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O lapso temporal como forma de extinção das obrigações administrativas.

Decadência, prescrição e preclusão no Direito Administrativo

Agenda 30/06/2015 às 15:03

ANALISE GERAL SOBRE AS FORMAS GERAIS DE PRESCRIÇÃO, DECADÊNCIA E PRECLUSÃO COMO INSTITUTOS JURÍDICOS EXTINTIVOS DAS OBRIGAÇÕES. PARTINDO-SE DE UMA INVESTIGAÇÃO PRINCIPIOLÓGICA E DAS BASES FUNDAMENTAIS, CONSTITUCIONAIS E INFRACONSTITUCIONAIS ACERCA DO TEMA

1.1. INTRODUÇÃO

Iniciando-se os estudos pela analise dos princípios aplicados e os direitos que o instituto jurídico da prescrição busca tutelar. Estabelecer os conceitos gerais de prescrição preclusão e decadência, bem como definir os conceitos específicos de prescrição, decadência e preclusão no âmbito administrativo.

2.1. ANÁLISE PRINCIPIOLÓGICA DO LAPSO TEMPORAL COMO FORMA DE EXTINÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA E SUA NATUREZA DE TUTELA NO ORDENAMENTO JURÍDICO.

O lapso temporal como forma de extinção das relações jurídicas encontra como fundamento de sua natureza de ser o mesmo da prescrição comum. Firmando as bases no princípio da segurança jurídica e da estabilidade das relações. Motta (apud ANIBAL BRUNO, 2004, p. 699), explica que com o decurso do tempo, vão se alterando os fatos, e com estas, as relações jurídicas que neles se fundam, e, sendo assim, o direito não pode deixar de tutelar essa consequência natural.

O autor vai além, doutrinando no sentido de que com o passar do tempo vão sumindo os sinais fáticos, e predominando as circunstâncias. Ou seja, a memória dos homens fica fragilizada através dos anos, e tanto o testemunho quanto as lembranças ficam cada vez mais fragilizadas o que as tornam provas imprecisas. (MOTTA apud ANIBAL BRUNO, 2004, p. 699).

Portanto, essa fragilidade de testemunho pode acarretar em um risco ao juízo decisório que desta maneira venha a se proferir com base em tais incertezas, o que se mostra como uma grande situação de insegurança jurídica.

Além disso, o fato cometido foi-se perdendo no passado, apagando-se os seus sinais físicos e as suas circunstancias na memoria dos homens; escasseiam-se e tornam-se incertas as provas materiais e os testemunhos e assim crescem os riscos de que o juízo que se venha a emitir sobre ele se extravie, com grave perigo para a segurança do direito. Uma e outras razões fazem da prescrição um fato de reconhecimento jurídico legitimo e necessário. Anibal Bruno (apud MOTTA, 2004, p. 699),

Verifica-se, assim, uma preocupação, de certa maneira, com a verdade jurídica dos fatos para que não se confunda com a verdade criada circunstancialmente pelo decurso do tempo.

Da mesma forma que ocorre no direito civil, se o detentor de um direito de ação que se mantém inerte e não o exerce no prazo previsto, nasce contra ele uma situação jurídica oposta que lhe impede de exercer tal direito, tendo em vista que ninguém pode ficar eternamente a mercê de uma pretensão não exercida, uma vez que esta situação gera a insegurança jurídica.

O tempo serve, então, para estabilizar essa relação com fins a gerar um conforto social perante o direito gerando a estabilidade jurídica.

O fundamento da prescrição administrativa é o mesmo da prescrição comum: o principio da segurança jurídica e da estabilidade das relações. De fato, o direito não pode ficar a mercê de eternas pendencias, provocando uma situação de instabilidade no grupo social. O tempo é necessário para proporcionar essa estabilização. Desse modo, se o titular de um direito fica inerte para exercê-lo, surge, em certo prazo, situação oposta que passa a impedi-lo do exercício. Ou seja, a inercia do titular do direito cria situação favorável a terceiros, que acabam por se beneficiarem daquela situação de inercia. (CARVALHO FILHO, 2007, P. 830)

O lapso do tempo como forma extintiva de direitos também tem sua natureza de ser no ramo do direito público, justamente com base na segurança jurídica e na estabilidade das relações, como leciona Carvalho Filho (2007).

