Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

Incidência do ICMS no comércio eletrônico

Exibindo página 4 de 4
Agenda 01/04/2003 às 00:00

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O comércio eletrônico, pela novidade e complexidade embutidas, é assunto que desperta grande interesse e também muitas discussões, notadamente no campo jurídico. Fruto da tecnologia advinda com a Internet, é atividade bastante recente que não comporta tratamento simplista e fracionado, mas deve ser vista conjunturalmente, ou seja, como um elemento importante da chamada "nova economia", e à luz dos desdobramentos do fenômeno da globalização.

Ao tratarmos especificamente a tributação do comércio eletrônico, no que se refere à incidência do ICMS, esbarramos nas inúmeras possibilidades de transações, nem todas ainda devidamente identificadas, e à total ausência de legislação adequada a tema tão novo. Transações comerciais que possuíam uma moldura e conceitos bastante definidos, repentinamente adquiriram caráter internacional, onde as fronteiras são cada vez mais tênues, trazendo questionamentos importantes principalmente para os Estados.

O ICMS, sendo tributo indireto de âmbito estadual, que recai sobre o consumo, possui caráter normativo nacional fixado pela constituição e que encontra regulamentação em Lei Complementar, cuja supremacia deve ser obedecida. Analisando-se a legislação brasileira pertinente ao ICMS, concluímos que a mesma não está totalmente adequada para captar a capacidade contributiva manifestada através desse novo meio. Os conceitos clássicos definidos pela legislação, como por exemplo os de mercadoria, serviço, local e estabelecimento, são deficientes porque comportam inúmeras interpretações, muito embora alguns sejam abrangentes o suficiente para a incidência do imposto em questão.

Contudo, entendemos que alguns equívocos estão sendo cometidos pelo Judiciário, como por exemplo no caso do enquadramento do software. Os conceitos de mercadoria e serviço são relevantes para dirimir a controvérsia existente sobre a natureza jurídica do mesmo e, pelo estudo feito, concluímos que nesse caso específico, indiscutivelmente trata-se de mercadoria. Ao adquirimos um software em um estabelecimento físico qualquer, pagamos pelo conteúdo inserido em um meio físico (CD ou disquete) e sobre esse conteúdo/mercadoria vendido é que incide o imposto. Portanto, ao comprarmos esse mesmo software em um site e incorporá-lo ao nosso computador via download e não mais por um meio físico, estamos realizando exatamente a mesma transação abrangida pela materialidade da competência tributária do ICMS. Nesse sentido, entendemos um grande equívoco a distinção entre software de prateleira e próprio.

Ainda, a questão de poder ou não considerarmos o site como estabelecimento, é assunto que comporta as mais diversas interpretações. Entendemos que, dependendo do tipo de atividade nele realizada, sem dúvida alguma poderão ser assim considerados. O problema maior é adequar a legislação de modo a que esta contemple todas as composições possíveis.

Assunto dos mais polêmicos e que também divide a doutrina, é a discussão travada quanto à incidência de ICMS ou ISS no serviço de provedores de acesso à Internet. De todas as posições estudadas, concluímos que a mais coerente é a tese sustentada por Marco Aurélio Greco, considerando esse um serviço de comunicação, passível, portanto, de incidência do atual ICMS, elidindo toda a discussão sobre a pertinência ou não do ISS.

Verificamos ainda que o Brasil não está muito afastado dos demais países no que concerne à legislação sobre o comércio eletrônico, de forma geral, mas encontra-se bastante atrasado no que se refere ao aspecto tributário. Os projetos de Lei em tramitação no Congresso não tratam dessas questões. Muito embora o governo federal acompanhe a posição adotada pela OCDE, buscando utilizar os tributos já existentes no que for possível - e no caso dos provedores de acesso, entendemos ser possível o enquadramento - fica evidente a insuficiência da legislação atual, haja vista as inúmeras ações ajuizadas contra os Fiscos Estaduais e a polêmica sobre qualquer assunto que envolva comércio eletrônico. Pensamos que o melhor caminho seja não o de simples adequação das normas existentes, mas a criação de uma lei específica, em forma de micro-sistema, que contemple todos os aspectos do comércio eletrônico, detalhadamente, adaptada aos princípios tributários constitucionais, e com regras comerciais compatíveis a essa nova economia. Talvez seja viável a inserção da disciplina tributária no Projeto de Lei 1589/99, já em tramitação e que é o mais abrangente.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Entendemos, ainda, que tal proposta deva passar necessariamente pela tão falada e pouco desejada reforma tributária, de modo a adequar a nomenclatura e os requisitos aos impostos já existentes ou que serão criados nos demais países, além de tornar o sistema mais simples, proporcionando ao contribuinte entender o que paga, para quem paga e para onde vão os recursos arrecadados. Manter as transações eletrônicas subordinadas a várias instruções normativas, envolvendo jurisprudências as mais diversas, contribui para a incerteza jurídica, elevação de custos e retardamento de investimentos no setor. A uniformização dos princípios legais que estruturarão essa nova modalidade de comércio só contribuirá para o desenvolvimento do e-commerce, além de fazer do Brasil um modelo do comércio eletrônico.

