Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Impeachment ou intervenção militar: é só o que temos?

Agenda 13/04/2015 às 21:49

Outra coisa de importância crucial a ficar esclarecida é que não existe uma “Intervenção Militar Constitucional.” Ao contrário, as forças armadas- e não “Poderes armados”- existem para que garantam a Lei e a Ordem nos moldes da Constituição da República..

Desde que o pleito presidencial foi finalizado, tenho recebido sucessivos convites para me filiar à ala “insurgente que luta pelo Impeachment da presidente, pela democracia e contra a corrupção do Brasil, que apóia a intervenção militar constitucional porque somente estes com sua autoridade poderiam fazer frear os absurdos sofridos pelo país até então.”

Bem, antes qualquer comentário mais elaborado, gostaria de dizer que a mim muito me espanta que palavras como “Democracia” e “Intervenção militar” estejam juntas em uma mesma oração, reforçando o mesmo contexto, simplesmente, porque são completamente antagônicas. Tamanho absurdo somente é superado quando a alternativa da proposta, tipo “combo”, floreia, dizendo que além da intervenção militar, vem à reboque Jair Bolsanaro para presidência do país.

Outra coisa de importância crucial a ficar esclarecida é que não existe uma “Intervenção Militar Constitucional.” Ao contrário, as forças armadas- e não “Poderes armados”- existem para que garantam a Lei e a Ordem nos moldes da Constituição da República, e não para que ameacem estes Poderes Constitucionais. Qualquer pensamento ou atitude diferente disto seria antidemocrático e iria na contra-mão direção da legalidade.

Sem fazer maiores alusões às violências perpetradas contra às liberdades de toda sorte no período histórico ditatorial, também chamado de “período negro”, como aquela que prendiam o cidadão “para averiguação” pelo tempo que julgassem conveniente, pode-se, baseando-se em números fáticos, chegar a conclusão de quem pede a intervenção militar não sabe muito bem o que evoca, para isso compartilho com os leitores alguns dados: Você sabia que de 1968 a 1973, ou seja, em cinco anos, nossa dívida externa mais que triplicou? Verdade, saiu da casa dos 4 bilhões de dólares e atingiu a casa dos 13 bilhões de dólares. Sabia que a inflação passava dos 22% ao mês? Que havia mais de 25 milhões de crianças passando fome? Que mais de 60% das crianças trabalhava mais de 40 horas semanais? (igual a que a maioria dos adultos trabalha hoje, por lei). Que no início de 1970 havia mais de 50% dos brasileiros ganhando menos que o salário mínimo? Que no fim dos anos 1950 um trabalhador precisava de 65 horas de trabalho para comprar uma cesta Básica de alimentos e que para adquirir esta mesma cesta em 1975 o trabalhador precisaria de mais 170 horas de trabalho duro? Sabia que por conta de um programa dos militares chamado de “Educação pelo Trabalho”, onde crianças e adolescentes entre 10 e 14 anos já trabalhavam igual a “gente grande”, o êxodo acadêmico foi o maior já visto, e ganhamos, reiteradas vezes, como o país com a maior população de analfabetos e semi-analfabetos? Que em 1974 o investimento em saúde era de menos de 1% do que se arrecadava e que no mesmo período o da educação foi diminuído a menos da metade?(...)

Também importante falar sobre o que seria esse tal Impeachment ou impugnação de mandato? Então, conceitualmente, seria: “A cassação do mandato do chefe do poder executivo (Presidente da República, Governador e Prefeito) pelo congresso nacional, pelas assembleias estaduais ou pelas câmaras municipais. A denúncia válida pode ter por base o crime comum, o crime de responsabilidade, o abuso de poder, desrespeito às normas constitucionais ou violação de direitos pátreos previstos na constituição. Este sim, instrumento democratico e com previsão constitucional. Funciona da seguinte forma; o artigo 85, da Constituição da República, e a Lei 1079/50, em seu artigo 4o diz que são crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentarem contra a Constituição da República, e, especialmente, contra: I - A existência da União; II - O livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário e dos poderes constitucionais dos Estados; III - O exercício dos direitos políticos, individuais e sociais; IV - A segurança interna do país; V - A probidade na administração; VI - A lei orçamentária; VII - Aguarda e o legal emprego dos dinheiros públicos; VIII - O cumprimento das decisões judiciárias.

Qualquer cidadão pode apresentar denúncia contra ato do Presidente da República nos moldes da Lei. A denúncia se inicia com apresentação dos fatos ao Presidente da Câmara dos Deputados, que pode aceitar ou rejeitar. Caso rejeite, ali se encerra o caso. Caso aceite, uma via crucis será iniciada até a decisão final do Senado Federal, pois este é quem tem a competência de julgar o Presidente nos crimes de responsabilidade. Para resumir, é necessário autorização de 2/3 da câmara e do senado, com a consequente condenação de 2/3 dos Senadores. Findo o processo, assumiria o vice-presidente.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

É óbvio que teríamos uma visão ingênua do guadro se acreditássemos que nosso país não necessita evoluir muito e em muitos quesitos. Acredito que também seria ingênuo

de nossa parte depositarmos neste ou naquele político as esperanças para a solução de todos os problemas e esquecermos que são tantos, que somente uma conjunto de ações coordenadas por um grupo de pessoas imbuídas de muita responsabilidade e sentimento cívico poderá, em um prazo razoável, promover as mudanças necessárias- como reforma política e tributária, por exemplo- para que o país volte aos trilhos, sem olvidarmos que as próximas gerações também trabalhem duro e incansavelmente para que o país permaneça nos trilhos.

Mas o que se leva de bom de toda essa estória é que demonstramos que, de fato, estamos em uma democracia, que podemos discutir, divergir e discordar do governo, fazermos passeatas e a imprensa pode escrever, livremente, sem que haja prisão ou ameaça de sanção. Me socorro nas frases de dois grandes pensadores, Winston Churchill e Voltaire, o primeiro dizia que “ninguém pretende que a democracia seja perfeita ou sem defeito. Tem-se dito que a democracia é a pior forma de governo, depois de todas as outras experimentadas de tempos em tempos”; o Segundo dizia: “Posso não concordar com nenhuma das palavras que você disser, mas defenderei até a morte o direito de você dizê- las.” E viva a Democracia! 

Sobre o autor
Antonio Marcos de Oliveira Lima

Doutorando em Direitos Humanos pela Universidade Nacional de Lomas de Zamora, Argentina. Professor de direito Administrativo em graduacao e cursos preparatórios , Diretor-Geral do IBPC (instituto brasileiro de proteção ao consumidor), Coordenador do Núcleo de Pesquisa e Estudo dos Direitos da Mulher, Advogado militante com atuação profissional Brasil X Portugal em Direito Civil, Direito do Consumidor , Direito Empresarial, Terceiro Setor, Direito Administrativo, Direito Tributário, Direito Intrrnacional, Sócio de Fernandes e Oliveira Lima advocacia e consultoria jurídica. Autor de "União estável e União Homoafetiva, os paralelos e as suas similitudes"; Ed. Pasquin Jus, 2006; "Retalhos Jurídicos do Cotidiano"; 2015, Ed. Lumen Juris.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!