Em consequência no Direito Administrativo também é preciso assegurar a estabilidade dessas relações, sobretudo entre a administração e o administrado; dai a criação da prescrição administrativa. Esse é o fundamento do instituto. (CARVALHO FILHO, 2007, P. 830)

Desta forma, deve-se ser aplicado ao direito administrativo o lapso de temporal como forma de extinção dos direitos, para que este ramo não tenha desamparo jurídico e tampouco fragilidade jurídica tanto em relação à administração quanto ao administrado. 

O instituto da prescrição não se confina ao direito privado. Também o direito público valoriza o decus do tempus como elemento tanto aquisitivo como extintivo de direito e obrigações (...) O efeito do decurso do tempo como fator de paz social, tranquiliza as relações jurídicas, conduz a que, salvo direito imprescritíveis por sua natureza, como os da personalidade, as pretensões e ações tenham, como princípio inerente, um limite temporal de exercício. Motta (apud TÁCITO, 2004)

Elenca-se Motta (apud TÁCITO, 2004), deixando claro que mesmo no direito público a inércia do titular e o decurso do tempo como forma extintiva de direito, tem como finalidade a paz social e o equilíbrio das relações jurídicas.

Motta (2004) ainda argumento que “Em qualquer área do direito, a prescrição é princípio de ordem pública e objetiva estabilizar as relações jurídicas. Funda-se no princípio da segurança jurídica, evitando-se que as relações jurídicas perdurem, indissolúveis e definitivamente, no tempo. [...]”. (MOTTA, 2004, P. 699)

O decurso do tempo extintivo de direitos, sendo um meio de estabilização das relações jurídicas objetivando a paz social pautado na segurança jurídica, trata-se de instituto de ordem pública, devendo ser tido como regra, inclusive, Meirelles (2009) já salientou que “[...] o STF já decidiu que a regra é a prescritibilidade [...]”. (MEIRRELLES, 2009, p. 689)

O lapso temporal como extinção das pretensões punitivas do Estado com base nas infrações de trânsito muito embora sem previsão expressa no Código de Trânsito Brasileiro de 1997 vale-se da prescrição administrativa subsidiariamente, como já elencado, e isso tem razão de ser pelo fato de que, em se tratando de uma pretensão punitiva do Estado, esta não foge a regra insculpida no art. 5º, inciso XLVII, alínea “b” da Constituição Federal.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

XLVII - não haverá penas:

[...]

b) de caráter perpétuo;

O Supremo Tribunal Federal, desta forma, pronunciou-se no sentido de que, no campo das penas, seja de índole administrativa ou criminal, não é aceitável a inexistência de prescrição, uma vez que esta está diretamente ligada à segurança jurídica e estabilidade das relações jurídicas.

[...] não se coaduna com nosso sistema constitucional, especialmente no campo das penas, seja de índole criminal ou administrativo, exceto relativamente ao crime revelado pela ação de grupos armados, civis ou militares contra a ordem constitucional e o Estado Democrático – inciso XLIV do artigo 5º da CF/88, a inexistência de prescrição. (...) É sabido que dois valores se fazem presentes: o primeiro alusivo a justiça, a direcionar a possibilidade de ter-se o implemento a qualquer momento; o segundo esta ligado a segurança jurídica, a estabilidade das relações e, portanto, a própria paz social que deve ser restabelecida num menor espaço de tempo possível. [...] (BRASIL, Supremo Tribunal Federal, 1999)

Anteriormente aos recentes julgados do Supremo Tribunal Federal, o mesmo já havia decidido pela prescritibilidade das pretensões punitivas administrativas. No Mandado de Segurança 20.069, sob a Relatoria do Ministro Cunha Peixoto, em que se discutia a possibilidade de aplicação de penalidade administrativa após o prazo prescricional administrativo, o relator votou pela denegação da segurança.

Ademais, se até as faltas mais graves – e por isso mesmo também definidas como crime – são, de modo genérico, susceptíveis de prescrição, no plano administrativo não há como pretender-se que a imprescritibilidade continue a ser o principio geral, por corresponder ao escopo da sansão administrativa, ou seja, o interesse superior da boa ordem. (...) Dessa maneira, se no âmbito do direito punitivo, escoado o período prescricional, não mais se cogita de sancionar o agente, também no direito administrativo, não é de ser ele mais punido. (BRASIL, Supremo Tribunal Federal, 1976).

