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O contrato individual de trabalho: a mudança do prazo determinado para o indeterminado

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A mudança do contrato individual de trabalho por tempo determinado para o indeterminado se apresenta como uma meio de compelir os empregadores a cumprirem os requisitos básicos inerentes a aquele tipo de contratação.

Resumo: A regulamentação do contrato individual de trabalho surgiu na jurisdição internacional como um meio de assegurar a dignidade dos trabalhadores, garantindo-os um rol mínimo de direitos a serem observados pelos empregadores.Em consonância com este entendimento, foi formulado o principal diploma legal brasileiro em matéria trabalhista, denominado Consolidação das Leis Trabalhistas. Nele, há classificação dos contratos individuais de trabalho em indeterminados e determinados, cujas diferenças provocam repercussão na esfera dos deveres e direitos trabalhistas. É neste contexto que o presente trabalho buscouanalisar as previsões legais e os posicionamentos jurisprudencial e doutrinário em relação à mudança do contrato individual de trabalho por tempo determinado para o indeterminado na realidade pátria. Para tanto, utilizou-se de uma pesquisa descritiva, baseada no método hipotético-dedutivo e na observação indireta. Como resultado, ficou demonstrado que a indeterminação do contrato a prazo ocorre todas as vezes que este pacto laboral não respeita os requisitos trazidos em lei, traduzindo-se em uma proteção ao trabalhador.

Palavras-chave: contrato individual de trabalho; direitos trabalhistas; mudança.


1 INTRODUÇÃO

O Direito é produto do relacionamento social, cuja função primordial é harmonizar e coordenar a convivência humana, através da criação de normas que reflitam os valores e costumes vigentes em determinada sociedade de acordo com o contexto histórico-cultural vivido. Dessa forma, na medida em que as relações sociais se intensificam, tornando-se mais complexas, novos parâmetros são inseridos nas previsões legais.

O Direito do Trabalho surgiu, então, como resposta ao capitalismo liberal, mais especificamente como meio de afastar as mazelas sociais ocasionadas pelas relações empregatícias desenvolvidas durante Revolução Industrial, tais quais o trabalho infantil, a baixa remuneração e a excessiva jornada de trabalho. Naquele contexto, o contrato de trabalho era baseado na livre manifestação das partes, em conformidade com o individualismo e a racionalidade defendidos pelo Estado moderno.

No século XX, com o advento do Estado Social, contudo, a liberdade contratual deixou de ser o único condicionante do contrato de trabalho, surgindo também o interesse social. Assim, o contrato passa a ser infiltrado pelos princípios da boa fé objetiva, do equilíbrio econômico e da função social, que buscam permear a conduta dos contratantes pela lealdade e respeito, limitando as arbitrariedades acordadas nas cláusulas contratuais.

No Brasil, a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), sancionada em 1943, é reflexo do posicionamento supramencionado, na medida em que buscou consolidar em seus dispositivos a proteção à parte hipossuficiente da relação de emprego, o empregado, ao passo que impôs a proibição de determinados conteúdos na consecução dos contratos trabalhistas. Nesse diapasão também se encontra a Constituição Federal de 1988, que, no art. 7º, prevê uma série de direitos sociais aos empregados urbanos e rurais, voltados para dignidade da pessoa humana e sua condição social.

É nesse contexto que se insere a discussão acerca da mudança do contrato individual de trabalho por prazo determinado para indeterminado, tema do presente trabalho. Compreender essa situação se mostra de essencial importância na medida em que é um dos mecanismos presentes no ordenamento jurídico brasileiro para proteger o empregado das arbitrariedades do empregador.

Portanto, o presente trabalho possui como objetivo analisar as previsões legais e os posicionamentos jurisprudencial e doutrinário em relação à mudança do contrato individual de trabalho por tempo determinado para o indeterminado na realidade pátria. Para tal, buscará expor as características inerentes aos contratos individuais de trabalhos, apresentará as especificidades do contrato individual de trabalho por tempo determinado, bem como explicitará as hipóteses que provocam a mudança deste contrato para aquele por tempo indeterminado.

