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Cobrança em zona azul: uma possível inconstitucionalidade

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Resumo:


  • O artigo discute a legalidade da cobrança de estacionamento rotativo, conhecido como Zona Azul, sob a ótica tributária, questionando a legitimidade constitucional e a observância das limitações do poder de tributar.

  • Historicamente, os estacionamentos rotativos surgiram para gerenciar o uso das vagas públicas e garantir a rotatividade, sendo a cobrança um mecanismo para desencorajar a ocupação prolongada e garantir acesso equitativo.

  • Conclui-se que as características da cobrança em estacionamentos rotativos se alinham com a definição de tributo, devendo ser instituídas por lei, sendo compulsórias, baseadas em atos lícitos e realizadas por atividade administrativa vinculada.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Se alguma cobrança realizada nos estacionamentos rotativos nas vias públicas deixar de respeitar os requisitos essenciais para a instituição de um tributo, haverá, inexoravelmente, desrespeito à ordem constitucional, e, portanto, deve ser extirpada.

1 INTRODUÇÃO

Este artigo propõe-se a analisar uma exação cobrada diuturnamente nas grandes cidades do Brasil: a cobrança nos estacionamentos rotativos nas vias públicas, também conhecidos como Zona Azul.

Serão analisadas as questões atinentes aos estacionamentos rotativos, a sua natureza jurídico-tributária, a legitimidade constitucional da exação e, por fim, a necessidade de serem respeitadas as limitações do Poder de Tributar.

Deve ser ressaltado que questões referentes ao Direito Administrativo podem ser levantadas acerca do tema, isso porque em muitos municípios brasileiros a cobrança feita nos estacionamentos rotativos se dá com severa ofensa às normas administrativas. Não é esse, porém, o escopo deste artigo.

Almeja-se neste artigo analisar a questão sob a ótica tributária, ou seja, quanto à legitimidade, ou não, da cobrança feita em face dos ditames constitucionais tributários, visto que se pretende ao longo deste trabalho comprovar a natureza tributária da exação.


2. ESTACIONAMENTOS ROTATIVOS NAS VIAS PÚBLICAS NOS MUCÍPIOS BRASILEIROS: UMA BREVE INCURSÃO HISTÓRICA

O estacionamento rotativo, também conhecido como Área de Zona Azul, foi regulamentado no Brasil em 30/12/1974, com a publicação do Decreto do Poder Executivo nº 11.661/74, no Município de São Paulo.

Inicialmente, essa modalidade de estacionamento regulava 5.000 (cinco mil) vagas no centro da cidade de São Paulo (CET/SP, 2010). Hodiernamente, as áreas de Zona Azul abrangem mais de 35.000 (trinta e cinco mil) vagas no município de São Paulo, incluindo-se vagas reservadas para portadores de deficiência, idosos e caminhões de transporte de cargas.

2.1 O SURGIMENTO DOS ESTACIONAMENTOS ROTATIVOS FRENTE ÀS NECESSIDADES MUNICIPAIS

Os estacionamentos rotativos surgiram nas grandes cidades com o objetivo de tentar desobstruir o trânsito nas áreas de maior circulação de automóveis.

As áreas de Zona Azul têm como escopo permitir de forma mais equitativa que uma quantidade maior de pessoas na sociedade possa utilizar as vias públicas para estacionar seus veículos, bem como gerar maior rotatividade na dinâmica do trânsito urbano.

Inclusive, um dos slogans utilizados na cidade de São Paulo no início dos estacionamentos rotativos, para justificar sua cobrança, foi: “Onde todos estacionam menos, todos podem estacionar”. (CET/SP, 2010)

Então, o cidadão ao estacionar o veículo em áreas de Zona Azul é cobrado um valor calculado proporcionalmente ao número de horas de permanência nos estacionamentos das vias públicas, podendo variar o valor da cobrança a depender do Município e da localidade dentro do Município.

Pelo fato dos passeios urbanos serem públicos, muitas pessoas na sociedade utilizavam os locais permitidos para estacionar seus veículos como se fosse seu estacionamento particular, deixando por tempo indeterminado seus automóveis na via pública.