Porém o Ministro Moreira Alves, proferindo seu voto de vista, entendeu que a regra geral é a prescritibilidade, sendo necessária a aplicação de um prazo prescricional para todos os casos, salvo as expressas exceções de imprescritibilidade Constitucionalmente previstas.

Ocorre que, apresar da regra ser a prescrição, as normas de direito administrativo e de direito de trânsito não possuem especificamente um prazo e uma forma de prescrição. Assim essas normas não prevendo a forma e o prazo prescricional, residindo neste ponto a controvérsia, e assim, tendo de ser aplicada a analogia e os princípios gerais com vistas a resolução dos casos concretos.

“[...] várias são as infrações cuja penalidade não encontra previsão legal quanto ao limite prescricional para sua aplicação. É ai que reside a controvérsia: qual será o prazo prescricional se não há, em nosso ordenamento, até o momento, norma geral nesse sentido? A doutrina majoritária defende que a lacuna na lei deve ser preenchida com recurso à analogia, em cumprimento ao art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil, segundo a qual “Quando a lei for omissa, o juiz decidira o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.”. [...]” (MOTTA, 2004, p. 708)

Desta maneira, conforme ensina Motta (2004), mesmo que não exista, no ordenamento especifico prazos extintivos em decorrência da inércia e do lapso temporal, devem ser aplicados outros dispositivos acerca do tema, com vista a efetivação da garantia fundamental acerca da impossibilidade de aplicação de penalidade perpétua, com vistas a segurança jurídica e estabilidade das relações, Meirelles (2009), no mesmo sentido que o doutrinador acima, argumenta que:

“[...] quando a lei não fixa prazo da prescrição administrativa, esta deve ocorrer em cinco anos, à semelhança da prescrição das ações contra a Fazenda Pública (Dec. 20.910/32), das punições dos profissionais liberais (Lei 6.838/80) e para cobrança de crédito tributário (CTN, art. 174) (...) Ainda no âmbito federal, de acordo com a Lei 9.873, de 23.11.99, prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública, direta e indireta, decorrente do poder de polícia, objetivando apurar infrações (...) O Decreto 6.514 de 22.5.2008, também trata da aplicação deste prazo prescricional na esfera do poder de policia ambiental.” (MEIRELLES, 2009, P. 689)

Meirelles (2009) salienta que em razão da necessidade de aplicação subsidiaria de normas para se estabelecer um prazo e uma forma prescricional, deve-se buscar nos vários diplomas legais pátrios os subsídios normativos para tanto, salienta o Decreto 20.910/32, a Lei 6.838/80, o art. 174, do CTN, a Lei 9.873/99 e cita também o Decreto 6.514/08, cada qual com sua peculiaridade e campo de incidência específica, que após a necessidade de aplicação incide nos casos em que o Poder Judiciário entender necessário para resolução do caso concreto.

Carvalho Filho (2007), segue a mesma linha de raciocínio já demonstrada acima, elencando que apesar da lei não estabelecer prazos em especifico, é aceito a aplicação de outros dispositivos legais com vistas a sanas tais lacunas:

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“Quanto aos prazos que não têm previsão legal surgem algumas controvérsias. Para uns, a Administração não tem prazo para desfazer seus atos administrativos. Outros entendem que se deve aplicar as regras sobre prescrição contidas no Direito Civil, ou seja, prazos mais longos para atos nulos e mais curtos para atos anuláveis. O melhor entendimento no entanto, é o que considera que a prescrição, em se tratando de direitos pessoais, se consuma no prazo que ocorreria a prescrição judicial em favor da Fazenda Pública, ou seja, o prazo de 5 (cinco) anos, como estabelece o Decreto n. 20.910/32. Relativamente aos direitos reais, aplicam-se, ai sim, os prazos do Direito Civil, conforme já assentou caudolosa corrente jurisprudencial.” (CARVALHO FILHO, 2007, p. 832)

Evidente que apesar de ser pacificado o entendimento de que a regra é a prescritibilidade, a omissão da legislação deixa margem a controvérsia, sobre o prazo e a forma prescricional.

Assim, a doutrina e a jurisprudência tentam sanar essa lacuna aplicando analogicamente dispositivos de vários outros diplomas legais, em se tratando mais especificamente para o caso de prescrição da pretensão punitiva de trânsito, é aceito em parte pelas duas fontes do direito a aplicação do Decreto 20.910/32, do Código Civil, da Lei 9.873/99, do Código Tributário Nacional e da Resolução 182/2005, do CONTRAN.