A pesquisa realizada neste trabalho pode ser classificada como descritiva, uma vez que lançou mão de um amplo referencial bibliográfico, constituído por distintas doutrinas e previsões legais do ordenamento jurídico brasileiro. Quanto ao método de abordagem, fez opção pelo método hipotético-dedutivo.

 Enquanto ao método de procedimento, este trabalho realiza-se por meio de observação indireta, porque se pauta em documentações. Assim, utilizam-se de livros, artigos científicos, dispositivos legais e jurisprudências pátrias, de forma a oferecer uma melhor fundamentação ao tema pesquisado.


2 CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO

2. 1 A acepção jurídica acerca do contrato individual do trabalho

A figura do contrato de trabalho surgiu concomitantemente ao desenvolvimento do Direito do Trabalho. Sendo assim, data do século XIX, quando, durante a Revolução Industrial, os Estados modernos perceberam que as relações de trabalho necessitavam receber regulamentação estatal de forma a assegurar a dignidade do trabalhador, parte hipossuficiente da mencionada relação.

Neste escopo, surgiu o Direito Individual do Trabalho, ramo autônomo que estuda o contrato individual do trabalho e as regras normativas ou legais a ele aplicáveis (MARTINS, 2008). Nele, a pesquisa busca observar e compreender a formação do contrato de trabalho, sua natureza jurídica e classificação, as partes envolvidas e as causas de suspensão, interrupção e extinção do contrato.

No Brasil, antes do advento do Direito do Trabalho, a relação de trabalho era regida pelo Direito Civil, que assegurava a autonomia individual na celebração deste ajuste. A prestação do trabalho, neste contexto, era percebida como uma espécie de locação de serviço (PEÇANHA, 2006).

O aparecimento da Organização Internacional do Trabalho e a progressiva presença de imigrantes em território brasileiro, que já haviam participado de greves e manifestações nos países de origem, formaram o contexto em que as primeiras normas trabalhistas nacionais foram criadas (EVANGELISTA, 2011). O governo de Getúlio Vargas, assim, tornou-se um marco do Direito do Trabalho brasileiro.

Em 1930, foi instaurado o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, responsável por expedir decretos envolvendo matérias como trabalho das mulheres, salário mínimo e regulamentação de profissões (MARTINS, 2008).  Em 1934, a seu turno, foi promulgada a primeira Constituição a regular normas trabalhistas, garantindo, dentre outros direitos, a isonomia salarial, a liberdade sindical, a jornada de trabalho de oito horas, o repouso semanal e a proteção ao trabalho das mulheres e menores.

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Diante do amplo arcabouço normativo até então produzido, o governo percebeu a necessidade de sistematizar as normas de trabalho, de modo que juntas “pudessem formar uma só regra trabalhista a ser respeitada por todos. Dessa maneira, em 1943 foi editada a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)” (EVANGELISTA, 2011).

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) disponibiliza um título exclusivo para o contrato individual de trabalho, o qual é conceituado em seu artigo 442: “Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego” (BRASIL, 2011, p. 296).  Tal definição, até hoje, suscita dúvidas e críticas da doutrina nacional.

Alice Barros (2009) destaca que a o contrato não corresponde à relação de emprego, mas é ele que cria esta relação jurídica. Sérgio Martins (2008, p. 79), de forma semelhante, frisa que “se o contrato de trabalho corresponde à relação de emprego, não é igual à relação de emprego, pois a lei emprega o verbo corresponde. Se corresponde, não representa a mesma coisa. [...] O contrato cria uma relação jurídica, não podendo a ele corresponder”.

O termo gera ainda maior confusão porque a CLT emprega as expressões relação de emprego (artigo 2º, §1º, e artigo 6º), contrato de trabalho (artigos, 443, 445, 448, 451, 468, 477 e 651, §3º) e relação de trabalho (art. 477)[3]. Neste aspecto, explica Nascimento (2009) que a relação de trabalho é um gênero, que corresponde a uma visão objetivista do vínculo do emprego; contrato de trabalho também é gênero, mas corresponde a uma visão contratualista; já a relação de emprego é a mais importante modalidade de contrato de trabalho.

