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Cargas probatórias dinâmicas no novo código de processo civil

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Agenda 23/05/2015 às 03:44

O presente trabalho visa demonstrar e debater o tema das cargas probatórias dinâmicas no novo código de processo civil. Traz um panorama do atual sistema das cargas probatórias, traçando um paralelo entre inversão do ônus da prova e prova dinâmica.

Sumário: 1. Introdução – 2. Distribuição Estática do Ônus da Prova – 2.1 Aspectos Gerais do Ônus Probandi – 2.2 A Distribuição Estática – 3. Inversão/Modificação do Ônus da Prova – 4. Cargas Probatórias Dinâmicas – 4.1 Prova Diabólica – 4.2 Distribuição Dinâmica do Ônus da Prova – 5. Conclusão - Referências Bibliográficas.


1 INTRODUÇÃO

No presente trabalho realizaremos uma análise das questões probatórias que permeiam o atual ordenamento jurídico brasileiro. Debateremos acerca do atual momento que passa o processo civil brasileiro, os institutos atualmente vigentes, as críticas necessárias a eles.  Daremos especial atenção ao atual instituto da inversão do ônus da prova, sua definição, e eventuais ponderações e críticas.Tentaremos enfatizar o momento de reformulação de ideias e paradigmas que são postos em discussão dentro do ordenamento jurídico brasileiro (temas anteriormente tidos como dogmas por parte dos clássicos processualistas, que ainda relutam em aceitar o novo modelo de processo civil), bem como o tema da inovação nos institutos e teorias práticas do processo.

Trata-se, em verdade, de uma pequena análise crítica ao ordenamento jurídico processual atual, de forma a tecer uma base lógica para o entendimento do conceito de processo civil contemporâneo, bem como as questões de debate deste último tópico. O perfeito entendimento acerca do modelo de distribuição probatória contemporânea passa, necessariamente, pela análise dos institutos que o precederam.

Certo que o presente trabalho tem por escopo a plena explicação, debate e demonstração da aplicação prática da teoria das cargas probatórias dinâmicas no processo civil brasileiro. Entretanto, tentaremos abordar o tema de forma a demonstrar a imensa dificuldade (ou até impossibilidade) de desvinculação da presente teoria da própria história evolutiva que sofreu o processo brasileiro desde o início de seu estudo até o regramento vigente. A intenção do estudo é analisar os pontos importantes da matéria, em razão da recente promulgação do novo Código de Processo Civil Brasileiro. Passaremos pelo instituto do ônus da prova estático, da inversão do ônus da prova e da distribuição dinâmica do ônus da prova.


2 DISTRIBUIÇÃO ESTÁTICA DO ÔNUS DA PROVA

Neste tópico cuidaremos de ressaltar qual a situação dos ônus probatórios no ordenamento jurídico brasileiro. Ressaltaremos a previsão legal acerca do ônus da prova estático, e todos os pontos e aspectos percebidos pela doutrina com relação ao tema. Analisaremos as denominações e críticas doutrinárias e os devidos apontamentos deste trabalho.

2.1 ASPECTOS GERAIS DO ÔNUS PROBANDI

Parte predominante da doutrina entende que o instituto do ônus da prova se apresenta no ordenamento jurídico brasileiro em dois aspectos: subjetivo e objetivo. Há ainda dentre eles, aqueles que, como por exemplo, José Carlos Barbosa Moreira[1], intitulam esses aspectos do instituto em formal e material.

O ônus da prova subjetivo trata-se de uma regra de conduta e modo de proceder dirigida às partes, para que produzam provas no processo visando o esclarecimento dos fatos que alegaram, e somente estes. Através de expressa previsão legal, encontra-se previamente determinada quais as ações que deverão ser tomadas por cada parte (ao autor a prova de determinados fatos; o réu os fatos de seu interesse). Com isso, finda a instrução, com base nas provas colacionadas aos autos pelas partes, e somente nelas, o juiz pelo princípio do livre convencimento, dispõe da total certeza no tocante ao esclarecimento dos fatos. Nesse caso não há dúvida sobre o direito debatido. O juiz convenceu-se com base no arcabouço probatório trazido pelas partes.

Diferente do que ocorre no ônus da prova objetivo. Segundo este aspecto, o juiz tem a indicação de como deverá proceder ao julgar a lide caso não encontre provas nos autos suficientes para determinar a sua certeza sobre os fatos. Trata-se, em verdade, de uma regra processual dirigida ao juiz, com a finalidade única de aplicar-se ao caso concreto como regra de julgamento em casos de dúvida a respeito da verdade real. Nesse ponto, vale ressaltar que a crítica doutrinária é no sentido de que esse aspecto objetivo do instituto do ônus da prova trata-se, em sua essência, de mais uma regra da espécie ‘válvula de escape’, que é disponibilizada ao julgador para que, finda a instrução, não havendo ainda a plena convicção do debatido pelas partes, nos casos em que há falta de prova ou de elementos que possam embasar a sua decisão, use-a.