2.2. CONCEITO GERAL DE PRESCRIÇÃO, DECADÊNCIA E PRECLUSÃO.

O tema prescrição sempre foi muito presente no direito, tendo em vista que é ela que garante a segurança jurídica e a estabilidade das relações. Nas diversas áreas do direito existem várias obras, trabalhos e estudos sobre a prescrição, ficando claro o seu alto grau de relevância no ordenamento jurídico pátrio. No direito administrativo com a pretensão punitiva não é diferente, existem vários autores que estudam esta matéria sob diversos aspectos e, por consequência, chegam a conceitos gerais diferentes.

Tendo em vista o caráter cogente das normas de trânsito e o grande interesse do Estado na incolumidade dos bens e usuários sujeitos ao trânsito, o direito de trânsito é um ramo do direito público.

[...] Fenômeno físico – movimentação e imobilização de pessoas veículos e animais nas vias terrestres abertas a circulação: confira-se o n° 6.1, adiante – as regras que regem pressupõem a ocupação, particularizada e em tempo hábil, por esses entes e veículos, das vias publicas e das privadas abertas ao publico (...) e, sobretudo, visam a segurança dessas pessoas, à incolumidade delas, dos animais, dos veículos, demais bens públicos e privados e do meio ambiente, restando fundadas no direito publico em virtude da “bastante” intensidade do interesse do Estado no objeto de tais normas, ou seja, na regulamentação das preditas movimentação e imobilização viária. [...] (MIRANDA apud MITIDEIRO, 2005,  p. 08)

Miranda (apud MITIDEIRO, 2005), ainda foi além, ao explicar que direito público “[...] trata-se da intensidade do interesse do Estado no Direito. (...) É de mister que a intensidade seja “bastante” para conferir caráter de direito público a norma ou instituição. [...]”. (MIRANDA apud MITIDEIRO, 2005, p. 08)

Evidente que se aplicam os conceitos gerais de prescrição, da decadência e da preclusão aplicados ao direito administrativo para o tema em estudo, tendo em vista que a doutrina possui diferentes entendimentos acerca do conceito do fenômeno jurídico que é a extinção da pretensão punitiva administrativa do Estado ante o lapso temporal.

Dias (apud MELLO, 2009, p. 1038) entende que a prescrição é a perda da ação judicial como meio de defesa de uma pretensão jurídica pelo transcurso do lapso temporal legalmente previsto para sua utilização. Para Meirelles (2009) a “[...] prescrição é a perda da ação pelo transcurso do prazo para seu ajuizamento ou pelo abandono da causa durante o processo.”.

Já a decadência, possui um conceito muito diferente da prescrição, na lição de Mello (2009, p. 1039), é a própria perda do direito em si face à exaustão do prazo previsto para o exercício do direito substantivo. Meirelles (2009) da mesma forma que a doutrina de Mello (2009, p. 1039) conceitua a decadência como “[...] o perecimento do direito pelo não exercício no prazo fixado em lei.”. (MEIRELLES, 2009, p. 739)

Mello (2009), possui ainda um conceito acerca da preclusão em comparação aos conceitos de prescrição e decadência:

Preclusão é a perda de uma oportunidade processual (logo, ocorrida depois de instaurada a relação processual), pelo decurso do tempo previsto para seu exercício, acarretando a superação daquele estagio do processo (judicial ou administrativo). Diferente da prescrição em que nesta o que se perde é o direito de ação, pelo que seu termo inicial é sempre no interior do processo. (MELLO, 2009. p. 1039)

Na visão de Mello (2009) a preclusão opera-se depois de instaurada a relação processual, seja ela administrativa ou judicial, sendo, portanto, a perda da faculdade de praticar determinado ato no curso do processo. Elencando, ainda, que a preclusão sempre ocorrerá no curso de um processo, já a prescrição é a perda do direito da ação e, via de regra, sempre se inicia antes do processo.

Mello (2009) ainda diferencia a preclusão da decadência, salientando que “Diferente da decadência em que nesta, conforme visto, o que se perde é o direito material, ao passo que na preclusão o que se extingue é o direito adjetivo.” (MELLO, 2009, p. 1039).

