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Desistência do pedido de concordata

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Agenda 01/04/2002 às 00:00

1. INTRODUÇÃO

Os princípios que informaram o surgimento do instituto da concordata remontam à Roma antiga, quando os herdeiros, necessários ou voluntários, possuíam responsabilidade pessoal na sucessão mortis causa. Assim, quando o passivo da herança era superior ao ativo, os herdeiros, visando resguardar a memória do morto da pecha de infâmia, pactuavam com os principais credores a redução da dívida, acordo denominado pactum ut minus solvatur, o que era levado para homologação pelo magistrado.

"Na verdade, porém, não havia no direito antigo a concordata, como a conhecemos hoje" [1].

As regras gerais sobre falência, que ainda subsistem, foram elaboradas na Itália Medieval. Ocorria que muitas vezes o falido desaparecia, e, para evitar a venda compulsória de seus bens, lhe era concedido um salvo conduto para voltar à pátria. Era um meio para solucionar a situação originada pelo estado de penúria econômica do devedor e não um favor ao devedor de boa fé. Era necessário a intervenção do magistrado, como estabelecido no Statuto dei Mercanti di Lucca, de 1610. Durante o séc. XVIII foram fixadas as linhas gerais da concordata. Após sua homologação "obrigava a todos os credores quirografários por créditos anteriores ao estado de falência." [2]

O instituto transpõe as fronteiras da Itália, sendo disseminado pelo tráfico mercantil à Alemanha, Suíça, Espanha e Holanda. Na França, onde foi regulado originariamente pela Ordenança de 1673, o Código Comercial de 1807 disciplina de forma severa o assunto, mitigado em 1833 por legislação específica sobre falência e concordata

No Brasil, o Código Comercial de 1850 disciplinava através do art. 847 a concordata suspensiva, admitindo ainda em seu art. 900 a moratória deferida pelo Tribunal do Comércio. A concordata preventiva regrava-se pelo dec. n.º 917, de 1890, que instituiu a cessão de bens, abolido juntamente com a moratória pela lei n.º 2.024 de 1908, instrumento normativo regulamentador da concordata suspensiva e preventiva da falência, modificado pelo dec. n.º 5.746, de 1929.

"Hoje, o instituto jurídico da concordata despiu-se da natureza contratual e revestiu-se de uma estrutura organicamente processual; a "concordata contrato" substituiu-se, entre nós, desde 1945, pela "concordata sentença", aquela, necessitando do assentimento dos credores, e esta, prescindindo-se de tal consentimento." [3]

A natureza jurídica da concordata sempre suscitou controvérsia doutrinária. Não sendo possível a anuência de todos os credores, ou a determinação imediata de todos, o estado pré-falimentar do devedor levou à solução em que o Estado-juiz decidiria a demanda proposta por aquele comerciante em má situação econômica que pede um abatimento na dívida, um prazo para solvê-la, ou ambas pretensões, que, após todo o trâmite processual, com a estrita observância dos princípios e ditames legais pertinentes, conferem ao julgador as condições para concluir por cumprida a concordata, evitando-se a quebra da empresa.

A teoria contratual sucumbe por "abstrair da sua concepção o complexo dos atos que formam o processo, fora do qual a concordata, no sentido técnico-jurídico, não existe" [4]

Assim, a concordata é a demanda na qual o devedor procura impor aos credores quirografários a moratória judicial, visto que os efeitos oriundos do processamento regular atingem apenas o passivo quirografário e não impedem aos credores privilegiados o exercício de seus direitos de ação contra o devedor insolvente. É denominada concordata preventiva ou suspensiva, "conforme for pedida em juízo antes ou depois da declaração da falência" [5].

A concordata preventiva será: remissória, se o devedor pleitear apenas desconto de 50%, com pagamento à vista; dilatória, quando o devedor requerer o prazo de dois anos para pagamento integral; ou mista, a mais comum, onde dilata-se o prazo do pagamento para seis, doze ou dezoito meses e defere-se abatimento no importe devido em 60%, 75% ou 90%, respectivamente. Nas hipóteses de concordata dilatória e mista com dezoito meses de prazo, devem ser pagos no mínimo dois quintos dos credores quirografários no primeiro ano, conforme estatui o art. 156 da Lei de Falências.

