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Principais mudanças introduzidas pela Lei nº 11.343/2006: uma análise comparativa

Agenda 19/02/2014 às 17:43

Principais mudanças no ordenamento jurídico brasileiro a partir da entrada em vigor da nova lei de drogas (Lei nº. 11.343/2006).

Resumo: Este artigo visa debater as principais mudanças no ordenamento jurídico brasileiro a partir da entrada em vigor da nova lei de drogas (Lei nº. 11.343/2006). Embora já haja quase uma década de vigência, muito ainda se discute no meio acadêmico e em trabalhos científicos sobre alguns pontos polêmicos e/ou controvertidos desta legislação. Por isso, este estudo visa comparar a nova legislação de tóxicos com as antigas leis que disciplinavam o tema, traçando, ponto a ponto, as mudanças sob o enfoque da política criminal e também do direito penal propriamente dito.

Palavras-chave: Lei de Drogas, Mudanças, Política Criminal.

Sumário: Introdução. Mudanças objetivas com o advento da Lei Nº. 11.343/2006. 1. Tratamento dispensado ao usuário e pena a ele cominada. 2. Tratamento dispensado ao traficante e penas cominadas. 3. Novas figuras típicas previstas na Lei nº 11.343/2006. 4. A controvérsia da abolitio criminis em relação à conduta do usuário. 5. Demais alterações significativas. Conclusão.


INTRODUÇÃO

A nova Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006) inaugurou no ordenamento jurídico brasileiro um nova forma de tratar este tema tão delicado. Se antes as antigas leis de drogas (Lei nº 6.368/76 e Lei nº 10.409/02) tratavam o tema mais com uma vertente penalista do que sociológica, a partir de 2006 esta lógica se inverteu.

Com o advento do novo diploma legal, o legislador demonstrou maior preocupação com o aspecto sociológico do tema. Percebeu-se que o problema não era apenas de direito penal: envolvia assistência social, economia, critérios criminológicos, políticas públicas e uma série de fatores que contribuem para a disseminação, em todo o território nacional, de substâncias entorpecentes. Tais circunstâncias revelam-se decisivas no processo de construção da política antidrogas a ser adotada pelo legislador brasileiro.

E foi por estes motivos que a Lei nº 11.343/2006 mostrou-se consoante com a realidade. Tratou o tema mais a fundo, analisou critérios não penalistas e definiu, além de crimes e sanções, critérios de política criminal. Talvez esta seja a maior inovação trazida pela nova lei. Isto porque revelou-se uma mudança na mens legis. O próprio legislador passou a enxergar o tema de uma maneira diferenciada e mais ampla.

Nas legislações anteriores, não se verificava tamanha preocupação em se abarcar diversas ciências no tratamento do mesmo tema. Em 2006, contudo, este panorama foi modificado e várias mudanças foram introduzidas. Neste estudo, o objetivo será analisar as principais mudanças trazidas por esta nova lei, estabelecendo um quadro comparativo com a legislação anterior, e traçando as mudanças essenciais havidas com o advento da lei de 2006.

Passaremos a analisar, então, as mudanças objetivas introduzidas pela nova legislação – já que o aspecto sociológico/criminológico já foi exaustivamente discutido nesta introdução. Mudanças objetivas são as mudanças nos textos de lei, que alteram figuras típicas e cominam diferentes penas às condutas, bem como dispositivos legais introdutores de novas figuras típicas.


1. TRATAMENTO DISPENSADO AO USUÁRIO E PENA A ELE COMINADA

Uma das principais mudanças introduzidas pela nova lei de drogas foi no aspecto do usuário destas substâncias. Antes, a pena cominada pela lei nº. 6.368/76 incluía a restrição da liberdade, o que foi suprimido com a nova legislação.

Vemos aqui uma opção de política criminal realizada pelo legislador: viu-se que tratar o usuário de forma criminosa, mandando-o para a prisão, não cumpria a função reeducadora da pena. As prisões brasileiras não cumpriam o processo de ressocialização do usuário, que tornava a utilizar as mesmas substâncias ou até mesmo aprofundava-se no universo das drogas.

O art. 28. da nova legislação deu lugar ao art. 16. da lei anterior, com as mudanças que seguem:

Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

I - advertência sobre os efeitos das drogas;

II - prestação de serviços à comunidade;

III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

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Comparando-se com o art. 16. da lei anterior, temos as seguintes mudanças:

Estas, portanto, são as principais mudanças trazidas pela legislação em relação ao usuário.


2. TRATAMENTO DISPENSADO AO TRAFICANTE E PENAS COMINADAS

Ainda no rol das principais alterações, menos profunda que aquela realizada na figura do usuário, temos a mudança no conceito e nas penas cominadas aos traficantes. O art. 33. da nova lei substitui o art. 12. da legislação anterior, assim dispondo:

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.

