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A competência na ação de inventário

Discutem-se os principais aspectos relativos à natureza da regra de competência para o processo e julgamento da ação de inventário.

O objetivo do presente artigo limita-se a discutir os principais aspectos relativos à natureza da regra de competência para o processo e julgamento da ação de inventário.

Com o falecimento de uma pessoa, opera-se a imediata transferência de seus bens aos herdeiros legítimos e testamentários. Trata-se do princípio da saisine, previsto no artigo 1.784 do Código Civil.

No entanto, para que se possa apurar o patrimônio do falecido e atribuir a cada herdeiro a sua parcela na herança, é necessário que se ingresse com o procedimento de inventário. Não havendo testamento nem herdeiros incapazes, e estando todos os herdeiros de acordo com a partilha dos bens, poderá o inventário ser feito pela via extrajudicial, conforme inovação trazida pela Lei 11.441/2007. Nas demais situações, caberá aos herdeiros proceder ao inventário pela via judicial, nos moldes dos artigos 982 e seguintes do Código de Processo Civil. 

Dispõe o artigo 96, caput, do Código de Processo Civil que é competente para a ação de inventario o foro do último domicilio do falecido. Se o de cujus não tinha domicilio certo, a ação de inventario deverá ser proposta no foro da situação dos bens; caso tenha deixado bens em locais diversos, a ação deve ser iniciada no local em que ocorreu o óbito.

No dia-a-dia forense, percebe-se que muitos juízes adotam a pratica de declinar de sua competência de ofício, quando a ação de inventário não é ajuizada no foro do último domicilio do falecido. No entanto, trata-se de decisão que está em desacordo com a disciplina das regras de competência estabelecida pelo Código de Processo Civil.

Conforme amplo entendimento doutrinário, o artigo 96, caput, do Código de Processo Civil, contém regra de competência territorial e, portanto, relativa, a qual não pode ser conhecida de oficio pelo magistrado. Caso não haja alegação de qualquer dos herdeiros ou interessados, por meio de exceção, prorroga-se a competência, nos moldes dos artigos 112, caput, e 114 do Código de Processo Civil.

Ao analisar o artigo 96 do Código de Processo Civil, o ilustre professor Candido Rangel Dinamarco afirma que “não houve a menor intenção do legislador de ir além da definição da competência puramente territorial para os inventários, partilhas e tais processos correlatos”. (Instituições de Direito Processual Civil, v.I, 2ª edição, São Paulo: Malheiros, 2001, p.541).

No mesmo sentido, em comentário ao dispositivo legal supracitado, Patricia Miranda Pizzol conclui: “O art.96 do CPC trata também de competência territorial, relativa e prorrogável.” (Código de Processo Civil Interpretado, coord.Antonio Carlos Marcato, 3ª edição, São Paulo: Atlas, 2008, p.259).

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Luiz Guilherme Marinoni e Sergio Cruz Arenhart, lecionam que “a competência em questão é relativa, podendo-se propor a demanda em qualquer outro foro, independentemente da condição dos herdeiros” (Curso de Processo Civil, v.5, Procedimentos Especiais, São Paulo: RT, 2009, p.128).

Assim, trata-se de regra de competência territorial, e, portanto, relativa, não podendo o magistrado declinar de sua competência de oficio, como, inclusive, preceitua a Súmula 33 do STJ.

Nesse sentido, a jurisprudência:

ARROLAMENTO DE BENS – COMPETÊNCIA TERRITORIAL – NATUREZA RELATIVA – DECLINAÇÃO DE OFÍCIO – IMPOSSIBILIDADE – SÚMULA 33/STJ. 1. Esta Corte já se manifestou no sentido de ser relativa a competência estabelecida no art. 96 do CPC. 2. Inviável, neste sentido, a declinação de ofício, pelo magistrado. Súmula 33/STJ. 3. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo de Direito de São Lourenço do Oeste - SC. (STJ, 1ª Seção, CC 52781/PR, rel.Min.Eliana Calmon, j.23.11.2005).