Obtendo a concordata suspensiva, o devedor pagará 35% dos débitos, se for à vista, ou a 50% dos credores no prazo de dois anos, sendo que dois quintos no primeiro ano, ex vi art. 177, dec. lei 7.661/45.

"A concordata é um benefício que pressupõe dificuldades econômicas ou financeiras de um devedor, empresário comercial malheureux et de bonne foi, como enunciava a lei belga, que pela primeira vez, nos fins do século passado, regulou a concordata preventiva.

Para obstar a falência ou suspendê-la, dando um tempo ao devedor de recuperar ou de restaurar sua empresa em risco de ruína iminente, o instituto das concordatas é exaltado por muitos autores. Outros, porém, o combate, pois nele vêem, nas mais das vezes, um instrumento de espoliação dos credores." [6]

Mas, se após ajuizado o pedido de concordata preventiva, o devedor vier a desistir da ação, deparamo-nos com uma questão que a doutrina e a jurisprudência têm debatido sem atingir um consenso. O presente trabalho visa analisar o tema tendo o fito de por em relevo os argumentos hábeis a proporcionar um modo de conciliar o interesse dos credores quirografários no cumprimento da concordata. ou mesmo na decretação da falência do solvens, em confronto com a possibilidade de desistência da ação proposta, facultada sob certas condições pelo ordenamento processual civil em vigor ao devedor quirografário.


2. DESISTÊNCIA DO PEDIDO

Para compor situações de litígio de forma civilizada, o Estado criou o monopólio da jurisdição, ou o dever-poder de aplicar o direito visando `a paz social, afastando, com poucas exceções (como, v.g., a legítima defesa), a auto-tutela. Assim, a lesão ou ameaça de lesão de direito subjetivo será elidida através da aplicação do direito positivo, onde impera o sistema jurisdição-ação-processo. Ação é o direito público, subjetivo, abstrato e autônomo de invocar a tutela jurisdicional visando a solução de um conflito de interesses. Assim configura-se a lide, a existência de uma pretensão e de uma resistência a essa pretensão, conforme preleciona Carnelutti. Processo é o instrumento utilizado pelo Estado-juiz para compor a lide, sendo que procedimento é o rito a ser seguido para obtenção de um pronunciamento judicial válido. Uma ação difere de outra pela combinação processo-procedimento elaborada pelo legislador.

"A ação – direito subjetivo público exercitado pelo autor contra o Estado-juiz – revela, pois, a par do pedido de tutela jurídica estatal, uma pretensão de direito material contra o réu (sujeito passivo do processo).

Na realidade, o quer o autor, embora nem sempre o consiga, é que a tutela jurisdicional redunde na proteção de seu interesse e na subjugação do interesse do réu". [7]

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Desta forma, o processo apto para a atividade jurisdicional é regido por regras específicas, que determinam o modo de atuação do sistema judicial pátrio e as condições do exercício da ação. Tais regras encontram-se insculpidas na Carta Política de 1988 (princípios constitucionais do processo), tendo por vértice a cláusula due process of law [8]. No âmbito civil, vigora o CPC como norma precípua, que além de ser informadora, é parâmetro para aplicação de analogia, e tem aplicação subsidiária relativo às normas instrumentais especiais em vigor, quando nestas há hipótese de omissão legislativa. É o princípio da especialidade: lex speciali derogat lex generali. Como ainda não há diploma legal sobre desistência do pedido de concordata, busca-se o subsídio normativo nas disposições aplicáveis do CPC, nunca olvidando-se, porém, que o Dec. lei 7.661/45 possui também uma principiologia geral, como, v.g., seu art. 140, o entendimento de que a concordata é um favor legal concedido ao comerciante de boa fé [9].

Não há estipulação legal para o pedido de desistência da concordata. O instituto, porém, é espécie do gênero desistência da ação. A desistência da ação é ato unilateral do autor, praticado antes de findo o prazo para resposta do réu. Após a resposta, instaura-se o contraditório, devendo haver a aquiescência do réu (art. 267, § 4º, CPC) para ser deferido.

