DECRETRO-REGULAMENTO - MEDIDA PROVISÓRIA - LEI
O Decreto 3555/2000 foi editado para regulamentar a Medida Provisória 2026-3, de 28 de julho de 2000, no âmbito federal. Entretanto, este diploma não foi apreciado pelo Congresso Nacional, tendo o Presidente da República adotado, em 23 de agosto de 2000, a MP 2026-4 e assim sucessivamente até a MP 2182-18, sempre convalidando os atos praticados com base na medida provisória anterior.
A convalidação dos atos praticados durante sua vigência, já o dissemos em nosso livro Medidas Provisórias, deve ser operada pelo Congresso Nacional, e não por medida provisória expedida pelo Chefe do Executivo [45] (artigo 62, parágrafo único). Atualmente a Constituição é expressa na ordem, quando atribui ao Congresso Nacional a competência para disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas decorrentes das medidas provisórias que perderam eficácia (§ 3º do artigo 62, com a redação dada pela EC 32/2001). De qualquer forma, as relações jurídicas delas decorrentes vinham sendo convalidadas pelas medidas provisórias subseqüentes, e a lei, finalmente, convalidou os atos praticados com base na Medida Provisória 2182/2001.
Em face das sucessivas reedições das medidas provisórias e, portanto, do esvaziamento de cada uma delas, com a perda da eficácia, na medida em que o Congresso Nacional não a tivesse apreciado e convertido em lei, questão de sumo interesse surge com relação a decreto regulamentar de medida provisória que não tenha sido apreciada no prazo constitucional.
Indaga-se se o decreto-regulamento continua em vigor, na hipótese de a medida provisória ser substituída por outra, como vinha acontecendo, ou, como no caso concreto, pela lei.
Não temos dúvida em afirmar que o decreto permanece íntegro, para regulamentar os atos na esfera federal, desde que a nova medida provisória ou a lei contenha a mesma matéria regulamentada, com mínima variação, isto é, não disponha de modo diferente e as relações decorrentes do diploma anterior tenham sido convoladas, isto é, naquilo que não colidir com a lei.
Hely Lopes Meirelles afirma, categoricamente, que o decreto vigora, em sua plenitude, se a matéria regulamentada estiver contida na nova lei. [46]
Diógenes Gasparini leciona, que os decretos-regulamento fundamentam sua legitimidade na lei que eles regulamentam e, desaparecendo esta, deixa o decreto regulamentador de existir. [47]
Contudo, com relação à medida provisória, desde que seja objeto de reedição e convoladas as relações dela decorrentes, entende esse autor que o decreto regulamentador continua em vigor [48].
Outra questão significativa diz respeito à regulamentação de medida provisória.
A regulamentação da medida provisória, por decreto do Executivo, é perfeitamente lícita, visto que ela é lei, sem embargo de o ser, sob condição resolutiva. Seria absurdo que a Carta previsse, como de fato prevê, a edição desses atos, com vigência imediata, e não fosse possível regulamentá-la, o que seria uma contradição total, um verdadeiro paradoxo, já que sua execução poderia tornar-se inviável.
O texto legal deve ser interpretado inteligentemente, de modo que não conduza ao absurdo, segundo o pensamento sábio de Carlos Maximiliano, ou, na palavra lapidar do Ministro Sálvio de Figueiredo, a interpretação das leis é obra de raciocínio, mas também de sabedoria e bom senso, não podendo o julgador ater-se exclusivamente aos vocábulos, senão aplicar os princípios que informam as normas positivas.
Existindo, pois, decreto regulamentando a matéria, não deve este ser desprezado.
Observe-se, porém, que os Decretos 3555/2000 e 3697/2000 somente se aplicam à União.
PRINCÍPIOS CARDEAIS
Os princípios básicos a que se submete o pregão são a legalidade, impessoalidade, moralidade, eficiência (desempenho), igualdade, publicidade, probidade administrativa, vinculação ao instrumento convocatório, julgamento objetivo, celeridade, finalidade, razoabilidade, competitividade, justo preço, seletividade e comparação objetiva das propostas. Nenhuma dessas diretrizes pode faltar.
A interpretação das normas de licitação far-se-á sempre da forma mais ampla possível, visando à ampliação da disputa entre os interessados, levando em conta o interesse da Administração, a segurança e a finalidade do contrato.
RECURSOS ORÇAMENTÁRIOS
A previsão de recursos, isto é, a disponibilidade de recursos orçamentários, para pagamento dos encargos, no exercício financeiro, é conditio sine qua nom, para a celebração do contrato (artigo 19 do Regulamento federal).
A previsão de recursos orçamentários (obras e prestação de serviços – artigo 7º; compras – artigo 14 da Lei 8666/93) é essencial (art. 55, V, da Lei mencionada).
