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Cobrança em zona azul: uma possível inconstitucionalidade

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Agenda 16/04/2013 às 09:24

5 AS POSSÍVEIS INCONSTITUCIONALIDADES NA COBRANÇA EM ESTACIONAMENTOS ROTATIVOS : EVIDÊNCIA DO DIA-A-DIA.

Se o legislador desejar que os administrados remunerem as despesas dos atos ou diligências de polícias que os alcançaram, deverá criar cobranças através de taxas de polícia. Em respeito aos ditames constitucionais, os serviços públicos específicos e divisíveis e os atos de polícia endereçados a alguém só podem ser remunerados por meio de taxa. Isso não é uma sugestão, ou uma opção, mas sim uma obrigatoriedade.

Atento ao abuso do Estado, Roque Carraza adverte:

“Na prática, pelo respaldo que um setor expressivo da doutrina lhes dá, as pessoas políticas têm-se remunerado pelos serviços públicos que prestam ou pelos atos de polícia que realizam, por meio de “tarifa”( “PREÇO”). Uma parte significativa das receitas públicas advém das “tarifas” que o Poder Público manipula, com total liberdade, sem se preocupar com os direitos dos contribuintes. De fato, aí estão aí as tarifas de correio, telefone, de água, de luz, de transporte, todas aumentadas por decretos( quando não por portarias), sem maiores insurgências, seja da parte dos contribuintes, seja da doutrina em geral, que, em síntese, sustenta que “tarifa não é tributo, e portanto, não precisa obedecer ao regime jurídico tributário” (CARRAZA, 2002, p. 365) .

Em muitos Municípios brasileiros a cobranças em áreas de Zona Azul é feitas como se preço público fosse, ou seja, uma espécie de relação contratual do cidadão com o Estado ou instituição privada aos olhos do Estado, com a finalidade única de ludibriar a ordem Constitucional. Não raros são os Municípios que fazem a cobrança nos estacionamentos rotativos lastreando tal exação em decretos ou portarias do Executivo, sem qualquer respeito aos direitos constitucionais dos cidadãos de não terem seu patrimônio ilegitimamente invadido.

É como se estivesse permitido o seguinte pensamento: se a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal quiserem colocar-se sob a égide do sistema constitucional tributário brasileiro, remunerem-se, pelos serviços públicos prestados ou pelos atos de polícia realizados, por meio de taxas; se, porém, quiserem operar com inteira liberdade, remunerem-se por meio de “tarifas” (CARRAZA, 2002, p. 365).

Caso um Município delegue a atividade de polícia a uma entidade privada por meio de processo licitatório, essa delegabilidade será inconstitucional. Assim decidiu a Corte Suprema nacional na ADIn 1.717/ DF, em 07/11/2002, pela impossibilidade de ser delegada a atividade de Polícia administrativa do Estado:

DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 58 E SEUS PARÁGRAFOS DA LEI FEDERAL N. 9.649 DE 27.05.1998, QUE TRATAM DOS SERVIÇOS DE FISCALIZAÇÃO DE PROFISSIONAIS REGULAMENTADAS.

[...] 2. A interpretação conjulgada dos artigos 5º XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70 parágrafo único, 149 e 175 da Constituição Federal, leva à conclusão, no sentido da indelegabilidade, a uma entidade privada, da atividade típica de Estado, que abrange até poder de polícia, de tributar e de punir, no que concerne ao exercício de poder de polícia [...]3. Decisão unânime.

Diante dessa vexatória situação, as entidades tributantes atropelam impunemente os princípios da legalidade, igualdade, anterioridade, dentre outros. Tais inconstitucionalidades, porém, são sanáveis por via de ação (mandado de segurança, ações ordinárias, ação direta de constitucionalidade) ou exceção. Melhor dizendo, o prejudicado poderá socorrer-se das vias judiciais para evitar esta pseudotributação (CARRAZA, 2002, p. 365) .


6 CONCLUSÃO

Diante das evidencias expostas ao longo deste artigo, constata-se que a cobrança realizada nos estacionamentos rotativos públicos apresenta características típicas de uma exação tributária, quais sejam: devem ser instituídas através de lei em sentido estrito, incidem sobre fatos lícitos, devem ser pagas em dinheiro, são compulsórias e devem ser cobradas mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

Assim expõe Paulo de Barros Carvalho (CARVALHO, 2008, p. 374):

 Em face do exposto, tenhamos presente que qualquer prestação que tiver ínsitas as características supramencionadas será tributo, independente do nome que se lhe atribuam ou da destinação que seja dada aos recursos decorrentes de sua cobrança.

Essa é a conclusão que se tem à luz do artigo 4º, incisos I e II do Código Tributário Nacional, Lei n. 5.172/66:

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Art. 4º A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la:

I - a denominação e demais características formais adotadas pela lei;

II - a destinação legal do produto da sua arrecadação.

Por derradeiro, se alguma cobrança realizada nos estacionamentos rotativos nas vias públicas deixar de respeitar os requisitos essenciais para a instituição de um tributo, haverá, inexoravelmente, desrespeito à ordem constitucional, e, portanto, deve ser extirpada do ordenamento jurídico do município.

Isso porque a competência e as regras tributárias já nascem constitucionalmente delimitadas. “A competência é uma afirmação da liberdade, mas é também uma limitação; uma autorização para o exercício das faculdades, das atribuições tributárias dos entes políticos, que nascem com uma limitação constitucional, que lhes é inerente” (BORGES, 1978, P. 134).


REFERÊNCIAS

BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário, 3ª Edição, Editora Lejus. São Paulo, 2001.

BINI, Guido Zano. Corso de Diritto Amnistrativo, V4. Milão: A Giuffré, 1968.

BORGES, José Souto Maior.Elementos de direito tributário. Revista dos Tribunais. São Paulo, 1978, p. 134

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Brasília: Empresa Gráfica do Senado, 1988.

________. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Brasília: Empresa Gráfica do Senado, 1967.

________. Lei 5.172/66. Código Tributário Nacional.

________. Lei Lei 9.503/97. Código de Trânsito Nacional.

CALMON, Sacha. Comentários à Constituição de 1988. Editora Forense. 1990. Rio de Janeiro.

CARRAZA, Roque Antonio.  Curso de Direito Constitucional Tributário, 14ª Ed., Editora Malheiros, p.. 365.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário, 13ª edição. Editora Saraiva, São Paulo. 2000.

________. Direito Tributário Linguagem e Método, 2ª edição. Editora Noeses, p. 282/283.

COMPANHIA DE ENGENHARIA DE TRÁFEGO. Acessado em: WWW.CETSP.COM.BR. Estacionamento Rotativo. 02 de janeiro de 2011.

COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro, 3ª Ed. Editora Forende, 1999, p. 148.

GIANNINI, Achille Donato. Tratado de Diritto Tributario, v. I, editrice torinese, 1956, p. 111.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, 29ª Ed. Editora Malheiros, 2009, p. 26.

Sobre o autor
Antônio Carlos do Espirito Santo Filho

Advogado formado pela Faculdade Ruy Barbosa, Salvador -BA. Contador formado pela Universidade Federal da Bahia. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários - IBET.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTO FILHO, Antônio Carlos Espirito. Cobrança em zona azul: uma possível inconstitucionalidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3576, 16 abr. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24191. Acesso em: 5 nov. 2024.

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