1.INTRODUÇÃO
Reza o Art.217-A do Código Penal Brasileiro que é crime “Ter conjunção carnal ou praticar qualquer outro ato libidinoso como menor de 14 anos”. Inobstante ser indispensável a tipicidade subjetiva(dolo ou culpa) por parte do agente , depreende-se da leitura do dispositivo que o legislador desconsiderou o “ consentimento da vítima” como elementar do tipo, ou seja, a consumação delitiva independe da aceitação do ato sexual por parte da vítima . Ao fazer isso o legislador pressupôs para estas vítimas( menores de quatorze anos) uma incapacidade de gerir a própria sexualidade, apelidada pela doutrina de “vulnerabilidade”.
A celeuma surge quando nos deparamos com a possibilidade ou não de relativização desta “ vulnerabilidade”. Afinal, é aceitável a ideia de que todos os menores de 14 (quatorze) anos são incapacitados de vivenciar e aceitar de forma livre e consciente a prática de um ato sexual?
A discussão ganha terreno da jurisprudência e na doutrina pátria na busca por um entendimento compatível com o Direito Penal Constitucional.
2.DESENVOLVIMENTO
A jurisprudência do STF e do STJ é firme no sentido de que não se admite prova em contrário, ou seja , trata-se de um presunção absoluta de vulnerabilidade, conforme segue :
“A violência presumida foi eliminada pela Lei 12.015/2009.A simples conjunção carnal com menor de quatorze anos consubstancia crime de estupro.Não há mais que se perquirir se houve ou não violência. A lei em espécie-Crime contra a didnidade sexual, consolidou de vez a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal”.HC 101.456,Rel.Min.Eros Grau,julgamento em 9.3.2010,Segunda Turma,DJE de 30.04.2010).
Não obstante este entendimento, a doutrina majoritária tem se inclinado em sentido diverso. Argumenta-se que a “presunção absoluta de vulnerabilidade” é antes de mais nada, uma negação da “presunção de inocência”(art.5°LVII,da Constituição Federal) uma vez que inviabiliza o exercício do contraditório ,quiçá da amplitude de defesa , também princípios constitucionais (art.5°LV, Constituição Federal).
Outro argumento que robustece a necessidade de flexibilização da presunção de vulnerabilidade advém de uma interpretação sistemática do Código Penal Brasileiro com o Estatuto da Criança e do Adolescente. Este último, ao tratar de forma diferenciada da responsabilidade pela prática de ato infracional por crianças (menor de 12 anos) e adolescentes( menor com doze anos completos até os 18 anos). É que parece inconcebível que um adolescente( menor de 18 entre 12 e 14 anos) possa ter maturidade para experimentar a aplicação de uma medida sócio- educativa mas não possua capacidade para administrar livremente uma escolha sexual.
Destarte, segundo esta linha doutrinária , trata-se de uma incoerência do sistema legal considerar que já existe maturidade para sofrer uma reprimenda Estatal, mas não reconhecer esta mesma maturidade para escolhas sexuais no caso dos adolescentes.
3.CONCLUSÃO
É forçoso reconhecer o apelo do legislador para a necessidade de se proteger a criança e o adolescente presumindo a sua vulnerabilidade, vez que estes sujeitos de direito se encontram em situação de pessoa em desenvolvimento, carecendo de uma atenção especial do sistema normativo. No entanto, não há como negligenciar a presunção de inocência , o contraditório, a amplitude de defesa e a situação peculiar dos adolescentes , de modo que a somente possibilidade de relativização da presunção de vulnerabilidade aferida casuisticamente é compatível com o ordenamento jurídico vigente.
4.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARROS, Francisco Dirceu .Vulnerabilidade nos Novos Delitos Sexuais. Carta Forense, 02 de março de 2010.
GRECO, Rogério .Curso de direito penal parte especial. Rio de Janeiro: Impetus, 2010.
MAGALHÃES, Eduardo Noronha. Direito penal. São Paulo: Saraiva , 2007.
STF. Segunda Turma .Relator Ministro Eros Grau. Habeas Corpus. n°101.456,D.J.E. 30.04.2010.