Não se fará nenhuma licitação nem se celebrará contrato sem a disponibilidade de recursos.
A Constituição é imperativa neste sentido [49].
A Lei de Responsabilidade Fiscal – Lei Complementar 101, de 4 de maio de 2000, que estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, aplica-se à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, compreendendo os Poderes Executivo, Legislativo (neste abrangidos os Tribunais de Contas da União, dos Estados, do Distrito Federal e Municipais, onde houver), o Judiciário e o Ministério Público. Também lhe devem obediência as administrações diretas, fundos, autarquias, fundações e empresas estatais dependentes [50].
Este diploma legislativo traça as diretrizes para a realização da licitação e celebração dos contratos [51].
A inobservância dessas normas sujeita o agente às sanções administrativas e penais, bem como à Lei de Improbidade Administrativa.
LICITAÇÃO [52]
Os contratos realizados com a Administração Pública deverão, obrigatoriamente, ser precedidos de licitação, salvo as exceções previstas na Lei 8666/93, e são extremamente formais e obrigatórios, nos casos de concorrência e tomada de preços, assim como nas dispensas e inexigibilidades cujos preços estejam compreendidos nos limites dessas modalidades de licitação.
São facultativos os termos dos contratos, quando a Administração puder substituí-los por outros instrumentos [53], tais como carta-contrato [54], nota de empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de execução.
Visando simplificar, o legislador faculta a Administração adotar o pregão, mas aplicar-se-ão subsidiariamente as normas da Lei 8666/93, seguindo a ordem emanada do artigo 9º.
AUTORIDADE COMPETENTE [55]
Cabe, à autoridade competente, isto é, àquele a quem o regimento ou o estatuto do órgão ou da entidade conferir essas atribuições: 1 - determinar a abertura da licitação, 2 - designar o pregoeiro e os componentes da equipe de apoio. 3 - decidir os recursos contra atos do pregoeiro. 4 - homologar o resultado da licitação e 5 - promover a celebração do contrato.
Cumpre-lhe, ainda, entre outras atividades, por si ou por delegação de competência ao pregoeiro ou ao ordenador de despesas ou ao agente encarregado da compra: 1- definir o objeto da licitação e o seu valor estimado em planilha, com clareza, concisão e objetividade. 2 - justificar a necessidade da aquisição e 3 - estabelecer os critérios de aceitação das propostas, as exigências de habilitação, as sanções administrativas aplicáveis por inadimplemento e as cláusulas contratuais, os prazos e demais condições essenciais.
PREGOEIRO [56]
O pregoeiro, designado pela autoridade competente, dentre os servidores do órgão ou da entidade, que está promovendo a licitação, é o responsável pelos trabalhos do pregão. Não é qualquer servidor, senão aquele que tiver habilitação específica.
Poderá contar com uma equipe de apoio, para lhe prestar assistência, designada pela autoridade competente, constituída, em sua maioria, de servidores ocupantes de cargo efetivo ou emprego da Administração. A preferência recairá sobre servidores do quadro permanente do órgão ou da citada entidade.
Entre as relevantes funções do pregoeiro, distinguem-se: 1 - o credenciamento dos interessados. 2. o recebimento dos envelopes das propostas de preços e da documentação de habilitação. 3 - a abertura dos envelopes das propostas de preços. 4 – o seu exame e a classificação dos proponentes. 5 - a direção dos procedimentos referentes aos lances e à seleção da proposta ou do lance de melhor preço. 6 - a adjudicação da proposta de menor preço. 7 - a elaboração de ata. 8 - o recebimento, a apreciação e a decisão sobre recursos. 9 - o encaminhamento, à autoridade superior, do processo devidamente instruído. após a adjudicação, para a homologação e a contratação.
Cabe-lhe, também, nas hipóteses previstas no Regulamento, negociar diretamente com o licitante, visando conseguir melhor preço.
No Ministério da Defesa, o pregoeiro e a equipe de apoio poderão constituir-se de militares.
MELHOR PREÇO
O melhor preço não significa desprezo à qualidade. Não é o único elemento para apreciação. A autoridade competente não só deve justificar a necessidade da aquisição, mas, ao julgar, deverá considerar, além do critério de menor preço, os prazos máximos para fornecimento, as especificações técnicas, os parâmetros mínimos de desempenho de qualidade e as demais especificações do edital.
O critério melhor preço não pode ser analisado, isoladamente.
ASSINATURA DO CONTRATO
Logo após a homologação da licitação pela autoridade competente, o adjudicatário será convocado para assinar o contrato, no prazo definido pelo edital.
