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Uma Polícia Civil mais eficiente se faz com carreira única

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Agenda 28/02/2012 às 07:15

É viável a extinção das atuais carreiras policiais civis e seus respectivos cargos, criando uma nova carreira (carreira policial civil) e aproveitando os servidores das carreiras e cargos anteriores. É ato discricionário do chefe do Poder Executivo. Basta verificar a compatibilidade funcional e remuneratória, além da equivalência dos requisitos exigidos em concurso público.

Sumário: 1. INTRODUÇÃO; 2. POLÍCIA CIVIL; 2.1. Conceito; 2.2. Direção; 2.3. Competências (funções estatais); 2.4. Subordinação;2.5. Organização e funcionamento (princípio da eficiência); 2.6. Subsídio e servidor policial; 2.7. Servidor policial civil; 2.8. Carreira única nas polícias civis: resistências; 2.9. Delegado de polícia de que carreira?; 2.9.1. Emenda Constitucional nº 19/1998 e a Polícia Civil; 2.9.2. CARREIRA ÚNICA e o Supremo Tribunal Federal - STF; 2.9.3. STF ADI 245 RJ; 3. REGIME JURÍDICO: DIREITO ADQUIRIDO?; 4. POLÍCIA CIVIL: órgão público autônomo (Hely Lopes Meirelles); 5. CARREIRA, CARGO E CLASSE; 6. CRIAÇÃO, EXTINÇÃO E TRANSFORMAÇÃO DE CARGOS; 7. APROVEITAMENTO; 7.1. APROVEITAMENTO: conceito; 7.2. APROVEITAMENTO: decisões do STF.


1. INTRODUÇÃO:

Com o crescimento da violência e a falta de resposta das instituições policiais constitucionalmente definidas, percebe-se que há algo de errado no estabelecimento dos órgãos estaduais de segurança pública. Em alguns poucos Estados já houve, além de fortes investimentos em recursos materiais, uma significativa melhoria nas remunerações dos servidores policiais. Todavia, nota-se que não há uma conseqüente e marcante redução nos índices de violência e criminalidade.

Alguns teóricos podem afirmar que a violência e a criminalidade são fenômenos sociais que somente serão consideravelmente reduzidos com uma forte presença social do Estado. Em parte, isso é verdade, mas só em parte. Não é muito explorada, principalmente pela chamada “mídia especializada”, a desorganização administrativa dos órgãos de segurança pública, em especial os estaduais: polícia civil, polícia e corpo de bombeiro militar. Estes, se fossem empresas privadas, já estariam falidos há muito tempo pela falta de EFICIÊNCIA.

As “empresas” estaduais de Segurança Pública, na atual conjuntura, não estimulam seus “empregados”. Estes, na sua grande maioria não têm qualquer perspectiva de crescimento profissional com o consequente crescimento econômico. Dessa maneira, na Polícia Civil sergipana, quem ‘nasce’ delegado, ‘morre’ delegado, quem ‘nasce’ escrivão, ‘morre’ escrivão, quem ‘nasce’ agente, ‘morre’ agente; na Polícia e Bombeiro Militar sergipanos, quem ‘nasce’ praça, ‘morre’ praça, quem ‘nasce’ oficial, ‘morre’ oficial.

Os profissionais de segurança pública permanecem profissionalmente estáticos sem se preocupar em crescer em seu labor. Suas únicas preocupações são as recomposições e/ou os aumentos salariais. Não se debate internamente se o serviço está ou não sendo prestado com qualidade e eficiência, se o “cliente” está ou não satisfeito. Dessa forma, aumentar a folha de pagamento será sempre considerado aumento de despesa e nunca investimento.

Nesse contexto, todas as manifestações de classe têm como foco central: o aumento de salário. Exige-se aumento simplesmente pelo fato de se existir, sem nenhuma preocupação orgânica com a necessidade de se dar aos “clientes” a devida contrapartida, qual seja, melhoria na prestação dos serviços.

É uma percepção óbvia que todo trabalhador vai sempre querer perceber melhor salário. Afinal, ser remunerado pela sua força de trabalho é o justo. Agora, há que existir aumentos gerais e indistintos para todos e aumentos pontuais para aqueles que objetiva e efetivamente mereçam.

