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Considerações sobre a “penalidade” incidente em SLA nos contratos administrativos de prestação de serviços de tecnologia de informação

Agenda 01/06/2013 às 14:10

No caso da entregabilidade infungível, há previsibilidade que dá origem ao prévio acordo sobre a “adequação” no preço. No caso da entregabilidade fungível, há superveniência de fato (justificável ou não) que causa a mora.

As INs nº 02 e 04/SLTI/MP recomendaram a inclusão, em contratos de prestação de serviços, em especial de tecnologia de informação, de Acordos de Nível de Serviço (SLA), que estipulem compromissos de qualidade e prazos a serem atendidos pela Contratada, em relação a aspectos mais relevantes dos serviços contratados.

Entende o TCU (Acórdão 717/2010, TCU, Plenário) que “as reduções de pagamento decorrentes do descumprimento de Acordos de Nível de Serviço não devem ser interpretadas como penalidade e sim como adequações pelo não atendimento das metas estabelecidas em complemento à mensuração dos serviços efetivamente prestados;”.

Tendo em vista a diversidade da natureza dos serviços submetidos a um SLA, a mencionada decisão, como tem jurisprudencialmente construído o Supremo Tribunal Federal, em alguns casos, deve ter seus efeitos modulados, de acordo com a referida diversidade de características de cada tipo de serviço. Senão vejamos.

Para o que nos interessa no presente, faz-se necessário analisar as características dos serviços que integram o SLA a partir de um atributo próprio dos mesmos, que podemos denominar entregabilidade, ou seja, a forma como a prestação daquele serviço impacta no cumprimento das obrigações contratuais.

Para determinados serviços a entregabilidade é fungível, com isso queremos dizer que, embora não seja entregue dentro dos níveis acordados no SLA (prazo, qualidade etc ...), quando entregue ainda terá proveito e utilidade para o contratante. Para outros serviços, diga-se que a entregabilidade é infungível, ou seja, quando não entregues, no nível exatamente firmado no SLA, o mesmo se torna imprestável para o contratante.

Para ilustrar a questão da entregabilidade infungível, podemos tomar como exemplo a capacidade de uma operadora de telefonia em completar as ligações que lhe foram demandadas. Nesse tipo de serviço pode-se incluir no SLA um indicador que é o número de chamadas completadas e estabelecer um nível mínimo de 98%, por exemplo. Verifica-se, nesse caso, que o indicador adotado é o fato de uma chamada (ligação demandada) se completar, ou não. Caso a chamada não se complete no momento em que é realizada, a mesma chamada não poderá ser aproveitada e uma nova chamada necessitará ser feita, na tentativa de completar a ligação desejada. Por isso é infungível a entregabilidade do referido serviço.

Por sua vez, a solicitação de correção de um totalizador de valores em um determinado relatório que, por exemplo, estivesse prevista para ser atendida em um SLA, no prazo de 48 horas, mesmo que não cumprida nesse prazo, ainda poderia ter um resultado útil ao solicitante, se fosse atendida em 72 horas. Esse seria um serviço de entregabilidade fungível, pois, mesmo que não atendida no nível de serviço acordado, a demanda que foi cumprida com proveito e utilidade, ao final, é a mesma.

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Assim, devemos considerar que para determinados serviços constantes de um SLA, que tem característica de entregabilidade fungível, a redução ou glosa que é aplicada na fatura do mesmo, fica caracterizada como multa moratória, penalidade prevista no artigo 86, da Lei 8.666/93, pois mesmo com a (de)mora  do serviço além do prazo estipulado no SLA (ou redução de qualquer outra característica de qualidade na entregabilidade acordada no SLA) o serviço, quando/como entregue, ainda terá proveito útil para o contratante, sendo o contratado apenado com a multa pela “mora” (atraso injustificado na execução).

Por outro lado, a redução ou glosa aplicada na fatura de serviço, que tem característica de entregabilidade infungível, é efetiva adequação do preço pago por inadimplemento parcial do contrato, resolvida, portanto, em perdas e danos, correspondentes ao percentual ou valor de redução/glosa/desconto previamente ajustado entre as partes, no Contrato SLA.

No caso da entregabilidade infungível há previsibilidade que dá origem ao prévio acordo sobre a “adequação” no preço. No caso da entregabilidade fungível, há superveniência de fato (justificável ou não) que causa a mora.

Dessa forma, necessário concluir que inadimplemento contratual irrecuperável (serviços de entregabilidade infungível) e mora na entrega do serviço contratado (serviços de entregabilidade fungível) são fatos contratuais de natureza diversa, sendo que, na existência de um SLA, aqueles são resolvidos por perdas e danos (“adequações”) e estes são efetivamente penalizados com aplicação de multa moratória, submetendo-se ao disposto no artigo 86, da Lei 8.666/93.

Sobre o autor
Reinaldo de Almeida Fernandes

Advogado (OAB/SC 13546). Sócio de R. A. Fernandes, Scheidt Cardoso Advocacia e Consultoria. Analista de Sistemas. MBA em Direito Econômico e Empresarial (FGV). Extensão em Direito de Tecnologia de Informação.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERNANDES, Reinaldo Almeida. Considerações sobre a “penalidade” incidente em SLA nos contratos administrativos de prestação de serviços de tecnologia de informação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3622, 1 jun. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24594. Acesso em: 7 nov. 2024.

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