O contrato somente poderá ser celebrado se o licitante vencedor mantiver as mesmas condições de habilitação. Esta diretriz, para a área federal, está inscrita no inciso XXI do artigo 11 do decreto regulamentar.
RECUSA DE ASSINAR O CONTRATO
Para os contratos com a União, o Regulamento prevê a hipótese de o adjudicatário recusar-se a assinar o contrato, sem justificativa plausível. Neste caso, convocar-se-á outro licitante, com observância da ordem de classificação, sucessivamente, de conformidade com os incisos XV e XVI e XI, XII do artigo 11 do citado Decreto 3555/2000. Estas mesmas regras aplicam-se, se o licitante vencedor não estiver em situação regular no ato da assinatura do contrato, sem prejuízo das sanções cabíveis.
Marcelo Palmieri observa que a diretriz fixada nesse decreto é diferente daquela indicada no § 2º do artigo 64 da Lei 8666/93, com relação à chamada dos licitantes para contratar. [57]
FORMALIDADES DO CONTRATO
Alerte-se que os atos essenciais do pregão e os decorrentes de meio eletrônico deverão constar do respectivo processo, para apresentação aos órgãos de controle.
Os contratos e seus aditivos também se submetem às formalidades previstas na Lei Geral – Lei 8666/93 e às mesmas regras de simplificação.
Por óbvias razões, os prazos dos contratos, que têm por base a licitação pelo pregão, ficam submetidos a este supracitado diploma legislativo, inclusive quanto à duração, nulidades, condições etc. [58]
NEGOCIAÇÃO
A negociação é o ponto nevrálgico. O pregoeiro goza de extrema autoridade para negociar diretamente com o proponente, com vistas a obter o melhor preço, sem prejuízo, repita-se, da qualidade e da eficiência.
PUBLICIDADE DO CONTRATO
A publicidade dos atos administrativos e, por via de conseqüência, dos contratos administrativos e seus aditivos, qualquer que seja a modalidade de licitação eleita, tem como fonte a Carta Maior, assim que os extratos dos contratos, para terem eficácia, devem obrigatoriamente ser publicados, na imprensa oficial (artigo 60, parágrafo único, c/c o artigo 6º, XIII, da Lei 8666/93), obedecidos os prazos estipulados na lei geral.
A lei estadual, do Distrito Federal ou municipal não poderá dispensar a publicação, já que a publicidade é norma geral, com embasamento constitucional; os prazos, entretanto, poderão por lei local ser encurtados ou dilatados.
No entanto, na esfera federal, o artigo 20 do Decreto 3555/2000 comanda que a publicação do extrato de contrato se faça, no Diário Oficial da União, no prazo de vinte dias da data de sua assinatura, indicando ainda a modalidade de licitação e seu número de referência. Seu descumprimento implicará na aplicação de sanções administrativas.
O parágrafo único do artigo 60 da Lei 8666/93 (norma geral), contudo, determina, energicamente, que os contratos e seus aditamentos deverão ser obrigatoriamente publicados na imprensa oficial (in casu, no Diário Oficial da União), como cond0ição indispensável para sua eficácia. A administração deverá providenciar a publicação até o quinto dia útil do mês seguinte ao de sua assinatura, para ocorrer no prazo de vinte dias [59]. Vale dizer, o decreto não pode, absolutamente, alterar a lei.
Sublinhe-se que o regulamento, como ato administrativo, posto em vigência, por decreto, não tem força bastante para modificar a Lei 8666/93, no que concerne ao prazo assinado para promover a publicação. Poderiam fazê-lo a lei ou a medida provisória, enquanto estava em vigor, mas não o fizeram.
Robertônio Pessoa, apoiado na melhor doutrina (Celso Antonio Bandeira de Mello, Michel Stassinopoulos, Fritz Fleiner e Ana Cândida Ferraz, entre outros), advoga que a atividade administrativa deve ser exercida, de conformidade com os limites pré-estabelecidos pela lei e, com Ana Cândida, escreve: quando o regulamento ultrapassa essas barreiras, o ato do Executivo revela-se abusivo. [60]
Na lição de Hely Lopes Meirelles, sendo o regulamento ato inferior à lei, não pode ele contrariá-la, sob pena de nada valer, ser írrito, nulo e ilegal, configurando-se, deste modo, total ilegalidade. [61]Cita em abono a esse entendimento acórdão do Supremo Tribunal Federal. [62] Não pode, assim, invadir as reservas legais, cabendo-lhe tão somente tornar a lei explícita dentro dos limites delineados por esta [63].
Entretanto, somente a autoridade competente poderá questionar a validade do artigo 20, no foro competente e pelos meios legais, visto que o ato administrativo, não importa o nome que se lhe dê, goza da presunção de legitimidade, e, por isso mesmo, enquanto não ocorrer sua invalidade, eles são plenamente válidos e operantes, quer para o Poder Público, quer para os súditos.