Acima, estabeleceram-se os conceitos gerais aceitos no direito administrativo, de que a prescrição é a perda do instrumento utilizado para tutelar o direito, a decadência é a perda do direito que seria tutelado e a preclusão é a perda de uma oportunidade ou faculdade para prática de um ato em um processo ou procedimento administrativo.

Quanto à definição específica e conceito geral da extinção do poder administrativo de prover a aplicação da penalidade decorrente da infração da legislação de trânsito em face do decurso do tempo. Para Mello (2009, p. 1040), existem quatro tipos de prescrição para o direito público.

As duas primeiras são prescrição da pretensão do administrado contra a administração sendo “[...] as limitações temporais para insurgência do administrado na via administrativa (...) em seguida a prescrição das ações judicias dos administrados contra o Poder Público [...]”, (MELLO, 2009, p. 1044). A prescrição da insurgência do administrado na via administrativa é a prescrição do direito do administrado requerer na via administrativa, ou ainda, o administrado perde o instrumento que perante a administração, efetivaria o seu direito, já a prescrição das ações judiciais do administrado contra o Poder Público, é a perda do direito de ação judicial, ou seja, o administrado perde o direito de ação judicial.

As duas últimas são as pretensões da administração pública contra o administrado, conforme Mello (2009).

[...] Assim como as pretensões do administrado contra a administração sujeitam-se a prazos para serem interpostas – seja na via administrativa seja na via judicial -, também podem se extinguir por decurso de prazo as ações judiciais da Administração contra o administrado, tanto quanto o poder administrativa de incidir sobre dada situação jurídica especifica (...) [...] (MELLO, 2009, p. 1039)

Desta forma, o administrado deve obedecer aos prazos prescricionais para que possa exercer seus direitos perante a administração, assim, nada mais justo do que a administração também sujeitar-se a prazos para exercer suas pretensões contra o administrado, o que realmente ocorre, a administração pode ter extinto pela prescrição tanto suas pretensões judiciais, quanto suas pretensões administrativa contra o administrado, sendo este tipo de prescrição abordado também por Meirelles (2009) “Há portanto duas espécies de prescrição administrativa: (...) outra que extingue o poder de punir da administração.” (MEIRELLES, 2009, p. 690).

Muito embora existam quatro tipos diferentes de prescrição, neste trabalho é estudado apenas a prescrição da pretensão da administração contra o administrado, ou seja, a prescrição do direito de punir da administração.

A extinção da pretensão punitiva administrativa em face do decurso do tempo na doutrina ainda não possui entendimento sólido formado, pois Edmir Netto de Araujo e José Santos Carvalho Filho defendem se tratar de prescrição, Hely Lopes Meirelles argumenta tratar-se de preclusão, Celso Antonio Bandeira de Mello e Weida Zancaner decadência e ainda Marçal Justem Filho defende um conceito misto, ou seja, dependendo do caso trata-se de decadência ou de preclusão.

2.3. CONCEITOS ESPECÍFICOS DE PRESCRIÇÃO, DECADENCIA E PRECLUSÃO.

Araúju (2010), sustenta em sua obra que “[...] apesar de opiniões em contrário, os prazos prescricionais administrativos, ao menos no âmbito disciplinar, não são de decadência, por que não extingue o direito da administração em punir, mas a possibilidade de utilizar o procedimento prescrito em lei para essa penalidade ser operante [...]”, (ARAÚJO, 2010, p. 1189), deste modo, evidente que para o citado autor, trata-se de prescrição na essência do conceito, tendo em vista a extinção da possibilidade de utilização do instrumento, processo, “ação” administrativa para aplicação da penalidade, ou seja, o decurso do tempo extingue o direito agir da administração, impossibilitando-a de penalizar o administrado..

Ainda defendendo que o lapso do tempo como forma de extinção da pretensão estatal trata-se de prescrição, encontramos a lição de Carvalho Filho (2007), para quem a prescrição administrativa é “[...] a situação jurídica pela qual o administrado ou a própria administração perdem o direito de formular pedidos ou firmar manifestações em virtude de não o terem feito no prazo adequado.” (CARVALHO FILHO, 2007, p. 830), o autor entende se tratar da perda do direito de, mediante um instrumento, a administração firmar uma vontade, tratando-se de prescrição, o que nada mais é do que a perda do meio para realização de sua vontade.