COMPETÊNCIA. CONFLITO. CPC, ART. 96. FORO COMPETENTE. INVENTÁRIO. COMPETÊNCIA TERRITORIAL. NATUREZA RELATIVA. IMPOSSIBILIDADE DE DECLINAÇÃO DE OFÍCIO. ENUNCIADO Nº 33 DA SÚMULA/STJ. FALTA DE ATENÇÃO. CONFLITO CONHECIDO. I - Cuidando-se de competência territorial, cuja natureza relativa comporta prorrogação, não é dado ao juiz  declarar-se incompetente de ofício, incidindo, no ponto, o enunciado nº 33 da sumula deste Tribunal. II - Nos termos do art. 96, CPC, é competente para processar o inventário o foro do domicílio do autor da herança, somente havendo superfície para outras considerações a esse respeito quando ele não tenha tido domicílio certo. III - Sem embargo do habitual e desumano excesso de serviço na Justiça, não se justifica que, em casos como o dos autos, não se dê a devida atenção à espécie, tornando ainda mais difícil, para o cidadão, a prestação jurisdicional. (STJ, 2a Seção, CC 19334/MG, rel. Min. Salvio de Figueiredo Teixeira, j.28.11.2002).

AGRAVO DE INSTRUMENTO- Inventário- Decisão que reconheceu de ofício a incompetência para o julgamento do feito e determinou a remessa para o foro do último domicílio do “de cujus” - Competência territorial é relativa e não pode ser apreciada de ofício Súmula 33 do Superior Tribunal de Justiça – Recurso provido. (TJSP, 2ª Câmara de Direito Privado, AI n.0049850-09.2012, rel.Des.José Carlos Ferreira Alves, j.17.04.2012).

CONFLITO NEGATIVO. Inventário. Aplicabilidade do art.96 do Código de Processo Civil. Competência territorial, de natureza relativa. Inviável declinar a competência de ofício. Aplicabilidade da Súmula 33 do Colendo Superior Tribunal de Justiça. Conflito procedente para declarar competente o Juízo Suscitado. (TJSP, Câmara Especial, CC n.0308792-84.2011, rel.Des.Antonio Carlos Tristão Ribeiro, j.26.03.2012).

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. Inventário. Ação distribuída em foro diverso daquele constante como último domicílio da 'de cujus' - Declinação “ex officio”. Impossibilidade. Hipótese de competência relativa Inteligência da Súmula nº 33 do STJ e da Súmula 71 do TJSP. Conflito procedente. Competência do Juízo suscitado. (TJSP, Câmara Especial, CC n.0300853-53.2011, rel.Des.Martins Pinto, j.26.03.2012).

Sobre o tema, o extinto Tribunal Federal de Recursos editou a Súmula 58, com a seguinte redação: “Súmula 58 do TFR (Inventário): 'Não é absoluta a competência definida no art. 96, do Código de Processo Civil, relativamente à abertura de inventário, ainda que existente interesse de menor, podendo a ação ser ajuizada em foro diverso do domicílio do inventariado.”

Recentemente, o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo editou a Súmula 71, com a seguinte redação: “A competência para o processamento de inventário ou arrolamento em razão do foro do domicílio do autor da herança é relativa.”

Diante dos argumentos expostos, conclui-se que, encerrando o artigo 96, caput, do Código de Processo Civil regra de competência territorial, e, portanto, relativa, não cabe ao magistrado declinar de sua competência de ofício, sem que haja alegação de algum herdeiro ou interessado no tocante à incompetência relativa. 

Sobre os autores
Daniel Jacomelli Hudler

Acadêmico de Direito em São Paulo (SP). Estagiário da Defensoria Pública.

Claudia Aoun Tannuri

Defensora Pública do Estado de São Paulo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HUDLER, Daniel Jacomelli; TANNURI, Claudia Aoun. A competência na ação de inventário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3611, 21 mai. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24479. Acesso em: 15 nov. 2024.

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