Sem dúvida, em regiões de grande circulação, o fato de não haver dinâmica rotativa entre os veículos causava uma grande injustiça: de um lado pessoas que utilizavam diuturnamente e por tempo indeterminado as vias públicas para estacionar seus veículos e, do outro, o cidadão com o mesmo direito de estacionar, mas que sempre era lesado pela impossibilidade de estacionar seu veículo.

Frente à competência atribuída pelo Código de Trânsito Brasileiro, Lei nº 9.503/97, no art. 24, cabe aos Municípios a fiscalização do trânsito, inclusive, para implantar, manter e operar o sistema de estacionamento rotativo nas vias públicas. Assim, qualquer cobrança ou ato administrativo que se refira à regulação do trânsito deverá ser constituído e cobrado pelo Município de sua circunscrição.

Art. 24. Compete aos órgãos e entidades executivos de trânsito dos Municípios, no âmbito da sua circunscrição:

I – cumprir e fazer cumprir legislação e as normas de trânsito, no âmbito de suas atribuições;

X – implantar, manter e operar sistema de estacionamento rotativo pago nas vias;

Almejando dirimir esses infortúnios, surgiram as chamadas Áreas de Zona Azul. Ou seja, a Administração Pública Municipal, incumbida do papel executivo de regulação das relações urbanas, interveio delimitando e restringindo direitos de certos cidadãos em prol do bem-estar coletivo.

Certo é que todos possuem o direito de estacionar seus veículos em vias públicas, já que os bens públicos podem e devem ser utilizados por todos na sociedade sem qualquer forma de distinção. Porém, quando essa utilização passa a ferir o interesse da coletividade, induvidosamente, o Estado deve intervir restringindo o direito anteriormente disponibilizado ao indivíduo.

O Estado não proibiu qualquer cidadão de estacionar seus veículos nas vias públicas, apenas passou a exigir certa quantia em dinheiro pelo tempo de uso, o que acaba de certa forma inibindo o cidadão de deixar seu veículo por tempo indeterminado ou por longo período de tempo nas vias urbanas.


3  A NATUREZA TRIBUTÁRIA DA COBRANÇA EM ESTACIONAMENTOS ROTATIVOS.

Como se sabe, a cobrança realizada nas áreas de Zona Azul dos Municípios é compulsória, devendo ser paga em pecúnia (dinheiro), em decorrência de fato lícito (estacionar em lugar público) e regida por atividade administrativa plenamente vinculada.

Compulsória, porque em momento algum se admite qualquer relação negocial do órgão fiscalizador com o cidadão. O contribuinte enquadrado na situação (fato gerador) de estacionar seu veículo em determinadas áreas permitidas do município, cujo tratamento especial possuem, áreas essas chamadas de zona azul, obrigatoriamente tem que pagar certa quantia em dinheiro, sob pena de multa.

Não se pode sob qualquer égide admitir tentativa de negociação do valor a ser pago abrindo exceções para alguns cidadãos. O valor atribuído nos estacionamentos rotativos é analisado e arbitrado unilateralmente pela Administração Pública.

Deve ser ressaltado ainda que os valores das multas pelo descumprimento da obrigação de pagar são sempre muito mais dispendiosas que o próprio valor da obrigação, ou seja, vê-se que a finalidade das multas pelo não pagamento dos estacionamentos rotativos destoa completamente da finalidade das multas nas relações contratuais privada, assemelhando-se, também nesse quesito, às punições pelo descumprimento das obrigações tributárias.

A cobrança deve ser paga em dinheiro, não sendo admitida qualquer outra espécie de pagamento. Não há a possibilidade de que sejam quitados os valores cobrados nos estacionamentos rotativos com prestações de serviços ou objeto diverso do dinheiro.

A cobrança surge do ato lícito de estacionar o veículo em locais permitidos. A administração municipal estabelece as áreas cujo estacionamento de veículos é proibido: nesses locais, não há que se falar em estacionamentos rotativos, neles não há qualquer cobrança para estacionar, caberá, sim, uma multa punitiva.

