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Lavagem de dinheiro: considerações sobre a Lei 9.613/1998 e as recentes modificações da Lei 12.683/2012

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Agenda 01/06/2024 às 08:47

A nova lei de lavagem de dinheiro no Brasil gera controvérsia sobre a obrigação de advogados comunicarem atividades suspeitas, conflitando com o sigilo profissional.

Resumo: Este trabalho versa sobre a análise do Crime de lavagem de dinheiro. Tema recorrente, ainda mais em face da recente mudança da legislação. A Lei 12.683/2012 modificou de forma indelével a Lei 9.613/1998. A mudança visa tornar mais eficaz a persecução penal em relação ao ilícito em comento. A expressão lavagem de dinheiro é entendida como um conjunto de atos praticados para ocultar, dissimular e reintegrar o dinheiro obtido de forma ilícita no sistema econômico-financeiro, como se tivesse origem legal. Ele é composto de três fases, consistentes na colocação, ocultação e integração. A prática ilegal será analisada no seu aspecto processual. Uma verificação da extinção do rol de crimes antecedentes, a alteração do art. 1º da lei que não mais fala em crime mas sim infração penal. Qual o bem jurídico tutelado, e a classificação se crime permanente ou instantâneo. A autonomia processual, as medidas assecuratórias e o aumento do rol dos que devem comunicar indícios de lavagem de dinheiro, passando agora a contar com a pessoa física, entre eles o advogado.

Palavras-chave: Lavagem de dinheiro; Crime; Crimes antecedentes; Autonomia do Processo; Extinção do Rol dos crimes antecedentes.

Sumário: 1. Introdução. 1.2. Considerações gerais sobre lavagem de dinheiro. 1.2.1. Breve histórico. 1.2.2. Conceituação. 1.2.3. Fases da lavagem de dinheiro. 1.2.3.1. Colocação. 1.2.3.2. Ocultação ou layering. 1.2.3.3.integração. 1.2.4. Tipologias da lavagem de dinheiro. 1.2.4.1. Empresa de fachada. 1.2.4.2. Empresa fictícia. 1.2.4.3. “Laranja”. 1.2.4.4. Venda fraudulenta de imóveis. 1.2.4.5. Produtos de seguradoras. 1.2.4.6. Dólar a cabo. 1.2.4.7. Contrabando de moeda. 1.2.4.8. Off shore. 1.2.4.9. Outras formas. 1.3. Politicas de combate à lavagem de dinheiro. 2.3.1. Considerações gerais. 2.3.2. Instrumentos internacionais. 2.3.2.1. Convenção de Viena. 2.3.2.2.declaração de Princípios da Basiléia. 2.3.2.3. Recomendações do Gafi. 2.3.2.4. Criação do Grupo de Egmont. 2.4. Combate a lavagem de dinheiro. 2.4.1. Considerações. 2.4.2. Três gerações de leis. 2.4.3. A Lei 9.603/1999. 2.4.4. A Lei 12.683/2012. 2.5. O crime de lavagem de dinheiro. 3.5.1. Considerações gerais. 3.5.2. Bem jurídico tutelado. 3.5.2.1. A administração da justiça. 3.5.2.2. A ordem socioeconômica. 3.5.3. Do tipo penal. 3.5.4. Crime instantãneo ou permanente? 3.5.5. Crime antecedente. 3.6. Aspectos processuais. 4.6.1. Autonomia processual. 4.6.2. Extinção da punibilidade do crime antecedente. 4.6.3. Citação e inaplicabilidade da suspensão do processo. 4.6.4. Delação premiada. 4.6.5.medidas assecuratórias. 4.6.6. Medidas assecuratórias cabíveis. 4.6.7. Alienação antecipada. 4.7. Ampliação do rol das pessoas sujeitas às obrigações da politica de prevenção. 5.7.1. Considerações gerais. 5.7.2. A possível participação de advogados nos crimes de lavage de dinheiro. 5.8. Considerações gerais.


1. INTRODUÇÃO

A Lavagem de dinheiro é tema recorrente. Não é um ilícito recente, mas ganhou contornos relevantes no século passado.

Mesmo na vida cotidiana, entre aqueles que não são operadores do Direito, esta é uma expressão conhecida. A tecnologia tem feito com que haja formas cada vez mais complexas de relações econômicas, e justamentes estas facilidades faz com que surja um terreno propício para o branqueamento de capitais.

Prevenir e na sequência punir tem sido uma preocupação constante dos Estados, e este trabalho se propõe a discutir o ilícito em comento.

Ver-se-á a origem histórica, desde os primórdios na década de 20 do século passado até a mais recente mudança na legislação pátria.