A desistência da ação ou do pedido não se confunde com a renuncia ao direito em que se funda a ação (art. 269,V, do CPC). A renúncia gera a extinção do processo com julgamento de mérito. Homologando a desistência da ação o juiz não analisa o mérito (art. 267, VIII, do CPC.), o que significa a sua ocorrência antes de prolatada a sentença; "naquela como nesta, contudo, incide a regra do art. 26 do CPC, quanto à condenação nas despesas processuais e honorários advocatícios." [10] Em tal situação, o patrono do autor deve possuir poderes especiais para desistir da ação, conforme art. 38 do CPC.

"E, homologada por sentença (a desistência da ação), produz seus efeitos, embora, sendo mero direito processual o que se extingue por essa forma, não impede a propositura de nova ação com o mesmo objeto, porque, salvo estipulação em contrário, a relação de direito material em que se fundou a demanda não foi afetada pela desistência da causa." [11]

Por considerar a desistência do pedido de concordata preventiva dilatória forma de renúncia ao próprio favor concedido pela lei falimentar, assevera Bottesini [12] que a integração da lei será feita tendo por paradigma o art. 269, V, do CPC, ao invés de ser utilizado o art. 267, VIII.

Entende que " acolher tal pedido, como a desistência disciplinada pelo art. 267, VIII, do CPC, implicaria outorga à concordatária desistente, da faculdade de renovar a instância pelos mesmos créditos, ou por alguns deles, mesmo que supervenientes, o que esbarraria na vedação legal posta no art. 143, III, da Lei de Falências".

Ousamos divergir deste posicionamento, pois tanto para a desistência da ação quanto para a renúncia ao direito é exigido mandato outorgado com poderes especiais. A vontade do devedor deve ser inequívoca. Também não podemos olvidar que a renúncia do direito material à concordata significaria a obrigatoriedade de requerer-se auto-falência caso a empresa voltasse a um estado de penúria econômica, e isto não atenderia à finalidade da lei falimentar, que procura proteger o comerciante de boa fé, e não pulverizá-lo do cenário comercial através da execução coletiva.

Poderá, então, o devedor que teve o pedido de desistência de concordata homologado requerer novamente o favor legal. " O empresário que anteriormente requereu a moratória judicial e, depois de concedida, dela desistiu, não está impedido de requer outro favor legal, mas, inclusive nesta hipótese, terá de aguardar o prazo de cinco anos. Como medida de cautela, também, neste caso, não será demais instruir o novo pedido de concordata com a sentença homologatória da desistência" [13].


3. DESISTÊNCIA DO PEDIDO DE CONCORDATA

Considerando a inexistência de norma legal reguladora da desistência do pedido de concordata, conforme já salientado, verifica-se que o vácuo legislativo é apenas aparente e não impede a existência válida do instituto. Muito pelo contrário, esta situação corrobora a eficácia do sistema processual em vigor, sustentado por princípios, os quais informam inclusive o ato de legislar, como os insculpidos no art. 4º da LICC: "Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito". [14] Esta situação está patenteada no seguinte trecho de acórdão do TJSP [15]: "A lei falimentar é omissa a respeito da desistência da concordata, como também o é em relação ao recurso da decisão homologatória da desistência."

Por faltar o diploma legal específico, "faz o juiz aplicação da norma a casos não previstos, mas que com ela guardem identidade de razão, sob a invocação do princípio segundo o qual se presume que o legislador lhe daria o mesmo regime, se dele tivesse cogitado: "ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio". Chama-se a este processo analogia legal, e por ele se estende o dispositivo da lei a um caso não previsto, seja porque não cogitou do assunto o legislador, no momento de ditar a regra, seja porque surgiu ulteriormente em conseqüência do desenvolvimento da ciência, da complexidade da vida econômica, ou das novas exigências sociais." [16]

"A disciplina legal do pedido de desistência da concordata preventiva dilatória é, inegavelmente, questão em que a Lei de Falências se mostra lacunosa. Não há nela disposição expressa no sentido de que a concordatária possa desistir do favor legal que requereu, e que ainda não lhe foi concedido por sentença." [17]