Finalmente, não poderíamos deixar de mencionar a tese defendida pelos EUA, de não tributar o e-commerce pelos próximos cinco anos. Cremos que se trata muito mais de estratégia empresarial, na forma de subsídios disfarçados e ocupação do mercado, do que propriamente preocupação em desenvolver o comércio eletrônico no resto do mundo. Não somos contra os incentivos fiscais; o que não podemos aceitar é a transformação dos mesmos em benefícios que privilegiam apenas os grandes conglomerados, em detrimento das pequenas e médias empresas. Aliás, estratégia é algo que deveria preocupar o governo brasileiro quando busca a inserção do país na economia globalizada. O posicionamento brasileiro nos foros internacionais deveria ser consistente com a viabilização e defesa do setor industrial, através do incentivo à geração de empregos, já que os ganhos de produtividade resultantes da introdução dos métodos de comércio eletrônico são em parte devidos a reduções nos postos de trabalho.

Nesse sentido, entendemos que tributar linearmente o comércio eletrônico com alíquotas elevadas não trará benefício algum, principalmente para as empresas que estão iniciando nessa área. BORDIN, em artigo publicado na Rede, faz esclarecedora preleção sobre o que chama de "subversão dos ideais tributários", informando que o ICMS cobrado pelos Estados está concentrado nos chamados produtos e serviços seletivos, como cigarros, bebidas, comunicações, energia e combustíveis. No Rio Grande do Sul, por exemplo, o ICMS concentra 53% da arrecadação. Refere que a experiência internacional demonstra que o IVA é imposto predominantemente neutro e de maior potencial financeiro, enquanto que os impostos seletivos são apenas complementares a ele. Conclui dizendo que existe "concentração em demasia da principal receita estadual em poucos produtos e em poucos contribuintes, pondo em risco o financiamento do setor público. Ademais, como manda a boa técnica dos tributos sobre o valor agregado, a base do imposto deve ser a mais ampla possível."

Verificamos, por último, que o Brasil possui forte atração econômica em relação às grandes empresas de informática, pelo tamanho e potencialidade do mercado. Contudo, os dados sobre o desenvolvimento do comércio eletrônico no país ainda são incipientes, principalmente pela pouca participação dos órgãos que congregam o empresariado. Também o desenvolvimento do e-commerce resume-se, na sua quase totalidade, em propiciar um novo meio para o comércio tradicional, longe ainda de constituir-se em um mercado de massas.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALBERTIN, Luiz Alberto. Cenário Atual e Tendências do Comércio Eletrônico no Mercado Brasileiro. Seminário Internacional Comércio eletrônico e Tributação. Brasília: ESAF. 12/06/2000.

ALBERTIN, Luiz Alberto. Comércio Eletrônico. São Paulo: Editora Atlas, 1999. 275p.

ABREU, Cláudio e PRADO, Marcos. Tributação na Internet. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, nº 67, abril/2001. p 17 –27.

ASIAIN, Jorge Hugo. Comercio electronico – operaciones internacionales. http://www.abdf.com.br/seminarios.asp. Pesquisado em 09/04/01, 01:09h.

AVERBACH, Cyro. O ponto de vista de um empresário. Seminário Internacional Comércio Eletrônico e Tributação. Brasília: ESAF. 12/06/2000.

BARSHERFSKI, Charlene. O comércio eletrônico na política comercial dos EUA. FIERGS, 2000. mimeografado.

BASSO, Maristela. Prudência no comércio eletrônico. http://www.jusnavigandi.com.br Pesquisado em 12/12/2000, 14h.

BORDIN, Luís Carlos Vitali. Subvertendo os ideais tributários. Artigo. www.sintaf-rs.org.br/fatogerador/fg21/fg artigo.htm Pesquisado em 25/04/01, 23:45h.

CARVALHO, Paulo de Barros. O fato gerador do ICM. São Paulo:Resenha Tributária. 1978.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Editora Saraiva, 2000. 538p.

CARVALHO, Rubens Miranda de. ICMS – Comentários à LC 87/96. São Paulo: Editora Oliveira Mendes, 2000. 320p.

CASTRO, Aldemario. Os meios eletrônicos e a tributação. http://www.infojus.com.br/areal/aldemarioaraujo2.htm Pesquisado em 03/03/01, 15h.

CHIESA, Clélio. A tributação dos serviços de Internet prestados pelos provedores: ICMS ou ISS? Revista de Direito Tributário, São Paulo: Malheiros, nº 74. p. 193-204.

COELHO, Sacha. Curso de Direito Tributário brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 1999. 801p.

CRONIN, Mary J. Fazendo Business via Internet. São Paulo: Editora Érica, 1995, 248 p.

FARIA, José Eduardo. O Direito na Economia Globalizada. São Paulo: Malheiros, 1999, 359p.

FERNANDEZ, Oscar Soto L. O Comércio Eletrônico no Brasil: uma questão estratégica. Seminário internacional Comércio Eletrônico e Tributação. Brasília: ESAF, 12/06/2000.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1975.