Serviria ao Magistrado em razão deste não poder escusar-se do julgamento – por tratar-se de fato notório que no Processo Civil Brasileiro o juiz não pode negar-se a decidir uma questão, por falta de elementos. É a regra contida no art. 4º, da Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro (decreto 4.657 de 1942). Também conhecido como vedação ao non liquet, ou em uma tradução mais aberta, proibição ao não julgamento pelo juiz (visto que o non liquet é a possibilidade do juiz de não julgar um processo, em razão de não ter convicções suficientes para tal) [2][3]. A aplicação dessa regra gera, por via reflexa, indica qual parte deverá arcar com o prejuízo de sua inércia, isso porque, a falta de produção de prova por uma das partes pode trazer prejuízo a ela no momento do julgamento. Caso não esteja convicto, o juiz analisará qual parte desincumbiu-se do seu ônus: o autor de provar fato constitutivo de seu direito ou o réu de provar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Seria essa uma regra que permitiria ao Estado-Juiz agir diante da insuficiência, ou até mesmo inércia, probatória das partes.

Com base em tal teoria estática, a carência probatória deixada por uma das partes durante o processo implicará diretamente na medida em que ela arcará com o peso do provimento jurisdicional emitido. As partes desde o momento em que envolvidas na relação jurídica processual tem o dever de lutar pelo seu objetivo principal: o autor em ver suas alegações consolidadas e o réu em ver desconstituído o direito do autor. E aqui se evidencia o caráter contencioso do atual modelo de processo civil que permeia o ordenamento jurídico brasileiro. Não se pode acreditar que há nesse modelo segurança das decisões, isso porque, a aplicação da norma em seu aspecto objetivo pressupõe análise do mérito de modo formal, e não propriamente material, visto que facilmente serão proferidas decisões meramente processuais, visando dar fim ao processo, e não de real análise do mérito, em razão da dúvida do julgador acerca da verdade. Com essa regra a busca pela verdade real é colocada de lado, para que se produzam resultados satisfatórios: o ‘fim’ da lide.

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Entretanto, o nosso entendimento é de que a utilização desta classificação em nada poderá influir o julgamento. Isto porque, ao cabo da instrução somente caberia ao juiz analisar se o conteúdo probatório foi suficiente para forma seu convencimento ou não. Não cabe a ele analisar se aplicará a norma jurídica como regra de julgamento ou julgará com base no conteúdo probatório que é completo. Caso entenda pela incompletude do arcabouço probatório, que determine que se produzam as provas que entender necessárias. Caso dê-se por satisfeito, que julgue de acordo com o seu convencimento da lide. Esse é o princípio esculpido no art. 130 do Código de Processo Civil brasileiro. A determinação é expressa para que o julgador determine a produção de todas as provas que entender essenciais a formação de sua convicção. Com isso ao adentrar a fase decisória não há motivos ou razões que justifiquem a aplicação do dispositivo de forma objetiva pelo julgador, em razão das partes não terem produzido provas.

A função do Estado-juiz é estimular o processo, para que, somente assim, tenha fim a lide e, tendo isso vem vista, no momento adequado expeça provimento jurisdicional (adequado e eficaz), e por ocasião deste somente analisará as provas. Por óbvio que o maior interesse no fim do litígio deverá ser da parte, entretanto, a partir do momento em que trouxer a lide à luz jurisdicional, o interesse passa a ser estatal, sendo este que deva prevalecer. Aliás, essa é uma (se não a principal) crítica de parte da doutrina, pois não veem nesta classificação dos aspectos do ônus da prova nenhuma utilidade prática. Para estes trata-se de mero debate positivista, o que não o deixa de ser.

2.2 A DISTRIBUIÇÃO ESTÁTICA

Atualmente o Código de Processo Civil, adota a distribuição estática do ônus da prova. Trata-se fato pacificado pela doutrina processualista. A norma jurídica insculpida no art. 333, do Código de Processo Civil, distribui o ônus da prova levando em conta a posição que as partes ocupam no processo, a distribuição nos polos da ação, não permitindo, em regra, ao aplicador da lei flexionar esse modelo ao caso concreto. O código prevê que é de competência da parte ativa da ação a produção da prova quanto ao fato que constituiu o seu direito. E no mesmo sentido a parte passiva da ação da prova quanto aos fatos que desconstituem o direito alegado pela parte autora[4].