A finalidade da cobrança em estacionamentos rotativos, como a de todos os tributos, não é a de punir a prática de um ato ilícito. As cobranças em áreas de Zona Azul não incidem sobre os condutores que estacionam em locais proibidos, ou seja, os que praticam um ato ilícito, mas tão somente sobre aqueles atos lícitos.

Ademais, a cobrança deve surgir, obrigatoriamente, mediante lei, isso porque qualquer privação de liberdade dos cidadãos só pode ocorrer por meio de previsão legal. Ademais, respeitando as ordens da Constituição Federal e do Código de Trânsito Nacional, a Administração Pública deve exercer sua atividade fiscalizatória lastreada pela vinculação que lhe é peculiar.

Assim leciona Maria Sylvia Zanella de Pietro (DE PIETRO, 2006, 127):

O poder de polícia reparte-se entre Legislativo e Executivo. Tomando-se como pressuposto o princípio da legalidade, que impede à Administração impor obrigações ou proibições senão em virtude de lei, é evidente que, quando se diz que o poder de polícia é a faculdade de limitar o exercício de direitos individuais, está-se pressupondo que essa limitação seja prevista em lei.

Diante de todas essas evidências, dúvida não há que a cobrança feita nos estacionamentos rotativos das vias públicas possui todas as características de tributo, ou melhor, uma cobrança com requisitos, características, natureza e finalidade de tributo só pode ser um tributo.

O Código Tributário Nacional, Lei nº 5.172/66, conceitua, no seu art. 3º, tributo como sendo “toda prestação pecuniária compulsória , em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.”

Acerca do tema Leandro Paulsen (PAULSEN, 2008, p. 624) expõe o seguinte posicionamento:

Os Municípios têm identificado áreas de maior concentração comercial e de prestação de serviços, que implicam maior fluxo de veículos, e regulamentado o estacionamento, mediante limitação de tempo, de modo a garantir a rotatividade. O estacionamento é sujeito, ainda, ao pagamento de determinado montante, normalmente proporcional ao tempo ocupado. Tendo em conta que se cuida de bem de uso comum do povo e que os motoristas têm o direito de estacionar nos locais permitidos, qualquer valor cobrado em face disso não pode ser considerado como preço público, mas, sim, como tributo, pois reveste as características do art. 3ª do CTN, caracterizando verdadeira taxa de polícia.


4 A TAXA E A SUA NATUREZA JURÍDICA À LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E O CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL

As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição. (Lei nº 5.172/66, Art. 7º)

As taxas correspondem a uma das espécies de tributo no ordenamento jurídico pátrio. À luz do art. 145, II, da Constituição Federal, no capítulo do Sistema Tributário Nacional, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir as taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização efetiva ou potencial de serviço público específico e divisível prestado aos contribuintes ou postos a sua disposição.

Portanto, cada ente federado possui competência para cobrar taxas pelos serviços que preste ou pelo poder de polícia que exerça.

“Faz-se necessário somente que a pessoa política (União, Estado, Distrito Federal e Município) possua competência político-administrativa para prestar o serviço público ou praticar o ato do poder de polícia, que são os supostos fáticos das taxas” (CALMON, 1999, p. 148)

A taxa é uma espécie do gênero tributo, porque assim quis e quer o legislador constitucional. Em qualquer ordenamento jurídico onde vigore o Direito positivo e, por conseguinte, o princípio da legalidade, as molduras jurídicas da Nação devem ser lapidadas pelo Poder Legislativo.

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Dentre os tributos, a taxa é àquela exação cobrada devido à existência de uma prestação estatal em trâmite, não necessariamente que venha a beneficiar diretamente ou exclusivamente o contribuinte, mas sim uma atividade voltada principalmente ao bem da coletividade e que de alguma forma o contribuinte se encontre correlacionada a ela.

