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Polícia do Senado Federal:

criaram mais uma Polícia

Através da Resolução nº 59 do Senado Federal, de 05/12/2002, foi criada a Polícia do Senado Federal. Em seu art. 2º, inciso IX, atribui à mesma funções de investigação e de inquérito, que são atribuições típicas de polícia judiciária.Questiona-se a constitucionalidade deste inciso, vez que o inciso IV do § 1º, do art. 144 da Constituição Federal é taxativo ao estabelecer que é atribuído à polícia federal exercer as funções de polícia judiciária da União:

Art. 144 - § 1º - "A polícia federal, instituída por lei, como órgão permanente, organizado e mantido pela União, estruturado e mantido em carreira, destina-se a:

(...)

IV – exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União" (negritamos).

Será que uma simples resolução tem a capacidade de interferir nas atribuições da polícia federal, constitucionalmente estabelecidas?

A Resolução nº 59, de 05/12/2002, dispõe sobre o poder de polícia do Senado e, em seu artigo 2º, inciso IX, considera como atividades típicas da Polícia do Senado Federal "as de investigação e de inquérito". Vislumbra-se, então, que esta malfadada resolução criou uma outra polícia judiciária exclusiva para o Senado Federal, afrontando o artigo 144, parágrafo 1º, inciso IV, da CF, invadindo a esfera de atribuições exclusivas da polícia federal, mostrando-se flagrantemente inconstitucional. Vejam o que consta na Resolução nº 59/02, em seu art. 2º, § 1º, inciso IX:

"§1º - São consideradas atividades típicas de Polícia do Senado Federal;

(...)

IX – as de investigação e de inquérito." (negritamos).

Ora, uma resolução legislativa não pode ter o condão de suprimir uma norma constitucional. Segundo o Diretor-Geral do Senado Federal, tal Resolução regulamenta o artigo 52, inciso XIII, da Constituição Federal, o qual foi transcrito abaixo:

Art. 52 - "Compete privativamente ao Senado Federal:

(...)

XIII – dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para a fixação da respectiva remuneração observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias." (negritamos).

Verifica-se que houve um erro de interpretação por parte do Senado Federal quando ao termo "polícia" evidenciado acima. Este se refere ao poder de polícia, que é exercido por aquela Casa por meio de suas atribuições de natureza administrativa, dentre elas, a fiscalização do trânsito de pessoas nas suas dependências, revista, busca, apreensão e segurança dos parlamentares. Esse poder de polícia também é conferido a órgãos da administração pública, como os departamentos de vigilância sanitária e de fiscalização tributária, por exemplo. Conforme conceitua a Professora Maria Sylvia Zanella di Pietro, poder de polícia é a "atividade do Estado consistente em limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público." (Direito Administrativo, 13ª Edição, Atlas, p. 110).

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Assim sendo, o conceito de "polícia" referido no art. 52, inciso XIII da CF não abarca o sentido de polícia judiciária, como entendeu o Senado, mas o sentido de polícia de manutenção da ordem pública naquela Casa.

É temerário aceitar-se passivamente a existência do inciso IX diante de algumas incógnitas: haveria alguma razão plausível para que o Senado Federal criasse uma polícia judiciária própria? Por que invadir as atribuições da polícia federal desta maneira? Estaria este órgão desempenhando mal suas funções a ponto de desassossegar os parlamentares?

Na esteira de incongruências, vem o § 2º do art. 2º da mencionada Resolução estabelecer que "As atividades típicas de polícia do Senado Federal serão exercidas exclusivamente por Analistas Legislativos, Área de Polícia e Segurança, e por Técnicos Legislativos, Área de Polícia, Segurança e Transporte, desde que lotados em efetivo exercício na Sub-Secretaria de Segurança Legislativa". Este restará também prejudicado caso permaneça o inciso IX do § 1º do art. 2º, pois por meio dele, está-se transferindo atribuições exclusivas de delegado de polícia federal a pessoas não investidas em cargos da carreira policial.

Outra anomalia jurídica é o art. 4º da desafortunada Resolução: "Na hipótese de ocorrência de infração penal nas dependências sob a responsabilidade do Senado Federal, instaurar-se-á o competente inquérito policial presidido por servidor no exercício de atividade típica de polícia, bacharel em Direito". Vejam: inquérito policial instaurado por servidor "em exercício de atividade típica de polícia". Onde fica o princípio da autoritariedade no inquérito policial, segundo o qual este só pode ser iniciado por autoridade competente? (leia-se, no contexto, delegado de polícia federal).

Alerta-se que o inciso IX do § 1º do art. 2º da Resolução nº 59/02 dever imediatamente ser declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, sob pena de verem-se invertidas atribuições constitucionais, suprimidas garantias individuais e violados princípios basilares da administração, mormente os da legalidade, impessoalidade e moralidade. A sociedade agradece e o Estado de Direito permanece.

Sobre os autores
Antônio Carlos de Lima

delegado de polícia em Goiânia (GO)

Íris Cristina Ogêda Oliveira

bacharel em Direito pela Universidade Federal de Goiás

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Antônio Carlos; OLIVEIRA, Íris Cristina Ogêda. Polícia do Senado Federal:: criaram mais uma Polícia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 64, 1 abr. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3954. Acesso em: 23 nov. 2024.

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