A partir da Convenção de Viena em 1998, que versava sobre o tráfico de entorpecentes e substâncias psicotrópicas houve a criminalização da conduta considerada lavagem de dinheiro, a partir deste momento os países signatários se comprometeram a tipificar estas condutas. O Brasil passa a tipificar esta conduta com a Lei 9.613/98, com um atraso de dez anos, mesmo porque naquele momento o país não era convidativo para a prática de tal ilícito.

A lavagem de dinheiro é composta de três fases, colocação, ocultação e integração.

Há uma tipologia bastante extensa de práticas criminosas que são usadas para o cometimento da infração, entre as quais: empresa de fachada, empresa fictícia, “laranjas”, produtos de seguradoras, off shore e uma gama extensa que este trabalho não se propõe a discutir.

Ver-se-á que em face da recente preocupação com o crime há várias políticas de combate. O combate repassa pelo esforço conjunto de países e instituições que precisam implementar ações para reprimir a ilicitude.

Este trabalho se ocupa com o crime a partir da Lei 9.613/98, vez que sendo uma legislação de segunda geração possuía um rol extensivo de crimes antecedentes, rol este que desapareceu a partir da Lei 12.683/2012. Esta sem sombra de dúvidas a mudança mais significativa na legislação pertinente.

Ocupar-se-á a presente monografia em analisar o crime na sua classificação se crime instantâneo ou permanente, e seus reflexos na ação penal. Assim como qual o bem jurídico tutelado pela legislação de lavagem de ativos. Alguns aspectos processuais também serão objeto deste trabalho, como a autonomia processual, vez que o delito de lavagem de dinheiro é crime acessório, mas de destaca do crime antecedente no momento processual.

As medidas assecuratórias cabíveis, a alienação antecipada de bens, assim como a ampliação do rol das pessoas sujeitas às obrigações da política de prevenção; a legislação anterior exigia apenas das pessoas jurídicas, mas atualmente aqueles que militam nas chamadas áreas sensíveis- entre eles os advogados- estão sujeitos.

O foco principal deste trabalho é pesquisar e analisar o crime de lavagem de dinheiro, a dificuldade que decorre de se detectar, comprovar e punir os “lavadores” de recursos com origem ilícita. Tudo isto dentro de uma perspectiva de respeito às leis e ampla defesa aos acusados.


2. CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE LAVAGEM DE DINHEIRO

2.1. BREVE HISTÓRICO

A lavagem de dinheiro é um processo que visa transformar o dinheiro sujo em recurso aparentemente limpo.1 O lucro obtido pela prática do crime precisa ganhar ares de legalidade, assim, a prática tem como propósito final dificultar o rastreamento e a identificação da origem ilegal do dinheiro.

A expressão money laundering foi usada como termo jurídico pela primeira vez nos Estados Unidos, num caso que se demandava a perda de dinheiro procedente de tráfico de entorpecentes. O termo era empregado pelas organizações mafiosas que usavam lavanderias automáticas para investir dinheiro e encobrir sua origem ilícita.2

O termo remonta à cidade de Chicago, na década de 20, quando criminosos abriram lavanderias, onde de maneira fraudulenta alteravam os lucros, isto é, lavavam pouca roupa, mas mesclavam os lucros da prestação de serviços de lavagem de roupas, com aqueles oriundos de práticas ilícitas, tais como jogos de azar, bebidas, prostituição, assim justificavam seus ganhos ilícitos e seu alto padrão de vida3.

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Não há concordância a respeito da terminologia desta conduta, de forma que enquanto alguns países utilizam a locução “lavar”, outros optaram por utilizar “branquear”, enquanto na Itália é reciclaggio del denaro (reciclagem de dinheiro).

Em outros idiomas, são utilizadas expressões equivalentes: lavados de activos, lavado de dinero e blanqueo de dinero na América Latina e Espanha4, reciclaje na França e branqueamento de capitais em Portugal.

Prática comum, vez que se trata de crime transnacional, embora divergentes na nomenclatura a ser usada, é um ilícito cada vez mais comum, até porque a criatividade dos criminosos não tem limite, e cada vez mais são criadas formas diferentes de ocultar a origem criminosa dos recursos. A legislação pátria está em sintonia com os acordos internacionais.