Nesse contexto, em que a única causa trabalhista é o salário, o “funcionário” faz de seu “emprego” um bico. Busca-se ascensão social por outras vertentes profissionais completamente diversas da sua profissão de origem. Até os poucos cursos oferecidos pelas academias das polícias não interessam, pois em nada serve de requisito para possíveis promoções.

É urgente, portanto, uma mudança de paradigma organizacional nas estruturas funcionais dos órgãos de segurança pública. Não se realizará um serviço público policial verdadeiramente eficiente enquanto houver concurso para chefe. Este deve ser nascer da base, forjado na experiência e na qualidade técnica observada com critérios objetivos. É preciso a instituição da MERITOCRACIA OBJETIVA no serviço público policial.


2. POLÍCIA CIVIL.

Antes de entrarmos propriamente na proposta sindical de projeto lei orgânica da Polícia Civil do estado de Sergipe que venha a garantir a eficiência do trabalho policial civil é imperioso o conhecimento de informações básicas.

2.1. Conceito

A Polícia Civil, ao lado da Polícia e do Corpo de Bombeiros Militar, é órgão público estadual de Segurança Pública, com previsão constitucional, cuja função estatal é prestação do serviço público policial civil. Este tido como dever do Estado e responsabilidade de todos.

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

V- polícias civis.

2.2. Direção

De acordo com a primeira parte do §4º do art. 144 da Constituição Federal, os órgãos públicos denominados Polícias Civis devem ser dirigidas por SERVIDOR PÚBLICO ocupante do CARGO PÚBLICO EFETIVO de delegado de polícia de CARREIRA. Ver-se-á adiante que essa carreira pode ser a carreira de delegado ou a carreira policial civil.

Art. 144. (...).

§4º. Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.

Assim, delegado de polícia é o nome do cargo público efetivo ocupado pelo servidor apto a comandar o órgão público Polícia Civil.

A direção do órgão público POLÍCIA CIVIL, é atribuição constitucional do cargo de delegado de polícia, esteja ou não descrita na Lei Orgânica Nacional das Polícias Civis (prevista no §7º do art. 144 da CF e ainda inexistente) bem como nas respectivas Leis Orgânicas Estaduais. Assim, acrescente-se às atribuições legais do cargo de delegado de polícia a atribuição de direção do órgão policial civil.

2.3. Competências (funções estatais)

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos.

§4º. Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.

De acordo com a segunda parte do §4º do art. 144 da Constituição Federal, o ÓRGÃO PÚBLICO denominado Polícia Civil tem a função estatal de prestar o serviço público policial civil, através (rol taxativo):

a) da preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio – competência geral de todos os órgãos de segurança pública (CF, art. 144, caput); e,

b) do exercício da função de polícia judiciária estadual comum e da apuração de infrações penais comuns – ou seja, a INVESTIGAÇÃO CRIMINAL ESTADUAL COMUM (CF, art. 144, §4º, 2ª parte). A Polícia Civil investiga os delitos, exceto aqueles que não são de competência da Polícia Federal, bem como os chamados delitos militares.

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2.4. Subordinação

A Polícia Civil, ao lado da Polícia e do Corpo de Bombeiros Militar, é órgão estadual de Segurança Pública subordinado diretamente ao governador. E esta prerrogativa é indelegável (se fosse delegável a própria Constituição Federal assim disporia).

Art. 144. (...):

§6º. As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do Exército, subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.

Assim, os chefes da Polícia Civil têm status constitucional de Secretário de Estado.

2.5. Organização e funcionamento (princípio da eficiência)

Art. 144. (...):

§7º. A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades.

O citado dispositivo constitucional originário ainda não regulamentado (§7º do art. 144) traz uma informação muito cara aos legisladores infraconstitucionais. A legislação de organização e funcionamento dos órgãos de segurança pública DEVE GARANTIR a eficiência de suas atividades.

Celso Antonio Bandeira de Melo[1], referindo-se a doutrina italiana, trata o princípio da eficiência como sendo ‘princípio da boa administração’ que consiste em desenvolver a atividade administrativa ‘do modo mais congruente, mais oportuno e mais adequado aos fins a serem alcançados, graças à escolha dos meios e da ocasião de utilizá-los, concebíveis como os mais idôneos para tanto’.

