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A proteção dos dependentes no auxílio-reclusão frente às alterações dadas pela Emenda Constitucional n.º 20, de 15 de dezembro de 1998

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Agenda 06/11/2014 às 14:45

O presente trabalho acadêmico abordará a evolução constitucional e legislativa do auxílio-reclusão no Brasil, explanará os requisitos de concessão e discutirá a constitucionalidade da Emenda Constitucional nº. 20/1998.

RESUMO:O presente trabalho acadêmico abordará a evolução constitucional e legislativa do auxílio-reclusão no Brasil, explanará os requisitos de concessão e discutirá a constitucionalidade de um deles – instituído pela Emenda Constitucional nº. 20/1998 –, o qual exige, para a concessão do benefício, que o segurado seja de baixa renda, abstendo-se tal emenda quanto à situação por que passarão os dependentes dos demais segurados. Os Tribunais Regionais Federais já não mais decidem pela inconstitucionalidade da reforma constitucional, preferindo seguir o atual (mas não vinculante) entendimento do Supremo Tribunal Federal.

PALAVRAS-CHAVE: Auxílio-reclusão. Requisitos. Segurados de baixa renda. Dependentes excluídos.


1.    Introdução

Levantamento do Ministério da Justiça[1] aponta que, no Brasil, havia em dezembro/2012 490.822 presos em regimes de restrição significativa de liberdade (condenados a regime fechado e semiaberto, bem como presos provisórios em carceragens da Polícia ou em penitenciárias). Um dado assustador quando se sabe que no mesmo mês do ano de 2011 havia 451.914 presos nestas condições, o que revela um aumento de 38.908 presos em um ano (aproximadamente 9%), isto excluindo aquelas pessoas condenadas a regimes abertos ou a penas pecuniárias.

No mesmo período, o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) concedeu 34.439 auxílios-reclusão à população urbana e 3.460 à população rural, totalizando 37.899 benefícios desta espécie concedidos, mas que, longe de parecer significativo para a Previdência, representou apenas 0,10% de tudo o que a Previdência gastou em benefícios no ano de 2012[2].

Auxílio-reclusão: um benefício que se concede à família do segurado levado à prisão em regime fechado, semiaberto ou regime equivalente no aspecto da restrição da liberdade. Um benefício até certo ponto polêmico e, dentre os benefícios previstos na Legislação Previdenciária, o que mais desperta dúvidas acerca não só de seus critérios para concessão, mas quanto a sua própria existência.

Assim, este trabalho acadêmico se propõe a abordar tão polêmico benefício, debatendo as correntes que se formaram neste processo crítico, bem como se propõe, com o discurso, desmitificar a ideia de que tal benefício se constitui em uma benesse gratuita do Estado a fomentar a delinquência.

Evidenciaremos um olhar que vai além do sentimento de vingança contra o infrator, um olhar que procura ver as necessidades dos familiares que foram deixados desguarnecidos em virtude do encarceramento do segurado. Estes, sim, os verdadeiros beneficiários da norma.

Porém, todo este estudo seguirá traçando primeiramente a evolução histórica do instituto, para depois explicitar seus requisitos concessivos e, somente com o fechamento deste ciclo propedêutico, criticar os mesmos, refletindo sempre a respeito da situação dos dependentes, cuja proteção restou claramente prejudicada após a edição da Emenda Constitucional n.º 20, de 15 de dezembro de 1998 (EC 20/98).


2.    Histórico no Brasil e Direito Comparado

O Brasil é o único País em que existe o benefício nos moldes do auxílio-reclusão, cuja previsão remonta ao extinto Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos (IAPM) e, após, pelo também extinto Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Bancários (IAPB).[3] Assim, vê-se que no direito comparado não se tem a prisão do segurado como risco social a ser coberto pela previdência social, não sendo nenhuma surpresa “a perplexidade dos operadores do direito de outros países ao tomarem conhecimento da existência de benefício previdenciário decorrente da prisão do segurado no Brasil”[4].

