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Eficiência do gasto público.

Aplicação do modelo balanced scorecard para geração de lucro social

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Agenda 19/03/2013 às 17:34

A partir da visão integrada da metodologia Balanced Scorecard, a busca pelo lucro social passa a permear a rotina do setor público, aprimoramento a gestão dos recursos arrecadados junto à população em termos de eficácia, eficiência e efetividade.

Resumo: O modelo Balanced Scorecard (BSC), ferramenta desenvolvida por Robert S. Kaplan e David P. Norton, por meio de apenas 4 (quatro) perspectivas (financeira, dos clientes, dos negócios internos e do aprendizado e inovação), oferece aos gestores públicos, parâmetros para uma avaliação rápida e objetiva da qualidade dos gastos estatais, em consonância com os princípios constitucionais da eficiência (artigo 37, caput) e da economicidade (artigo 70, caput).

Palavras-chave: Balanced Scorecard (BSC), perspectiva financeira, perspectiva dos clientes (cidadãos), perspectiva dos negócios internos (procedimentos administrativos), perspectiva do aprendizado e da inovação, avaliação de desempenho.


1. Introdução

Até o início da década de 1990, os indicadores para mensuração de desempenho na iniciativa privada baseavam-se em medidas como o retorno sobre o investimento (ROI) e o retorno sobre o patrimônio líquido (ROE). Ocorre que o lucro realizado não era garantia de aumento de valor para o acionista. Nesse contexto, a geração de valor ao acionista, baseando-se em conceitos como resultado econômico e custo de oportunidade, passou a ser o indicador de mensuração de desempenho da gestão empresarial, a partir do cálculo do valor econômico agregado – EVA e do valor de mercado agregado – MVA, entre outros. A partir da criação ou destruição de valor ao acionista, executivos são premiados ou demitidos.

Durante muito tempo, o gasto público brasileiro foi discutido em termos quantitativos. Tanto é que a Constituição Federal vinculou parte da receita de impostos dos entes federativos em gastos com o ensino (artigo 212) e com a saúde (artigos 196 a 200). Hoje, o gasto brasileiro com educação é em torno de 5% do PIB1, pouco abaixo da média dos países da OCDE (6,2%)2, mas acima de países como Itália e República Eslovaca. Ainda assim, segundo o Relatório de Monitoramento de Educação para Todos em 2010, da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), a qualidade da educação brasileira é baixa, apresentando o maior índice de repetência da América Latina e o segundo maior índice em termos de abandono escolar no continente3.

Nesta marcha, após o equilíbrio orçamentário-financeiro das contas nacionais por meio da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Federal 101/2000), a discussão transmutou-se da quantidade para a qualidade do gasto público, em busca de maneiras pelas quais a aplicação do dinheiro arrecadado dos cidadãos possa ser verificada em termos de eficácia, eficiência e efetividade (artigos 37 e 70 da Constituição Federal).

Segundo magistério de Alexandre de Moraes4, “o princípio da eficiência é o que impõe à administração pública direta e indireta e a seus agentes a persecução do bem comum, por meio do exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, participativa, eficaz, sem burocracia e sempre em busca da qualidade, rimando pela adoção dos critérios legais e morais necessários para melhor utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitarem-se desperdícios e garantir-se maior rentabilidade social“. (grifo nosso)

O aperfeiçoamento da legislação de regência, a instrumentalização do controle social, a modernização dos órgãos de controle e a criação de indicadores de desempenho têm contribuído para mensuração da qualidade dos dispêndios estatais.

A partir da integração e da adaptação dos indicadores econômico-financeiros, sociais e qualitativos existentes, aplicando-se o modelo de análise estratégica do Balanced Scorecard (BSC), conceito desenvolvido por Robert S. Kaplan e David P. Norton, o objetivo deste trabalho é propor uma nova abordagem em relação ao gasto público, visando a qualidade e o atendimento dos legítimos anseios da população brasileira, respeitando-se a legislação de regência. A metodologia Balanced Scorecard, por meio de apenas 4 (quatro) perspectivas (financeira, dos clientes, dos negócios internos e do aprendizado e inovação), poderá oferecer aos gestores públicos, de maneira clara e objetiva, parâmetros para gastos mais efetivos, eficientes e eficazes.

Assim sendo, o presente trabalho estrutura-se nos seguintes tópicos: 1 abordagem das atuais ferramentas de mensuração da quantidade e qualidade dos gastos públicos; 3 apresentação dos principais conceitos do Balanced Scorecard; 4 integração dos indicadores existentes no setor público por meio da metodologia BSC; 5 conclusão.

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2. Atuais ferramentas de mensuração dos gastos públicos

A inclusão de um determinado pleito ou necessidade social na agenda governamental inicia o ciclo de políticas públicas. A seleção de alternativas para o enfrentamento das questões suscitadas direcionará o gasto público.

Neste contexto, o ordenamento jurídico vigente estabeleceu uma série de controles quantitativos, qualitativos e sociais com o objetivo de compatibilizar os gastos estatais com o interesse público:

  1. ciclo orçamentário;

  2. controle social;

  3. modernização do controle externo;

  4. reordenamento da contabilidade aplicada ao setor público;

  5. indicadores de quantidade;

  6. indicadores de qualidade.