Estes atos, contudo, são passíveis de sustação até a manifestação de validade ou invalidade dos mesmos, seja através de recursos internos, seja através de ações próprias.
Enquanto esta providência não for tomada, o prazo previsto, no Decreto 3555/2000, deve ser obedecido em sua plenitude pela Administração da União.
A Lei, num rasgo de extrema felicidade, obriga a convocação dos interessados por meio de publicação no Diário Oficial ou, à sua falta, em jornal de circulação local. Contudo, faculta sua divulgação, pelos meios eletrônicos, aproveitando-se sem dúvida os recursos da moderna tecnologia e, se se tratar de licitação de grande vulto, a publicidade poderá dar-se também pelos jornais de grande circulação,
É lamentável que o legislador não tenha tornado obrigatória a publicidade desses atos através da Internet, quando até os interrogatórios de presos se farão por esse processo, e o mundo jurídico vem aderindo a esse meio eficaz e rápido de transmissão de dados. Atualmente, é impensável abrir-se mão desse fabuloso instrumento de trabalho.
DURAÇÃO DOS CONTRATOS
Os contratos administrativos estão adstritos à vigência do respectivo crédito orçamentário, que segue o exercício financeiro. Esta é a regra ditada pelo artigo 57, caput, da Lei 8666/93. Não obstante, prevê esta disposição as exceções inscritas nos respectivos incisos e no § 3º do artigo 62, devidos às peculiaridades desses contratos. [64]
O § 9º do art. 165 da CF assenta que cabe à lei complementar dispor sobre o exercício financeiro. A Lei 4320, de 1964, no artigo 34, registra que o exercício financeiro coincidirá com o ano civil.
Os contratos de prestação de serviços continuados poderão ter sua duração prorrogada, além do exercício financeiro, por iguais e sucessivos períodos, segundo a redação dada pela Lei 9648, de 27 de agosto de 1998. Anteriormente, o inciso II fora modificado pela Lei 8883, de 8 de junho de 1994.
Serviços contínuos são aqueles que não podem ser suspensos ou interrompidos. A interrupção ou suspensão poderá causar dano ou prejuízo, de monta. É imprescindível a continuação de sua execução. Esta é também a orientação do Tribunal de Contas da União [65].
O inciso II do artigo 57 impõe, porém, certas restrições que não podem ser olvidadas. Essa prorrogação somente poderá ser feita, se os preços dos serviços e as condições forem mais vantajosas.
A prorrogação poderá fazer-se por iguais e sucessivos períodos e não pode ultrapassar sessenta meses, excetuada a hipótese inscrita no § 4º desse artigo, que permite, em caráter excepcional, a dilação do prazo em até 12 meses, mediante autorização da autoridade superior e motivação, isto é, justificativa plausível. O § 2º do artigo 57 desse diploma legislativo é categórico, ao exigir, nesses casos, a justificação por escrito e autorização prévia da autoridade competente para celebrar o contrato.
Duas questões de suma importância apresentam-se ao aplicador da lei e ao intérprete.
1.O fornecimento pode ser acomodado no inciso II do artigo 57 mencionado?
Fornecimento é a aquisição remunerada de bens ou, na dicção do inciso III do artigo 6º, da LLCA [66], compra é toda aquisição remunerada de bens para fornecimento de uma só vez ou parceladamente.
A resposta a essa indagação é positiva, desde que se caracterize a continuidade e seja devidamente justificada essa situação pela Administração, em harmonia com a Doutrina e a jurisprudência das Cortes de Contas. Neste sentido, Jorge Ulisses Jacoby Fernandes [67].
2.Pode a Administração utilizar-se do pregão, em se tratando de serviços de duração continuada?
Respondemos afirmativamente, tendo em vista a filosofia que norteou o legislador (presteza, desburocratização, melhor preço e condições) e a redação do inciso II do artigo 57 da citada Lei geral – 8666/93, que autoriza a prorrogação do contrato de prestação de serviços a serem executados de forma continuada por iguais e sucessivos períodos, desde que os preços e as condições sejam as melhores e mais proveitosas.
Os desígnios da lei, em ambas as hipóteses, sediam-se na obtenção de melhor preço e condições mais vantajosas.
Não há, pois, incompatibilidade na escolha da modalidade pregão, mesmo que se trate de contratação de prestação de serviços continuados, devido à rapidez desse procedimento. Muito pelo contrário.
Não obstante, a Administração somente estará autorizada a eleger esta modalidade, se se tratar de bens e serviços comuns, nos termos da lei.