2.3.1. CONCEITO ESPECÍFICO DA EXTINÇÃO DA PRETENSÃO ADMINISTRATIVA FACE O DECURSO DO TEMPO ORA COMO PRECLUSÃO, ORA COMO DECADÊNCIA.

Justem Filho (2008), defende um conceito misto sobre o tempo como fator extintivo da pretensão estatal.

“[...] A eventual perda de direito em virtude da ausência tempestiva do exercício de direito no relacionamento direto entre administração e particular não configura hipótese de prescrição. Assim se passa porque se trata da ausência do direito de ação, mas do não exercício de direitos e poderes de direito material. (...) A instauração do processo administrativo deriva não do exercício do direito de ação, mas da necessidade de definir o conteúdo do direito material de titularidade das partes por meio de procedimento norteado pela ampla defesa e pelo contraditório. Em outras palavras, a instauração do processo administrativo é uma manifestação do direito subjetivo ou poder jurídico de que cada parte é titular em face da outra. [...]” (JUSTEM FILHO, 2008, P. 978)

Justem Filho (2008) leciona no sentido de que não se trata de prescrição em si, uma vez que a pretensão da administração por meio do processo administrativo não é uma pretensão de ação, e sim a manifestação de um direito subjetivo ou do poder jurídico em que é titular a administração pública.

“O decurso do tempo pode acarretar a perda de direitos, poderes ou faculdades na via administrativa. Mas não configurará uma hipótese de prescrição em tais casos. Existirá ou decadência ou preclusão temporal. Haverá decadência quando o decurso do tempo produzir a extinção de um direito ou de um poder. Haverá a preclusão temporal quando uma faculdade processual deixar de ser exercitada no momento apropriado.” (JUSTEM FILHO, 2008, P. 979)

Justem Filho (2008) ainda vai além e estabelece em sua doutrina que mesmo com a não configuração da prescrição, existe, assim, a ocorrência da preclusão ou da decadência, dependendo do caso, mas nunca existirá a prescrição.

2.3.2. CONCEITO ESPECÍFICO DA EXTINÇÃO DA PRETENSÃO ADMINISTRATIVA FACE O DECURSO DO TEMPO COMO DECADÊNCIA.

Mello (2009, p. 1044), ensina que a perda da possibilidade de a administração prover sobre dada e determinada situação não se assemelha a prescrição, uma vez que esta seria a perda ao direito de exercício da pretensão de ação para resguardar direito ameaçado ou violado.

O autor argumenta que o lapso temporal como forma extintiva da pretensão da administração se assemelha a decadência, uma vez que a decadência, na lição de Mello (2009), é a própria perda do direito em si, em face da exaustão do prazo previsto para o exercício do direito substantivo (MELLO, 2009, p. 1039).

Para o doutrinador Mello (2009) a situação jurídica acima é a omissão para o exercício tempestivo de pretensão administrativa, ou seja, a falta da administração em prover o seu dever-poder, “[...] é o não-exercício, a bom tempo, do que corresponderia, no Direito Privado, ao próprio exercício do direito. Donde, configura-se situação de decadência, [...]”.(MELLO, 2009, p. 1044), no direito administrativo como o poder público não necessita da ação judicial para executar seus atos, o lapso temporal não acarreta a perda de uma ação, e sim, a perda do próprio direito que era objeto o ato. Zancaner (2001) em sua obra assentou o mesmo entendimento.

[...] no Direito Privado a prescrição basta para garantir a segurança jurídica [...] o mesmo não se dá no Direito Publico, pois o principio da segurança jurídica só fica resguardado através do instituto da decadência, em se tratando de atos inconvalidáveis, devido ao fato da Administração Publica não precisar valer-se da ação, ao contrario do que se passa com os particulares, para exercitar o seu poder de invalidar. Logo o instituto da prescrição não seria suficiente para pacificar a situação que advém da matéria objeto deste estudo. Tanto é exata a assertiva que não se concebe a possibilidade de interrupção ou de suspensão do prazo para a administração publica invalidar, característica essa da decadência em oposição a prescrição. Assim, muito embora a doutrina tenha utilizado o prazo prescricional como forma de sanação dos atos inválidos, este consiste em prazo decadencial [...] (ZANCANER, 2001. p. 77)

Entende a autora que para garantir a segurança jurídica no ramo do direito administrativo, não se mostra suficiente, apenas com a utilização do instituto da prescrição, pois ao contrario do direito privado onde os particulares necessitam de valer-se da ação judicial como instrumento de efetivação de seu direito, no direito administrativo quando falamos de atos decorrentes do poder de autotutela e autoexecutoriedade da administração, a prescrição não garante a sanação do ato administrativo pelo fato de que tais atos não se dão pela instrumentalização judicial.

