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Criminologia, Direitos Fundamentais e Direito Constitucional: compreensão jusfilosófica sobre o pensamento de Thomaz Szasz

Agenda 18/02/2015 às 17:57

Artigo versa sobre a compreensão da Criminologia crítica frente às internações compulsórias e o discurso legitimado do Direito sobre a "loucura".

O húngaro radicado no Estados Unidos, Thomas S. Szasz, representa um baluarte contra o domínio do saber/poder psiquiátrico, aplicado em larga escala, como forma de domínio do homem sobre o homem. O livro “A  fabricação da loucura” (1971) de Szasz é anterior à “ A Verdade e as formas jurídicas”(1973) e de “Vigiar e Punir”(1975) ambos de Michel Foucault e que discutem o tema do domínio saber/poder empregados pela psiquiatria e pelo Direito.

A tese central de Szasz é : O tratamento especial (involuntário) é uma consequência de suas raízes no liberalismo clássico, baseadas nos princípios de que cada pessoa tem o direito ser dono de seu corpo e mente e de não sofrer violência dos outros, embora tenha criticado tanto o chamado "mundo livre" como os estados comunistas, por sua utilização de psiquiatria, e pela "drogofobia". Segundo Szasz, o suicídio, a prática da medicina, o uso e a venda de drogas, assim como as relações sexuais, devem ser privados, contratuais e fora da jurisdição do Estado.

Idéias polêmicas com entendimentos os mais ferrenhos e críticos. Em 1970, Szasz fundou, juntamente com George Alexander e Erving Goffman, a American Association for the Abolition of Involuntary Mental Hospitalization (AAAIMH), com o objetivo de abolir a intervenção psiquiátrica involuntária. Tema que é atual e que se confunde com a internação compulsória de usuários de drogas com internação psiquiátrica por maladie psíquica.

Chamou-nos a atenção o envolvimento de Szasz com Erving Goffman , envolvimento de contribuição acadêmica e disseminação das idéias para torná-las concretas como ocorreu com a AAAIMH, desfeita em 1980. O contato que tivemos com a obra de Goffman, se deu com Stigma [1], obra que se apresenta densa e que analisa temas como: o controle da informação, o controle social, o chamado comportamento desviante, o “eu” e o “outro” entre outros pontos.

 Thomaz Szasz e Goffman se apresentam a tempo a este pesquisador. Ambos com uma visão ímpar dos controles de dominação , apresentam denúncias sob forma acadêmica sobre a manipulação institucionalizada do homem sobre o homem e que perdura por milênios. Manipulação que possui nomes como medicina, religião, política e todas elas legitimadas pelo Direito e pela psiquiatria.

A política, o modus operandi  do “homem político” de Aristóteles, se alicerça no Direito que o legitima e o autoriza, todavia, o mimetismo dos interesses o conduz para caminhos estranhos e bem opostos à utopia democrática. O homem revoltado (expressão que tomamos emprestado de Albert Camus) é amordaçado, calado, trancafiado, drogado, manietado, torturado, dado como louco, individualizado, tudo sob a égide da psiquiatria e do Direito.

 Szasz, Goffman, Howard Becker, Robert King Merton, Michel Foucault entre outros, contribuiram para um entendimento aprofundado da etiologia do domínio do homem sobre o homem.  Szasz[2] denuncia o uso da força como forma de controle, seja no campo da psiquiatria seja no campo da legitimimação do discurso.

Na frase de Szasz, mesmo perplexo frente a comprovação das atitudes dos homens, entendemos que é possível explicar, justificar não. Sem contrariar o mestre, o holocausto(1939-1945) é explicável sob a ótica histórica, injustificável sob qualquer ótica. O papel da Criminologia, percebe-se, é extenso na compreensão dos fatos e condutas. Muito longe de ser uma ciência secundária do Direito, antes, é imperativo o diálogo com ela para perceber o homem, esse meio para o fim.

Temas atuais em Direitos Humanos é uma possibilidade de dialogar com formas arcaícas de compreensão do saber legitimado, a rigor , que passa pela chancela do Direito, como ciências dogmáticas que não abrem mão do poder institucionalizado.

Estudamos sob a égide da compreensão da Drª Carolina Lisboa a questãso do Direito Constitucional sem constituição. Em certo momento da sua tese de doutorado apresenta o caso Roe versus Wade de 1970 no Estado do Texas e que versa sobre a questão do aborto.