Diógenes Gasparini[2] leciona que ao se atender o princípio da eficiência, deve-se ir ‘mais além’. Para ele, ‘de fato, certas situações não devem ser mantidas se o contrariarem. O agente público, em tais casos, deve tomar as medidas necessárias para pôr fim a certa situação tida, em termos de resultados, por desastrosa para o Estado. Assim, deve extinguir órgãos e entidades e remanejar servidores sempre que se verificar um descompasso entre a situação existente e o princípio da boa administração, (...)’.

Dirley da Cunha Junior[3], citando Maria Sylvia Zanella di Pietro, diz que “o princípio da eficiência apresenta, na realidade, dois aspectos: pode ser considerado em relação ao modo de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores resultados; e pode ser também considerado em relação ao modo de organizar, estruturar e disciplinar a Administração Pública, também com o mesmo objetivo de alcançar o melhores resultados no desempenho da função ou atividade administrativa”.

Este segundo aspecto (modo de organizar, estruturar e disciplinar a administração pública), é o que deve ser observado quando da formulação de uma nova lei orgânica estadual da Polícia Civil. A atual forma de organização dos cargos e classes em diversas carreiras em nada favorece uma prestação de serviço público policial civil eficiente.

O princípio da eficiência (boa administração) somente foi expressamente previsto para a Administração Pública em geral, através da EC nº 19/98, que o inseriu no caput do art. 37 do texto constitucional. Até então era um princípio implícito para o conjunto da Administração Pública. O princípio da eficiência para a Administração Pública em geral é, pois, norma constitucional derivada.

CF, art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

Para Daniel Augusto Mesquita e outros[4], este ‘princípio está intimamente ligado aos objetivos da Reforma Administrativa do Estado, realçada no final da década de 1990, que objetivava atingir um modelo de Administração Pública Gerencial. Preconizava o controle de resultados e não de meios’.

Dessa maneira, enquanto a Administração Pública em geral somente teve a obrigação constitucional de observar o princípio da eficiência com a EC nº 19/98, o legislador constituinte originário deixou, desde início, expresso que o princípio da eficiência deveria ter observação obrigatória quando o tema fosse Segurança Pública.

CF, art. 144. (...).

§7º. A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades.

Então, é racional se buscar um novo modo de organizar, estruturar e disciplinar a Administração Pública Policial Civil em que se prime pela EFICIÊNCIA.

Ver-se-á adiante que é mais EFICIENTE organizar os cargos e classes policiais civis, preservando o cargo de delegado de polícia, em uma ÚNICA CARREIRA, a CARREIRA POLICIAL CIVIL.

2.6. Subsídio e servidor policial

Art. 144. (...).

§9º. A remuneração dos servidores policiais integrantes dos órgãos relacionados neste artigo será fixada na forma do § 4º do art. 39. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

O §9º do art. 144, da CF, inserido pela EC nº 19/98, conhecida como a emenda da reforma administrativa, veio informar a obrigatoriedade do subsídio com modalidade remuneratória obrigatória para os servidores da atividade fim dos órgãos de Segurança Pública.

O serviço público relativo à Segurança Pública sempre foi considerado pela doutrina e pela jurisprudência como sendo um serviço público essencial. O subsídio é a modalidade remuneratória dos agentes políticos e dos integrantes das chamadas Carreiras de Estado. Desse modo, com a obrigatoriedade do subsídio como modalidade remuneratória dos servidores da atividade fim dos órgãos de Segurança Pública, estes passaram a ter status constitucional de integrantes de CARREIRA DE ESTADO.

Outra preciosa informação trazida pelo §9º do art. 144, foi a denominação genérica de SERVIDORES POLICIAIS para todos os integrantes dos órgãos de Segurança Pública.

Assim, pode-se depreender o seguinte:

2.7. Servidor policial civil

Fácil então se perceber que todos os servidores públicos da atividade fim do órgão policial civil são denominados, por decorrência constitucional, SERVIDORES POLICIAIS CIVIS. Estes, na medida das atribuições que a lei lhes conferir, são autoridades policiais civis. Ou seja, a eles a lei deve conferir, na medida exata, o múnus público da INVESTIGAÇÃO CRIMINAL (poder de polícia judiciária estadual comum e de apurar as infrações penais comuns).