Destarte, "se, pois, a decisão que admite a concordata, constitui o estado concordatício, declarando os termos da inicial do devedor e submetendo-o à mediata eficácia falencial se adimplir, é claro que o pedido de desistência de concordata, posteriormente, de efeito desconstitutivo, há de depender da prova de pontualidade e solvência". [18]

3.1 Possibilidade de desistência.

A desistência da concordata preventiva é admitida como faculdade do devedor, antes ou depois do despacho que instaura este procedimento, desde que "inexista qualquer motivo que obrigue o juiz ao decreto da falência do peticionário, na fase daquele art. 161, "caput", ou que obrigue a convolar a concordata preventiva em falência (art. 162)." [19]

Tal privilégio tem fundamento na premissa segundo a qual " a concordata é um favor legal concedido ao comerciante devedor. E desde que deferida em seu benefício, pode dela desistir"

"Assim, homologada a desistência, volta ao credor, integralmente, o direito representado pelo crédito, assistindo-lhe a faculdade de, não satisfeita a dívida, requerer a falência do devedor ou tomar as providências cabíveis sem as limitações decorrentes do processo da concordata. Ou, como observa Elias Bedran, "os credores nenhum prejuízo poderão alegar contra a suspensão, porque ficarão livres para manejarem a cobrança de seus créditos, regularmente." [20]

Segundo Netto Armando, [21] "da desistência nenhum prejuízo promana aos seus credores, mas, muito ao revés, só vantagens poderão advir-lhes daquela desistência. É que, com a concordata protela-se-lhes o pagamento; reduzem-se-lhes os créditos; cessam-se lhes os juros creditórios; suspendem-se-lhes as ações e execuções, enquanto que, homologada aquela desistência, quebram-se todos os elos que prendiam aquêles credores quirografários à concordata preventiva, fosse esta simplesmente diminutiva, fosse apenas dilatória, fosse – como quase sempre o é – mista."

"A desistência pode ser requerida em qualquer fase do processo de concordata: antes ou depois da decisão que deferiu o processamento da concordata. Porém, há decisões considerando abusivo e irregular o exercício do direito de desistência às vésperas do vencimento da primeira parcela, sem a anuência dos credores" [22].

3.2 Desistência condicionada.

Existem condições objetivas que impedem o deferimento do pedido de concordata, além das elencadas pela lei falimentar como hipótese de decretação da quebra ex officio(arts. 161 e 162, LF).Tais condições devem ser verificadas detidamente durante análise do caso concreto, podendo ser comprovadas nos autos pelos credores através de qualquer meio de prova admitido em direito, visto que um pedido temerário de desistência significa tentativa do devedor em evitar o cumprimento da concordata e gerar prejuízo aos credores.

A análise do pedido de desistência deve ser ainda mais acurada após o despacho que determina o prosseguimento do feito. O despacho que instaura o procedimento da concordata gera, para os credores, o direito subjetivo de obter seus créditos como ali estipulado. Sendo a concordata óbice ao requerimento de falência e à execução fundados em créditos quirografários, o seu ajuizamento exterioriza a má situação financeira da empresa, que poderá ser salva de iminente falência se forem a final julgadas cumpridas as estipulações do despacho que analisa o pedido de concordata, considera-o apto e instaura o procedimento, modificando as obrigações estabelecidas entre a concordatária e seus credores quirografários.

"E êsse caráter constitutivo, não pode ser olvidado, porque o que o concordatário quer, no exercício da ação judicial intentada, é obter a modificação de seu estado jurídico; e essa modificação não se circunscreve à pessoa concordatária – vai atingir vastas camadas de interesses que estão vinculados ao comerciante que pede o favor. Os efeitos do despacho que ordena o processamento, que admite a concordata, são de tal profundidade, que constitui o tal despacho o esqueleto estrutural básico e condicionante da fase final do cumprimento do favor; sem a articulação válida, íntegra e autêntica da instauração do processo concordatício, não tem razão de ser o encerramento dêle; e daí, aquele dever de o juiz decretar a falência, em qualquer momento do processo, de acôrdo com as circunstancias do art. 162.