Ainda, defendendo tratar-se de decadência e não de prescrição ou preclusão, encontramos o que ensina Motta (2004), salientando o termo que melhor define tal situação jurídica é “decadência administrativa” (MOTTA, 2004, p.700).

[...] muito embora vários autores utilizem o termo “prescrição administrativa”, em se tratando de anulação de atos administrativos viciados, o termo que melhor define a perda do direito da administração de invalida-los seria a “decadência administrativa”. (MOTTA, 2004, p. 700)

O autor salienta que não se trata de prescrição, pois a prescrição somente ocorreria em relação a um direito de ação, e como já dito acima, o Estado não necessita de valer-se de uma ação judicial para ver executada sua vontade, pode ele valer-se da auto executoriedade de seus atos, por este fato não se aplica a prescrição, e sim, a decadência, tendo em vista que o que se extingue é o próprio direito objeto do ato e não a executoriedade do mesmo.

2.3.3. CONCEITO ESPECÍFICO DA EXTINÇÃO DA PRETENSÃO ADMINISTRATIVA FACE O DECURSO DO TEMPO COMO PRECLUSÃO.

Possuindo um conceito um pouco diferente dos demais, Meirelles (2009) ensina que é inapropriado utilizar o termo prescrição administrativa, vez que não se trata de prescrição, e sim, de mera preclusão sobre a apreciação de determinada situação pela administração (MEIRELLES, 2009, p. 689).

[...] inapropriadamente se fala em prescrição administrativa para indicar o escoamento dos prazos para interposição de recurso no âmbito da Administração, ou para manifestação da própria Administração sobre conduta de seus servidores ou sobre direitos e obrigações dos particulares perante o Poder Publico. A prescrição administrativa opera a preclusão da oportunidade de atuação do Poder Publico sobre matéria sujeita a sua apreciação. (MEIRELLES, 2009. p. 689)

O doutrinador adota esta corrente, pois entende que no âmbito da administração pública não existe prescrição, nem decadência para prática dos atos, o que existe é a mera preclusão, ou seja, a perda de uma faculdade de atuação pela não manifestação no tempo que deveria. O doutrinador vai ainda mais longe ao caracterizar a preclusão administrativa.

A prescrição administrativa opera a preclusão da oportunidade de atuação do Poder Público sobre a matéria sujeita à sua apreciação. Não se confunde com a prescrição civil, nem estende seus efeitos às ações judiciais (v. adiante, item 7), pois é restrita à atividade interna da Administração, acarretando a perda do direito de anular ato ou contrato administrativo, e se efetiva no prazo que a norma legal estabelecer. Mas, mesmo na falta de lei fixadora de prazo prescricional, não pode o servidor publico ou o particular ficar perpetuamente sujeito a sansão administrativa por fato praticado há muito tempo. (MEIRELLES, 2009, p. 689)

Meirelles (2009) entende que a prescrição administrativa, muito embora possua o nome de prescrição, opera a preclusão temporal para a administração manifestar-se. Argumenta ainda que este tipo de prescrição não se confunde com a prescrição civil tendo em vista que a prescrição civil opera a extinção do direito de ação e não uma preclusão de manifestação. Também entende que esta prescrição não tem seus efeitos estendido às ações judiciais, tendo em vista tratar de ato típico da administração pública, não podendo ter intervenção judicial, e por consequência não aplicável pelo judiciário. A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, aplicando o conceito de Meirelles (2009), proferiu julgado interessante sobre o tema.