2.2. CONCEITUAÇÃO

“Lavar” etimologicamente vem do latim lavare, isto é; “tornar puro”, enquanto dinheiro vem do latim vulgar denarius, ou cada dez, que correspondia a uma moeda romana, e hoje significa moeda corrente. Pelas origens históricas da prática ilegal da lavagem de dinheiro, é possível uma definição a respeito do objeto deste estudo. Assim define Carlos Márcio Rissi Macedo em sua obra:

Tradicionalmente define-se lavagem de dinheiro ou de capitais como sendo o processo pelo qual busca atribuir-se faceta lícita a ganhos advindos de atividades ilegais, tencionando assim, além de obstar a atividade estatal investigativa dos mecanismos de combate à criminalidade, a criação de um canal seguro de transferência de valores de forma a incrementar a atividade criminosa antecedente.

O Art. 1º da Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998, já com a alteração recente da Lei nº 12.683, de 9 de Julho de 2012, dispõe que a prática de lavagem de dinheiro é ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente de infração penal.

Para Filippetto, lavagem de dinheiro é o conjunto de procedimentos adotados para transformar o proveito econômico obtido com a prática de ações criminosas em recurso de trânsito normal na economia.7

Na concepção do Conselho de Atividades Financeiras (COAF): “A lavagem de dinheiro constitui um conjunto de operações comerciais ou financeiras que buscam a incorporação na economia de cada país dos recursos, bens e serviços que se originam ou estão ligados a atos ilícitos”.8

Diaz-Marotto y Villarejo citado por André Luis Callegari tem a lavagem de dinheiro como sendo o “processo ou conjunto de operações mediante o qual os bens ou dinheiro resultantes de atividades delitivas, ocultando tal procedência, se integram no sistema econômico ou financeiro”.9

Os criminosos recorrem a todo um arcabouço de atividades, com propósito deliberado de introduzir no sistema econômico formal10 os ativos que agora ganham uma aparência de legitimidade. Portanto, conforme a apresentação da cartilha do COAF:

Lavagem de dinheiro é um processo pelo qual o criminoso transforma recursos ganhos em atividades ilegais em ativos com uma origem aparentemente legal. Essa prática geralmente envolve múltiplas transações, usadas para ocultar a origem dos ativos financeiros e permitir que eles sejam utilizados sem comprometer os criminosos. A dissimulação é, portanto, a base para toda a operação de lavagem que envolva dinheiro11 proveniente de um crime antecedente.

Por todos os ângulos que se possa olhar, há um consenso, a lavagem de dinheiro é a conduta segundo a qual a pessoal faz desaparecer os rastros da ilegalidade do dinheiro obtido.

2.3. FASES DA LAVAGEM DE DINHEIRO

Veja-se como ocorre a lavagem de dinheiro. Ela se manifesta por meio de diversas ações, Os mecanismos mais utilizados envolvem teoricamente três etapas independentes que, com frequência ocorrem simultaneamente.12 Não há unanimidade quanto ao vocabulário a ser usado; mas consonância a respeito da tripartição das fases. Para a caracterização delitiva nem todas as fases precisam ser percorridas.

2.3.1. Colocação

A primeira das fases é a colocação; Callegari faz a seguinte afirmação a respeito desta fase:

De acordo com a doutrina, esta é a fase em que os delinquentes procuram desembaraçar-se materialmente das importantes somas em dinheiro que foram geradas pelas suas atividades ilícitas. O montante arrecadado é normalmente trasladado a uma zona ou local distante daquele em que se arrecadou.13

A colocação, também conhecida como conversão ou placement consiste no ingresso dos recursos ilícitos no mercado formal.

Trata-se do movimento inicial para distanciar o valor de sua origem criminosa, com a alteração qualitativa dos bens, seu afastamento do local da prática da infração antecedente, ou outras condutas similares. É a fase de maior proximidade entre o produto da lavagem e a infração penal.

Neste momento o delinquente busca distanciar o lucro auferido com a prática do ilícito do local do seu cometimento; visa separar o criminoso dos produtos dos seus crimes, e para isto faz-se conversão em moeda estrangeira, compra de imóveis, enfim, toda uma sorte de operações que possam dissipar os ativos no mercado financeiro.

A colocação faz com que o criminoso por vezes faça o seu dinheiro tramitar por países com legislações menos austeras. Nas palavras de Macedo:

O objetivo final desta etapa é fazer com que o dinheiro em espécie seja transformado em outra forma de valor, seja em depósito em uma conta bancária, seja outro ativo financeiro líquido, passando-se à fase sucessiva do processo de lavagem.15

Este é o instante em que se começa o crime de lavagem de dinheiro, até então era recurso obtido de forma ilícita, e a partir deste momento principia a conduta da prática do crime acessório.

