Ao longo dos anos, a construção do instituto da prescrição no direito tributário foi editada por remendos introduzidos na legislação sem que fosse realizada uma pré-análise dos reflexos que poderiam causar no ordenamento jurídico pátrio, com a finalidade de privilegiar o Estado, no sentido de melhor aparelhá-lo na guerra contra a evasão fiscal.
O referido tratamento casuístico originado por interesses do Fisco desconfigurou o instituto jurídico da prescrição, dando formatação distinta no direito tributário, daquele conhecido no direito civil.
Não obstante a tal realidade, há um número bastante elevado de execuções fiscais cujos créditos tributários encontram-se prescritos sem que os contribuintes tenham conhecimento. O fato é que os sujeitos passivos (contribuintes) nem sabem que os créditos tributários não podem mais ser exigidos.
Como se não bastasse, embora o instituto da prescrição seja matéria de ordem pública a qual pode ser alegada a qualquer momento e reconhecida “ex officio”, mesmo assim não é comum que os magistrados identifiquem a prescrição e a decretem sem que as partes requeiram expressamente.
Por outro lado, hodiernamente, parcela considerável das execuções fiscais que tramitam no Poder Judiciário é oriunda dos créditos tributários constituídos por meio de lançamento por homologação, que é a modalidade que será abordada no presente artigo.
Consoante regramento disposto no artigo 150 do CTN, nos tributos sujeitos a lançamentos por homologação (ex. IR, IPI, PIS, ICMS, entre outros) o sujeito passivo se antecipa à Fazenda Pública, entrega ao Fisco a declaração devida, informando o valor que entende devido dos tributos, e procede à quitação da exação, aguardando o procedimento homologatório expresso ou tácito.
Assim sendo, o pagamento da exação ocorre antecipadamente, concretizando-se o lançamento tributário posteriormente, isto é, a autoridade fiscal homologa-a, se correta, ou efetua um lançamento tributário suplementar a fim de exigir eventuais diferenças.
Nos termos da jurisprudência do STJ, em se tratando de tributo sujeito a lançamento por homologação, o termo inicial para a contagem do lustro prescricional se dá na constituição definitiva do crédito tributário, conforme dicção do artigo 174 do Código Tributário Nacional.
O referido termo inicial é aceito de forma pacífica na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, conforme bem salientou o rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, em acórdão do qual se transcreve a seguinte ementa:
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. PRAZO PRESCRICIONAL. TERMO A QUO. ART. 174 DO CTN. 1. Na Declaração do Imposto de Renda, o prazo prescricional de cinco anos tem seu começo a partir da constituição definitiva do crédito tributário, isto é, da entrega da Declaração. 2. A prescrição tributária segue os termos do art. 174 do CTN, ou seja, tem o Fisco cinco anos para a cobrança do crédito tributário, a contar de sua constituição definitiva. 3. Precedentes do STJ. (REsp 413.457/RS, 1ª Turma, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 02/12/2003) (texto original sem grifos)
Com a entrada em vigor da Lei Complementar n.º 118/2005, o despacho ordenatório citatório do magistrado, passou a caracterizar como marco de interrupção da prescrição, ao contrário do anteriormente disposto, qual seja, “pela citação pessoal feita ao devedor”.
Não obstante às diversas críticas esposadas pela doutrina sobre a flagrante intenção de maior proteção à Fazenda Pública, com a execução da presente medida, outros questionamentos passaram a dominar as discussões nos Tribunais pátrios. Por exemplo, se a nova regra deveria ser aplicada às Ações de Execuções Fiscais propostas pelo Fisco antes da data de entrada em vigor da LC n.º 118/2005?
Após uma grande discussão acerca da matéria, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que deveria ser observado o momento do despacho de citação. Caso o despacho do juiz que determinar seja anterior à vigência da referida Lei Complementar, deve ser aplicada a redação original do art. 174, parágrafo único, I, do CTN, não se interrompendo o prazo prescricional do despacho ordinatório citatório, mas sim da citação válida do executado, consoante demonstram os seguintes arestos:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. INTERRUPÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. DESPACHO QUE ORDENA A CITAÇÃO. ALTERAÇÃO DO ART. 174 DO CTN CONFERIDA PELA LC 118/05. APLICAÇÃO IMEDIATA.
1. A Lei Complementar 118, de 9 de fevereiro de 2005 cuja vigência teve início em 09.06.05, modificou o art. 174 do CTN para atribuir ao despacho do juiz que ordenar a citação o efeito interruptivo da prescrição e por se constituir norma processual deve ser aplicada imediatamente aos processos em curso, podendo incidir mesmo quando a data da propositura da ação seja anterior à sua vigência. Contudo, a novel legislação é aplicável quando o despacho do magistrado que ordenar a citação seja posterior à sua entrada em vigor. Precedentes.
2. No caso concreto, a Corte regional assentou que a inscrição em Dívida Ativa originou-se de lançamento de valores devidos a título de Imposto Territorial Rural-ITR referente ao ano de 1995, com vencimentos no período de 30.09.96 a 29.11.96; tendo a notificação do lançamento fiscal ao contribuinte ocorrido em 02.09.96, não havendo notícias da apresentação de defesa administrativa nem da realização do respectivo pagamento. A execução fiscal foi proposta em 26.02.02; o despacho que ordenou a citação ocorreu em 28.02.02 (fl. 07 da execução); tendo se efetivada em 12.03.02 (fl. 13-verso da ação executória).
3. Desse modo, sob qualquer ângulo, evidente que restou operada a ocorrência da prescrição, porquanto decorrido o prazo prescricional qüinqüenal entre a data da efetiva citação do executado, ocorrida em 12.03.02, e a data da constituição do crédito tributário (02.09.96), nos termos da redação original do art. 174, § único, I, do CTN, uma vez que o despacho ordinatório da citação foi proferido ainda antes da vigência da LC 118/05.
4. Agravo regimental não provido.
(STJ, AgRg no REsp 1073004 / PR, rel. Min. CASTRO MEIRA, T2, DJe 12/12/2008) (Grifo nosso)
Desse modo, se transcorrerem mais de cinco anos entre a data da constituição definitiva do crédito tributário e a data em que o magistrado determinar a citação, ou que o contribuinte seja devidamente citado (conforme a situação), o crédito tributário estará extinto não podendo mais ser exigido. Nesse caso, o contribuinte deve arguir a prescrição, por meio de exceção de pré-executividade, sem necessidade da garantia do Juízo.