2.1. Ciclo Orçamentário

Em termos orçamentários, as políticas públicas são traduzidas nas peças orçamentárias, cuja previsão legal remonta a Lei Federal 4320/64, tendo a Constituição Federal e a Lei de Responsabilidade Fiscal incluído novos anexos, demonstrativos e parâmetros mínimos para sua elaboração. São elas: o Plano Plurianual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a Lei Orçamentária Anual. As peças orçamentárias devem ser complementares e interrelacionadas, estabelecendo indicadores físicos e financeiros para avaliação do desempenho dos programas, das atividades e dos projetos estabelecidos no planejamento. Há também a existência de planos setoriais relativos a urbanismo, a saneamento básico, a educação e a saúde, entre outros, os quais serão instrumentalizados a partir das dotações orçamentárias contidas na tríade orçamentária (PPA, LDO e LOA).

O ciclo orçamentário pode ser resumido conforme abaixo:

O processo orçamentário é dinâmico, podendo sofrer alterações ao longo da execução do exercício, desde que observadas as cautelas legais. As etapas do gasto público envolvem os Poderes Executivo (elaboração, execução e avaliação), Legislativo (discussão, aprovação e avaliação) e a sociedade (discussão e avaliação).

2.2. Controle Social

A transparência e a publicidade, instrumentos do controle social, permeiam o ciclo orçamentário, nos termos da legislação vigente:

DISCUSSÃO
AVALIAÇÃO

2.3. Modernização do Controle Externo

Além da instrumentalização do controle social, os órgãos de controle externo passam por um processo de modernização e de fortalecimento. Nos termos dos artigos 31 e 70 da Constituição Federal, o Poder Legislativo fiscaliza (avalia) o Poder Executivo com auxílio dos Tribunais de Contas, nas respectivas esferas federativas5. Durante muito tempo, o foco das fiscalizações do controle externo foi voltado exclusivamente para a legalidade dos atos e dos fatos administrativos, privilegiando o controle quantitativo e formal da despesa. As análises dos fiscais voltavam-se muito mais para a validação dos montantes aplicados pelos entes federativos do que para a qualidade dos gastos públicos. Eis a auditoria legal ou de conformidade.

A partir da década de 1990, o Tribunal de Contas da União iniciou a implantação de novo modelo de verificação, a chamada auditoria operacional, que tem por escopo “o exame independente e objetivo da economicidade, eficiência, eficácia e efetividade de organizações, programas e atividades governamentais, com a finalidade de promover o aperfeiçoamento da gestão pública”6. Hoje, esse modelo difundiu-se aos tribunais de contas dos demais entes federativos, fornecendo resultados alentadores em termos de controle de qualidade e quantidade de despesa. O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, por exemplo, tem aplicado o modelo de auditoria operacional para análise da efetividade dos programas do Governo Paulista7 e iniciou o processo de implantação para os demais municípios jurisdicionados8.

Destaque-se, ainda, o Programa de Modernização do Sistema de Controle Externo dos Estados e Municípios Brasileiros (PROMOEX), financiado com recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), para o aperfeiçoamento dos tribunais de contas brasileiros, objetivando a maior integração entre os referidos órgãos e a padronização de procedimentos, conforme citamos a seguir9:

2.4. Reordenamento da Contabilidade Aplicada ao Setor Público (CASP)

A evolução do controle social e dos órgãos de controle externo foi acompanhada pelo reordenamento da contabilidade aplicada ao setor público. A partir da publicação do Decreto Federal n° 6.976, de 7 de outubro de 2009, bem assim das portarias da Secretaria do Tesouro Nacional, o foco da CASP foi direcionado para o controle do patrimônio público, deflagrando adaptações nos demonstrativos contábeis existentes (Balanço Orçamentário, Balanço Financeiro, Balanço Patrimonial e Demonstração das Variações Patrimoniais), criação de novas peças contábeis (Demonstrativo do Fluxo de Caixa, Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido e Demonstrativo do Resultado Econômico), valorização das notas explicativas e normas para consolidação dos balanços públicos. Esse reordenamento tem por escopo aperfeiçoar a transparência das informações contábil-financeiras do setor público, visando a já comentada instrumentalização do controle social. Eis as normas brasileiras aplicadas ao setor público (NBCAP, NBC T SP ou NBC T 16), resumidas a seguir:

Número

Ementa

NBC T 16.1

CONCEITUAÇÃO, OBJETO E CAMPO DE APLICAÇÃO

NBC T 16.2

PATRIMÔNIO E SISTEMAS CONTÁBEIS

NBC T 16.3

PLANEJAMENTO E SEUS INSTRUMENTOS SOB O ENFOQUE CONTÁBIL

NBC T 16.4

TRANSAÇÕES NO SETOR PÚBLICO

NBC T 16.5

REGISTRO CONTÁBIL

NBC T 16.6

DEMONSTRAÇÕES CONTÁBEIS

NBC T 16.7

CONSOLIDAÇÃO DAS DEMONSTRAÇÕES CONTÁBEIS

NBC T 16.8

CONTROLE INTERNO

NBC T 16.9

DEPRECIAÇÃO, AMORTIZAÇÃO E EXAUSTÃO

NBC T 16.10

AVALIAÇÃO E MENSURAÇÃO DE ATIVOS E PASSIVOS EM ENTIDADES DO SETOR PÚBLICO

NBC T 16.11

SISTEMA DE INFORMAÇÃO DE CUSTOS DO SETOR PÚBLICO

Fonte: Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público – 4ª edição

2.5. Indicadores de Quantidade

O ordenamento jurídico brasileiro estabeleceu uma série de limites quantitativos em relação à execução orçamentária dos entes federativos, entre os quais, destacamos:

2.6. Indicadores de Qualidade

Uma vez que a destinação de recursos a áreas consideradas críticas estava assegurada, criou-se a necessidade de avaliar a qualidade com que os gastos públicos estavam sendo executados.

O Ministério da Educação e da Cultura, no contexto do Plano de Desenvolvimento da Educação, criou o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), para medir a qualidade de cada escola e de cada rede de ensino. De acordo com o MEC10, o indicador é calculado com base no desempenho do estudante em avaliações do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) e em taxas de aprovação11. Assim, para que o IDEB de uma escola ou rede cresça é preciso que o aluno aprenda, não repita o ano e frequente a sala de aula. O índice é medido a cada dois anos e o objetivo é que o País, a partir do alcance das metas municipais e estaduais, tenha nota 6 (seis) em 2022 – correspondente à qualidade do ensino em países desenvolvidos. De maneira análoga, há indicadores para avaliação do Ensino Médio (ENEM) e do Ensino Superior (SINAES).

O Ministério da Saúde, por meio do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS), franqueia uma série de indicadores e dados básicos da saúde brasileira (IDB). De acordo com o DATASUS12, O IDB é composto por um conjunto de mais de 100 indicadores, divididos em 7 (sete) grupos: demográficos, socioeconômicos, mortalidade, morbidade, fatores de risco e de proteção, recursos e cobertura. São desdobrados segundo as unidades da federação, suas capitais e regiões metropolitanas, podendo ser categorizadas também por faixa etária, sexo ou outras características, de acordo com o indicador. Ainda sobre a saúde pública, o Governo Brasileiro iniciou, em 2012, pesquisa inédita com os usuários do Sistema Único de Saúde para avaliação da qualidade dos serviços prestados pela rede pública. O usuário poderá opinar sobre a instalação do hospital, o atendimento prestado pelos médicos e enfermeiros e se recomendaria o hospital a um amigo ou parente. Os critérios de avaliação são: muito bom, bom, regular, ruim a muito ruim. O questionário pode ser respondido pelo paciente ou algum membro da família13.

No âmbito do Estado de São Paulo, destacamos a existência de endereço eletrônico, mantido pela Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE)14, onde se apresenta o diagnóstico dos municípios paulistas em termos de território e população; estatísticas vitais de saúde; educação; condições de vida da população; habitação e infraestrutura urbana; emprego e economia. Demais disso, em maio de 2008, o Governo Paulista lançou o Programa de Qualidade da Escola, com o objetivo de aprimorar a qualidade e a equidade do sistema de ensino da rede estadual paulista, a partir do IDESP. Esse indicador é composto pelo desempenho dos alunos nos exames de proficiência do SARESP (retenção do aprendizado) e pelo fluxo escolar (tempo do aprendizado) 15.

A mobilização da sociedade civil insere-se na busca pela qualidade do gasto público, como no movimento “Compromisso Todos pela Educação”, estabelecendo 5 (cinco) metas para garantir, até 2021, educação básica de qualidade para todos os brasileiros. São elas16:

  1. Toda criança e jovem de 4 a 17 anos na escola;

  2. Toda criança plenamente alfabetizada até os 8 anos;

  3. Todo aluno com aprendizado adequado à sua série;

  4. Todo jovem com ensino médio concluído até os 19 anos;

  5. Investimento em educação ampliado e bem gerido.

A partir dessa breve sinopse dos indicadores e ferramentas de mensuração da quantidade e da qualidade do gasto público existentes, entendemos que o desafio é conjugá-los, para que, a partir de uma visão sistêmica, o instrumental disponível possa ser utilizado para avaliar o gasto público em termos de eficácia, eficiência e efetividade. Entendemos que a metodologia de análise estratégica denominada Balanced Scorecard é a ferramenta para atingir essa integração.

Sobre o autor
Leandro Luis dos Santos Dall'Olio

Pós-graduado em Finanças pela Fundação Getúlio Vargas, atualmente Chefe Técnico da Fiscalização no Tribunal de Contas do Estado de São Paulo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DALL'OLIO, Leandro Luis Santos. Eficiência do gasto público.: Aplicação do modelo balanced scorecard para geração de lucro social. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3548, 19 mar. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24005. Acesso em: 27 dez. 2024.

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