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A (im)possibilidade de conversão do pedido de demissão em rescisão indireta do contrato de trabalho

Agenda 05/05/2015 às 13:02

Quando se vir obrigado a deixar o trabalho por culpa do empregador, o trabalhador deve propor ação trabalhista pretendendo a rescisão indireta do contrato, e não pedir demissão para depois pleitear a conversão dos institutos, pois dificilmente o conseguirá.

1.INTRODUÇÃO

O presente estudo tem como escopo analisar a (im)possibilidade de reversão do pedido de demissão praticado pelo empregado, e homologado pelo sindicato, em rescisão indireta do contrato de trabalho, por ato faltoso praticado pelo empregador.

Para isso, serão abordados separadamente os institutos da demissão e rescisão indireta e, ao final, será analisada a (im) possibilidade de conversão destes institutos, bem como estudada a forma como a jurisprudência trabalhista vem se posicionando em demandas análogas ao tema.


2.DO “PEDIDO” DE DEMISSÃO

O ‘pedido’ de demissão nada mais é que uma comunicação realizada pelo empregado ao empregador, informando-o de que não mais deseja continuar com o vínculo de emprego até então existente.

Todavia, apesar de o termo ‘pedido’ ser utilizado pela maciça doutrina e jurisprudência, na realidade, não existe de fato um pedido de demissão, mas sim uma comunicação de extinção do contrato de trabalho, por iniciativa, unilateral, do empregado. Como bem explicitado pela doutrinadora Vólia Bomfim Cassar: “O empregado não pede nada, pois após a comunicação, a extinção independe da concordância do empregador”. [1]

Para a validade da comunicação do pedido de demissão, necessário se faz o preenchimento de alguns requisitos, tais como, capacidade do empregado, declaração de vontade reptícia e, no caso de empregado contratado a mais de um ano, é necessária a homologação do pedido de demissão ou recibo de quitação no sindicato da categoria ou perante autoridade do Ministério do Trabalho.

Sobre o assunto leciona Sérgio Pinto Martins:

A única formalidade existente na legislação é que a demissão do empregado com mais de uma no de serviço só será válida quando feita com a assistência do sindicato ou perante a autoridade do Ministério do Trabalho (§1º do art. 477 da CLT). Tendo o empregado menos de um ano de casa, não haverá necessidade da referida assistência. [2]

A comunicação de demissão acaba por suprimir quase todas as verbas rescisórias a que o empregado teria direito se comparado com a despedida sem justa causa, vez que nesta modalidade de extinção do contrato, as verbas devidas pelo empregador ficam restritas ao 13º salário proporcional e às férias vencidas e proporcionais com 1/3.  


3.DA RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO

A rescisão indireta, também denominada de dispensa indireta, é a faculdade do empregado em romper o contrato de trabalho por justo motivo quando o empregador praticar uma das hipóteses previstas no art. 483 da CLT, quais sejam:

São requisitos objetivos para a aplicação da rescisão indireta: tipicidade da conduta, ou seja, a infração empresarial deve estar prevista no art. 483 da CLT e; gravidade da conduta, que significa que a falta ensejadora da justa causa deve ser extremamente grave, a ponto de tornar insuportável a continuação do vínculo do emprego.

Além desses requisitos, deve o empregado atentar-se a imediatidade da punição, vez que caso transcorra longo período entre a ciência do ato e a punição, entender-se-á pela aplicação do perdão tácito do empregado.

Neste tocante, corrente jurisprudencial e doutrinária defende que a imediatidade do empregado estará caracteriza, se o empregado requerer a rescisão indireta em até 30 (trinta) dias, contados do ato faltoso.  

Vólia Bomfim Cassar explica que a despedida indireta se opera ope iuris e não ope judicis, isto significa que a aplicação da penalidade ao empregador depende apenas de uma declaração de vontade emitida pelo empregado, não havendo, portanto, necessidade de pronunciamento do Poder Judiciário. [3]

Em contrapartida, Sérgio Pinto Martins, defende a tese de que a única maneira de ser verificar a justa causa cometida pelo empregador é justamente o ajuizamento de ação trabalhista, postulando a rescisão indireta do contrato de trabalho. [4]

Na realidade prática, o que se verifica, é a necessidade de ajuizamento de ação trabalhista, não apenas para ver reconhecida a justa causa cometida pelo empregador, apta à rescisão indireta do contrato, como também, para assegurar ao empregado o pagamento de todas as verbas rescisórias decorrentes desta modalidade de extinção contratual.  