A doutrina, portanto, para dirimir qualquer dúvida, conceitua contrato individual do trabalho como o acordo expresso ou tácito firmado entre empregado e empregador, pelo qual aquele se compromete a executar pessoalmente serviço de natureza não-eventuala este, mediante subordinação jurídica e remuneração. Nestes termos, é ele “ato jurídico realizado entre empregador e empregado para regulamentar relações básicas de direitos e deveres” (CONTARIN, 2009, p. 9).

 Faz-se, portanto, necessário correlacionar contrato individual de trabalho às definições de empregado e empregador. De acordo com a CLT:

Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

§ 1º - Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados.

§ 2º - Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.

Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

Parágrafo único - Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual. (BRASIL, 2011, p.239)

O empregado é, portanto, pessoa física, sujeito da relação de emprego, que presta serviço de natureza contínua, obrigado a cumprir as ordens determinadas pelo empregador em decorrência do contrato de trabalho, mediante salário. Este, por sua vez, é pessoa física ou jurídica que assume os riscos da atividade, que paga a remuneração daquele pelo trabalho prestado e que possui poder diretivo.

Em suma, o contrato individual do trabalho, tal como previsto na CLT, se refere à relação de trabalho pactuada entre empregado e empregador. Ele cria uma relação jurídica com obrigações mútuas.

2.2 Características do contrato individual de trabalho

O contrato individual de trabalho possui características[4] que lhe são inerentes, essenciais para definir no caso prático se determinada relação de trabalho expressa ou não um contrato de emprego. Em geral, a doutrina costuma identificá-lo com contrato: de Direito Privado, bilateral, oneroso, de caráter subordinativo, comutativo, intuitu personae, de trato sucessivo e não solene.

O contrato individual de trabalho é de Direito Privado, uma vez que celebrado por pessoas iguais, ambas sujeitas de direitos e de obrigações, que, aplicando-se o princípio da autonomia da vontade, podem livremente pactuar (PEÇANHA, 2006). Por conseguinte, é sinalagmático, tendo em vista que as partes se obrigam reciprocamente: a cada obrigação de fazer (prestar serviço) corresponde uma obrigação de dar (pagar o salário) equivalente (VINCENTE; ALEXANDRINO, 2007). Há, assim, uma bilateralidade de obrigações e de direitos.

A onerosidade do contrato individual de trabalho refere-se ao salário pago ao empregado pelo serviço prestado. Dessa forma, se não há remuneração, também não existirá o vínculo empregatício (MARTINS, 2008). A subordinação jurídica é outro elemento primordial deste contrato, caracterizada pelo dever do empregado em observar as diretrizes formuladas pelo empregador quanto ao modo e ao tempo em que se deverá ser executada a prestação de serviços (BARROS, 2009). Neste sentido, aquele que assume com este compromisso por meio do contrato, passa estar diante dele subordinado, devendo acatar suas decisões com zelo e qualidade (LAGO, 2011).

O contrato em apreço é comutativo, uma vez que existe equivalência entre as prestações devidas pelos contratantes, ou seja, “cada contratante se obriga a dar ou fazer algo que é considerado equivalente àquilo que lhe dão ou fazem e essa equivalência pode ser verificada de imediato” (CONTARIN, 2009, p.4). Assim, o empregado dispende suas energias, transformando-as em força de trabalho, a qual será utilizada pelo empregador.

Todo contrato individual de trabalho é intuitu personae, uma vez que pressupõe a prestação pessoal do trabalho pelo empregado (PEÇANHA, 2006). Apenas esporadicamente e com a aquiescência do empregador poderá aquele ser substituído na prestação de serviços. É também de trato sucessivo, pois pressupõe a continuidade da prestação de serviços, não se exaurindo com o cumprimento de uma única prestação (MARTINS, 2008).

