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A formação do estado filiativo na socioafetividade e o direito sucessório por sua decorrência

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Agenda 28/01/2013 às 16:35

Os estudiosos do assunto citam a desnecessidade do sobrenome quando é evidente o trato e a fama, ou seja, quando o pai afetivo coloca o filho como sendo de sua prole, sem distinções, e, ainda, quando o filho é visto pela sociedade como o sendo daquele que considera pai.

Resumo: Trata-se de trabalho monográfico que visa a estudar o tema da filiação socioafetiva,a fim de verificar os seus meios de reconhecimento e consequente disposição sucessória aos bens do pai falecido.Este estudo leva em consideraçãoas importantes modificações havidas na estrutura jurídica do Estado Brasileiro com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, tomando por base a ascensão de princípios de cunho social, que reiteram a acepção cidadã da atual Carta Magna. Neste prospecto, coloca-se o afeto, que intrínseco à lei e coadunado com o novo paradigma jurídico e social é atualmente utilizado para definir, juntamente com a convivência familiar, a verdadeira relação parental, desvinculando a paternidade e a maternidade da necessidade do vínculo biológico. Desta forma, imprescindível se faz a análise da possibilidade de se centrar a atual formação do estado filiativo na posse do estado de filho, ao ponto de se legitimar a percepção de Direito Sucessório por sua decorrência. Faz-se, além do estudo doutrinário, uma análise ao entendimento dos Tribunais do sul do País com relação ao reconhecimento da paternidade socioafetiva e seus efeitos no Direito das Sucessões.

Palavras-chave: Direito de Família. Filiação. Socioafetividade. Sucessões.

Sumário: 1 INTRODUÇÃO. 2 DIREITO DE FILIAÇÃO. 2.1 HISTORICIDADE DA FILIAÇÃO E SUAS NUANCES DENTRO DO DIREITO DE FAMÍLIA. 2.2 A ADAPTABILIDADE DO DIREITO E O ADVENTO DA CONSTITUIÇÃO CIDADÃ. 2.3 A PRINCIPIOLOGIA CONSTITUCIONAL APLICADA À FILIAÇÃO. 3 A FORMAÇÃO DO ESTADO DE FILIAÇÃO E O RECONHECIMENTO DE FILHO. 3.1 A FILIAÇÃO HAVIDA NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO. 3.2 A FILIAÇÃO NÃO-MATRIMONIAL E SUAS FORMAS DE RECONHECIMENTO. 3.3 A ADOÇÃO FILIATIVA: O AFETO COMO LEGITIMADOR DE DIREITOS. 4 A FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA E O DIREITO SUCESSÓRIO BRASILEIRO. 4.1 POSSE DO ESTADO DE FILHO. 4.2 A SUCESSÃO DOS DESCENDENTES NO CÓDIGO CIVIL DE 2002. 4.3 POSSIBILIDADE DE EXISTÊNCIA DE DIREITOS SUCESSÓRIOS DO FILHO SOCIOAFETIVO – PESQUISA JURISPRUDENCIAL. 5 CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.


“Tenho a impressão de ter sido uma criança brincando à beira-mar, divertindo-me em descobrir uma pedrinha mais lisa ou uma concha mais bonita que as outras, enquanto o imenso oceano da verdade continua misterioso diante de meus olhos.” (Isaac Newton)


1 INTRODUÇÃO

A afetividade atualmente é considerada como princípio intrínseco que abarca a maioria dos institutos do Direito Civil Pátrio, tendo em conta a nova dogmática jurídica inserida nos arranjos constitucionais da Carta Magna de 1988. Asdisposiçõesprincipiológicas, antes restritas aos Códigos, viram-se inseridas em nossa atual Constituição, alterando consideravelmente a noção patrimonialista do retrógrado Direito, e aludindo uma nova perspectiva, centrada noafeto, igualdadee solidariedade social.

Dentro desta premissa, no que se refere ao Direito Filiativo, encontra-se o que chamamos de Socioafetividade, que, dado todo o desenvolvimento da sociedade e a necessidade de se adaptar às mais diversas espécies de família existentes, se fez evidente, porquanto aplicável para que se vislumbre a fática relação de parentesco.

Todavia, o desenvolvimento da ciência e a contribuição que a certeza da filiação biológica trouxe para que se tornasse, em tese, mais simples todo o processo de investigação paternal, fez com que a socioafetiva se colocasse numa discussão que só poderá ser resolvida quando inseridas as duas possibilidades de reconhecimento na relação de fato, tornando o julgamento deveras subjetivo e induzindo a possíveis divergências no que tange a percepção de direitos hereditários.

A partir destas considerações, formulou-se a seguinte problemática: há de se falar em Direitos Sucessórios advindos do reconhecimento da Paternidade Socioafetiva?

