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Comentários à nova Lei do Processo Administrativo Federal (Lei 9784/99)

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6 ASPECTOS INOVADORES DA LEI

No processo administrativo, ponto relevante é a divulgação oficial dos atos administrativos, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas na Constituição. A divulgação oficial dos atos processuais administrativos relaciona-se tanto com a exigência constitucional da publicidade dos atos processuais previsto no artigo 5º, LX, da Constituição Federal, quanto com o princípio da publicidade dos atos praticados pela administração pública, artigo 37, caput, da Constituição Federal.

No artigo 46, da Lei nº. 9.784/99, em caso de terceiros no processo administrativo, o direito à vista dos autos e à obtenção de certidões ou cópias reprográficas dos dados e dos documentos ali contidos, está subordinado a esses direitos da personalidade ou ao interesse da segurança nacional, no tocante à imposição do sigilo sobre certos documentos contidos no processo.

Percebe-se, portanto, que o proposto critério processual da divulgação oficial dos atos administrativos, busca inserir-se na questão da participação do usuário na administração pública, possibilitando a este, mesmo não sendo parte interessada direta em determinado processo, ter meios para saber o que está ocorrendo na Administração.

Neste sentido haverá análise de pontos específicos e relevantes ao processo administrativo e à sociedade.

          6.1 Interessados.

A institucionalização da divulgação oficial dos atos processuais administrativos poderá ser condição para assegurar o direito ao exercício da legitimação processual administrativa, de que trata o Artigo 9º. Capítulo V, quando, em seu inciso II, admite:

          é interessado no processo administrativo, aqueles que "sem terem iniciado o processo, têm direitos ou interesses que possam ser afetados pela decisão a ser adotada " (inciso II), as " organizações e associações representativas, no tocante a direitos e interesses coletivos " (inciso III), e "as pessoas ou as organizações legalmente constituídas quanto a direitos ou interesses difusos" (inciso IV).

A divulgação dos atos administrativos, ganha relevância, devendo esse critério informar a instrução processual, que, nessa nova lei federal, está regulada no Capítulo X, artigos 29 e 47, no tema da consulta e audiência públicas.

          6.2 Comunicação dos Atos.

A comunicação dos atos processuais far-se-á mediante intimação do interessado, para ciência de decisão, ou para efetivação de diligências, conforme artigo 26, caput, da referida lei.

As intimações seguirão o seguinte rito:

          Forma escrita, em vernáculo, contendo a assinatura da autoridade responsável (artigo 22, §1º.);

Deverá ser efetuada por via postal com aviso de recebimento, ou por telegrama ou outro meio que assegure a certeza da ciência do interessado (artigo 26, §3º.);

Após efetuada a intimação mediante aposição do "ciente" da parte ou do procurador habilitado no processo;

Haverá necessidade de Intimação mediante publicação oficial, quando haja interessados indeterminados, desconhecidos ou com domicílio indefinido;

A intimação deverá ter antecedência mínima de três dias úteis (27), quanto à data de comparecimento;

A contagem do prazo, iniciar-se-á a partir da data da cientificação oficial, com exclusão do dia do começo e inclusão do dia de vencimento (artigo 66), importando dizer, assim, que, na realização da intimação pela via postal ou telegráfica, o prazo inicia-se quando verificada a recepção da intimação pela pessoa a quem se destinava.

A intimação deverá conter, em seu teor, a identificação do intimado, e nome do órgão ou entidade administrativa, endereço e local de sua sede ou da unidade onde o processo tenha curso; e, finalidade da intimação ou do ato que se deva praticar; data, hora e local em que se deve comparecer; se obrigatório o comparecimento pessoal da parte intimada, ou se esta poderá fazer-se representar por procurador; notícia de que o processo terá continuidade, independentemente do seu comparecimento; indicação dos fatos e fundamentos legais pertinentes.

Serão objeto de intimação os atos do processo de que resultem, para o interessado, a imposição de deveres, ônus, sanções ou restrição ao exercício de direitos e atividades, além de outros atos , de qualquer natureza, que lhes digam respeito, descreve o artigo 28 da citada lei.

As intimações serão nulas quando feitas sem observância das prescrições legais, determina o artigo 26, §5º.

Os prazos consideram-se prorrogados até o primeiro dia útil seguinte ao dia em que deveriam vencer, se este cair em dia em que não haja expediente ou este encerrar-se antes da hora normal. Salvo motivo comprovado de força maior, os prazos processuais administrativos não se suspendem.

          6.3 Instrução Processual.

A inovação aqui contida é a expressão da democracia para a atuação administrativa, existindo a necessidade de consulta e a audiência públicas, no curso da instrução processual quando se decida ou aprecie assunto de interesse geral.

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O despacho motivado da autoridade abrirá período de consulta pública para manifestação de terceiros, define o artigo 31, se não houver prejuízo para a parte interessada. Não se estará condicionando o interesse geral ao interesse privado, particularizado de um interessado, mas buscando preservar o direito individual perseguido no procedimento administrativo em curso. Haverá hipótese em que o interesse manifesto pela parte não se distinguirá de outros, caso típico das novas formas de legitimação processual ativa, quando se tratem de direitos coletivos ou direitos difusos. Porém , haverá, ainda, hipótese em que a pretensão veiculada pelo particular não possa ser atendida antes de consultados os interesses de terceiros, quer estejam bem identificados, ainda que coletivamente, quer sejam anônimos ou não individualizados.

Há de salientar o assunto de interesse geral, do qual prevê a norma, ou seja, será o assunto de repercussão além da esfera de direitos e interesses de uma ou mais pessoas determinadas(28).