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Caso capitaneado pelas advogadas Linda Coffee e Sarah Weddington, com a alegação de que a gravidez de Roe era fruto de aborto. Em uma decisão emblemática, a Corte Suprema Americana decide em 1973 a favor de Roe que  entrega seu filho a adoção.

O aborto é um dogma, aqui no Brasil positivado no Código Penal de 1940. Exceção em três casos: anicefalia, estupro, risco iminente à vida da mãe. A dificuldade é que a Constituição americana possui mais de 200 anos, a nossa 25 anos.

Os temas atuais em Direitos Humanos, podemos listar:

  1. Homofobia.
  2. Aborto[3]
  3. Exploração e violência contra a mulher [4]
  4. Trabalho infantil[5]
  5. Prostituição.
  6. Liberação da maconha e outras drogas.
  7. Trabalho protegido pelos aspectos sociais.
  8. Direito à vida.
  9. Racismo.
  10.  Xenofobia.
  11.  Tortura.
  12.  Desaparecimento forçado.

Temas debatidos em diferentes esferas, com pesquisadores de diferentes áreas, desde de Supiot e Villey até pesquisadores brasileiros como a Drª Carolina Lisboa, que nos mostram a dificuldade da matéria e a necessidade de seu estudo cada vez mais às claras e com a seriedade da delgada posição que se encontra. 

Ao analisarmos os temas atuais em Direitos Humanos, nos aproximamos da “teoria dos direitos fundamenatais”. No caso brasileiro, o celebrado Artigo 5º da Constituição de 1988 que parece uma constituição por si mesmo.

Vivemos uma situação complexa que Thomas S. Szasz apresenta com uma vestimenta social, a saber, tempos modernos envoltos em roupas arcaicas e dogmáticas. O artigo 5º da Constituição celebra o direito à livre expressão do pensamento, incapaz , todavia, de erradicar o trabalho escravo positivado no artigo 149 do Código Penal getulista de 1940.

A OEA, a  CIDH e “longa manus” são órgãos necessários para países “terceiro mundistas” que possuem fragilidade democrática. Quando observamos o engessamento das formas de poder. O Estado possui amplo poder de “vigiar e punir” , no dizer de Foucault.

Sigmund Freud em sua obra intitulada “O mal-estar da civilização”, obra do final dos anos 1920, prenunciava a situação frenética que nos encontramos. A civilização parece mais irracional que nunca, os Direitos Humanos são violados em larga escala, resulta em uma situação “esquizofrênica” no campo social e jurídica.

O apelo da obra dos cientistas sociais  é para uma humanização do humano e que os direitos que lhe assistem( os humanos),  saiam das folhas de papel. A criação de um órgão para defesa dos direitos humanos resulta da falta de consciência, pelo menos da maioria, desses direitos. Norberto Bobbio, político, jurista e filósofo faz críticas[6] a essa situação.

Almeja-se que o Direito rompa com o paradigma da verdade absoluta e aceite a interdisciplinaridade como meio de entender o humano dentro da fabricação da loucura criada por séculos de privações, cerceamentos, punições, expiações, fogueiras e inquisição, que ainda existem, velas, todavia, existem.

                                                                                                         


[1]           GOFFMAN, E. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. 4ª ed. Rio de Janeiro: LTC, 1988.

[2]              “ O objeto da Psiquiatria é o conflito humano. Mas o conflito precisa ser arbitrado, controlado, solucionado. Por isso, o homem sempre achou necessário empregar vários métodos para lidar com antagonismos interpessoais e sociais. Todos esses métodos tem uma coisa em comum: o uso da força. No entanto, talvez porque os homens são homens e não animais, não podem apenas coagir, oprimir ou exterminar seus semelhantes; precisam também explicar e justificar a destruição”. In: Thomas S. Szasz : “A  fabricação da loucura” (1971).

[3]           Caso Roe versus Wade.

[4]            Lei 11340/06

[5]            Artigo 149 do Código Penal Brasileiro.

[6]              Bobbio, Norberto . Sociedade e Estado na Filosofia Política Moderna, São Paulo, Brasiliense.

Sobre o autor
Sérgio Ricardo de Freitas Cruz

Mestre e doutorando em Direito. Membro do IBCCRIM e do IBDFAM.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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A motivação para a reflexão do texto surge em uma dificuldade do Direito em avaliar o doente tido como "louco" e suas classificações para a Criminologia crítica.

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