Porém, não se pode entender como demérito o fato de que apenas o Brasil conta com tal benefício, considerando que em outros países há benefícios também não alcançados pelas legislações estrangeiras, como é o caso da “previdência social argentina, que garante pensão para as mães com mais de 7 filhos”[5].

Enfim, ainda que se tenha a origem do benefício nos Institutos acima narrados, foi mesmo com a Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960, denominada Lei Orgânica da Previdência Social – LOPS que o direito ganhou status universal. Vejamos o que dispunha o texto normativo:

CAPÍTULO XIDO AUXÍLIO-RECLUSÃO

Art. 43. Aos beneficiários do segurado, detento ou recluso, que não perceba qualquer espécie de remuneração da emprêsa, e que houver realizado no mínimo 12 (doze) contribuições mensais, a previdência social prestará auxílio-reclusão na forma dos arts. 37, 38, 39 e 40, desta lei.

§ 1º O processo de auxílio-reclusão será instruído com certidão do despacho da prisão preventiva ou sentença condenatória.

§ 2º O pagamento da pensão será mantido enquanto durar a reclusão ou detenção do segurado o que será comprovado por meio de atestados trimestrais firmados por autoridade competente.

Digno de nota é que, à semelhança dos requisitos da pensão por morte na época, para a concessão do auxílio-reclusão se exigia do segurado que ele tivesse realizado no mínimo 12 (doze) contribuições mensais à Previdência Social antecedendo o fato gerador do benefício. Como veremos a seguir, este número mínimo de contribuições necessárias à postulação do benefício, denominada “carência”, não mais faz parte dos requisitos atuais de concessão.

Pois bem. Se foi verdade que o auxílio-reclusão teve previsão normativa já faz mais de meio século, no plano constitucional sua previsão é recente, pois foi com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 que se deu a primeira normatização do benefício com semelhante respaldo. Nenhuma outra Constituição que a antecedeu fez tal previsão.

É certo que a Constituição de 1988, ao dispor do risco social “reclusão”, não fez nenhum detalhamento acerca dos requisitos de concessão, mas já percebia-se que, topologicamente, não era o mesmo atrelado à renda do segurado, como ocorreu com o salário-família. Vejamos a redação original do diploma constituinte:

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Art. 201. Os planos de previdência social, mediante contribuição, atenderão, nos termos da lei, a:

I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte, incluídos os resultantes de acidentes do trabalho, velhice e reclusão;

II - ajuda à manutenção dos dependentes dos segurados de baixa renda;

III - proteção à maternidade, especialmente à gestante;

IV - proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário;

V - pensão por morte de segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, obedecido o disposto no § 5º e no art. 202.

Para conter o que se propagou como “o rombo da Previdência” – um problema financeiro e atuarial que se projetou tão sombriamente – procedeu-se à sua reforma que, de tão lesiva ao trabalhador, foi apelidada de “contrarreforma”. A alteração constitucional ficou a cargo da Emenda Constitucional n.º 20, de 15 de dezembro de 1998 (EC 20/98), um inconteste retrocesso em termos de proteção social. Vejamos:

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:     (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)       (Vide Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada;     (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

II - proteção à maternidade, especialmente à gestante;     (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

III - proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário;     (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

IV - salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda;     (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º.     (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) (grifos nossos).

Assim, percebe-se claramente que o inciso IV do art. 201 da CF restringiu as possibilidades de concessão do auxílio-reclusão, que antes era irrestrita quanto à renda do segurado, para alcançar, agora, apenas os dependentes dos segurados de baixa renda.

E o que vem a ser “segurado de baixa renda”? A resposta foi ofertada pela própria Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998 que, em disposição de conteúdo transitório, em seu art. 13, trouxe a regra de que:

Até que a lei discipline o acesso ao salário-família e auxílio-reclusão para os servidores, segurados e seus dependentes, esses benefícios serão concedidos apenas àqueles que tenham renda bruta mensal igual ou inferior a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais), que, até a publicação da lei, serão corrigidos pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do regime geral de previdência social.