Partiu-se da hipótese que, tendo por conta o princípio da igualdade entre os filhos, independentemente de sua origem de parentalidade, uma vez reconhecida a paternidade, seja o meio que for, far-se-á certa a legitimação sucessória daquele ligado pelo pai (lato senso) por meio de laços afetivos, tãosomente.

Desta forma, como meio de se vislumbrar a realização efetiva da pesquisa e de responder a problemática arguida, dividiu-se a presente monografia em cinco capítulos.

O primeiro diz respeito à introdução, visando a apresentação simplista da matéria e de seu aporte metodológico, que se faz por oportuno.

No segundo capítulo, inicia-se o estudo da filiação, desenvolvendo sua tratativa histórica, acepção dogmática na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e consequente aplicação principiológica da referida Carta Magna nas hodiernas relações parentais.

Por conseguinte, no terceiro capítulo, expõem-se os meios de formação do estado filiativo, seja dentro das relações matrimoniais, apartadamente às de casamento e aqueles advindos por intermédio da adoção, sendo este último colacionado à premissa afetiva das modernas relações em Direito.

No quarto capítulo adentra-se no conceito da socioafetividade propriamente dita, correlacionando-a com os meios de reconhecimento da paternidade, a aplicação da posse do estado de filho para que se legitimem Direitos Parentais, seguido de uma breve análise da vigente Sucessão dos descendentes no Código Civil de 2002 e finalizando com o aporte jurisprudencial que objetiva a visualização prática do que vem sendo aplicado nas decisões dos Tribunais do Sul do país, além do entendimento do Superior Tribunal de Justiça.

Por derradeiro, no quinto capítulo, faz-se a apresentação das devidas conclusões diante de todo o subsídio teórico tomado por base para a efetiva resposta da pergunta problema legitimadora da presente pesquisa, dado o objetivo geral do presente trabalho que é verificar a possibilidade de se falar em Direitos Sucessórios do filho socioafetivo.

Utilizou-se o método dedutivo de abordagem, vez que parte-se de uma premissa geral (a de formação do estado filiativo na atual normativa civil-constitucional) para outra específica (a da legitimação da filiação socioafetiva como perceptora de Direitos Hereditários advindos de seu reconhecimento).

Valeu-seda pesquisa básica, tendo por conta que a meta primordial da presente pesquisa é a busca do saber com o intuito de satisfazer um aprofundamento nos conhecimentos, à atualização doutrinária e jurisprudencial, sem propensão imediata de aplicabilidade prática.

Quanto ao objetivo do tipo de pesquisa, determinou-se a exploratória, tendo por conta o intento de oferecer informações acerca do assunto através do estudo de livros, jurisprudências, artigos científicos, trabalhos monográficos e legislações, utilizando-se da técnica bibliográfica, corroborando no estabelecimento de hipóteses acerca do tema proposto.


2DIREITO DE FILIAÇÃO

Com a justificativa de preservação do que se tinha por núcleo familiar, o legislador infraconstitucional colocava os filhos numa situação que correspondia, literalmente, à discriminação de seu tratamento, tendo por conta sua origem de concepção. À teoria se tinha o sentido de resguardar a família tradicional, o que, em outrora, correspondia ao aceitável na sociedade; na prática, o que se via, era uma tratativa de preservação não da entidade familiar, mas de seu patrimônio, vez que, em se tratando filhos que tenham por origem à diversa da que se habitualmente julgava por moralmente aceito, renegava-se sua legitimidade e, por condição, estes eram colocados a parte dos direitos que os concebidos tradicionalmente.[1]

A premissa acima aduzida corresponde ao que tínhamos na legislação anterior: a filiação, assim como todo o Direito de Família, tinha como preocupação a preservação do patrimônio familiar, não com o sujeito, protagonista da relação jurídica.

Atualmente, a família brasileira tem como extensões àquelas existentes quando da vivência das sociedades romana e germânicas e, ainda, influência direta da Igreja que, com seu Direito Canônico, alcançou e alcança as relações familiares no que tange à compatibilização de direitos, ainda nos dias atuais, mesmo diante daratificação da condição laica do Estado.[2]

Arnaldo Wald[3], quando trata da percepção patriarcal do Direito primitivo brasileiro, que, historicamente, se coloca contemporâneo à nossa vivência, tendo por conta a recente história democrática e desvinculação à Portugal, datada do século passado, aduz que:

O conceito de família independia assim da consanguinidade. O pater famílias exercia a sua autoridade sobre todos os seus descendentes não emancipados, sobre a sua esposa e sobre as mulheres casadas com manuscom seus descendentes

Com a temática assim exposta inicia-se o primeiro capítulo deste trabalho monográfico, que pretende abordar a evolução legislativa do Direito de Filiação, tendo por conta a noção do patriarcado e suas consequências, ante a premissa de existência, além de fazer constar os princípios que temos dispostos constitucionalmente em nosso sistema normativo de direitos.