GRAZZIOTIN, Júlio César. Comércio eletrônico. Seminário sobre comércio eletrônico. Porto Alegre: AFIVESC, 26 e 27/10/2000.

GRECO, Marco Aurélio. Internet e Direito. São Paulo: Dialética, 2000. 207p.

GRÉGIO, Odécio. O ponto de vista de um interveniente financeiro. Seminário Internacional Comércio Eletrônico e Tributação. Brasília: ESAF. 12/06/2000.

LAURINDO, Fernando José. Conceitos fundamentais, evolução e peculiaridades do comércio eletrônico. Seminário Internacional Comércio Eletrônico e Tributação. Brasília: ESAF. 12/06/2000.

LAVIERI, João Vicente. Internet: incidência do ICMS ou ISS? Artigo fornecido pela COMUT/UNISINOS, sem fonte, pesquisado na Internet em dez./2000.

LOKCHIN, Bernardo. Entrevista concedida por telefone. Executivo do CONTEC/FIERGS. Porto Alegre, 10/04/2001.

LUNARDELLI, Pedro.G. Tributação na Internet. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, nº 59,agosto/2000 p. 75-94

LYNCH, Daniel e LUNDQUIST, Leslie. Dinheiro Digital – o comércio na internet. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1996. 25 p.

MACIEL, Everardo. Sessão inaugural do seminário internacional comércio eletrônico e tributação. Brasília: ESAF, 12/06/2000.

NETO, Matteus V. ICMS: a lei complementar 87/96 interpretada. São Paulo: LED, 1997. 325p.

NICHOLAS, Paulo. Comércio eletrônico e ICMS. www.direito.com.br/doutrina. Artigo fornecido pela COMUT/UNISINOS, em dez/2000.

NOVA Enciclopédia Ilustrada Folha. São Paulo: Folha da Manhã, 1996, vol, I e II, p. 290 e868.

NUNES, Denise. RS se revela um conservador otimista. Panorama econômico. Correio do Povo, Porto Alegre,15/03/2001. Economia, p.16.

OLENIKE, João Eloi. A guerra fiscal. www.tributarista.org.br/content/estudos/guerfisc.html. Pesquisado em 29/04/01, 09:52h.

OLIVEIRA, Júlio Maria de. Internet e competência tributária. São Paulo: Dialética, 2001. 175 p.

PEDROSA, Ivo. A tributação do consumo e a dinâmica do federalismo brasileiro: as perspectivas do ICMS e de outros tributos sobre o consumo. Artigo. Pesquisado em 15/05/01. 23:56h.

PERRONE, Luís. A tecnologia WAP. www.jb.com.br/inter/internet/wap1.html Pesquisado em 22/04/2001, 13:16h.

PESSOA, Luciana P. A necessidade de um ambiente jurídico para o comércio eletrônico. http://teiajuridica.com/af/ambjurcomele.htm. Pesquisado em 31/10/2000, 22:47h.

Propostas de Diretivas da UE. http://europa.eu.int/eur-lex. Pesquisado em 15/08/2000, 22h.

RADOS, Gregório et alii. Valor agregado a serviços e produtos de informação. www.ced.ufsc.br/ursula/papers/valor.html Pesquisado em 22/04/01, 11:30h.

ROSADO, Ruy. Aspectos jurídicos do comércio eletrônico. Seminário Internacional Comércio Eletrônico e Tributação. Brasília:ESAF, 12/06/2000.

RIBAS, Sílvio. Estrutura para portais de negócios na AL. Porto Alegre: Gazeta Mercantil, C-3, 13/07/2000.

SAMUELSON, Robert. La fiscalidad para Internet. Apud LAGO, Miguel Ângelo. Fiscalidade del comercio electronico: los impuestos de la nueva economia. www.abdf.com.br/seminarios.asp. Pesquisado em 09/04/01, 01:15h.

SILVA, Luís Antonio Pereira da. Entrevista concedida por telefone. Ex- presidente da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas. Porto Alegre, 07/05/01.

TEIXEIRA, Rômulo. ICMS na operação mercantil com software. www.jusnavigandi.com.br/doutrina. Pesquisado em 11/10/2000, às 09:32h.

TRIBUTAÇÃO no e-commerce – Artigo publicado, sem referência autoral, em http://www.ctcc.com.br/dicas-3.htm. Pesquisado em 25/04/2001, 10h.

VENTURA, Luís Henrique. Comércio eletrônico. Revista Jurídica Consulex. Brasília: Consulex, nº 35, p. 62 – 63.

WILLIG, David S. A internet e a constituição dos Estados Unidos. Artigo. www.direito.com.br. Pesquisado em 26/11/200, 19:30h.

Endereços Eletrônicos De Pesquisas De Notícias Sobre E-Commerce:

http://idgnow.terra.com.br/idgnow/business/2001/05/0029.

http://www.uol.com.br/computerworld/news/0001/24/000124dell.htm

http://www.fittel.org.br/forums/noticias/posts/355.html

Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARASUOL, Eliana Mara Soares. Incidência do ICMS no comércio eletrônico. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 64, 1 abr. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3992. Acesso em: 22 nov. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!