ADMINISTRATIVO - SERVIDOR PÚBLICO - VANTAGENS PECUNIÁRIAS INCORPORADAS AOS PROVENTOS DA APOSENTADORIA - PRAZO PARA A ADMINISTRAÇÃO ANULAR O ATO - DECADÊNCIA - PRESCRIÇÃO 1. A Lei 9.784, de 1999, aplica-se também aos estados e municípios (AgRgREsp n.º 620.043, Min. José Arnaldo da Fonseca). Votos vencidos. 2. O prazo decadencial de que trata o art. 54 da Lei 9.784, de 1999, "tem início a partir da publicação da lei, não sendo possível retroagir a norma para limitar a Administração em relação ao passado" (STJ, Corte Especial, MS n.º 9.112, Min. Eliana Calmon). Votos vencidos. 3. "A prescrição administrativa opera a preclusão da oportunidade de atuação do Poder Público sobre a matéria sujeita à sua apreciação. Não se confunde com a prescrição civil, nem estende seus efeitos às ações judiciais (v. adiante, item VI), pois é restrita à atividade interna da Administração, acarretando a perda do direito de anular ato ou contrato administrativo, e se efetiva no prazo que a norma legal estabelecer (Hely Lopes Meirelles). Votos vencidos.” (SANTA CATARINA, Tribunal de Justiça, 2005a).

No julgado acima a administração pública realizou uma revisão na aposentadoria da servidora inativa, e lhe reduziu os proventos, ocorre que a servidora havia se aposentado no ano de 1996, e a administração veio a realizar a revisão no ano 2003, ou seja há mais de 7 anos depois do ato da aposentadoria. Segundo os argumentos da servidora, deveria ser aplicado o prazo de 5 (cinco) anos previsto no art. 54, na Lei 9.784/99, pelo lado da administração, foi sustentado que a Lei 9.784/99 como não vigorava a época do ato, é licito a administração revogar seu ato a qualquer tempo. O deslinde da demanda em primeiro grau foi positivo para servidora, sendo o mesmo confirmado em segundo grau pelo Grupo de Câmaras de Direito Publico do Tribunal de Justiça Catarinense.

Os desembargadores no caso acima, inclusive adotaram o entendimento do doutrinado elencado neste tópico, aduzindo que a prescrição no caso em tela, operou a preclusão para a administração revisar a aposentadoria da servidora, utilizando assim o entendimento de que a prescrição administrativa não se confunde com a prescrição civil, nem estende seus efeitos às ações judiciais, pois é restrita à atividade interna da Administração (MEIRELLES, 2009. p. 689), ficando evidente que apesar de não haver conceito consolidado na doutrina, a jurisprudência tem aceitado a definição e aplicação de Meirelles (2009).

2.3.4. TABELA DEMONSTRATIVA DE DOUTRINADORES E TESES ADOTADAS.

Doutrinador

Tese Adotada

Edmir Neto de Araujo

Prescrição administrativa como perda da possibilidade da administração de utilizar o processo administrativo.

José Santos Carvalho Filho

Prescrição administrativa como perda da possibilidade da administração de utilizar o processo administrativo.

Hely Lopes Meireles

Prescrição administrativa como perda da faculdade de prover determinado ato, caracterizando preclusão.

Weida Zancaner

Prescrição administrativa como extinção do próprio direito de punir com base no ato infracional, hipótese de decadência.

Celso Antônio Bandeira de Mello

Prescrição administrativa como extinção do próprio direito de punir com base no ato infracional, hipótese de decadência.

Marçal Justem Filho

Prescrição administrativa, ora caracterizando preclusão e ora caracterizando decadência.

3. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS

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Sobre o autor
Roger Mendes Cecchetto

Possui graduação em Direito pela Fundação Universidade Regional de Blumenau - SC (2011), Especialização em Gestão, Educação e Direito de Trânsito pela Faculdade Dom Bosco de Cornélio Procópio - PR (2012), Especialização em Direito Administrativo pela Universidade Anhanguera de Campo Grande - MS (2012), Pós-graduando Lato Sensu em Direito Constitucional Aplicado pelo Faculdade de Direito Damásio de Jesus de São Paulo - SP (2014) . Atualmente é sócio-fundador e advogado no escritório Cecchetto Advocacia e Consultoria Jurídica, é assessor jurídico da Fundação Promotora de Exposições de Blumenau - PROEB (Fundação Pública Municipal), é professor na Fundação Universidade Regional de Blumenau - FURB, é diretor de ensino do Centro de Formação de Condutores Verdeblu LTDA., é conselheiro titular do Conselho Municipal de Trânsito de Blumenau - COMTRANBLU, é membro julgador da Comissão Permanente de Analise e Julgamento de Recursos do Transporte Público Municipal do SETERB, coordenado da comissão de Transportes e Mobilidade Urbana da Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil de Blumenau - SC. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Administrativo, Direito de Trânsito, Direito Constitucional e Direito Civil.

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