2.1 HISTORICIDADE DA FILIAÇÃO E SUAS NUANCES DENTRO DO DIREITO DE FAMÍLIA

Dentro da determinação do desenvolvimento familiar há uma espécie de paleontologia social, tendo por conta que sua conceituação, ou a tratativa desta, se dá, aos diversos autores estudioso do assunto, de forma determinada ou mesmo por intermédio de suposições, diante da sua subjetividade evidente em, mesmo nas mais antigas civilizações, corresponder à tendência do estabelecimento de espécies diversas além daquela posta por regra na sociedade.[4]

A impossibilidade de ter uma certeza biológica de ligação, nas mais antigas civilizações, fez com que as sociedades primitivas colocassem a filiação com uma nuance não necessariamente consanguínea.

Historicamente, assinalo a sua presença nos países da civilização mediterrânea, mais precisamente enfocando o Direito Romano, cujos padrões, na descrição de Fustel de Coulanges e Rudolf Von Jhering, procuram assentar a sua tipologia, com base nos princípios da religião doméstica. Filho não era aquele ligado ao pai por laços de consaguinidade (cognatio), porém, o que era apresentado ante o altar doméstico, ao qual se transmitia o culto dos dii lares, de que seria continuador do culto (agnatio).[5]

A conotação afetiva das relações de casamento, que, por regra, anteveem a concepção de linhagem, não era posta por condição nas antigas civilizações. Como exemplo de tal realidade, cite-se a correspondência do casamento de viúvas, sem filhos, com o parente mais próximo do marido; o filho, caso existisse, era considerado filho do suplente de seu pai, ou seja, vê-se aqui, uma relativização do registro, ainda que tácito, ante a modificação da situação paterna do filho.[6]

O casamento era assim obrigatório. Não tinha por fim o prazer; o seu objeto principal não estava na união de dois seres mutuamente simpatizantes um com o outro e querendo associarem-se para a felicidade e para as canseiras da vida. O efeito do casamento, à face das religiões e das leis, estaria na união de dois seres no mesmo culto doméstico, fazendo deles nascer um terceiro, apto para continuador desse culto. [7]

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A base da família na Antiguidade era a crença nos mortos e a noção de imortalidade que a conceituação de linhagem trazia com o estabelecimento da paternidade. Ao se ter um filho, acreditava-se que a imortalidade da figura individual seria uma constante, tendo por significado maior a perpetuação da felicidade familiar, que, em sendo um conceito subjetivo, deve ser vislumbrado ao modelo de família adotado no período retro. Mantendo-se a espécie, mantinha-se o culto o que, por sua vez, trazia a noção da desnecessidade do vínculo genético para o estabelecimento do enlace paterno.[8]

Para se aprofundar conscientemente na instituição da família, há de se conscientizar que sofreu no curso da história sensível alteração estrutural, partindo de que num certo momento compreendia todas as pessoas agrupadas em torno de um chefe comum. Assim se entendia em Roma, onde abrangia todo um conglomerado de pessoas, incluídos os servos (famuli, donde a palavra família) e não apenas o que em linguagem moderna representa as pessoas ligadas pelo parentesco, no sentido estrito de cultores das homenagens aos antepassados (penates), descrita com exatidão por Fustel de Coulanges.[9]

Via-se no Direito Romano a figura do pater famílias queexercia sobre os filhos um direito de vida e de morte, tendo por conta a assertiva da subordinação que eles tinham para com a figura paterna. Na mesma premissa estava a mulher, quando colocada, hierarquicamente, abaixo do marido, tendo que se submeter às vontades daquele que era designado chefe de família.[10]

Carlos Roberto Gonçalves explica que:

Com o tempo, a severidade das regras foi atenuada, conhecendo os romanos o casamento sinemanu, sendo que as necessidades militares estimularam a criação de patrimônio independente para os filhos. Com o Imperador Constantino, a partir do século IV, instala-se no Direito Romano a concepção cristã de família, na qual predominam as preocupações de ordem cristã da família, na qual predominam as preocupações de ordem moral. Aos poucos foi então a família romana evoluindo no sentido de se restringir progressivamente a autoridade do pater, dando-se maior autonomia à mulher e aos filhos, passando estes a administrar os pecúlios castrenses (vencimentos militares).[11]

NoDireito Canônico, o matrimônio era visto de forma sacralizada, com características indissolúveis. A noção de que Deus uniria e o Homem seria incapaz de separar denotava e externava o viés psicológico a que a religião se utilizava para motivar os que, objetivamente e sem opções, a seguiam. Tinha-se, à época, uma mistura entre o Estado, que não era laico, e a Igreja, que se colocava na sociedade como norteadora jurídica.[12]

Na Idade Média, as relações familiares, pela influência direta da Igreja Católica no mundo conhecido, eram correspondidas regraticamente pelo Direito Canônico. Não só nas relações formativas de Direito de Família é que podemos citar a correspondência do Direito Canônico nas relações jurídicas gerais dos Estados, mas também nas que envolviam o patrimônio deste. Cite-se também a crescente importância das regras de origem germânica neste diapasão.[13]

Foi gradual e progressiva a construção de família que se aproxima a que conhecemos, ao ponto de se tornar um dos mais (se não o mais) importantes institutos sociais.