Podemos dizer que os ônus probatórios de cada parte, da forma que estão atualmente dispostos no Código de Processo Civil, estão ligados a necessidade das partes de verem aceitos os fatos que alegaram como base da ação ou da exceção. Percebe-se então que a disposição da carga probatória no código está ligada à própria forma de desenvolvimento do processo. Isso porque, o legislador ao mencionar no inciso primeiro do art. 333, do Código de Processo Civil, em fato constitutivo do autor, trata-se na verdade da causa de pedir da petição inicial, que é onde se assenta o direito alegado. Na mesma esteira, o fato impeditivo, modificativo e extintivo do direito do autor, mencionado no inciso segundo, do art. 333, do Código de Processo Civil, seria nada mais que a causa de resistir, que é o direito impugnado por ocasião da contestação.

Contudo, críticas devem ser feitas a esse modelo de distribuição probatória. A principal delas dá-se em razão de que o modelo desconsidera as modificações fáticas do processo e suas peculiaridades (visto que cada processo é uma relação jurídica distinta e única), e estabelece uma regra padrão de análise das provas no processo. Tal forma de distribuição inflexível do ônus de prova enrijece o sistema processual, e sua aplicação ao caso concreto pode resultar em julgamentos dotados de ineficácia prática. Com um regramento geral e único de desenvolvimento processual, abandona-se o fato de que os processos não desenvolvem-se da mesma forma. É claro que isso ocorre em razão de que nem todos os processos debatem o mesmo direito e em razão do mesmo fato. São situações fatídicas diferentes, que por consequência geram direitos e obrigações diferentes.

Por vezes, não cabe à determinada parte produzir prova de determinado direito, pois não é ele o detentor do elemento de prova, ou ainda, porque não consegue ele provar o fato, porque não está ao seu alcance essa prova (o que já nos é conhecido em nosso ordenamento por prova diabólica, v.g. os fatos negativos). E aqui nasce o problema, ou deficiência de tal sistema probatório. Por vezes, a fim de solucionar o problema, em algumas hipóteses o legislador traz determinadas presunções legais, em outras, não. Com isso, fez nascer o debate doutrinário acerca de que, em alguns casos, a fórmula do art. 333 por si não é suficiente para trazer a verdade dos fatos ao processo. E para que seja flexibilizado a aplicação da norma, nasce na doutrina moderna o interesse e discussão pela corrente da distribuição dinâmica do ônus da prova, tema que veremos mais a frente.

Logicamente que, como já dito, o juiz poderia aplicar a regra do art. 333 em seu aspecto objetivo e por fim ao processo. Entretanto, também permeado pelas discussões de um novo modelo de processo civil, percebe-se que, aplicar objetivamente a regra do art. 333, traz fim ao processo, porém, não soluciona o litígio, que em casos, pode tratar-se de discussões importantes. Nessa aplicação regramental a busca pela verdade real toma o caráter de segundo plano, o que não é o interesse da doutrina moderna. E nitidamente, merece acolhimento essas alegações. As discussões acerca da efetividade do provimento jurisdicional é tema constante e latente na doutrina moderna, em razão da importância do processo como forma de pacificação social[5]. E assim, cercado de todas estas questões principiológicas, o tema cresce, e ganha defensores a pretexto de que esse modelo não é mais único e suficiente para a solução de todos os litígios de forma eficaz, em razão da já citada dinamicidade do processo diante do caráter estático deste modelo.


3 INVERSÃO/MODIFICAÇÃO DO ÔNUS DA PROVA

O instituto da inversão do ônus da prova teve seu surgimento em um período do ordenamento jurídico processual brasileiro, que foi tido por alguns como a cisão da ordem jurídica vigente, e a abertura para um novo panorama de direitos: os direitos transindividuais (ou difusos). Até o ano de 1990, não se falava em tutela de direitos difusos, havendo um ordenamento fechado à proteção de direitos individuais (os direitos concentrados que cada individuo detinha). O instituto foi o mecanismo encontrado para proteger direitos, em essência, diferente dos demais. Ademais, o momento histórico de concretização dos direitos do consumidor nos mostra a extrema influência sofrido por uma constituição (de 1988) que trouxe em seu bojo textos de extremo conteúdo principiológico. Com isso, também visando a iminente necessidade de efetivar a tutela dos direitos trazidos na carta magna, ocorre o surgimento do Código de Defesa do Consumidor.