O elenco de conseqüências, decorrentes da admissão da concordata é de tal vulto que, se se acolhesse a desistência, indistintamente, a qualquer momento, ao livre alvedrio do devedor, alienaríamos o próprio instituto e teríamos que a lei, concedendo o benefício ao devedor, também lhe dá o direito de prejudicar os credores o que é absurdo. Se todos são iguais perante a lei – não pode ela dar a mão a um para abandonar o outro ao abismo. E não se esqueça de que, se a falência está implícita no pedido de concordata preventiva, a desistência desta implica, em tese, a plena confissão daquela." [23]

"É esse despacho que instaura o juízo universal, produzindo, inclusive, o efeito de suspender o prazo prescricional dos títulos do devedor. Após a publicação do edital de convocação dos credores não é mais possível a desistência unilateral da concordata; para esta passa a ser necessária a concordância dos credores, cujos títulos, por força da concordata instaurada, não puderam ser exigidos" [24]

Destarte, o pedido de desistência só poderá ser homologado ser não for comprovado prejuízo aos credores.

Se antes de decidir sobre o pedido de concordata o magistrado estiver ante um requerimento de desistência, deverá perquirir se há motivos para decretar a quebra da empresa de ofício. Isto decorre do estado pré-falimentar confessado pelo devedor ao requerer concordata. Inexistindo óbice ao deferimento de desistência da concordata preventiva, o julgador não deferirá tal pedido sem ouvir os credores, pois foi instaurada a relação jurídica processual.

"A matéria, na doutrina, suscitou divergências. Miranda Valverde entendia que " o devedor pode sempre desistir do pedido de concordata preventiva e confessar falência" ( Comentários à Lei de Falências, Vol. III, pág. 215); Pontes de Miranda, igualmente, compreendia que "de desistência só se há de falar se deferido o pedido de decretação da falência" (Tratado de Direito Privado, Vol. 30, § 3.495-2)... Maximilianus Cláudio A. Fuher salienta que "não existe na lei nenhum artigo expresso que impeça a desistência. Se a falência for decretada, sê-lo-á por outro motivo, e não pela desistência em si" (Roteiro das Falências e Concordatas 3ª ed., 1974, pág. 112). Nós a admitimos antes do despacho de processamento da concordata e mesmo depois dele, até ser concedida a concordata, mas não após sua concessão, quando poderia haver renúncia, descumprimento ou cumprimento. [25]

Da decisão que homologar a desistência cabe recurso de apelação, uma vez que encerra o processo (arts. 267, VIII, e 513, do novo Cód. Proc. Civil)." [26]

Há, entretanto, posicionamento no sentido de ser impossível o deferimento do pedido de desistência após o despacho que instaura o processamento da concordata, como evidenciado no seguinte acórdão unânime da 1ª Câmara Cível do colendo TJMT:

"Se a falência está implícita no pedido de concordata preventiva, a desistência desta implica, em tese, a confissão daquela. Mas e´ certo Que o juiz pode deferir a desistência da concordata preventiva, deixando de decretar a falência se, justificado o pedido, o concordatário o formula antes do despacho que defere a instauração do processo, e não depois dele, o qual, com sua considerável carga de efeitos, antecipa a sentença, de caráter constitutivo, a ser, a final, proferida. Se fosse possível acolher a desistência, a qualquer momento, ao livre alvedrio do devedor, alienar-se-ia o próprio instituto da concordata, para admitir que a lei, concedendo o benefício ao devedor, também lhe dá direito de prejudicar credores." [27]

Entretanto, "simples indeferimento do pedido de desistência do pedido de concordata preventiva, de per si, não justifica a decretação da falência se não estiverem provada nos autos a falta dos requisitos previstos em lei e enumerados na LF 162 ou manifestamente constatada a insolvência absoluta do devedor (RT 643/81) [28]

Também não há consenso sobre a obrigatoriedade de quitação dos tributos para desistir-se do favor legal. Vejamos a seguinte orientação pretoriana, inserida na LEX 184/30:

"CONCORDATA – Desistência – Homologação – Prova da quitação dos impostos – desnecessidade – Créditos fazendários que, gozando de preferência, podem ser cobrados a qualquer momento – Artigos 187 do Código Tributário Nacional, e 28 da Lei Federal n. 6.830, de 1980 – Recurso não provido.