Pode-se notar, tal como leciona Nadaud, que “pouco a pouco a família romana e a família medieval se unem na noção de vida conjugal – o casamento como consortium vitae – e filiação, sendo de importância máxima o elo que os une. É assim que altera-se a forma dessa família, mudança paralela às profundas mutações da sociedade: a família tende a ser cada vez mais concebida como o centro da estrutura da sociedade, e, desta forma, o lugar onde se exerce o poder”.[14]

A noção de família, dentro das relações jurídicas sofreu (e sofre), ao longo dos séculos, mutações tanto estruturais quando preceituais, sendo esta última ensejadora da primeira. A retirada do conceito da “indissolubilidade do casamento” dentre as características daquele posto oficialmente na sociedade corresponde à evolução das relações humanas, principalmente no que diz respeito à evolução do próprio ser humano.

Podemos dizer que a família brasileira, como hoje é conceituada, sofreu influência da família romana, da família canônica e da família germânica. É notório que o nosso Direito de Família foi fortemente influenciado pelo direito canônico, como consequência, principalmente da colonização lusa. As Ordenações Filipinas foram a principal fonte e traziam a forte influência do aludido direito, que atingiu o direito pátrio. No que tange aos impedimentos matrimoniais, por exemplo, o Código Civil de 1916 seguiu a linha do direito canônico, preferindo mencionar as condições de invalidade.[15]

Tem-se certo que na ordenação civil brasileira de 1916 o direito de reconhecimento da filiação, e suas consequências jurídicas, já estava presente, ainda que com algumas restrições.

Mas foi somente com o advento da atual Carta Magna que se viu adentrar em nosso sistema jurídico-normativo princípios familiares de Direito que, além de retirar a discriminação entre filhos de diferentes espécies, trouxe à tona questões que subjetivaram o respaldo necessário para que fosse designado o vínculo jurídico-paternal, socializando o Direito de Família.[16]

Desse modo, diante do reconhecimento da inadequação do tratamento legal a respeito do tema envolvendo o estabelecimento e os efeitos da filiação, o direito brasileiro promoveu, paulatinamente no curso do século XX, mudanças, a princípio parciais e pontuais, até o advento da Constituição de 1988, que estabeleceu a plena igualdade dos filhos, independentemente do tipo de vínculo existente entre seus pais e da origem de parentalidade.[17]

De forma primeira, quando levamos em consideração a base familiar adentrada nas relações de filiação, viu-se o estabelecimento do patriarcado e da discriminação entre as diferentes espécies de filho, sendo considerado legítimo tão-somente aquele que, por presunção legal mediante declaração de vontade do intitulado pai, era colocado como geneticamente ligado a este – na verdade, diante da ausência de possibilidade de comprovação médica de condição, o vínculo genético era legalmente atrelado à realidade registral.[18]

Somente mediante a ascensão da atual Constituição, que modernizou o Direito de Família e reiterou o sentido social da lei, foi que o correspondido pela verdade real às diferentes espécies de filho pôde se ver adentrado na realidade jurídica das famílias, não havendo mais a conotação da ilegitimidade, seja qual for.[19]

Também foi gradual e vagarosa a evolução dos direitos dos filhos ditos ilegítimos (expressão hoje proibida em documentos oficiais). Como todos sabem, no sistema anterior à CF de 1988, os filhos se classificavam em legítimos, legitimados e ilegítimos. Estes, por sua vez, se desdobravam em naturais e espúrios. Os últimos, em adulterinos e incestuosos. Esta classificação foi derrubada desde 1988, pois é total a igualdade jurídica entre os filhos. Se hoje uma classificação dos filhos é admitida, para fins didáticos, apenas se pode falar em filhos matrimoniais e extramatrimoniais; mesmo esta dicotomia, bem a rigor, é falha, pois o filho extramatrimonial é um suposto filho, até ser reconhecido, voluntária ou judicialmente, e, quando o for, será absolutamente igual aos demais.[20]

Assim, com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, viu-se a legitimação daquilo que em anos se teve por evolução, diante da imensa modificação da base familiar, tendo por conta a implicação nos filhos da pluralidade de espécies de família existentes no atual sistema jurídico. O Direito se viu adaptado à realidade fática das famílias, contribuindo para que fosse, a legislação retro, denominada “cidadã”, tal como veremos no tópico seguinte.

2.2 A ADAPTABILIDADE DO DIREITO E O ADVENTO DA CONSTITUIÇÃO CIDADÃ

Os paradigmas que permanecem no ordenamento jurídico tendem a desaparecer e o emolduramento do Direito casuístico diante das novas perspectivas de vivência torna-se uma constante, tendo por conta a subjetividade e necessidade de se ter um tutelamento mais justo e eficaz, ao âmbito de se ter satisfeita a função reguladora do direito material posto em debate.