A cisão consiste no fato do Código de Processo Civil ter sido até aquele momento o centro de estudos do processo civil brasileiro, tutelando um processo civil de direitos individuais, visando somente o patrimônio do individuo, etc. E com o surgimento do código consumerista, há o surgimento de outro centro de concentração do ordenamento jurídico processual, que dividirá com o Código de Processo Civil a incumbência de organizar a tutela de direitos no processo civil brasileiro. Com o decorrer dos debates a respeito do novo ordenamento consumerista, a doutrina pontua então, que o Código de Defesa do Consumidor pode ser considerado (e para alguns doutrinadores, trata-se de um fato certo) o precursor da chamada geração de direitos transindividuais, onde os direitos das minorias passam a ter maior importância diante de direitos individuais já consolidados. Dessa forma, como esses direitos difusos trazem consigo o caráter de excepcionalidade e diferença dos demais, assim também são os mecanismos de aplicação, proteção e regramento destes direitos. Direitos ‘especiais’ exigem regramentos, e mecanismos também especiais. Em razão disso, é que atualmente o ordenamento jurídico brasileiro prevê a ‘inversão’ do ônus da prova para casos específicos, permitidos pelo legislador. Isso porque, essa regra trata-se de mecanismo específico de tutela de direito do consumidor.

A doutrina classifica a inversão do ônus da prova em legal e judicial (ou ope legis e ope iudicis, como lecionam alguns doutrinadores). Inversão do ônus da prova legal é aquele em que o legislador, por sua própria vontade, distribuiu o ônus da prova diversamente da regra do art. 333, do Código de Processo Civil. O exemplo mais clássico é o art. 38, do Código de Defesa do Consumidor. Alguns doutrinadores como, por exemplo, DIDIER (2010, p. 84), entendem que a inversão do ônus da prova legal, nada mais é do que mera presunção relativa fixada pelo legislador. Entretanto, divergimos.

O entendimento nosso é de que a inversão legal do ônus da prova trata-se na verdade de redistribuição do ônus da prova, ou ainda distribuição dinâmica do ônus da prova. Isso porque, incumbe a parte contrária a prova de fato constitutivo de direito do autor. Ou seja, incumbe a parte provar fato que lhe é prejudicial. É caso do citado exemplo do art. 38, onde a propaganda prejudicial ao consumidor deve ser provada por quem patrocina a propaganda, nitidamente em favor do consumidor. Caso fosse analisada à luz do art. 333, do Código de Processo Civil, caberia ao consumidor a prova do prejuízo,o que não ocorre. Aqui sim há ocorrência da distribuição dinâmica do ônus, teoria que veremos adiante, e não presunção relativa (que, segundo os conceitos doutrinários vigentes em nosso ordenamento, trata-se da inversão do ônus da prova) como preceitua a doutrina. Aqui o ônus vira-se contrário a regra do art. 333, do Código de Processo Civil, não havendo presunção em favor do consumidor, e por isso o entendimento nosso é que se trata de distribuição dinâmica e não de inversão do ônus da prova.

Prosseguindo, a inversão do ônus da prova judicial é aquela em que o legislador não traz regramento diferente na distribuição do ônus da prova, mas deixa em aberto a possibilidade do juiz, tendo em vista a excepcionalidade do caso concreto, inverta o ônus da prova. O exemplo mais conhecido de inversão judicial é a hipótese das relações de consumo, previsto no art. 6°, VIII, do Código de Defesa do Consumidor. A inversão do ônus nas relações de consumo é cabível em duas hipóteses: a primeira nos casos de verossimilhança das alegações do consumidor, e a segunda nas hipóteses em que o juiz verifica que o consumidor está em situação de hipossuficiência em relação ao fornecedor. Ambas são hipóteses que dependem de critérios do juiz. Isso porque, dependerá dele a interpretação do aspecto de verossimilhança e de hipossuficiência no caso concreto. Neste ponto, abrimos um parêntese para destacar a posição da doutrina e pontos conflitantes segundo nosso trabalho.

A maior parte (para não dizermos a totalidade) da doutrina entendem que essa hipótese de inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, do Código de Defesa do Consumidor seja uma espécie de redistribuição do ônus diferente da regra do art. 333, do Código de Processo Civil. Há autores que sustentam ainda, que essa inversão se contrapõe de forma extrema ao regramento do art. 333, do citado código. Entretanto, em que pese a maioria esmagadora (e dentre eles grandes autores) afirmarem assim, o fazem erroneamente. A doutrina intitula esse instituto de inversão do ônus da prova de forma equivocada, isso porque não há inversão do ônus da prova nesta hipótese prevista no Código de Defesa do Consumidor, não há mudança no regramento do ônus probandi. A denominada inversão do Código de Defesa do Consumidor traz ao processo apenas uma presunção de prova dos fatos constitutivos do direito em favor do autor, não havendo modificação na regra.