O contrato individual de trabalho é não solene, sendo suficiente para sua concretização a consensualidade entre as partes. É neste sentido que o artigo 443 da CLT indica que ele pode ser expresso, pelo qual um acordo escrito formaliza a tutela de direitos e deveres entre empregado e empregador, ou tácito, pela qual o acordo forma-se pela confiança entre as partes, pela oralidade e pelo comportamento (CONTARIN, 2009). Neste sentido:

CONTRATO DE TRABALHO - CARACTERIZAÇÃO. O contrato de trabalho no Brasil não requer formas solenes e as normas legais que o regulam são de ordem pública imperativas. Por conseguinte, os fatos reveladores dos elementos da relação de trabalho é que devem ser considerados para aferição da existência do contrato de trabalho. Podem ser ajustados com qualquer nome: contrato por obra certa, empreitada, temporário, estágio, etc. Se a realidade evidencia o contrato de trabalho, ele aí está. (SÃO PAULO. Tribunal Regional do Trabalho.RECORD 2980531906 SP 02980531906. Rel. Des. Vera Marta Publio Dias.Julg.: 30/11/1999 Data Pub.: 18/01/2000)

Por fim, deve-se salientar que o contrato de trabalho, como todo negócio jurídico, deve ter agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável e forma prescrita e não defesa em lei (NASCIMENTO, 2009). Caso contrário, será passível de nulidade.

A jurisprudência pátria já tem, por exemplo, posicionamento pacificado acerca da atividade ilícita do jogo do bicho. A Orientação Jurisprudencial 199 da SBDI-1 do Tribunal Superior do Trabalho expressou que é nulo o contrato de trabalho celebrado para o desempenho desta atividade, ante a ilicitude de seu objeto, o que prejudica o requisito de validade para a formação do ato jurídico. Nestes termos:

RECURSO DE REVISTA. JOGO DO BICHO. CONTRATO DE TRABALHO. NULIDADE. OBJETO ILÍCITO (OJ 199 DA SBDI-1 DO TST).Quem presta serviços em banca de "jogo do bicho" exerce atividade ilícita, definida por lei como contravenção penal. Nessa hipótese, a relação jurídica estabelecida entre as partes, conquanto dotada dos contornos do contrato de trabalho, não gera direitos, já que é ilícito o objeto e são ilícitas as atividades do tomador e do prestador dos serviços. Caso que enseja a aplicação da Orientação Jurisprudencial 199 da SBDI-1 do TST. Óbice do art. 896, § 4.º, da CLT, e da Súmula 333 do TST. Recurso de revista não conhecido. (BRASIL. Tribunal Superior do trabalho. 7ª Turma. RR 630002420095070006 63000-24.2009.5.07.0006. Rel. Min.Delaíde Miranda Arantes. Julg: 14/09/201. Pub: DEJT 23/09/2011)

O contrato individual de trabalho, portanto, preza pela consensualidade entre as partes. Esta característica, contudo, não pode denegar a legalidade do acordo, que deve se pautar pelos direitos e deveres previstos ao empregador e ao empregado nas normas trabalhistas.


3. ASPECTOS RELEVANTES ACERCA DA DURAÇÃO DA RELAÇÃO DE EMPREGO

3.1. O princípio da continuidade da relação de emprego

O Direito do Trabalho apresenta como finalidade a proteção da parte hipossuficiente da relação de emprego, qual seja o trabalhador. É neste sentido que a indeterminação da duração contratual tem se constituídoa regra geral aplicável aos contratos de trabalhonos diversos sistemas jurídicos, de tal maneira que se torna a forma normal de contratação (DELGADO, 2007).

O contrato por tempo indeterminado é aquele em que as partes, ao acordarem acerca da relação de trabalho, não prefixam o seu momento de extinção ou termo extintivo.Ensina Mendonça (2011) que sua concretização decorre da ausência de uma declaração de vontade dos envolvidos no sentido de limitar a duração do contrato, ou seja, quando o celebram não pensam em seu fim.