É desnecessária a prova de quitação dos impostos, para a homologação de desistência da concordata.

Apelação Cível n. 281.381-1 – Campinas – Apelante: Fazenda do Estado – Apelada: Lubflex Indústria e Comércio Ltda., em concordata".

"Para homologação do pedido de desistência de concordata preventiva, dispensável (...) a exibição da prova da quitação dos impostos, uma vez que eventuais débitos fazendários poderão ser cobrados fora do processo concordatário."(TJSP, in RT 674/115)

Não obstante tal posicionamento, entendemos ser a prova da quitação de tributos documento que deva ser anexado à exordial. Portanto, não será deferido a desistência da ação proposta, mas sim indeferida esta pretensão incidental, decretando-se a quebra da empresa que não apresentou certidão negativa de débito fiscal até a fase do art. 174 da lei falimentar. Senão, vejamos:

"O concordatário tem a faculdade de desistir da concordata, por se cuidar de favor que lhe é concedido. Mas esta faculdade não se apresenta incondicionada, e o pedido de desistência não deve ser homologado quando vise impedir a conversão da concordata em falência, a teor do art. 174, I, da Lei de Falências. Devedor com títulos protestados e débitos fiscais e ao IAPAS"(JSTJ, 9/114)"

"O art. 3º do Dec.-lei 858/69 estipula que não será distribuído requerimento de concordata preventiva sem prova negativa de executivo fiscal"(TJSP, in RT 668/84).

"Não será concedida concordata nem declarada a extinção das obrigações do falido, sem que o requerente faça prova da quitação de todos os tributos relativos à sua atividade mercantil"(CTN, art. 191) [29].

Isto decorre do próprio conceito de tributo: prestação pecuniária compulsória, não decorrente de sanção por ato ilícito, instituída por lei e cobrada por atividade administrativa vinculada.

A exação tem por como norte "o princípio da legalidade: só são exigíveis os tributos decretados em leis, nos casos e dentro dos limites desta. Em conseqüência, nos países de controle judicial de constitucionalidade e legalidade dos atos administrativos, há remédios expeditos (mandados de segurança, p. ex.) e recursos contra exigências ilegais por parte do Fisco" [30].

"O tribunal de Justiça de Minas Gerais, escudando-se no ensinamento de Trajano M. Valverde (in Falência no Direito Brasileiro, vol. III, p.194), decidiu que pode o requerente da concordata desistir do pedido, antes do despacho que abre o processo (Minas Forense, vol. 12/236).

J. Neto Armando sustenta que, não existindo obrigação do juiz decretar a falência do requerente de concordata preventiva, pode este requerer e obter a desistência, sem que isto implique em falência (Rev. For., 203/394).

Até o despacho de processamento da concordata preventiva pode haver pedido de desistência.

Depois dele e até ser decretada a concordata pode, também, ocorrer desistência.

Entretanto, após a decisão que decretar a concordata, não cabe mais desistência, mas renúncia, descumprimento ou cumprimento." [31]

3.3. Impossibilidade.

Vislumbramos como possível a desistência do pedido de concordata somente em se tratando de concordata preventiva, e não na suspensiva, onde tal requerimento necessariamente levaria à decretação da quebra. "É natural que assim seja, pois na hipótese de concordata suspensiva da falência, o pedido de sua desistência pelo concordatário resultaria infalivelmente no restabelecimento da falência suspensa, ou, para evitá-la, no pagamento integral dos credores." [32]

Sobre o autor
Maurício Coutinho de Almeida

advogado em Belo Horizonte (MG), mestrando em Direito Empresarial pela Faculdade de Direito Milton Campos, professor de Direito da Universidade de Itaúna (MG)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, Maurício Coutinho. Desistência do pedido de concordata. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 56, 1 abr. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2835. Acesso em: 22 dez. 2024.

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