Em Sergipe, são servidores policiais civis, e por via de conseqüência autoridades policiais civis, os ocupantes dos cargos públicos efetivos de DELEGADO, ESCRIVÃO, AGENTE E AGENTE AUXILIAR.

2.8. Carreira única nas polícias civis: resistências.

A primeira resistência a ser debelada é a utilização de normas de direito processual penal comum para explicar conteúdos de direito constitucional e/ou administrativo. Assim, cumpre afirmar que a análise sobre a possibilidade de organização dos cargos e classes policiais civis em carreira única deve ser feita sob o prisma jurídico dos modernos ditames do direito constitucional e do direito administrativo.

Muitos, seja por ignorância, seja por má vontade, reduzem o debate técnico-jurídico a especulações acerca da interpretação da expressão ‘autoridades policiais e seus agentes’, presente no Código de Processo Penal. Essa redação data da promulgação do texto legal, ou seja, 1941. Essa figura não existe mais, pois, segundo a moderna concepção, todos são agentes públicos.

Assinale-se, ainda, que a expressão ‘delegado de polícia’ somente foi inserida no texto do referido código através da Lei nº 5.126/1966, que deu nova redação ao inciso XI do art. 295 do CPP, ao elencar as autoridades com direito à prisão especial.

Concluir-se-á, adiante, que todo integrante de órgão de segurança pública é considerado como servidor policial, ou seja, autoridade policial.

Outra resistência a ser extirpada, quando se fala em modernização das Polícias Civis brasileiras através da instituição da CARREIRA ÚNICA, é o fato de que somente se autorizaria a legislação infraconstitucional a organizar os cargos e classes policiais civis em carreira única através de uma alteração no atual texto constitucional. Ou seja, através de uma Proposta de Emenda Constitucional – PEC. O “equívoco” está na única e tendenciosa interpretação que se dá ao texto do parágrafo 4º do art. 144 da Constituição Federal. Reflexo ainda de sua exegese antes da promulgação da Emenda Constitucional nº 19 de 04 de junho de 1998.

Ver-se-á adiante que esta emenda constitucional abriu não apenas a possibilidade de modernização geral da Administração Pública brasileira, como também a possibilidade de modernização da Administração Pública relativa à Polícia Civil.

Aqueles que resistem se esquecem que a Polícia Civil é um órgão público (estadual) que deve prestar um serviço público (investigação criminal) através de seus agentes públicos (servidores policiais civis) que ocupam cargos públicos com atribuições definidas e delimitadas por lei. Esses cargos podem ser organizados em ‘cargos isolados’ ou em ‘cargos em carreira’.

2.9. Delegado de Polícia de que Carreira?

Como visto anteriormente, a Constituição Federal determinou que o comando da Polícia Civil fosse uma atribuição exclusiva do servidor policial civil ocupante do cargo público efetivo de delegado de polícia de CARREIRA.

Conforme dito inicialmente, a grande resistência na organização dos cargos e classes policiais civis em carreira única reside na única interpretação que é dada à expressão CARREIRA no contexto do dispositivo constitucional citado.

Art. 144. (...).

§4º. ÀS POLÍCIAS CIVIS, DIRIGIDAS POR DELEGADOS DE POLÍCIA DE CARREIRA, (...).

Como não há Lei Orgânica Nacional da Polícia Civil, por ainda não haver sido regulamentado o §7º do art. 144 da Constituição Federal, o campo interpretativo da expressão “DELEGADOS DE POLÍCIA DE CARREIRA” se amplia.

Assim, é plenamente possível se afirmar que as Polícias Civis devem ser dirigidas:

a) por delegados de polícia da CARREIRA DE DELEGADO DE POLÍCIA; ou,

b) por delegados de polícia da CARREIRA POLICIAL CIVIL.

Na primeira hipótese, haverá ainda outras carreiras, dentre as quais, a carreira de agente, a carreira de escrivão etc. Já na segunda hipótese, haverá apenas uma única carreira policial civil, organizada em classes e cargos com atribuições ligadas à função estatal do órgão policial civil, qual seja, a investigação criminal.

