Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

Improbidade administrativa

Agenda 01/10/2000 às 00:00

Introdução:

A Lei nº 8.429 de 02.06.1992 - Conhecida como "lei do colarinho branco" veio regulamentar o parágrafo 4º do artigo 37 da Constituição Federal: "A administração pública direta e indireta ou fundacional..... obedecerá aos princípios........ e também, ao seguinte: § 4º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

A norma em questão revogou a Lei nº 3.164 de 1º de junho de 1957 que previa o seqüestro de bens do servidor público adquirido por influência ou abuso de cargo ou função pública e revogou também a Lei nº 3.502 de 21 de dezembro de 1958 que complementava a Lei nº 3.164, regulamentando o seqüestro e o perdimento de bens de servidor público da administração direta e indireta, nos casos de enriquecimento ilícito, por influência ou abuso de cargo ou função.

As normas revogadas não eram instrumentos adequados, deixando muito a desejar sobre a definição do conteúdo da expressão influência ou abuso de cargo e impondo dificuldades para a caracterização do enriquecimento ilícito, como se daria a sua apuração, motivo pelo qual muito pouco se ouviu falar em aplicação das penas previstas durante a longa vigência que tiveram.

A nova norma, alem de definir as situações que configuram atos de improbidade administrativa e escalonar a aplicação de penas na esfera administrativa, civil e penal, também formaliza o sistema de apuração.

Improbidade Administrativa é o designativo técnico para a chamada corrupção administrativa, que, sob diversas formas, promove o desvirtuamento da Administração Pública e afronta os princípios nucleares da ordem jurídica (Estado de Direito, Democrático e Republicano) revelando-se pela obtenção de vantagens patrimoniais indevidas às expensas do erário, pelo exercício nocivo das funções e empregos públicos, pelo "tráfico de influência" nas esferas da Administração Pública e pelo favorecimento de poucos em detrimento dos interesses da sociedade, mediante a concessão de obséquios e privilégios ilícitos. (1)

Assim constitui improbidade administrativa por enriquecimento ilícito (artigo 9º) atos que importem auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do cargo, mandato, função, emprego ou atividade.

Constitui também improbidade administrativa atos que causem lesão ao erário p/ação ou omissão, dolosa ou culposa, ainda que não receba direta ou indiretamente qualquer vantagem (artigo 10º).

E no artigo 11º, define ainda como improbidade administrativa, a ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições.

Qualquer das improbidades são punidas com a perda de bens ou valores acrescidos ao patrimônio do responsável, o ressarcimentos de danos causados ao erário, a perda da função, suspensão dos direitos políticos de 3 a 10 anos, multa e impossibilidade de contratação com órgãos de administração pública.


Processo Administrativo, Inquérito Policial e Ação Judicial

Qualquer pessoa e o Ministério Público poderão representar à autoridade administrativa competente para que seja instaurado o processo de apuração da pratica do ato de improbidade administrativa.

Prevê a lei que a representação que será escrita ou reduzida a termo e assinada, conterá a qualificação do representante, as informações sobre o fato e sua autoria e a indicação das provas de que tenha conhecimento.

A autoridade só poderá rejeitar a representação se esta não estiver de acordo com as formalidades previstas, por despacho fundamentado, sendo certo, que a rejeição não impede a representação ao Ministério Público.

A comissão processante é obrigada a dar conhecimento ao M.. PÚBLICO E AO TRIBUNAL DE CONTAS da existência de procedimento ou processo administrativo para apuração da prática de ato de improbidade, para que acompanhem, os quais poderão ser representados.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Havendo fundados indícios da responsabilidade do indiciado a comissão poderá representar ao Ministério Público ou à procuradoria do órgão público afetado, para que requeiram o seqüestro de bens do agente ou terceiro para garantia do ressarcimento das vantagens ou dos danos causados.

Havendo ilícitos penais o M. Público poderá de ofício ou a requerimento da autoridade administrativa requisitar a instauração de inquérito policial.

A aplicação das penalidades previstas, cíveis ou penais e a perda da função pública e suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória.


Legitimidade:

A legitimidade da Ação de Reparação de Danos ou perda dos bens havidos ilicitamente está reservada expressamente no artigo 17 da Lei, ao representante do Ministério Público e à Fazenda Pública pela sua procuradoria.

