Imagine abrir um negócio livre de qualquer tributação, encargos sociais, trabalhistas, previdenciários e, ainda, imune a qualquer execução judicial cível. Essa é a atividade do grande traficante de drogas que, a cada dia, atrai uma grande massa de consumidores de suas substâncias, notadamente a maconha e a cocaína.
Em todos os lugares a droga está presente. Desde o seu condomínio até às mais sofisticadas e badaladas rodas da society, você encontrará a maconha e a cocaína desfilando entre alguns de seus mais ilustres membros. Uns mais tímidos, recatados, outros sem nenhum acanhamento com o uso da droga.
A par dessa realidade inconteste, a maconha e a cocaína são substâncias proibidas em território nacional. Nossa legislação penal pune severamente o traficante destas drogas, assim como seus usuários. Aliás, a maior parte da atividade policial e judiciária, atualmente, é dedicada à persecução e punição da venda e uso de drogas.
Tanto o esforço do Poder Público em geral e da legislação federal foram insuficientes para combater a venda e o uso de drogas. Para alguns mais jovens chega a ser um contrassenso a repressão estatal à venda e consumo de drogas, já que estas substâncias encontram-se facilmente na sociedade. Exemplo disso são as famosas marchas e passeatas a favor da descriminalização das drogas realizadas nas grandes cidades e a descriminalização do porte de drogas para consumo próprio estar na pauta do Supremo Tribunal Federal (RE 635659).
Do choque da realidade da vida com a realidade legislativa vigente quem se beneficia é o grande traficante e o comércio clandestino de armas de fogo. Na ilegalidade, o traficante sabe bem que deve armar até os dentes seus soldados para fazer frente a rivais do mesmo ramo. Enquanto isso, nas comunidades carentes – sedes das bocas de fumo –, a dor, o desespero e a desgraça tomam conta de sua gente trabalhadora, silenciada pelo terror imposto por traficantes.
Não existem bocas de fumo nos elegantes Bairros da elite. Por consequência, nem um rojão sequer é lançado nas ruas e avenidas arborizadas das classes dominantes. Talvez por isso nossa teimosa legislação ainda resista à criminalização da maconha e da cocaína. O disque-droga não derrama o sangue dos filhinhos-de-papai e, de alguma forma, agrada a todos de fina flor.
Usar o Direito Penal para instalar uma política de saúde pública no Brasil foi ação estéril, sem efeito. A criminalização das drogas, hoje, confunde-se com a criminalização da pobreza. A legislação deve abrir seus olhos para uma realidade invencível e insuperável dos dias de hoje. A cultura e o modo de vida de um povo precede toda e qualquer atividade legiferante. De nada adianta criar disposições legais utópicas na contramão do fato e da realidade.