Dessa forma, uma das características deste tipo de contrato é o trato sucessivo, ou seja, “ele não se esgota mediante a realização instantânea de certo ato, mas perdura no tempo” (BARROS, 2009, p. 174). A vinculação jurídica, portanto, se prolonga. Por conseguinte, o princípio da continuidade da relação de emprego torna-se diretriz que informa e inspira as normas jurídicas acerca deste contrato individual de trabalho.

O princípio da continuidade da relação de emprego surge com o escopo de garantir uma segurança econômica ao trabalhador, incorporando-o ao organismo empresarial (BARROS, 2009). É neste corolário que se apresenta, por exemplo, o inciso I, artigo 7º, da Constituição Federal de 1988, pelo qual fica proibida a dispensa arbitrária (BRASIL, 2008).

Por outro lado, o mencionado princípio fundamenta-se pelo valor da antiguidade (NASCIMENTO, 2009), na medida em que a maioria dos direitos assegurados ao trabalhador decorre dela. Citem-se o aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, o direito à aposentadoria por tempo de serviço e a equiparação salarial.

Assim,corrobora tal princípio que é de interesse do Direito do Trabalho a conservação do vínculo empregatício, com a integração do trabalhador na estrutura e dinâmica empresariais. Isto porque é nesta perspectiva que a ordem justrabalhista pode cumprir satisfatoriamente o objetivo teleológico deste direito, qual seja o de assegurar melhores condições, sob a ótica obreira, de pactuação e gerenciamento da força de trabalho em determinada sociedade (DELGADO, 2007).

Em consonância com este entendimento, a Súmula nº 212 do Tribunal Superior do Trabalho estabelece que o ônus de provar as razões ensejadoras do término do contrato de trabalho, quando negados a prestação de serviços e despedimento, é do empregador, uma vez que o princípio da continuidade da relação de emprego se traduz em uma presunção favorável ao empregado. Em caráter exemplificativo, colaciona-se a seguinte jurisprudência:

RESCISÃO CONTRATUAL. ABANDONO DE EMPREGO. ÔNUS DA PROVA.O princípio da continuidade da relação de emprego estabelece que é presumida a intenção do empregado de continuar trabalhando, sendo, portanto, do réu o ônus de demonstrar o ânimo do reclamante de não mais permanecer no emprego (requisito essencial à configuração do abandono de emprego). Não se desincumbindo a ré de seu encargo, forçoso reconhecer que o término do contrato de trabalho ocorreu por interesse do empregador (CEARÁ. Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região. RO 9874020105070010. Relatora: Dulcina de Holanda de Palhano. Julg.: 09/05/2012. Pub.: 18/05/2012)

A continuidade da relação jurídica se constitui, portanto, uma questão técnica de classificação dos contratos de trabalhos quanto à duração. Neste sentido, o ordenamento jurídico reconhece a existência dos contratos individuais por tempo indeterminado, que são a regra no sistema legal, bem como dos contratos a prazo, estes taxativamente previstos em lei.

3.2. O contrato por tempo determinado

As transformações ocorridas na sociedade, a partir do surgimento do consumo em massa e da globalização, provocaram uma alteração no mercado de trabalho. Este passou a exigir a admissão de empregados por breves espaços de tempo, consoante a necessidade transitória do empregador de manter uma pessoa que exercesse determinada tarefa. É neste contexto de flexibilização que se desenvolve o contrato individual de trabalho por tempo determinado no Direito do Trabalho.

O contrato individual de trabalho por tempo determinado na legislação pátria é conceituado no artigo 443, § 1º, da CLT. Ipsis litteris: “Considera-se como de prazo determinado o contrato de trabalho cuja vigência dependa de termo prefixado ou da execução de serviços especificados ou ainda da realização de certo acontecimento suscetível de previsão aproximada” (BRASIL, 2011, p. 297).