É recente a igualdade de condições e de tratamento entre os filhos, mesmo em havendo a certeza de filiação entre este e o designado pai. O fato de um indivíduo ter nascido fora do casamento o colocava em desigual condição, quando comparado àquele que fora posto dentro de uma relação matrimonial: o que se via era a prevalência dos interesses da instituição matrimônio. Nesta senda, por exemplo, se o pai traísse sua esposa (o que era considerado crime), o filho nascente desta relação era excluso dos direitos de filiação que lhe eram inerentes, pelo simples fato de não ter nascido da relação oficial deste: era uma espécie de punição ao filho, mesmo sendo fato exclusivo de terceiro, neste caso seu pai.[21]

O Código Civil de 1916 e as leis posteriores, vigentes no século passado, regulavam a família constituída unicamente pelo casamento, de modelo patriarcal e hierarquizada, como foi dito, ao passo que o moderno enfoque pelo qual é identificada tem indicado novos elementos que compõem as relações familiares, destacando-se os vínculos afetivos que norteiam a sua formação. Nessa linha, a família socioafetiva vem sendo priorizada em nossa doutrina e jurisprudência. [22]

Com a absorção da transformação tida necessária, a Constituição Federal de 1988 priorizou a dignidade da pessoa humana e se alicerçou em três eixos básicos, sendo eles: a pluralidade dos entes familiares; a igualdade entre os filhos, independente de sua origem de parentalidade e a igualdade entre os cônjuges, fazendo com que houvesse a derrogação de uma centena de artigos do Código Civil de 1916.[23]

Antes, porém, houve uma gradativa modificação conceitual ao ponto das transformações da sociedade, ainda que de forma singela, mas que contribuíram para mostrar o quanto esta ensejava uma maior correspondência da norma legislativa para com o que ocorrera na prática. Com relação especificamente aos conceitos da filiação, base da discussão a que tomamos por evidente ao momento, cita Maria Berenice Dias:

O advento de duas leis, nos anos de 1942[24] e 1949[25], autorizou o reconhecimento do filho havido fora do matrimônio, mas somente após a dissolução do casamento do genitor. O máximo a que chegou o legislador foi conceder o direito de investigar a paternidade para o fim único de se buscar alimentos, tramitando a ação em segredo de justiça. Ainda assim, tais filhos eram registrados como filhos ilegítimos e só tinham direito, a título de amparo social, à metade da herança que viesse a receber o filho legítimo ou legitimado. A proibição de reconhecimento dos filhos ilegítimos foi alvo de progressivos abrandamentos e só veio a ser expressamente afastada no ano de 1989.[26]

Uma das características da aplicação da Constituição de 1988 em nosso cotidiano diz respeito à nova intenção do legislador que, com o acatamento de normas trazidas com recomendações de órgãos internacionais, trouxe o sentido da igualdade de condições entre os indivíduos da sociedade, quando colocados numa mesma característica de vivência. Há uma transcendência na eficácia da norma, o que significa dizer que qualquer outra hierarquicamente abaixo desta que, em seu conteúdo, contiver ação de desigualdade, será sumariamente não recepcionada pela incompatibilidade de valores para com o proclamado na norma suprema. [27]

O princípio da igualdade consagrado pela constituição opera em dois planos distintos. De uma parte, frente ao legislador ou ao próprio executivo, na edição, respectivamente, de leis, atos normativos e medidas provisórias, impedindo que possam criar tratamentos abusivamente diferenciados a pessoas que encontram-se em situações idênticas. Em outro plano, na obrigatoriedade ao intérprete, basicamente, a autoridade pública, de aplicar a lei e atos normativos de maneira igualitária, sem estabelecimento de diferenciações em razão de sexo, religião, convicções filosóficas ou políticas, raça, classe social.[28]

Neste mesmo sentido, Paulo Bonavides:

A Constituição de 1988 é basicamente em muitas de suas dimensões essenciais uma Constituição do Estado social. Portanto, os problemas constitucionais referentes a relação de poderes e exercício de direitos subjetivos têm que ser examinados e resolvidos à luz dos conceitos derivados daquela modalidade de ordenamento. Uma coisa é a Constituição do Estado liberal, outra a Constituição do Estado social. A primeira é uma Constituição anti-governo e anti-Estado; a segunda uma constituição de valores refratários ao individualismo no Direito e ao absolutismo no Poder.[29]

Com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que determinou a igualdade de condições entre os filhos, seja qual for sua origem de parentalidade, o legislador preocupou-se, mesmo com a não recepção do artigo 358 do Código Civil de 1916, onde classificava os filhos em diferentes espécies de acordo com sua origem de concepção, em revoga-lo expressamente, com o artigo 1ºda Lei 7.841[30], de 17-10-1989.[31]