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Assim, no caso de haver justa causa praticada pelo empregador, deve o empregado adotar procedimentos especiais para assegurar o seu direito ao reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho.

A princípio o pedido de rescisão indireta opera-se de duas formas distintas. O primeiro corresponde ao pedido realizado pelo empregado quando este ainda mantém o vínculo de emprego, justamente para se apurar a real existência de justa causa cometida pelo empregador e; o segundo, quando a relação empregatícia não mais persiste.  

Nas palavras de Maurício Godinho Delgado:

Há dois procedimentos que são, de certo modo, peculiares à ruptura contratual por falta do empregador, em contraponto com o término do contrato por justa causa operária: trata-se, de um lado, da circunstância de a infração empresarial ter de ser apurada e reconhecida em processo judicial, a partir de ação proposta pelo respectivo empregado. De outro lado, há também o debate acerca da necessidade ou não do imediato afastamento obreiro do trabalho, para que se possa considerar viável seu pleito de rescisão indireta do contrato. [5]

Para Sérgio Pinto Martins a manutenção do vínculo empregatício com o pedido de rescisão indireta são antagônicos entre si, visto que possibilita ao julgador o entendimento de que houve o perdão da falta praticada pelo empregador, ou que a falta não foi tão grave a ponto de impedir a continuidade do contrato de trabalho. [6]

Necessário se faz esclarecer, também, que o empregado que ajuíza ação tempestivamente requerendo a rescisão indireta não pode ser punido por abandono de emprego, mesmo que haja demora na citação.

Por fim, no caso de a justiça trabalhista entender por indeferir o pedido de rescisão indireta, converte-se a extinção do contrato para a modalidade de pedido de demissão, inclusive, quando se tratar de empregado estável.


4.DA (IM) POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DO PEDIDO DE DEMISSÃO EM RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO

O pedido de demissão e a rescisão indireta são duas modalidades de extinção do contrato de trabalho incompatíveis entre si. O pedido de demissão é ato unilateral praticado pelo empregado que não mais tem interesse em manter o vínculo de emprego até então existente. Já a rescisão indireta é ocasionada por ato praticado pelo empregador que torna insuportável ao empregado a continuação do emprego.

O empegado que pretenda pleitear a rescisão indireta do contrato de trabalho, tem, usualmente, dois procedimentos que podem ser adotados. O primeiro é manter o vínculo de emprego e ao mesmo tempo pleitear no judiciário a despedida indireta. O segundo é afastar-se do emprego e, em até 30 (trinta) dias ajuizar ação pleiteando a rescisão.

Contudo, apesar de não ser o adequado, o que se percebe na prática, é que o empregado primeiro faz o pedido de demissão e, após, ingressa com ação trabalhista pleiteando a conversão desta modalidade de extinção para a rescisão indireta do contrato de trabalho.   

Sabe-se que o art. 483 da CLT elenca diversas hipóteses, que se verificadas no caso concreto, são aptas ao reconhecimento da rescisão indireta para ato faltoso do empregador.

Assim, caso o empregador insurja-se em ato faltoso, pode o empregado ajuizar ação e pleitear a rescisão indireta, que, se reconhecida, ensejará no pagamento de todas as verbas rescisórias atinentes à despedida sem justa causa.

Mas se, em que pese a justa causa cometida pelo empregador, o empregado preferiu pedir demissão sem qualquer ressalva ou nulidade, considera-se este um ato jurídico perfeito e acabado.

 Ou seja, o empregado não pode após perfectibilizada a extinção do contrato de trabalho, pretender reverter judicialmente o pedido de demissão, sem nenhuma prova de coação ou de vício capaz de tornar nula a manifestação de vontade externada anteriormente. [7]

Este é, inclusive, o entendimento do e. TRT da 12ª Região, vejamos:

RESCISÃO INDIRETA. PEDIDO DE DEMISSÃO. INCOMPATIBILIDADE. O art. 483, da CLT, autoriza o trabalhador a, em verificando infração legal ou contratual por parte de seu empregador, pleitear perante Juízo o reconhecimento da rescisão indireta, inclusive com a possibilidade de cessação imediata da prestação de serviços. Não pode o empregado, contudo, tendo pedido demissão do emprego, elencar posteriormente faltas contratuais do empregador que dariam ensejo à rescisão indireta. O pedido de demissão, neste caso, encerra ato jurídico perfeito, ante a inexistência de qualquer vício de consentimento, devendo prevalecer. [8]