2.3.2. Ocultação ou layering

Adentramos ao segundo momento da tentativa de dar legitimidade aos lucros da atividade ilícita, e a este respeito leia-se a dicção de Bottini, “(a etapa seguinte é o mascaramento ou dissimulação do capital - layering), caracterizado pelo uso de transações comerciais ou financeiras”.16 Neste mesmo entendimento Macedo assim afirma:

Com a ocultação, camuflagem ou estratificação, há a primeira tentativa de obstacularização ao descobrimento da origem ilícita do capital, criando emaranhado de complexas transações financeiras, em sua maioria internacionais, projetadas para disfarçar o rastro de origem e prover anonimato dos agentes criminosos.17

E ainda Callegari discorrendo a respeito do mesmo assunto:

Assim, o propósito perseguido nesta fase é desligar os fundos de sua origem, gerando para isso um complexo sistema de transações financeiras destinadas a apagar as pegadas contábeis destes fundos ilícitos. Esta forma complexa em que as transações são desenvolvidas, mescladas e superpostas tem por finalidade que se torne extremamente difícil para as autoridades detectar estes fundos.18

Esta segunda fase caracteriza-se pela dissimulação, esta é a base sob a qual se assenta toda a operação de lavagem de dinheiro oriundo de um crime ou contravenção penal. Passa-se então à derradeira fase.

2.3.3. Integração

Neste momento da finalização do processo os ativos são incorporados formalmente ao sistema econômico, após todas as manobras encetadas o dinheiro ganha um lustro de legalidade, ainda que durante este processo possam ocorrer significativas perdas, mescla-se assim o capital lícito com o ilícito.

Consiste na incorporação formal dos recursos no sistema econômico mundial, aparece sob a forma de investimentos, compra de ativos, criação de uma rede de empresas que prestam serviços umas às outras. A integração é feita através da realização de investimentos em negócios lícitos nos diversos setores da economia.19

Nas palavras de Souza Netto “Nessa etapa são constituídas empresas e concedidos empréstimos, etc., convertendo-se ainda o restante do capital na realização de novas empreitadas criminosas”.20

Nesta fase do processo é muito difícil distinguir a riqueza legal da ilegal. Assim Rodolfo Tigre Maia afirma:

É frequente que os negócios decorrentes da atuação de tais empresas sejam reinvestidos em esquemas criminosos (nos mesmos que geraram os ativos ilícitos) e/ou em novos “empreendimentos”) e/ou que passem a “esquentar” (rectius:legitimar) o afluxo de novos volumes de dinheiro “sujo”, agora disfarçados em “lucros do negócio”, dinheiro “limpo”, ou, ainda, que forneçam ao na integração é potencializada a possibilidade de lesão à ordem econômica, quer na faceta da livre concorrência, quer na vertente da economia popular.21

A lavagem de ativos é uma maneira de mascarar a origem ilícita dos recursos, é um processo dinâmico, tem como características o distanciamento dos fundos do local de sua origem, a utilização de um requintado mecanismo para disfarçar e, por último, a sua recolocação no sistema econômico formal sob o manto de uma pretensa legalidade.

2.4. TIPOLOGIAS DA LAVAGEM DE DINHEIRO

As diferentes formas utilizadas pelos criminosos para lavar o dinheiro obtido nas diferentes atividades ilícitas são conhecidas como “tipologias de lavagem de dinheiro”.22

Em geral, como a transformação do dinheiro sujo em dinheiro aparentemente limpo envolve múltiplas operações financeiras e comerciais, feitas de forma concatenada e articulada, uma ou mais tipologias são utilizadas numa mesma operação, e algumas das mais conhecidas são:23

2.4.1. Empresa de fachada

Uma empresa de fachada dispõe de localização física. Trata-se de uma entidade legalmente constituída, participa do comércio de forma legítima, mas é, sobretudo utilizada para contabilizar os recursos que advém de atividades ilícitas. Em muitos casos, a empresa mescla recursos ilícitos com recursos provenientes de sua própria atividade, desta forma dificulta saber quais recursos estão limpos e quais estão sujos.24 Nas palavras de Mendroni:

É a existência de um prédio, uma casa, um escritório ou construção que o valha, sem a atividade econômica financeira que consta que se propõe a executar, fazendo-o, quando o faz, de forma simulada. No entanto, checando-se no local do endereço constante na Junta Comercial local será constatada a existência de um prédio naquele logradouro e número.25

Talvez das práticas delituosas esta seja a mais corriqueira, isto se deve a sua facilidade de implementação.