Fechando-se contra “ataques” externos, a família atual ganha, no seu cotidiano, razão suficiente para não aceitar a introdução, em seu meio, de fatores que possam leva-la à destruição. A afetividade, traduzida no respeito de cada um por si e por todos os membros – a fim de que a família seja respeitada em sua dignidade e honorabilidade perante o corpo social – é, sem dúvida nenhuma, uma das maiores características da família atual.[32]

Vê-se, na aplicada legislação pátria, uma preocupação não com o patrimônio, mas com a preservação da ágama familiar, vez que a Carta Magna colocou que, em contraponto a igualdade entre os filhos e a impossibilidade de se haver qualquer ato discriminatório entre estes, háo dever dos maiores em ajudar e amparar os pais na velhice, carência e/ou enfermidade, o que salienta, ainda mais, a noção social na nova constituinte.[33]

A Constituição Federal de 1988 espelhou a ânsia da sociedade brasileira pela normalização democrática e pela conquista do Estado Democrático de Direito, baseando-se na experiência constitucional europeia, em que o predomínio social encontra evidência, uma vez que ocupa papel de destaque o respeito aos valores mais elevados da natureza humana. [34]

A família, antes codificada, era, de acordo com os ensinamentos de Luiz Edson Fachin[35], definida como matrimonializada, patriarcal, hierarquizada e com feição impessoal; já com o advento da Constituição de 1988, tornou-se certo outro ponto do Direito de Família, tornando-o menos abrangente ao ponto de restringi-lo a regras fechadas, dadas as nuances gerais do disposto constitucionalmente, normas estas limitadoras ao poder infraconstitucional, vez estabelecidos os princípios que nortearão as relações gerais de Família, mais especificamente àqueles quando de sua formação e, por consequência, os adstritos aos elementos da filiação.

A Constituição de 1988 chamou para si o papel de lei fundamental da família, até então ocupado pelo Código Civil e por algumas leis esparsas responsáveis por um processo de migração do direito familiar. O texto constitucional sintoniza com a nova ordem jurídica que repugna dogmas do passado, como por exemplo, o fato de só poder ser legítimo o casamento civil; também a ideia absurda de inferioridade jurídica da mulher; desigualdade de tratamento dos filhos, além da antiga conveniência de marginalizar o concubinato, numa outra amostra de prevalência dos valores materiais sobre a importância da pessoa. [36]

Tendo certa a noção social trazida com a Constituição de 1988, e em sendo esta denominada cidadã, pelo seu conteúdo normativodiante da aplicação de princípios voltados para o social nas relações dos indivíduos que compõem o Estado de Direito, visualizemos de forma específica, por conseguinte, aqueles voltados ao Direito de Filiação.

2.3 A PRINCIPIOLOGIA CONSTITUCIONAL APLICADA À FILIAÇÃO

A noção de filiação dentro do contexto amplo da família sofreu, ao longo dos séculos, uma gradativa modificação, a ponto de o legislador colocar, cada vez mais, a subjetividade na sua formação tendo por conta os anseios sociais trazidos com a relativização constante de conceitos restritos de tal instituto.[37]

Com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, o Direito aproximou-se das relações sociais, deixando de se fazer constante seu caráter meramente político, abordando também direitos individuais e de cunho social, afirmando a formação de uma “nova e fecunda teoria constitucional”.[38]

Uma questão que devemos ter bastante clara na análise da Constituição Federal de 1988, no que se refere à família, é que ela apenas reconheceu a aevolução que já estava latente na sociedade brasileira. Não foi a partir dela que a mudança na família brasileira ocorreu. Constitucionalizaram-se valores que estavam impregnados e disseminados no seio da sociedade. Dos fatos e valores caminhou-se para as normas, tardiamente, é verdade. O texto constitucional de 1988 contemplou e abrigou uma evolução fática anterior da família e do Direito de Família que estava represado na doutrina e na jurisprudência. A Constituição de 1988, estimulada pela emenda Nelson Carneiro, mostrou que esses novos valores já conhecidos na sociedade não iriam causar trauma algum à nação. Albergou-se no plano constitucional o que já se tinha desenvolvido no plano sociológico da família.[39]

Paulo Bonavides[40] nos coloca a formação da constitucionalização dos princípios em duas fases: a programática e a não programática, que tem concepção objetiva. “Nesta última, a normatividade constitucional dos princípios ocupa um espaço onde releva de imediato a sua dimensão objetiva e concretizadora, a positividade de sua aplicação direta e imediata.”

Explica ainda que há uma espécie de peregrinação normativa da efetiva aplicação de princípios, que tiveram por origem na formação nos Códigos, acabando nas Constituições, tendo por fundamento a sua correspondência àqueles gerais de Direito. [41]

Assim, havendo a aplicada Constituição de estabelecer normas gerais de Direito que tutelem conceitos amplos de origem/respaldo social, tais como os de família, se coloca a aplicação prática dos princípios, constituindo “proposições genéricas que servem de substrato para a organização de um ordenamento jurídico”[42].