DESPEDIDA INDIRETA. PEDIDO DE DEMISSÃO. INCOMPATIBILIDADE DOS INSTITUTOS JUSTRABALHISTAS. NÃO RECONHECIMENTO. Entendendo o trabalhador que as atitudes da ré enquadram-se em alguma das hipóteses previstas no art. 483, da CLT, deve ele requerer diretamente a rescisão do pacto laboral de forma indireta, e não, tentar reverter o pedido de demissão em juízo. Notadamente quando não há prova de que o ato praticado pelo empregado tenha sido externado sob erro, dolo ou coação, como ocorreu no caso dos autos. Despedida indireta não caracterizada. [9]

Extrai-se, por conseguinte, que quando inexistem provas de coação e vício de consentimento do pedido de demissão realizado pelo empregado, por ser ato jurídico perfeito e acabado, impossibilita a conversão desta modalidade de extinção do contrato de trabalho para rescisão indireta do contrato de trabalho.

Por este motivo, quando houver a prática de ato faltoso e com gravidade tal que dificulte ao empregado a continuidade do contrato de trabalho, o trabalhador deve propor ação trabalhista pretendendo a rescisão indireta do contrato e não pedir demissão para depois pleitear a conversão dos institutos, vez que dificilmente o conseguirá.  


  REFERÊNCIAS

CASSAR. Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 5ª ed. Niterói: Impetus, 2011.

DELGADO. Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 12. Ed. São Paulo: LTR, 2013.

MARTINS. Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 28.ed. São Paulo: Atlas, 2012.

SANTA CATARINA. Tribunal Regional do Trabalho. Desembargador Helio Batista Lopes. Florianópolis, 28 de agosto de 2014. Disponível em: < http://www.trt12.jus.br/search/search?q=cache:6Glvg8QzF4YJ:norma.trt12.jus.br/acordaos_seged/284237++++&site=acordaos&proxystylesheet=gsa-jurisprudencia&access=p&oe=ISO-8859-5> .Acesso em 14 out. 2014.

SANTA CATARINA. Tribunal Regional do Trabalho. Desembargadora Ligia Maria Teixeira Gouvea. Florianópolis, 21 de agosto de 2014. Disponível em: < http://www.trt12.jus.br/search/search?q=cache:FQ5P5lDjtEMJ:norma.trt12.jus.br/acordaos_seged/284648++++&site=acordaos&proxystylesheet=gsa-jurisprudencia&access=p&oe=ISO-8859-5>. Acesso em 14. Out. 2014.


Notas

[1] CASSAR. Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 5ª ed. Niterói: Impetus, 2011. P. 1076. 

[2] MARTINS. Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 28.ed. São Paulo: Atlas, 2012. P. 403.

[3] CASSAR. Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 5. ed. Niterói: Impetus, 2012. p. 1162.

[4] MARTINS. Sergio Pinto. 28 ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 402.

[5] DELGADO. Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 12. Ed. São Paulo: LTR, 2013. p. 1264.

[6] MARTINS. Sergio Pinto. 28 ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 402.

[7] SANTA CATARINA. Tribunal Regional do Trabalho. Desembargador Helio Batista Lopes. Florianópolis, 28 de agosto de 2014. Disponível em: < http://www.trt12.jus.br/search/search?q=cache:6Glvg8QzF4YJ:norma.trt12.jus.br/acordaos_seged/284237++++&site=acordaos&proxystylesheet=gsa-jurisprudencia&access=p&oe=ISO-8859-5> .Acesso em 14 out. 2014.

[8] SANTA CATARINA. Tribunal Regional do Trabalho. Desembargador Helio Batista Lopes. Florianópolis, 28 de agosto de 2014. Disponível em: < http://www.trt12.jus.br/search/search?q=cache:6Glvg8QzF4YJ:norma.trt12.jus.br/acordaos_seged/284237++++&site=acordaos&proxystylesheet=gsa-jurisprudencia&access=p&oe=ISO-8859-5> .Acesso em 14 out. 2014.

[9] SANTA CATARINA. Tribunal Regional do Trabalho. Desembargadora Ligia Maria Teixeira Gouvea. Florianópolis, 21 de agosto de 2014. Disponível em: < http://www.trt12.jus.br/search/search?q=cache:FQ5P5lDjtEMJ:norma.trt12.jus.br/acordaos_seged/284648++++&site=acordaos&proxystylesheet=gsa-jurisprudencia&access=p&oe=ISO-8859-5>. Acesso em 14. Out. 2014.

Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PINHO, Renata. A (im)possibilidade de conversão do pedido de demissão em rescisão indireta do contrato de trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4325, 5 mai. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/32795. Acesso em: 22 dez. 2024.

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