Estaremos diante de uma taxa (tributo diretamente vinculado) se o antecedente normativo mencionar fato revelador de atividade estatal, direta e especificamente dirigida ao contribuinte, exibindo, na correspondente base de cálculo, a medida da intensidade da participação do Estado. (CARVALHO, 2008, P. 379)

Através da taxa constitui-se uma relação jurídica compulsória, previamente estabelecida por lei, obrigando o contribuinte a pagar determinado valor em dinheiro, por ter incorrido num fato gerador vinculado a uma atividade estatal específica. A taxa pode surgir frente à prestação de um serviço público específico e divisível, ou frente ao exercício do poder de polícia administrativa.

Em verdade, na grande maioria das vezes quando se pensa na incidência tributária de uma taxa imagina-se a prestação de um serviço estatal ao contribuinte e, pelo serviço prestado, como uma contraprestação, o contribuinte retribui o benefício que lhe foi auferido com um valor em pecúnia. Essa é a taxa em decorrência da prestação de um serviço público específico e divisível, mas não é essa a taxa supostamente cobrada nas áreas de zona azul.

Talvez a distinção entre taxa de polícia e taxa de serviço não mereça legitimidade científica, afinal a prestação do poder de polícia também é um serviço público (CALMON, 1990, p. 48). Mas distinções no objeto e nos fundamentos são evidenciadas entre as espécies de taxa.

Quando um cidadão deixa seu automóvel em um estacionamento rotativo, sobre ele incidirá uma cobrança, mas não porque lhe foi prestado um serviço específico do Estado para o seu benefício imediato. O cidadão ao estacionar seu veículo em determinados locais de uma cidade está obrigado a pagar certo valor em dinheiro como uma forma de limitação ao seu direito subjetivo de estacionar a qualquer hora do dia e por tempo indeterminado nas vias públicas. O Estado atua como um gerenciador da ordem social, tentando de alguma forma garantir a disponibilidade igualitária dos estacionamentos nas vias públicas.

A taxa pelo exercício regular do poder de polícia é uma realidade e, ressalte-se, é um dos meios de maior eficácia no combate ao abuso do direito por parte dos cidadãos. Diante da falta de controle e do bom senso das pessoas no século XXI, a taxa pelo exercício do poder de polícia vem se tornando um grande aliado no desenvolvimento social moderno.  

4.1 TAXA PELO EXERCÍCIO REGULAR DO PODER DE POLÍCIA

Etimologicamente, polícia vem do grego politeia, que, posteriormente em Roma, foi transformado em politia, para então chegar à língua portuguesa. Originalmente, polícia significava a arte de governar os cidadãos ou a bóia ordem da coisa pública. (MEIRELLES, 1966, P. 93)

A denominação taxa de polícia surgiu no ordenamento jurídico brasileiro com o advento da reforma tributária de 1965 na Constituição Federal. Mario Pugliese (PUGLIESE, 1930, p.66) denomina as taxas de polícia como Entrate di Polizia, sendo, na verdade, o correspondente à despesa que o Estado tem ao gerir a ordem pública. O Estado, no interesse do bem-comum, utiliza o seu poder de polícia. Regula tal poder e faz os cidadãos submeterem-se à legislação competente. Essa atividade exige um custo, que pode ser garantido através da taxa de polícia. Em suma, o Estado, impelido pela necessidade de resguardar o interesse da coletividade, exerce uma atividade de fiscalização ou de controle, da qual todos os cidadãos devem obedecer.

O Código Tributário Nacional conceituou o Poder de Polícia no seu artigo 78:

Considera-se poder de polícia a atividade da administração público que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos (Art. 78 do Código Tributário Nacional)

Conceituar não é atribuição do Poder Legislativo. Errou o legislador tributário por ter conceituado um instituto do Direito Administrativo, e, como se não bastasse, erroneamente deu o conceito da Atividade de Polícia ao Poder de Polícia. O Poder de Polícia não é atividade da Administração, é poder do Estado. Deve ser exercido mediante produção legislativa. A Administração Pública, com fundamento nesse poder, e dentro dos limites impostos pelo ordenamento jurídico, exerce atividade de polícia. (MACHADO, 2008, P. 425)

Deixando as falhas do Código Tributário Nacional para segundo plano, o Poder de Polícia do Estado é um dos temas em que são colocadas em confronto duas realidades: de um lado, o cidadão que deseja exercer ao máximo o seu direito, e, do outro, a administração pública, tendo como obrigação condicionar o exercício do direito do cidadão em prol do bem-estar da coletividade, exerce o poder de polícia.