2.4.2. Empresa fictícia

A empresa fictícia é aquela que só veio a existir no papel, constituída apenas documentalmente, é registrada na Junta Comercial responsável, mas por não possuir atividade econômica regular ela é utilizada para contabilizar recursos oriundos do crime.26

2.4.3. “Laranja”

É o agente intermediário que efetua em seu próprio nome, por ordem de terceiros, transações financeiras, ocultando a identidade do real agente ou beneficiário.27 Nomenclatura pouco convencional, mas bastante conhecida no Brasil, de fácil compreensão, até por aquele que não milita no ramo do direito; mesmo este compreende com facilidade que está se falando de um intermediário utilizado para ocultar a real identidade de algum beneficiário.

2.4.4. Venda Fraudulenta de imóveis

Os imóveis são comprados com recursos de origem ilícita, por valores oficialmente menores que aqueles que foram efetivamente pagos. A diferença entre o valor da transação e o valor declarado oficialmente é paga com dinheiro em espécie, ato contínuo, a propriedade é revendida pelo valor de mercado, e o lucro gerado é utilizado para justificar a origem do dinheiro.28

O agente, por exemplo, compra um imóvel e declara haver pagado um valor infinitamente menor. Paga a diferença ao vendedor “por debaixo do pano”. Depois, após alegar haver realizado reformas que valorizam o imóvel (às vezes, mentirosamente e às vezes realizando reformas com custo muito menor do que o verdadeiramente gasto), vende-o pelo preço normal de mercado29, transformando aquela diferença em ativo (lucro).

Com o mercado imobiliário aquecido este é um alvo constante, presta-se a justificar ganhos expressivos, vez que os imóveis a alcançaram valores nunca antes imaginados.

2.4.5. Produtos de seguradoras

Alguém adquire bens com recurso ilícito e faz seguro por um determinado valor, pagando de forma regular os prêmios do seguro. Pode acontecer de o valor segurado ser aumentado por meio de endossos à apólice. Posteriormente é simulado um sinistro, a seguradora paga o valor pelo qual foi segurado o bem. O beneficiário do seguro recebe o pagamento da seguradora (origem lícita), mescla esse valor com outros valores de origem ilícita e justifica a origem como sendo do recebimento do sinistro.30

2.4.6. Dólar a cabo

Transferência de valores “do” e “para” o exterior, com a intermediação de casas de câmbio, empresas de transferência de numerário e doleiros, a camuflagem está em que este dinheiro não sai fisicamente do país.31

2.4.7. Contrabando de Moeda

O dinheiro em espécie é transportado fisicamente para outros países, faz-se de tal forma que seja possível a sua ocultação, utiliza-se acomodação em bolsas ou compartimentos secretos no meio de transporte utilizado; mescla-se por vezes com recursos utilizados em carros blindados; ocultação em bens transportados.32

2.4.8. Off shore

São centros financeiro-bancários extraterritoriais. Os chamados paraísos fiscais operam de forma indiscriminada sob o mais estrito sigilo bancário. Não se submetem ao controle financeiro das autoridades administrativas de nenhum país, onde fundos em moeda estrangeira de não residentes são depositados para depois serem canalizados, através de intermediários financeiros aos tomadores de empréstimos, sendo estes também não residentes.33

Off shore é, portanto o banco instalado em um paraíso fiscal.34

2.4.9. Outras formas

As formas acima demonstradas são exemplificativas, não há uma lista fechada de todas as práticas utilizadas para a lavagem de dinheiro. Assim ainda existe a Estruturação, a Mescla, compra e venda de ativos ou instrumentos monetários, bolsas de valores, jogos e sorteios, aquisição de antiguidades e objetos de arte, restaurantes e comércio de refeições, simulação de compra e venda de mercadorias com emissão de notas fiscais frias.

É importante levar em consideração que uma ou outra é utilizada com mais frequência, mas a criminalidade se utiliza de diferentes modos para justificar os seus ganhos; às vezes um mesmo ativo passa por duas ou mais técnicas.35

Muitas são as formas utilizadas pelos criminosos para dar um lustro de legalidade aos recursos conseguidos de forma ilícita, este trabalho não se propõe a listar todos eles, até porque a mente criativa dos criminosos não tem limites.

Sobre o autor
Leomir Alves da Silva

Servidor do tribunal de Justiça do Paraná- Graduado em Direito- FESP-PR. Pós Graduado em Direito do Trabalho- FESP-PR. Pós Graduado em Filosofia-UFPR.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Leomir Alves. Lavagem de dinheiro: considerações sobre a Lei 9.613/1998 e as recentes modificações da Lei 12.683/2012. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7640, 1 jun. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/38205. Acesso em: 22 nov. 2024.

Mais informações

Monografia apresentada a Faculdade de Educação Superior do Paraná, como um dos requisitos para obtenção do título de Bacharel em Direito, sob a orientação da Profa. Msc. Ana Carolina Elaine dos Santos.

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