As principais mudanças, pontualmente, são:

Desta forma, percebemos que as mudanças relativas à figura do traficante, ao contrário do que aconteceu com o usuário, não foram abrandadas, mas tornaram-se mais severas. Isto explica-se em razão da natureza do crime de tráfico: não se atenta apenas contra o fato de ser um comércio ilegal, mas sim em relação ao perigo trazido à coletividade pela ação do traficante de drogas, que dissemina na sociedade as substâncias entorpecentes combatidas pela lei.


3. NOVAS FIGURAS TÍPICAS PREVISTAS NA LEI Nº 11.343/2006.

A nova lei, além de alterar dispositivos das legislações anteriores, também inovou ao tipificar, como crimes, novas condutas. São as dos artigos abaixo transcritos:

Art. 36. Financiar ou custear a prática de qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 desta Lei:

Pena - reclusão, de 8 (oito) a 20 (vinte) anos, e pagamento de 1.500 (mil e quinhentos) a 4.000 (quatro mil) dias-multa.

Art. 37. Colaborar, como informante, com grupo, organização ou associação destinados à prática de qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 desta Lei:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e pagamento de 300 (trezentos) a 700 (setecentos) dias-multa.

Art. 39. Conduzir embarcação ou aeronave após o consumo de drogas, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem:

Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, além da apreensão do veículo, cassação da habilitação respectiva ou proibição de obtê-la, pelo mesmo prazo da pena privativa de liberdade aplicada, e pagamento de 200 (duzentos) a 400 (quatrocentos) dias-multa.

Estes são os três novos tipos penais previstos na nova lei, o que a tornam, de forma consolidada, uma verdadeira inovação legislativa.


4. A CONTROVÉRSIA DA ABOLITIO CRIMINIS EM RELAÇÃO À CONDUTA DO USUÁRIO

Existe uma polêmica em torno da existência, ou não, de abolitio criminis em relação à conduta do usuário. O que houve, na verdade, foi um processo de, em linguagem comum, quase-despenalização, o que não implicou na despenalização da conduta, aplicando-se ao usuário de drogas medidas como advertência e inscrição em cursos. Tais critérios são de política criminal, mas não significam necessariamente uma abolitio criminis.

Este é o entendimento pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, conforme se vê:

HABEAS CORPUS. ART. 16. DA LEI N.º 6.368/76. SUPERVENIÊNCIA DA LEI N.º 11.343/2006. ABOLITIO CRIMINIS. INEXISTÊNCIA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE NÃO OCORRIDA.

1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal manifestou-se acerca da situação jurídica do crime previsto no art. 16. da Lei n.º 6.368/76, em face do art. 28. da Lei n.º 11.343/2006, e rejeitou a tese de abolitio criminis ou de infração penal sui generis, para afirmar a natureza de crime da conduta do usuário de drogas, muito embora despenalizado (RE 430.105 QO/RJ, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, DJe de 26/04/2007).

2. Extinção da punibilidade não configurada.

3. Ordem denegada.

(STJ - HC: 171727 SP 2010/0082524-0, Relator: Ministra LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 16/11/2010, T5 - QUINTA TURMA. Data de Publicação: DJe 06/12/2010).


5. DEMAIS ALTERAÇÕES SIGNIFICATIVAS

Algumas outras alterações foram introduzidas pela lei, também significativas, que se pontuam a seguir:

CONCLUSÃO

Ao confrontar as duas legislações, podem-se perceber significativas alterações e inovações: o legislador demonstrou maior preocupação com o aspecto sociológico do tema. Percebeu-se que o problema não era apenas de direito penal: envolvia assistência social, economia, critérios criminológicos, políticas públicas e uma série de fatores que contribuem para a disseminação, em todo o território nacional, de substâncias entorpecentes.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Lei Ordinária nº 6.368, de 1976.

BRASIL. Lei Ordinária nº 11.343, de 23 de agosto de 2006.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal, Vol. IV – Legislação penal especial. São Paulo: Saraiva, 2006.

MIRANDA, Gustavo Senna. Primeiras impressões sobre a nova Lei de Drogas (Lei nº. 11.343/2006), atualizada de acordo com as inovações trazidas pela Lei nº. 11.446/2007. Disponível em: www.mpes.gov.br. Acesso em: 02/10/2013.

Sobre o autor
Luis Felipe Araújo

Advogado (OAB/SE 8.634) e servidor da Fundação Universidade Federal de Sergipe.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAÚJO, Luis Felipe. Principais mudanças introduzidas pela Lei nº 11.343/2006: uma análise comparativa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3885, 19 fev. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26744. Acesso em: 22 dez. 2024.

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