Entretanto muito tem se discutido e bastante controvertida é a jurisprudência a respeito da Legitimidade do representante do Ministério Público para a proposição de Ação Civil Pública e do Inquérito Civil Público, visando a condenação dos agentes públicos e terceiros pela pratica de atos de improbidade.

Essa questão já foi alvo de questionamento quando vigentes as normas revogadas envolvendo a competência da Ação Civil Pública com a da Ação Popular, tendo a jurisprudência se firmado em prol da segunda.

1- Atualmente a corrente favorável à legitimidade do M. Público vem se fundamentando no artigo 129 inciso III da Constituição Federal vigente que estabelece: São funções institucionais do Ministério Público:......III- promover o inquérito e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; e nos artigos 16 e 17 da Lei nº 8.429/92 que estabelecem: art. 16 - Havendo fundados indícios de responsabilidade, a comissão representará ao M.Público ou à Procuradoria do órgão para que requeira ao juízo competente a decretação do seqüestro dos bens do agente ou terceiro que tenha enriquecido ilicitamente ou causado dano ao patrimônio público. - Art. 17- A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar.

2- Corrente contrária à legitimidade do M.Público para o inquérito e a ação civil pública decorrentes de atos de improbidades fundamenta-se nos termos da Lei 8.429 que ao definir o rito para estas ações estabeleceu o procedimento ordinário, devendo reger-se pelo CPC.

A corrente contrária ampara-se também na disposição do inciso IX do artigo 129 da C.Federal, porque exercer a defesa do patrimônio público implica exercício da representação judicial das entidades públicas.

" CF art. 129 - IX - ...........sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas.

E ainda, porque manteve a constituição vigente a ação popular como instrumento para a defesa do patrimônio público, sendo parte legítima qualquer cidadão. Art. 5º inciso LXXIII.

3- A jurisprudência do E. Tribunal de Justiça de São Paulo é dominante com o entendimento da legitimidade do MP e o cabimento da ação civil pública para a defesa do patrimônio público:

Apelação Cível nº 512-5/5 - Acórdão da Nona Câmara "JULHO/97" - "AÇÃO CIVIL PÚBLICA - Ato de improbidade - Legitimidade ativa do Ministério Público......"- É inegável que o representante do Ministério Público é parte legítima para promover o ajuizamento da ação civil pública, e a sua legitimidade ad causam vem evidenciada no artigo 5º da Lei nº 7.347/85 e no artigo 129, inciso III, da Constituição da República.

A jurisprudência dominante do E. TJSP já encontra amparo na jurisprudência que vem se firmando no E. Superior Tribunal de Justiça, RT 727/138, RSTJ 27.493.


Conclusão:

I- AÇÃO - O repudio geral da sociedade pelo noticiário diuturno da prática de atos de improbidade administrativa, premiados com a impunidade, fez com que o constituinte buscasse a regulamentação de normas eficazes, com imposição de penas visando a reparação dos danos causados ao erário, a punição administrativa com perda da função de forma a afastar o agente do patrimônio público e a privação de liberdade.

Em face desse quadro, a legitimação do Ministério Público para promover a Ação Civil Pública na defesa do patrimônio público tem respaldo em três fundamentos.

a) A ação popular, instrumento colocado à disposição do povo para defesa do patrimônio e da moralidade pública, demonstrou que na maioria das vezes em que foi utilizada, esteve sempre comprometida com objetivos político-partidário, tornando-a de eficiência questionável;

b) A inexistência de conflito entre os incisos III e IX do artigo 129 da Constituição - O Patrimônio Público inserido no inciso III e a defesa da moralidade administrativa constituem-se também em interesses supra-individuais, interesses difusos. O disposto no inciso IX veda a representação judicial das entidades públicas, a qual será exercida nas ações por improbidade pela procuradoria do órgão lesado. Os danos causado ao patrimônio público e à moralidade administrativa atinge diretamente o órgão lesado, mas atinge também indiretamente toda a população.

c) A legitimação não é exclusiva e sim concorrente com a entidade pública e com qualquer cidadão, diante da importância que se apresenta a defesa do patrimônio público que é de todos, devendo a sua gestão pautar-se pela moralidade administrativa. Nem sempre a direção do órgão lesado tem interesse no uso de sua legitimidade. Assim, tem a entidade pública legitimidade para defesa de direito próprio; O Ministério Público legitimidade para defesa do interesse do povo; e qualquer cidadão, legitimidade para a defesa de seu interesse e da coletividade através da Ação Popular.