Crê-se que ambas as interpretações são juridicamente possíveis, mormente após a promulgação da Emenda Constitucional nº 19, de 4 de junho de 1998.

2.9.1. Emenda Constitucional nº 19/1998 e a Polícia Civil.

Antes da EC nº 19/1998.

Para percebermos o impacto desta emenda na organização da Polícia Civil, é fundamental conhecermos os textos originais, por ela revogados, ei-los:

Art. 241. Aos delegados de polícia de carreira aplica-se o princípio do art. 39, §1º, correspondente às carreiras disciplinadas no art. 135 desta Constituição.

Art. 39. (...).

§1º. A lei assegurará, aos servidores da administração direta, isonomia de vencimentos para cargos de atribuições iguais ou assemelhados do mesmo Poder ou entre servidores dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, ressalvadas as vantagens de caráter individual e as relativas à natureza ou ao local de trabalho.

Art. 135. Às carreiras disciplinadas neste título aplicam-se o princípio do art. 37, XII, e o art. 39, §1º.

Como se vê, interpretação combinada dos textos originais dos arts. 39 e 241 da CF (anterior a EC nº19/98) concediam aos delegados de polícia de carreira isonomia de vencimentos com as chamadas doutrinariamente carreiras jurídicas, aquelas cujas funções são essenciais à justiça (MP, AGU, Advocacia e Defensoria Pública). Assim, delegados nunca tiveram o status de carreira jurídica, apenas tinham garantida de isonomia vencimental.

A isonomia de vencimentos com as ditas carreiras jurídicas, numa análise conjunta destes dispositivos constitucionais, era a fundamentação jurídico-constitucional para se considerar a carreira de delegado de polícia como uma carreira (categoria) específica, diferenciada. Isso deixou de ocorrer com o advento da Reforma Administrativa do Estado, trazida pela EC nº 19/1998.

Depois da EC nº 19/1998.

A EC nº 19/1998, ou como também ficou conhecida, a emenda da reforma administrativa do Estado brasileiro, alterou por completo os textos dos artigos 39 e 241, bem como incluiu o parágrafo §9º ao artigo 144.

Como dito acima, essas alterações suprimiram a especificidade da carreira (categoria) de delegado de polícia civil. O novo texto do art. 241 acabou com a isonomia de vencimentos dos delegados de polícia civil com os integrantes das chamadas carreira jurídicas. O texto do incluído §9º do art. 144 passou a denominar todos os integrantes dos órgãos de segurança pública como servidores policiais. As carreiras destes passaram então a ser consideradas como ‘carreiras de Estado’, em razão da obrigatoriedade de fixação da remuneração na forma de subsídio. Este espécie de remuneração utilizada para as carreiras de Estado (membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais).

Art. 144. (...):

§9º. A remuneração dos servidores policiais integrantes dos órgãos relacionados neste artigo será fixada na forma do § 4º do art. 39. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

Art. 39. (...).

§4º. O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por SUBSÍDIO fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI. (incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

Dessa forma, todos os integrantes (atividade-fim investigação) do órgão de segurança pública Polícia Civil passaram a ser compreendidos como SERVIDORES POLICIAIS CIVIS, integrantes de carreira ou de carreiras de Estado. São todos, portanto, membros de uma mesma categoria, qual seja, a categoria policial civil. Ao servidor policial civil ocupante do cargo público efetivo de delegado de polícia permaneceu a exclusividade da direção máxima do órgão (CF, art. 144, §4º).

A falta de regulamentação do §7º do art. 144 da CF associada ao conjunto de reformas produzidas pela EC nº 19/1998, passou a permitir aos Estados, firmes na regra do §3º do art. 24 da CF, a formulação de leis orgânicas para suas Polícias Civis, podendo optar em organizar os cargos e classes policiais civis, ou em diversas carreiras, ou em uma única carreira. A primeira opção tem sido a utilizada. Todavia, vem se mostrando como uma má escolha, pois divide o órgão, desagregando seus servidores.

CF, art. 144. (...):

§7º. A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades.

Art. 24. (...).

§3º. Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.

Abriu-se, portanto, o caminho para a instituição da CARREIRA ÚNICA não apenas nos órgãos policiais civis, como também em todos os órgãos de segurança pública brasileiros.