Os princípios são normas jurídicas que se distinguem das regras não só porque tem alto grau de generalidade, mas também por serem mandatos de otimização. Possuem um colorido axiológico mais acentuado que as regras, desvelando mais nitidamente os valores jurídicos e políticos que condensam. Devem ter conteúdo de validade universal. Consagram valores generalizantes e servem para balizar todas as regras, as quais não podem afrontar as diretrizes contidas nos princípios. [43]

À prática da feitura do texto constitucional, aduz Caio Mário da Silva Pereira que:

No âmbito do debate que envolve a constitucionalização do Direito Civil, mencione-se ainda o §1º do art. 5º do Texto Constitucional, que declara que as normas definidoras dos direitos e das garantias fundamentais têm aplicação imediata. Considero, no entanto, que não obstante preceito tão enfaticamente estabelecido, ainda assim, algumas daquelas normas exigem a elaboração de instrumentos adequados à sua fiel efetivação.[44]

Segundo o mesmo autor, os institutos citados são condicionados,em alguns casos, a mecanismos outros além dos princípios jurídicos constitucionais, dizendo respeito à seara processual,compondo a subjetividade do Direito.

[...] o direito subjetivo como faculdade de querer, porém dirigida a determinado fim. O poder abstrato é incompleto, desfigurado. Corporifica-se no instante em que o elemento volitivo encontra uma finalidade prática de atuação. Esta finalidade é o interesse de agir. [45]

Tendo grande relevância a aplicação dos princípios à norma infraconstitucional posta, não deixando de perceber a própria normatização social dentro da Carta Maior, a juridicidade prática principiológicafaz com que o trabalho do intérprete do caso concreto leve em conta não só a feitura seca do texto legislativo, mas que se atenha, também, a valores e interesses abarcados nesta premissa.[46]

Daí a necessidade de revisitar os institutos de direito das famílias, adequando suas estruturas e conteúdo à legislação constitucional, funcionalizando-os para que se prestem à afirmação dos valores mais significativos da ordem jurídica. Assim, cabe trazer alguns dos princípios norteadores do direito das famílias, ainda que não se pretenda delimitar números nem esgotar seu elenco. [47]

Dentro dessa principiologia familiar, destaca-se a presença de uma que serve de base para todas as outras, tal seja, a dignidade da pessoa humana. Sendo esta objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, conforme preconiza o artigo 1º, III, da referida legislação, a preservação da dignidade humana atua em todas as vertentes do sistema normativo-jurídico, havendo de ser observado tanto nas relações públicas quanto nas privadas.[48]

Assim, as relações jurídicas privadas familiares devem sempre se orientar pela proteção da vida e da integridade biopsíquica dos membros da família, consubstanciada no respeito e asseguramento dos seus direitos de personalidade.[49]

Falar de Dignidade da Pessoa Humana é falar do “mais universal de todos os princípios”. Nos dizeres de Maria Berenice Dias[50]é um macroprincípio do qual se irradiam todos os demais: liberdade, autonomia privada, cidadania, igualdade e solidariedade, uma coleção de princípios éticos.

A Constituição Federal de 1988 ao fixar a dignidade da pessoa humana como princípio central do Estado, jurisdicizando o valor humanista, disciplinou a matéria ao longo do texto através de um conjunto de princípios, subprincípios e regras, que procuram concretizá-lo evidenciando os efeitos que deste devem ser extraídos. [51]

Carlos Roberto Gonçalves classifica o Direito de Família como “o mais humano de todos os ramos do Direito”. A assertiva se dá pela correspondência da “evolução do conhecimento científico, dos movimentos políticos e sociais do século XX e o fenômeno da globalização” que “provocaram mudanças profundas na estrutura da família e nos ordenamentos jurídicos de todo o mundo.”[52]

Enfatiza Rodrigo da Cunha Pereira:

Todas essas mudanças trouxeram novos ideais, provocaram um ‘declínio do patriarquismo’ e lançaram bases de sustentação e compreensão dos Direitos Humanos, a partir da noção da dignidade da pessoa humana, hoje insculpida em quase todas as constituições democráticas. [53]

A crise instada ao instituto familiar inexiste, segundo Maria Helena Diniz, e dá a impressão de efetividade pelas maçantes transformações a que se passa, tendo por conta a ‘despatriarcalização’ do ordenamento jurídico-familiar.[54]A dignidade da pessoa humana como base para a formação da atual República denota e reitera o viés social a que nos submetemos à moderna constituinte.

Dentro da premeditação social da norma, adentremos num dos pilares da presente nuance fática da filiação dentro do ordenamento: a da igualdade entre os filhos, independentemente da sua origem de parentalidade.