Nesta modalidade de contrato, portanto, é previsto um limite para a sua duração, sendo o término ou a realização do serviço pré-determinados. Conforme destaca Evangelista (2010), as partes envolvidas ajustam de forma antecipada o seu fim, ou seja, antes mesmo do contrato ter validade já se sabe quando este deixará de ter efeitos jurídicos.

O termo final do contrato individual por tempo determinado é estabelecido com base em três elementos. São eles: o cronológico, em que se estabelece o número dias ou a data limite do contrato; o serviço especificado, correspondente, por exemplo, ao término da obra; e o advento de um acontecimento suscetível de previsão aproximada, o que ocorre, a título exemplificativo, com o término da colheita (MARTINS, 2008).

A Consolidação das Leis Trabalhista, no artigo 443, §2º, elenca os critérios de validade do contrato por prazo determinado no Brasil. No rol taxativo, encontra-se: serviço cuja natureza ou transitoriedade justifique a predeterminação do prazo; atividades empresariais de caráter transitório; ou contrato de experiência (BRASIL, 2011).

A atividade transitória referida no texto trabalhista diz respeito àquela que se limita no tempo, em que, para o empregado executá-la, é necessário um breve espaço de tempo, diferentemente da permanência própria das atividades da empresa e pertinentes aos seus fins normais (NASCIMENTO, 2009). Salienta Barros (2009) que a transitoriedade não significa eventualidade, já que o trabalho eventual não configura contrato de emprego. Por sua vez, Martins (2008) frisa que o caráter temporário deverá ser observado em relação às atividades do empregador, de acordo com as necessidades de seu empreendimento.

Aqui, portanto, deve-se esclarecer que o contrato individual por tempo determinado e o contrato temporário não são sinônimos. Este se satisfaz como uma hipótese daquele, conforme elucida a jurisprudência colacionada, a qual representa o entendimento pacífico dos tribunais pátrios:

CONTRATO DE TRABALHO TEMPORÁRIO. REQUISITOS.O contrato de trabalho temporário é contrato por prazo determinado (art. 443, § 2º, 'a', da CLT), submetido às regras especiais da Lei n. 6.019/74, regulamentada pelo Decreto n. 73.841/74, que devem ser observadas pela empresa de trabalho temporário e pela tomadora de serviços, sob pena de invalidação do liame temporário e conversão do pacto laboral em contrato por prazo indeterminado. No caso concreto, o reclamante foi contratado pela 1ª reclamada como trabalhador temporário e fornecido à 2ª reclamada, que aproveitou sua mão-de-obra pelo prazo de 30 (trinta) dias no cadastramento de postes da rede elétrica, serviço esse que, pela sua natureza, enquadra-se como serviço transitório cuja execução pressupõe acréscimo extraordinário de serviços a justificar a contratação de trabalhadores temporários. Além desses requisitos materiais, também foram observados os requisitos formais previstos na Lei n. 6.019/74 e no Decreto n. 73.841/74, motivo pelo qual mantém-se a sentença revisanda que considerou válido o contrato de trabalho temporário celebrado entre o obreiro e a 1ª reclamada.(MATO GROSSO. Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região. 1ª Turma. RORs 818201002123008 MT 00818.2010.021.23.00-8. Rel. Des. Edison Bueno. Julg.: 22/03/2011. Pub.: 23/03/2011).

O contrato de trabalho temporário, previsto na Lei n.º 6.019/74, é utilizado para atender a necessidade transitória de substituição de pessoal regular e permanente ou acréscimo extraordinário de serviço. O trabalho é contratado por meio de uma empresa especializada (a empresa de trabalho temporário) e o tomador de serviços (empresa ou cliente), que devem pactuar expressamente o tipo de serviço.

As atividades empresariais de caráter transitório que validam o contrato por tempo determinado, por sua vez, são aquelas determinadas pela própria transitoriedade da empresa, cuja existência limita-se, no tempo, pelos próprios fins a que se destina (NASCIMENTO, 2009). São, assim, exercidas excepcionalmente pelo empregador em caráter sazonal(DELGADO, 2007). É o caso, por exemplo, da atividade transitória de venda de fogos juninos, restrita ao mês de junho.

