As eleições brasileiras ganharam uma figura estranha, para não dizer repudiável, denominada Termo de Ajustamento de Conduta Eleitoral. Infelizmente, tal termo nasceu no bojo de uma das instituções mais respeitadas do meio jurídico, e fiscalizadora dos direitos e garantias fundamentais, o Ministério Público Eleitoral. Além disso, tais termos receberam, infelizmente, o aval do Poder Judiciário Eleitoral.
Minha crítica aos TCAs Eleitorais se resume ao fato de que as eleições diretas no nosso país foi uma consquista árdua. Não precisamos resgatar as minúcias desta conquista, pois é de amplo conhecimento o quão difícil foi romper as barreiras do autoritarismo e consolidar a democracia no Brasil.
A partir da abertura política as eleições deram ares de alta propagação do voto livre, de reverência à democracia, de revestimento de simbologia e liturgia festiva e popular. Seu propósito está longe de ser um conjunto de manifestações calculistas, frias, distantes do povo, ou, ainda, restritas à cartilhas, e, muito menos à predominância de muitos “não pode” em detrimento da liberdade de expressões e manifestações de pensamentos.
Deve preceder às eleições, um período de ampla discussão, de propagação de propostas, de demonstração de eloquência dos seus interlocutores, de embate de idéias, enfim, de uma verdadeira campanha eleitoral de convencimento. Campanha eleitoral significa colocar nas ruas todas as idéias criadas nos gabinetes, nos comitês eleitorais! É levar ao eleitor uma liturgia festiva dos partidos, das coligações, para que ele avalie uma a uma, e, após, escolha os candidatos que achar melhor. É assim que deve ser!
Durante anos tivemos estas demonstrações de campanhas, enfeitando as ruas brasileiras com bandeiras, com faixas, com placas, muros pintados, cavaletes, bonecos, standartes, adesivos, camisetas. De repente, movimentos retrógados começaram a ameaçar a liberdade de manifestações políticas livres, que são garantidas na Carta da República. Tentaram imprimir ares de sujeira, de lixo, de algazarra, de corrupção, de quebra de isonomia entre concorrentes àquilo que foi conquistado com muito esforço, suor, lágrimas e ideologias, ou seja, a liberdade de expressão política como um bem maior.
Dizem os representantes do Minsitério Público Eleitoral que tal medida visa atender os pedidos da população que não suporta carros de som nas ruas com propagandas e jingles, carreatas, bem como a sujeira na cidade provocada pela entrega de santinhos, adesivos e propostas.
Penso que há um número considerável de pessoas que repudiam qualquer tipo de propaganda. Porém, não são estas que devem regular a preferência. A Constituição da República além de ser nossa base de direitos é, também, nossa base histórica. Ela é marcada pela nossa história política e fixa os parâmetros mínimos das garantias e das liberdades: a de expressão é uma delas. Temos que sempre avançar nas conquistas, jamais retroceder! Portanto, sempre pela liberdade!
A figura dos TACs Eleitorais se trata, na verdade, de uma espécie ilegal de complementação à legislação eleitoral, com uma agravante, ou seja, o engessamento das campanhas eleitorais. Penso que a medida visa muito mais diminuir os problemas e trabalho para o próprio Ministério Público Eleitoral e para os Juízes Eleitorais do que proteger a sociedade de algo que ela repudia!
Ainda que haja manifestações contrárias ao sistema de campanhas eleitorais, é de se frisar que a lei eleitoral garantiu as manifestações tais como se apresentam na Lei nº 9.504/97. Se há insatisfações e se quer modificações nas regras, que seja pelo modo adequado, qual seja, por meio de projeto de lei junto ao Congresso Nacional para alterar a Lei das Eleições. Enquanto isso, a Lei das Eleições é que dita as regras das campanhas eleitorais.
A proposta dos TACs Eleitorais, penso ser uma verdadeira anômalia. A uma, porque se passou a usar estes termos de ajustamentos antes de qualquer irregularidade praticada; a duas, porque não faz nenhum sentido a sua presença nas campanhas eleitorais, tendo em vista a legislação eleitoral já regular de forma clara e delimitada, e, diga-se de passagem, de forma apertada, o que pode e o que não pode no período eleitoral em matéria de propaganda.
Temos que unificar o entendimento de que a legislação eleitoral aplicável às eleições é o velho Código Eleitoral, a Lei nº 9.504/97 (Lei das Eleições), e, as Resoluções editadas pelo Tribunal Superior Eleitoral. Nada mais! Esta legislação é dura suficiente para coibir qualquer irregularidade ou ilegalidade nas campanhas eleitorais.
E se o candidato ou a coligação não assinar o TAC Eleitoral? O que pode acontecer? Respondo: Absolutamente nada! É a legislação eleitoral que predomina. Somente ela que deve ser aplicada.
O Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso já acenou sabiamente em repudiar a presença dos TACs Eleitorais, conforme jurisprudência abaixo:
RECURSO ELEITORAL. EXECUÇÃO FIRMADA EM TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA. NULIDADE DO TÍTULO. EXTINÇÃO DO PROCESSO DE EXECUÇÃO. IMPROVIMENTO.- É nulo para todos os efeitos o Termo de Ajustamento de Conduta, firmado entre coligações e referendado pelo Ministério Público Eleitoral, que vise restringir direitos relativos à realização de propaganda eleitoral cominando pena de multa pelo descumprimento.
(Prestação de Contas nº 915, Acórdão nº 18566 de 03/11/2009, Relator(a) CÉSAR AUGUSTO BEARSI, Publicação: DEJE - Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral, Tomo 532, Data 09/11/2009, Página 1-7 )
Que as eleições sejam comandadas unicamente pelo Código Eleitoral, pela Lei nº 9.504/97, pelas Resoluções do TSE, prestigiando, acima de tudo, a liberdade de expressão política e de campanha eleitoral.