Dispõe o art. 227, § 6º da Constituição da República Federativa do Brasil: que “os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”[55]

Até o advento da aplicada Codificação Civil, datada do ano de 2002, havia a inaplicação expressa do disposto quando da classificação filiativa, porquanto o que colocava-se em evidência quando da existência do artigo 358 do Código Civil de 1916[56], que aduz a impossibilidade de reconhecimento dos filhos incestuosos e adulterinos.

A partir dessas ideias vale afirmar que todo e qualquer filho gozará dos mesmos direitos e proteção, seja em nível patrimonial, seja mesmo na esfera pessoal. Com isso, todos os dispositivos legais que, de algum modo, direta ou indiretamente, determine tratamento discriminatório entre os filhos terão de ser repelido do sistema jurídico. [57]

Com a promulgação do Código Civil de 2002, viu-se a reiteração do disposto constitucionalmente na legislação infra. Tal disposição encontra guarida aos artigos 1.596 a 1.629, dos capítulos que tratam da filiação, do reconhecimento dos filhos e da adoção.[58]

Por fim, não menos importante, reitera-se o conteúdo do princípio da solidariedade familiar, com expressão ratificada pelos artigos 3º, I e 229, da Constituição da República Federativa do Brasil, dando por conta a “superação do individualismo jurídico e busca a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a qual se origina nos vínculos de afetividade que marcam as relações familiares, abrangendo os conceitos de fraternidade e reciprocidade”.[59]

Indica a solidariedade como um vínculo de sentimentos que concorrem para a realização do indivíduo e o desenvolvimento de sua personalidade. No núcleo familiar, evidenciam-se os deveres de mútua assistência entre os cônjuges, de proteção da criança e do adolescente (A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança inclui a solidariedade entre os seus princípios, presente também no Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 4º) e amparo aos idosos, previstos nos artigos 226 a 230 da Constituição Federal.[60]

O princípio da solidariedade familiar encontra respaldo noutro princípio constitucional, tal seja o da solidariedade social. Há dois aspectos a que devem ser vislumbrados: o externo, quando desemboca no Poder Público o ônus de garantir a aplicabilidade de seu preceito e o interno, que diz respeito à constrição de políticas de atendimento por parte da sociedade civil diante da disposição pelo Estado de medidas que atendam às necessidades familiares dos “menos abastados e dos marginalizados”.[61]

Logicamente, a solidariedade familiar é construída sob valores traçados pelos ascendentes em favor dos descendentes. E, estes, por seu turno, acabarão por trilhar caminho parecido aquele que lhes foi ensinado. Muito embora o parâmetro de solidariedade interna sofra uma oscilação de uma entidade familiar para outra em virtude dos padrões culturais vigentes e da procedência de cada entidade, há um mínimo a ser preservado: os direitos personalíssimos de cada integrante da família, sua subsistência e a concessão de auxílio para que se possa ter a oportunidade de se atingir o nível de desenvolvimento esperado pelo interessado. Enfim, a assistência material e imaterial entre os membros da entidade familiar devem sempre se fazer presentes nas relações jurídicas existentes. [62]

A aplicação do princípio retro torna evidente a existência intrínseca doutro, tal seja, o da afetividade.

Mesmo que a Constituição tenha enlaçado o afeto no âmbito de sua proteção, a palavra afeto não está no texto constitucional. Ao serem reconhecidas como entidade familiar merecedora da tutela jurídica as uniões estáveis, que se constituem sem o selo do casamento, tal significa que o afeto, que une e enlaça duas pessoas, adquiriu reconhecimento e inserção no sistema jurídico. Houve a constitucionalização de um modelo de família eudemonista e igualitário, com maior espaço para o afeto e a realização individual.[63]

Imperiosa se faz a citação da existência doutros princípios constitucionais aplicáveis ao Direito de Família, que aparecem na doutrina de acordo com a corrente adotada pelo doutrinador a que se pese. Ademais, procurou-se abordar, no presente trabalho monográfico, aqueles que têm ligação direta com o Direito Filiativo, e que contribuem diretamente para a construção lógica da seara argumentativa deste.

Assim, conclui-se que havendo a igualdade entre filhos, destacando o sentido social da aplicada Constituição, subsiste a obrigação posterior em compatibilizar o cuidado destes para com os que lhe educaram o que, por sua vez, deve ser respaldado na afetividade, no sentido de buscar o elo maior que os une, o estado de filiação, tal como veremos com criteriosa especificidade no capítulo seguinte, quando trataremos das espécies existentes em nosso ordenamento jurídico.

Sobre o autor
Daniel Gilson Barcelos

Graduando em Direito - Universidade do Sul de Santa Catarina

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARCELOS, Daniel Gilson. A formação do estado filiativo na socioafetividade e o direito sucessório por sua decorrência . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3498, 28 jan. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23563. Acesso em: 25 dez. 2024.

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