Note-se que o valor disposto na Emenda Constitucional nº 20 equivalia, à época, a aproximadamente 2,8 salários mínimos, haja vista o salário mínimo vigente em dezembro de 1998 (quando da publicação da referida Emenda) corresponder a R$130,00.

No plano infraconstitucional, coube à Lei nº 8.213/90 e ao Decreto nº 3.048/99 a regulamentação da matéria, cujos textos servem de referência para a entidade concessora, o Instituto Nacional do Seguro Social, cumprir a sua função distributiva.


3.    Requisitos para obtenção do benefício

Conforme vimos, a concessão de auxílio-reclusão, atualmente, depende do preenchimento de três requisitos: qualidade de segurado do recluso; dependência econômica dos requerentes em relação a ele; e ser a renda do recluso inferior ao valor estabelecido no art. 13 da EC n.º 20, de 15.12.98, com as atualizações pertinentes.

a.    Qualidade de segurado do recluso

À semelhança da pensão por morte, não há necessidade de cumprimento de carência (número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, vide art. 24 da Lei nº 8.213/91), bastando a comprovação da qualidade de segurado. Isto não quer dizer que ser segurado corresponde a manter-se empregado. Mesmo o desempregado pode ostentar a condição de segurado, desde que se filie facultativamente ao regime e realize as contribuições devidas ou esteja em período de graça, que, de acordo com o que preceitua o art. 15 da Lei nº 8.213/91, é o tempo máximo que o segurado poderá deixar de contribuir sem romper o vínculo com o sistema.

Porém, não é demais lembrar que a condição de segurado deve vir acompanhada com a prova da situação de recluso, tanto é que a Lei nº 8.213/91, no parágrafo único do art. 80, exige que “o requerimento do auxílio-reclusão deverá ser instruído com certidão do efetivo recolhimento à prisão, sendo obrigatória, para a manutenção do benefício, a apresentação de declaração de permanência na condição de presidiário”.

Assim, o benefício somente é devido durante o período em que o segurado estiver efetivamente recolhido à prisão, sob regime fechado ou semiaberto (art. 116, § 5º, do Decreto nº 3.048/99), em decorrência de decisão judicial de qualquer natureza que determine seu recolhimento à prisão, mesmo em caso de prisão civil por dívida de natureza alimentícia, ou prisão processual (temporária, preventiva, v.g.).

Logo, não é devido o benefício no caso de cumprimento de pena em regime aberto ou quando o apenado cumpre a sanção em liberdade. Entende-se que, neste caso, o segurado não estaria impedido de trabalhar e sustentar, com recursos próprios, sua família[6].

b.    Dependência econômica dos requerentes em relação ao recluso

O auxílio-reclusão possui natureza substitutiva da renda do trabalhador, sendo devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço (art. 80 da Lei nº 8.213/91).

São, pois, os dependentes elegíveis a beneficiários do auxílio, divididos em três classes, de acordo com os incisos do art. 16 da Lei 8.213/91. Existindo alguém pertencente a uma classe, os dependentes das demais classes serão automaticamente excluídos da proteção previdenciária. São elas:

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente; (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)

II - os pais;

III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente; (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)

[...]

§ 2º .O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)

[...]

§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.

Portanto, as regras da pensão por morte são aplicáveis, no que couber, ao auxílio-reclusão, ou seja, aplicam-se as disposições da pensão por morte enquanto não houver disposição específica em contrário.