Como leciona Guido Zano Bini (BINI, 1968, p. 125), “[...]A idéia de limite surge do próprio conceito de direito subjetivo: tudo aquilo que é juridicamente garantido é também juridicamente limitado.”

Todos os cidadãos possuem uma série de direitos subjetivos, mas todo direito apresenta um limite, que, caso não seja respeitado esse limite, direitos subjetivos de outros cidadãos podem acabar sendo atingidos. Dentro de uma sociedade, direitos opostos e conflitantes convivem entre si, devendo ser respeitados, sob pena de que haja sobreposição de direitos, por conseqüência, haja um desequilíbrio na coletividade.

Assim, “o Poder Legislativo, no exercício do poder de polícia que incumbe ao Estado, cria, por lei, as chamadas limitações administrativas ao exercício das liberdades públicas.” (DI PIETRO, 2006, p. 128)

Poder de Polícia é a expressão que indica o poder inerente à administração pública. É o poder de vigilância inerente a toda administração pública. É o poder de frenagem que habilita a administração de velar eficientemente pelo bem-comum (MORAES, 1976, p. 79).

O exercício do Poder de Polícia para ser regular precisa ser desempenhado por órgão competente, respeitar os limites da lei que o estabelece e observar o devido processo legal.

Tentando regular o direito subjetivo de todo cidadão de estacionar nas vias públicas, o Estado, sob o receio que um cidadão usufrua desse seu direito em detrimento da falta de gozo do direito de outro cidadão, que também tem o direito de estacionar na via pública, propõe barreiras e óbices aos motoristas de automóveis com cobranças proporcionais ao tempo de uso das vidas públicas. 

No Brasil, entretanto, é de evidente percepção que muitos Entes da federação possuem o hábito de constituir cobranças com peculiaridades de um tributo, mas com suposta natureza jurídica diversa, com a finalidade de driblar os requisitos de validade de uma exação tributária.

É importante destacar que o fato de eventualmente o Município delegar irregularmente o exercício do poder de polícia a uma empresa pública ou a qualquer pessoa jurídica de direito privado, bem como dar nome diverso a cobrança, nada disso interfere na natureza da exação que deve ser analisada frente às suas características essenciais.

Um tributo instituído de forma oculta ou disfarçada, por meio do qual o Estado foge por completo dos limites consubstanciados no sistema tributário, é, indubitavelmente, inconstitucional, visto que é desrespeitado completamente o direito fundamental de todo cidadão de somente ser tributado frente o aval da Constituição.

Sobre o tema manifesta-se ainda Hugo de Brito Machado (MACHADO, 2008, 71):

Pode-se mesmo dizer que a instituição de tributos ocultos constitui verdadeira fraude à Constituição, que a torna débil, se não inteiramente inútil, em sua função de garantir os direitos fundamentais.

Não há que se permitir que o Estado desrespeite a ordem constitucional, transgrida as normas do sistema tributário e passe por cima dos direitos fundamentais dos cidadãos almejando beneficiar-se a qualquer custo.

É chegado o momento de revertermos este quadro, responsável por uma vasta tributação arbitrária, camuflada sob o rótulo protetor de “tarifa”, verdadeira palavra mágica que, com o abono de alguns tributaristas, tem dispensado as entidades tributantes do dever constitucional de observar o regime jurídico tributário. (CARRAZA, 2002, P. 365)

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Sobre o autor
Antônio Carlos do Espirito Santo Filho

Advogado formado pela Faculdade Ruy Barbosa, Salvador -BA. Contador formado pela Universidade Federal da Bahia. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários - IBET.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTO FILHO, Antônio Carlos Espirito. Cobrança em zona azul: uma possível inconstitucionalidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3576, 16 abr. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24191. Acesso em: 22 dez. 2024.

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