Diante da prova da ineficiência das Policiais Civis brasileiras, em sua grande maioria, sucateada, com baixos salários, desmotivada e servindo como mero órgão de registro cartorário, com pontuais e inconsistentes operações midiáticas, vê-se que o modelo atual de organização dos cargos e classes policiais civis em várias carreiras não é o mais eficiente. Não é, pois, a melhor das opções.

2.9.2. CARREIRA ÚNICA e o Supremo Tribunal Federal (STF).

Não há, até o presente momento, nenhuma decisão do STF que diga ser inconstitucional a instituição da CARREIRA ÚNICA na Polícia Civil, na hipótese de extinção de um regime jurídico com a criação de outro, com progressão funcional previsto por provimento derivado na modalidade PROMOÇÃO, respeitando-se o contido no §4º do art. 144 da Constituição Federal, ou seja, que o órgão policial civil deve ser dirigido pelo servidor policial civil ocupante do cargo público efetivo de delegado de polícia civil.

Via de regra, as decisões do STF que vedam a possibilidade de instituição da CARREIRA ÚNICA na Polícia Civil se fundamentam na manutenção do regime jurídico associado à progressão funcional mediante o provimento derivado denominado ASCENÇÃO. Esta modalidade de provimento derivado não mais tem respaldo constitucional, segundo reiteradas decisões do Guardião da Constituição Federal.

2.9.3. STF ADI 245 RJ.

EMENTA: ação direta de inconstitucionalidade. Polícia Civil. Carreira de Delegado. Ascensão funcional. - Se a Constituição Federal, no parágrafo 4º do artigo 144, estabelece que as polícias civis dos Estados serão dirigidas por delegados de polícia de carreira, não será possível, inclusive para as Constituições Estaduais, estabelecer uma carreira única nas polícias civis, dentro da qual se incluam os delegados, ainda que escalonados em categorias ascendentes. O que a Constituição exige é a existência de carreira específica de delegado de polícia para que membro seu dirija a polícia civil, tendo em vista, evidentemente, a formação necessária para o desempenho dos cargos dessa carreira. – A ascensão funcional não mais é admitida pelo inciso II do artigo 37 da atual Constituição. – Ação direta de inconstitucionalidade que se julga procedente para declarar inconstitucional o parágrafo 1º do artigo 185 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro.

Ao ler a presente ementa, os mais ‘apressados’ podem afirmar que o STF já decidiu não ser possível organizar os cargos e classes policiais civis em carreira única. Essa interpretação ou é fruto da pressa (que é a inimiga da perfeição), ou é oriunda do mau corporativismo, aquele que enfraquece a instituição em prol de interesses de pequenos grupos.

A única certeza que a presente decisão traz é que a ASCENSÃO é forma de provimento derivado não permitida pela atual ordem jurídica constitucional, portanto não pode servir de suporte jurídico para a organização dos cargos e classes policiais civis em CARREIRA ÚNICA. Ou seja, as polícias civis não podem organizar seus cargos em carreira única através da ascensão.

Vejamos o texto do dispositivo declarado inconstitucional, por maioria:

Constituição do Estado do Rio de Janeiro

Art. 185. (...):

§1º. A carreira de Delegado de Polícia faz parte da carreira única da polícia civil, dependendo o respectivo ingresso de classificação em concurso público de provas e títulos e, por ascensão, sendo que metade das vagas será reservada para cada uma dessas formas de provimento, podendo ser aproveitadas para concurso público as vagas que não forem preenchidas pelo instituto da ascensão.

Impende pontuar, ainda que a presente decisão, datada de 05 de agosto de 1992, não mais tem significado jurídico algum com o advento da Emenda Constitucional nº 19, de 4 de junho de 1998, que retirou a isonomia de vencimentos dos delegados de polícia civil com os cargos das carreiras jurídicas.

Sobre o autor
Antonio Moraes

Servidor Policial Civil (Escrivão), graduado em Direito UNIT (Sergipe) e graduando em Ciências Sociais UFS (Sergipe) e ex-presidente do Sindicato dos Policiais Civis de Sergipe (SINPOL Sergipe).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MORAES, Antonio. Uma Polícia Civil mais eficiente se faz com carreira única. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3163, 28 fev. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21164. Acesso em: 23 dez. 2024.

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