Veja: a regra é de que o autor deverá provar fato constitutivo e o réu fato impeditivo. Na inversão do Código de Defesa do Consumidor, da forma que é amplamente aplicada pela doutrina e cortes brasileiras, o que ocorre é que o autor apenas não necessita mais provar fato constitutivo, isso porque a lei autoriza que o juiz dê esse direito por provado, cabendo ao réu somente desconstituir o direito do autor. Nada mais é do que mera presunção em favor do autor, e não inversão do ônus da prova, como alegado pela maioria da doutrina. Para que houvesse a verdadeira inversão o réu deveria colacionar aos autos prova do direito do autor, e não prova de sua desconstituição. Trata-se de conceitos basilares. O termo inversão tem origem no verbo inverter. Que por sua vez, segundo dicionário, tem o sentido de ‘mudar de direção em sentido contrário’. Logo, o entendimento nosso é que por nome de inversão do ônus da prova deveríamos nomear as situações em que o ônus probatório é totalmente invertido entre partes (o que hoje a doutrina chama de distribuição dinâmica) e não hipóteses de mera modificação processual. Ou seja, o réu, a quem caberia desconstituir direito do autor, incumbirá em verdade a produção de prova que seja essencial a consolidar o direito do autor. Nesses casos ocorrerá a verdadeira inversão e não nas presunções que militam em favor, por exemplo, dos consumidores (art. 6º, CDC).

Nas brilhantes palavras do professor PAULO HENRIQUE DOS SANTOS LUCON “a inversão do ônus da prova do Código de Defesa do Consumidor nada inverte, pois inverter vem do latim invertere e significa mudar a ordem de, dispor de maneira contrária ao normal”[6][7]. Tratam-se, sem dúvida, de temas extremamente conexos. Entretanto, é inegável a diferença conceitual e prática de ambos os institutos. Não podemos aplicar erroneamente institutos trazidos por doutrinas clássicas e contemporâneas de forma a não discutirmos os erros conceituais destes. Não há razão para chamar de inversão algo que, na sua essência, não o é. Entretanto, é inegável a alteração no contexto fático do processo, havendo a clara necessidade de nomear o instituto. Segundo nosso entendimento, o melhor nome é “modificação” do ônus da prova, e não inversão, o que desde já sugerimos, e será como trataremos neste trabalho: modificação do ônus da prova. A inversão do Código de Defesa do Consumidor nada inverte, tão logo, equívoco atribuir a este fenômeno características que ele não tem (a inversão). Tão logo a necessidade de conceito, optamos por nomeá-lo também por modificação do ônus da prova.

Tecemos tais considerações pois, no momento em que o legislador brasileiro, ao determinar no Código de Defesa do Consumidor que seria possibilitado a inversão do ônus da prova para defesa do consumidor, coube a doutrina processualista pátria a função de conceituar e debater o instituto. Caso na oportunidade tivesse emitido conceito de inversão da forma correta, não estaríamos hoje em nosso ordenamento jurídico discutindo acerca da legalidade da distribuição dinâmica do ônus da prova (ou ainda, da verdadeira inversão do ônus da prova), ou acerca dessa ‘nova corrente’, isso porque, já o teria sido realizado pela época. Logo, a tão sonhada (e debatida) evolução do Direito Processual Civil, em busca da utópica celeridade não teria sido procrastinada até os atuais dias. Debateríamos hoje outros temas, e um processo civil com outros nortes. Dessa forma, entendemos necessárias tais ponderações, visto que, o que hoje chamamos de inversão do ônus da prova, não o é; e o que optamos por nomear de “cargas dinâmicas” (distribuição dinâmica, ou outros termos), trata-se de consequências de um conceito inicialmente mal formulado. Diante de todo o debatido, passemos ao estudo da real inversão do ônus da prova.

Sobre o autor
Marcelo Luciano

Discente do 10º termo do curso de Direito do Centro Universitário Toledo de Presidente Prudente/SP. Aluno-monitor de Direito Civil e Direito Processual Civil no Centro Universitário Toledo de Presidente Prudente/SP. Autor do trabalho de conclusão de curso denominado 'Cargas Probatórias Dinâmicas e o Novo Processo Civil Brasileiro'. Exerceu função de estagiário perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo na Comarca de Presidente Bernardes. Exerceu função de estagiário da 1ª Defensoria Pública de Presidente Prudente. Tem ampla experiência na área de Direito Privado, com ênfase em Direito Civil e Direito Processual Civil.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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