II- INQUÉRITO - A jurisprudência tem caminhado no sentido de que os mesmos fundamentos que dão legitimidade ao Ministério Público para a ação civil pública decorrente de ato de improbidade administrativa dão legitimidade para a promoção de inquérito civil público.

Entretanto se as disposições expressas nos artigos 16 e 17 da Lei 8429/92 têm total simetria com as disposições do artigo 129 da constituição federal, o que não acontece com o seu artigo 22 que determina:

          "Para apurar qualquer ilícito previsto nesta Lei, o Ministério Público, de ofício, a requerimento de autoridade administrativa ou mediante representação formulada de acordo com o disposto no art.14 poderá requisitar a instauração de inquérito policial ou procedimento administrativo".

A investigação e apuração da pratica de atos de improbidade administrativa pelo M. Público importaria em violação de funções destinadas ao Poder Executivo. O servidor público terá os seus atos investigados pela autoridade administrativa, garantido o direito de ampla defesa e se tais atos importarem em ilícitos penais a investigação será exercida pela autoridade Policial.

A inércia e a parcialidade das autoridades administrativas no procedimento administrativo serão objetos do controle externo a ser exercido não só pelo M. Público mas também pelo Tribunal de Contas.

Qualquer interpretação contraria do dispositivo legal mencionado importa em infringir o artigo 5º inciso LIV - " direito ao devido processo legal ". O devido processo legal para apuração de infrações administrativas é o processo administrativo na sua forma e competência legalmente prevista.(Lei Federal nº 9.784/99 e Lei Estadual/SP nº 10.177/98)

" SERVIDOR PÚBLICO - Demissão por Improbidade administrativa - Legitimidade do ato - Direito de defesa assegurado. Ementa Oficial : Demissão por improbidade administrativa, precedido o ato demissório de procedimento administrativo regular, em que à acusada foi assegurado o direito de defesa. Legitimidade, sob tal aspecto, do ato. MS- 21.922-0-RO - Tribunal Pleno do STF - RT- 735/198.

Marino Pazzaglini Filho, Márcio Fernando Elias Rose e Waldo Fazzio Júnior, membros do Ministério Público, defendem a tese de que o Procedimento Administrativo previsto na Lei 8.429/92 : "Trata-se de medida que deve ser adotada fundamentalmente, como diligência instrutória no âmbito do inquérito civil, não como sua substituta" "Não se busca o sancionamento administrativo ou funcional do agente público, mas a coleta de subsídios tendentes a instruir o inquérito civil e a eventual ação civil pública."

Segundo esse entendimento o processo administrativo da Lei nº 8429/92 seria uma sindicância para instruir o Inquérito Civil Público, com o que não se pode concordar.


NOTAS

  1. PAZZAGLINI FILHO, Marino; ELIAS ROSA, Márcio Fernando e FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Improbidade Administrativa, Edtora Atlas, 1996, pág. 35.

BIBLIOGRAFIA

PAZZAGLINI FILHO, Marino; ELIAS ROSA, Márcio Fernando; FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Improbidade Administrativa, Editora Atlas, 1996

MASCARENHAS, Paulo. Improbidade Administrativa e Crime de Responsabilidade de Prefeito, LED Editora, 1999;

MAZZILLI, Hugro Nigro. A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo, Ed. RT, 6ª Edição;

MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Ação Civil Pública, Ed. RT, 3ª Edição;

SALGADO FILHO, Nilo Spinola e MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Ação Civil Pública: Defesa do Patrimônio Público e da Moralidade Administrativa. Revista dos Tribunais nº 735, p. 161, janeiro de 1997.

Sobre o autor
Antonio Luiz Bueno de Macedo

advogado em Moji Mirim (SP), professor da Faculdade de Direito de São João da Boa Vista

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MACEDO, Antonio Luiz Bueno. Improbidade administrativa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 46, 1 out. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/371. Acesso em: 25 nov. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!