos feita pelo CFM a respeito da mesma. Portanto, defende-se nesse estudo que a prática da ortotanásia deverá ser pensada como uma atividade legítima da Medicina, embora devendo-se sempre o paciente intervir nesse processo e quando não lhe for possível, a família do mesmo.

A intenção do estudo não foi a criação de um direito paralelo ou coisa semelhante. Todavia, a autora adota a posição de que o ser humano deve ser visto de forma holística e não repartido como retalhos a fazer uma colcha de dormir. Isto porque, a dignidade humana que tanto se falou deve ser concebida como valor primordial na avaliação de outros valores, devendo essa dignidade abranger também o processo de morte e o morrer.

A legislação brasileira sofre de demência senil e isto é um fato. É preciso coragem para se fazer qualquer mudança. E, se a partir da idéia contratualista de que toda lei é feita pelo homem, já que é ele que elege seus governantes, logo, é o próprio homem que escolhe as leis a que se submeter. Assim, não se pode cruzar os braços e esperar por reformas. É preciso colocar-se como agente das mudanças. Cada indivíduo é responsável diretamente, ou indiretamente, pelas transformações ocorridas no seu país.

A proposta feita é que se deva refletir acerca das mudanças, das inovações tecnológicas. Os novos rumos criados com a nova ordem mundial atingem o ser humano em todas as suas nuances. Não há como se aumentar expectativa de vida hoje, sem se analisar como se dará o processo de morte amanhã.

Por fim, reitera-se a necessidade de se repensar o direito que se debate hoje nas faculdades, cheio de rompantes revolucionários e aquele direito que se pratica nos frios bancos dos tribunais. Colacionar, além disso, o Direito que aprova a retirada da vida de um ser humano indefeso através do aborto, mas impede que seja desligado um aparelho de alguém que jaz. Este já não vive, pois perdeu sua dignidade e, às vezes, assim se mantém, pois não pode, ao menos, contribuir com a doação de órgãos.

Necessário também, além de se repensar o Direito, a realização de ampla discussão nas áreas da Sociologia, Biologia, Medicina, Bioética, Psicologia, Teologia e outras, com o intuito de se buscar novas soluções para os enfrentamentos dos novos problemas que surgem com o passar dos anos.

Todavia, somente a partir do momento que, de fato, se conceber a vida como valor, não apenas no papel, não apenas nos discursos de cátedra, se poderá estabelecer um tratamento digno e humanitário para todas as fases da vida do ser humano.


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Sobre a autora
Rosinete Souza Barata

Advogada na Bahia. Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade Federal da Bahia.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARATA, Rosinete Souza. Eutanásia : morte digna ou homicídio?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3114, 10 jan. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20818. Acesso em: 26 nov. 2024.

Mais informações

Trabalho monográfico apresentado ao curso de Direito da Faculdade 2 de Julho como requisito à obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob a orientação da Profa. M.S. Astried Brettas Grunwald.

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