Assim, as cotas individuais do auxílio-reclusão extinguem-se pela ocorrência da perda da qualidade de dependente, caso em que sua cota reverterá em benefício dos demais dependentes, se houver. Neste ponto não há qualquer diferença com a pensão por morte e, inclusive, vem a cessar: quando da morte do segurado preso; quando o dependente antes menor de idade completar vinte e um anos, salvo se for inválido, ou pela emancipação, ainda que inválido, exceto, neste caso, se a emancipação for decorrente de colação de grau científico em curso de ensino superior; ou, para o beneficiário inválido, pela cessação da invalidez, verificada em exame médico-pericial a cargo da previdência social. Ressalte-se, ainda, que perde o filho-beneficiário perderá a condição de dependente se vier a ser adotado por outra família (logo, não perde a condição quando o cônjuge ou companheiro adota o filho do outro). 

Com a extinção da cota do último pensionista, a pensão por morte será encerrada. 

Uma das particularidades, então, repousa no que se refere ao caso de fuga, hipótese que suspende a percepção do benefício pelo dependente até que haja recaptura do segurado, sendo a benesse restabelecida a contar da recaptura, e desde que esteja ainda mantida a qualidade de segurado (§ 2º da IN nº 45/2010).

Falecendo o segurado preso, o auxílio-reclusão pago aos seus dependentes será automaticamente convertido em pensão por morte (art. 118 do Decreto nº 3.048/99), sem que os dependentes, portanto, tenham que o requerer.

c.     A renda do recluso deve ser inferior ao valor estabelecido no art. 13 da EC n. 20, de 15.12.98 com as atualizações pertinentes.

O derradeiro requisito para a concessão do benefício foi acrescentado pela EC 20/98, que restringiu a proteção apenas aos dependentes de segurados de baixa renda[7]. Com esta retração, objetivou-se reduzir o número de beneficiários do auxílio-reclusão, como se o pagamento de tal benefício fosse o responsável pelo déficit da previdência social no Brasil. Conforme vimos, o auxilio-reclusão, em 2012, representou apenas 0,10% de tudo que a Previdência gastou em benefícios no ano.

De toda forma, cabe aqui tecer algumas considerações sobre o conceito de baixa renda, deixando a questão da constitucionalidade para estudo em item específico.

Pois bem. Para efeito da aferição da baixa renda, esta será considerada o último salário-de-contribuição[8], tomado em seu valor mensal, na data da cessação das contribuições ou do afastamento do trabalho em decorrência da prisão (art. 334, §2º, inc. II, Instrução Normativa INSS/PRES nº 45/2010).

Tal critério parece-nos incorreto, ao menos se adotado rigorosamente. Não seria rara a situação em que a última remuneração do recluso se mostrasse superavaliada, como é o caso da percepção das verbas rescisórias, que não corresponderia, de fato, às parcelas salariais do segurado. Assim, poderia o critério ser flexibilizado diante da peculiaridade do caso concreto.

Veja-se também o segurado que, ao longo do ano, recebia rendimentos variáveis, como é o caso de empregados comissionistas. Neste caso, o mais correto seria apurar a renda segundo média aritmética dos últimos 12 salários, assim como se pratica no direito do trabalho para fins de se aferir o quanto para pagamento do 13º salário.

Na contramão, todavia, prescreve o § 6º, art. 334, da IN 45/2010[9] que, o segurado que recebe por comissão, sem remuneração fixa, terá considerado como salário-de-contribuição mensal o valor auferido no mês do efetivo recolhimento à prisão, da mesma maneira que os demais, como se tais segurados não merecessem tratamento diferenciado.

Mas controvérsia mesmo se pode deparar quando o segurado recluso encontrar-se desempregado por ocasião de seu encarceramento, e em fruição de período de graça. Neste caso, vê-se que ele não auferia qualquer rendimento, o que tem levado alguns órgãos do judiciário a considerar, para fins de apuração da baixa renda, que o segurado tinha como último salário-de-contribuição o valor zero. Ou seja, o recluso que estivesse desempregado às vésperas do encarceramento sempre seria considerado de baixa renda. É o que vem entendendo uma das turmas do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Vejamos:

ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. AUXÍLIO-RECLUSÃO. REGULARIDADE DA REPRESENTAÇÃO. SEGURADO DESEMPREGADO AO TEMPO DA PRISÃO. REFERÊNCIA SALARIAL INEXISTENTE. 1. Não há necessidade de juntada da certidão de nascimento dos filhos substituídos, uma vez que constam da relação de dependentes junto ao INSS, fl.12. 2. O motivo determinante do indeferimento do pedido de auxilio-reclusão foi o valor do salário de contribuição do segurado, de forma que não pode o impetrado invocar outros fundamentos para afastar o direito almejado, uma vez que a autoridade fica vinculada à motivação externada. 3. Nesse desiderato, verifica-se que ao ser preso, em 19/07/00, o segurado estava desempregado, estando em período de graça prorrogado, de forma que não vertia contribuições para o sistema e não possuía qualquer renda de molde a impedir o pagamento do auxílio-reclusão a seus dependentes. (TRF1, AC - APELAÇÃO CIVEL – 200138000233763, Relator(a): JUÍZA FEDERAL ROSIMAYRE GONCALVES DE CARVALHO, Data da Decisão: 19/09/2012 2ª TURMA SUPLEMENTAR, Data da Publicação: 20/11/2012)

Felizmente, mas com a ressalva de que o último salário-de-contribuição nem sempre reflete o padrão remuneratório anterior do segurado, vem a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais e, na linha do entendimento administrativo, decidindo que, em caso de desemprego do segurado, “o valor a ser considerado – para enquadramento do segurado no conceito de baixa renda para fins de percepção de auxílio-reclusão – deve corresponder ao último salário-de-contribuição efetivamente apurado antes do encarceramento”[10].

Para esse órgão judiciário, considerar (na ausência de renda decorrente de desemprego) salário-de-contribuição equivalente a zero seria o mesmo que reconhecer um salário-de-contribuição ficto, o que não vem sendo reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal (RE 583.834/SC, Relator Min. Ayres Britto, julgado em 21.9.2011, Informativo 641). 

Por fim, cabe deixar uma crítica acerca de como o Governo vem atualizando os valores do teto de salário-de-contribuição para a concessão do auxílio-reclusão, aproximando-o cada vez mais do salário-mínimo.

Em 1998, quando aprovada a EC 20/98, o valor do salário de contribuição requerido era de R$ 360,00, hoje, para ter direito ao benefício, o último salário-de-contribuição do segurado, tomado em seu valor mensal, deverá ser igual ou inferior ao valor de R$ 1.025,81 (um mil e vinte e cinco reais e oitenta e um centavos), de acordo com a Portaria Interministerial MPS/MF nº 19, de 10 de janeiro de 2014. Tem-se um reajuste de 284,94 %.[11]

Se tomássemos os valores do salário-mínimo nacional como base de comparação, temos em 1998 o valor do salário-mínimo de R$ 130,00 que, até o final do ano de 2014, era de R$ 724,00. Um reajuste de 556,92%.

A partir desta análise pode-se comprovar que a base de reajuste do benefício previdenciário é significativamente menor do que a do salário mínimo. Por um lado, isto faz com que a cobertura do auxílio-reclusão seja cada vez mais restrita e focalizada, afastando uma parcela significativa de dependentes que poderia ser alcançada pelo benefício. [12]

E, caso esta base de reajuste seja mantida, em alguns anos o valor do salário de contribuição será ultrapassado pelo salário mínimo, ou seja, chegará o dia em que o auxílio-reclusão será, na prática, extinto, em completo desrespeito à concepção inicial do poder constituinte originário.

Sobre o autor
Wesley Adileu Gomes e Silva

Procurador Federal - AGU. Especialista em Direito Público pela Facape e Especialista em Direito Previdenciário pelo Juspodivm. CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/9722241243723112

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ADILEU, Wesley Gomes Silva. A proteção dos dependentes no auxílio-reclusão frente às alterações dadas pela Emenda Constitucional n.º 20, de 15 de dezembro de 1998. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4145, 6 nov. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29875. Acesso em: 15 nov. 2024.

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