O contrato de experiência, por fim, é aquele que pretende aferir o desempenho e o entrosamento do empregado no local de trabalho, permitindo-lhe aperfeiçoar as condições da prestação de serviços (BARROS, 2009). Visa à observância mútua entre as partes do contrato, sendo analisadas as condições de trabalho, as aptidões técnicas e o desempenho nos relacionamentos interpessoais. Consiste, segundo Delgado (2007, p.541), em um “acordo bilateral firmado entre empregado e empregador, com prazo máximo de noventa dias, em que as partes poderão aferir aspectos subjetivos, objetivos e circunstanciais relevantes à continuidade ou extinção do vínculo empregatício”.

Não se confunde, portanto, com o período de experiência, previsto no artigo 478, §1º, da CLT, correspondente ao primeiro ano de duração do contrato por prazo indeterminado (BARROS, 2009). A previsão do artigo 443, §2º, alínea “c”, do mesmo diploma legal, é clara ao expressar que o contrato em apreço é espécie de contrato por tempo determinado e, por isso, dirime o embate doutrinário acerca de sua natureza jurídica (MARTINS, 2008). Neste sentido:

CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. EFEITOS.O contrato de experiência é modalidade de contrato por prazo determinado, extinguindo-se naturalmente pelo decurso do respectivo prazo. Considerando que havia previsão de prorrogação no contrato firmado e que foi observado o prazo de noventa dias do referido pacto de experiência, não há como serem aplicados os princípios e normas que regem a rescisão dos contratos de trabalho por prazo indeterminado que gerariam ao trabalhador direito ao recebimento das verbas rescisórias. Recurso conhecido a que se nega provimento. (MARANHÃO. Tribunal Regional da 16ª Região. RO 884201000316004 MA 00884-2010-003-16-00-4. Rel. Des. James Magno Araújo Farias.Julg.: 08/05/2012. Pub.: 17/05/2012).

O ordenamento jurídico brasileiro apresenta em leis infraconstitucionais outros tipos de contrato individual por tempo determinado.É o caso da Lei nº 2.959, publicada em 1956, que estabelece parâmetros para contratação de trabalhadores que realizam obra certa ou serviço certo. O Decreto-Lei n.º 691/69, por sua vez, impõe a contratação a prazo ao técnico estrangeiro, residente no exterior, admitido para trabalhos especializados no Brasil, em caráter provisório, com estipulação de salários em moeda estrangeira. A Lei n.º 5.889/73, a seu turno, regula o contrato de safra, cuja duração dependente de variações estacionais da atividade agrária, enquanto que a Lei nº 5.889/73 permite a contratação pelo produtor rural pessoa física de trabalhador rural para o exercício de atividades de natureza temporária. Os contratos de trabalho do atleta profissional do futebol (Lei 9.615/98) e do artista (Lei 6.355/78) também podem ser compactuados com termo final previamente estabelecido.

Cada tipo de contrato individual por prazo determinado possui um limite de duração, o qual, por força do artigo 445, da CLT, não pode ultrapassar dois anos. Caso contrário, tornar-se-á em contrato por prazo indeterminado, consoante será analisado a seguir.

Sobre os autores
José de Arimatéa Cruz

Graduado em Direito pela Faculdade de Ensino Superior da Paraíba.

Priscilla Lemos Queiroz Cappelletti

Graduada em Relações Internacionais pela Universidade Estadual da Paraíba. Graduada em Direito pela Faculdade de Ensino Superior da Paraíba. Especializando-se em Direito Civil pela Universidade Anhanguera-UNIDERP. Advogada militante nas áreas de Direito Civil e Direito do Consumidor.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CRUZ, José Arimatéa; CAPPELLETTI, Priscilla Lemos Queiroz. O contrato individual de trabalho: a mudança do prazo determinado para o indeterminado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3876, 10 fev. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26668. Acesso em: 23 dez. 2024.

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