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Menoridade penal

Agenda 07/04/2015 às 10:49

A gravidade recorrente de fatos ligados a menores impõe a adoção de medidas novas, de cunho preventivo/repressivo, que passem pela extensão da responsabilização adulta àquele que incorra na prática do mesmo crime.

Volta à cena a questão da redução da maioridade penal. Realmente, um problemão! Fato: no Brasil, mais se têm acentuado os casos de crimes hediondos por menores – sobretudo, entre 16 e 17 anos. Deles nos diz a imprensa.

A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados aprovou Proposta de Emenda à Constituição, a PEC 171/93, que altera a idade penal de 18 para 16 anos. Há quem se posicione contra e a favor. E as duas correntes são defensáveis. Eis o nó górdio, cujo desate tarda!

A sociedade brasileira é o termômetro, o campo sobre o qual se hão de debruçar o exame e as soluções do intrincado problema. E ela geme, sob o guante de delinquentes juvenis, que a tem barbarizado, penalizado e vitimado – sem dó!

Ora, a vida social muda, evolui. Natural, pois, mudem as necessidades e prioridades da população, às voltas com o enfrentamento de questões que a afligem. Invoco pensamento de Kátia Mecler, psiquiatra forense da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), no sentido de que ‘Essa limitação da idade de 18 anos foi estabelecida no Código Penal de 1940. Nós vivíamos em um outro mundo, com outros estímulos. Não se pode dizer que um jovem de 18 anos daquela época é o mesmo de hoje. O acesso à informação e à tecnologia favorece o desenvolvimento desse cérebro mais precocemente’.

A respeito, sintomático o fato de o jovem, a partir dos 16 anos de idade, ser considerado capaz de votar. Se pode fazê-lo, é sinal evidente de que tem todo o discernimento para verificar do certo e do errado, assumindo a responsabilidade de seus atos. A não ser assim, será institucionalizada a hipocrisia, a falsidade, o jogo espúrio de conveniência política – pode votar, embora continue penalmente inimputável.

Se não no pode responsabilizar, porque menor, que também se lhe não dê o direito de votar. Quem pode o mais – eleger o presidente da República, inclusive –, pode o menos – praticado o crime, por ele responder.

Alguns dizem que a pretendida redução é inconstitucional, porque cláusula pétrea – insuscetível de modificação. Mas, erram! Consta do artigo 228 da Constituição Federal: ‘São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial’.

O inciso IV do parágrafo 4º do artigo 60 daquela prevê que não podem ser objeto de supressão ‘os direitos e garantias individuais’. Porém, respeitadas opiniões contrárias, se é direito do menor não responder criminalmente, não é menos verdade que o conceito de menoridade, em si considerado, admite mudança. Isto, por se tratar de assunto de política criminal – queira-se ou não. Portanto, passível de alteração por via de Emenda Constitucional.

Comigo pensam, respeitante à conclusão de a questão não encerrar cláusula pétrea, por exemplo, o atual ministro do STF Marco Aurélio Mello e o ex-ministro Carlos Velloso, para quem a redução da maioridade penal inibirá jovens e criminosos.

Cabe enfocar questão de vida prática: àquele que não tenha um familiar estuprado, violentado, assassinado por um jovem inda dito e tido por menor, dentre 16 e 17 anos, fica fácil justificar e advogar da inadmissibilidade da redução da maioridade penal. Porém, se o infausto acontecimento o acometer, decerto, logo tenderá a mudar de opinião. Como diz o ditado popular, ‘pimenta nos olhos dos outros é refresco’.

É certo que, na base de tudo, sobreleva a omissão do Estado brasileiro no trato competente das questões afetas à segurança e estruturação adequada do sistema carcerário. Até porque, não será pela multiplicação de presos, reunidos ao léu e jogados em presídios e penitenciárias desprovidas de condições mínimas de ressocialização, que será resolvida a grave questão da criminalidade. Como dito pelo ministro Marco Aurélio Mello, ‘cadeia não conserta ninguém’.

Mas, a par da possibilidade de que o delinquente juvenil (de 16 e 17 anos) cumpra pena em local diverso dos demais, algo precisa ser feito, urgentemente, para estancar a sangria das muitas famílias brasileiras vitimadas por sua ação, na certeza, hoje, da inoperância do sistema aparelhado à contenção e punição desses jovens.

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Não nos esqueçamos, ainda, das leis frouxas do País, recheadas de benefícios e a sinalizarem impunidade, de jovens e velhos delinquentes. Este é outro viés do mesmo problema, circunscrito à política legislativa, à visão dos parlamentares brasileiros sobre a problemática da segurança pública.

Inocência dos ‘inocentes’! Nada mais enganoso. Quem, antes de completar 18 anos (mesmo que só por um dia), e desde os 16, estupra, mata, rouba, ser votante que pode ser, é tudo, menos inocente. Crente na impunidade, e disto sabedor – especialmente na era da informática e da internet –, usa e abusa do direito de sangrar a população, escudado em leis permissivas e favorecedoras do crime e de sua reincidência.

Isso, fora o interesse da própria ‘indústria do crime’, a se servir dos menores de idade quais bois de piranha, instrumentos à mão de seus interesses – de forma a manterem a criminalidade na crista da onda, sem os percalços de punições mais sérias.

Tudo, muitas vezes, somado à disposição daqueles que tudo fazem para que os direitos dos bandidos sejam preservados, esquecidos de que estes são os primeiros a desrespeitar os direitos humanos das pessoas verdadeiramente inocentes. É, em última instância, simples questão de justiça social de cunho comportamental, em que o interesse destes há de prevalecer sobre o daqueles – sejam velhos ou jovens.

Que se construa prisões, que se as bem aparelhem de molde a dar tratamento digno aos criminosos, mas que efetivamente sejam punidos, respondam por seus atos. Lembre-se: o potencial lesivo e ofensivo do ato dum adulto é o mesmo do de um jovem entre 16 e 17 anos. A dor da vítima é a mesma, diante da realidade nua e crua do crime!

Não se pode fugir à constatação de que a gravidade recorrente de atos e fatos ligados aos chamados ‘de menor’ impõe a adoção de medidas novas, de cunho preventivo/repressivo, que passem pela extensão da responsabilização adulta àquele que incorra na prática do mesmo crime.

Sintetizando, no Brasil, a inimputabilidade decorrente da idade segue o sistema biológico (artigos 228 da Constituição Federal e 27 do Código Penal de 1940). Não por critérios científicos, mas de política criminal. Daí a razão doutros países estabelecerem a responsabilidade penal em faixas etárias diferentes. E, se o Estado brasileiro não dá conta do cumprimento eficiente e suficiente de políticas públicas na área da segurança, que não mais se imponha à sociedade o ônus do sacrifício de vidas inocentes, sem a contraprestação da merecida punição. Maior ou menor de idade, pela infração consciente, resta a via única da reparação – a bem da população!

Sobre o autor
Edison Vicentini Barroso

Desembargador em São Paulo. Mestre em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Magistrado

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARROSO, Edison Vicentini. Menoridade penal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4297, 7 abr. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/37789. Acesso em: 23 dez. 2024.

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