A audiência pública é definida por Diogo de Figueiredo Moreira Neto como:

          Um instituto de participação administrativa aberta e indivíduos e a grupos sociais determinados, visando à legitimidade da ação administrativa, formalmente disciplinada em lei, pela qual se exerce o direito de expor tendências, preferências e opções que possam conduzir o Poder Público a uma decisão de maior aceitação consensual. (29)

          6.4 Dever de Decidir e Motivação.

A lei federal do processo administrativo instituiu expressamente a regra do dever de decidir a que está submetida a Administração Pública, quando dispôs, no artigo 48:

          A administração tem o dever de explicitamente emitir decisão nos processos administrativos e sobre solicitações ou reclamações, em matéria de sua competência.

Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, conforme determina o artigo 50, quando:

Neguem, limitem ou afetem direito ou interesses;

Imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;

Decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública;

Dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório

Decidam recursos administrativos;

Decorram de reexame de ofício;

Deixem de aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de pareceres, laudos, propostas e relatórios oficiais;

Importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo.

Apesar de inovador no processo administrativo, a decisão por motivação é desde há tempos presente nas decisões judiciais sob pena de nulidade e extinção da sentença. No processo administrativo esta previsão demonstra a segurança e proteção jurídica dos atos geralmente discricionários da administração pública.

          6.5 Recursos e Prazos.

A preocupação evidente nesta legislação processual administrativa é com a celeridade do processo e, portanto, com a efetividade do recurso à jurisdição administrativa.

Determinando os seguintes prazos:

          6.5.1. Cinco dias prorrogáveis em dobro.

          Atos processuais, em geral, salvo disposição específica, tanto da autoridade quanto do administrado, devem ser praticados no prazo de cinco dias (artigo 24), salvo motivo de força maior.

Poderão ser dilatados até o dobro, mediante comprovada justificação. Esta é norma que se aplica subsidiariamente a todos os demais procedimentos administrativos, ainda que regulados por norma especial, haja vista a regra do artigo 69.

Compreendidos por essa norma estariam todos os prazos de ordinário expediente, de trâmite entre órgãos ou de encaminhamento de autos, atendimento a despachos ou recebimento e juntada de documentos.

          6.5.2. Interregno de três dias úteis para intimações.

A intimação para ciência de decisão ou efetivação de diligências observará o prazo mínimo de três dias úteis, entre a ciência e a providência determinada ou a data de comparecimento determinado.

No caso de intimação de interessados indeterminados, desconhecidos ou com domicílio indefinido, e que regra particular, conforme artigo 26, §4º., diz deva ser efetuada por meio de publicação oficial, há margem para se questionar qual o prazo a ser estabelecido para atender à intimação.

Seria recomendável que não se estabelecesse, na hipótese, aquele mínimo de três dias úteis, dilatando, sempre, o prazo peremptório. O razoável seria, em não havendo previsão de repetir a publicação da intimação no veículo de imprensa, o que também poderia ter sido uma regra admitida, nesses casos, por analogia ao que dispõe o artigo 232, III, do Código de Processo Civil, que se entende haver sido afastada em decorrência dos princípios da celeridade e da economia e da menor onerosidade para o administrado, a autoridade fixar sempre o prazo para cumprimento de diligência ou prática de outro ato processual no máximo de 10 (dez) dias, contínuos determina o artigo 66, §2º., a contar da data da publicação, como admitido, por exceção, no Parágrafo único do artigo 24, da lei nº. 9.784/99.

A pluralidade dos intimados não justificaria ampliação desse prazo, também pela celeridade desejada para o processo administrativo e menor onerosidade para o administrado. Aplicável sempre, em qualquer hipótese, a regra do artigo 27:

          O desatendimento da intimação não importa o reconhecimento da verdade dos fatos, nem a renúncia a direito pelo administrado.

Há uma hipótese de arquivamento do processo, por decisão da autoridade administrativa, quando ocorra o não atendimento à determinação de o interessado apresentar dados, atuar no processo, ou juntar documentos solicitados, isto sido considerado necessário à apreciação da postulação feita, artigo 40; observada, entretanto, a possibilidade de atuação de ofício pelo órgão, suprindo a deficiência verificada, determinado pelo artigo 39, parágrafo único.

          6.5.3 Quinze dias.

Este é o prazo previsto no artigo 42, para a produção de parecer obrigatório e vinculante por órgão consultivo, salvo norma legal especial em contrário, ou comprovada necessidade de prazo maior ou de sua extensão. Se houver omissão do órgão consultivo, o processo quedará sem seguimento até a apresentação da peça obrigatória, cabendo a responsabilização de quem der causa ao atraso.

          6.5.4 Parecer obrigatório não vinculante.

No caso de um parecer obrigatório e não vinculante deixar de ser emitido, no prazo a propósito determinado de ofício pela autoridade (que deverá ser o de cinco dias, dilatado até o máximo de 10) , o processo poderá ter seguimento e ser decidido com a dispensa da peça opinativa, sem prejuízo da responsabilidade de quem se omitiu.

          6.6 Laudos Técnicos.

Quando necessários laudos técnicos de órgão administrativos e o encargo não tiver sido cumprido no prazo assinalado, deverá ser solicitado laudo técnico a outro órgão de capacidade técnica e qualificação equivalentes, presente no artigo 43), seguindo os seguintes prazos:

          6.6.1. Dez dias.

Este o prazo em que terá direito a manifestação o interessado após instrução, exceto se outro prazo for legalmente previsto. No procedimento de consulta pública, artigo 31, entende-se que o período de consulta pública para manifestação de terceiros, antes da decisão do pedido, afastaria, para os interessados que se houverem manifestado, não envolve nova manifestação, uma vez encerrada a instrução, nos termos do artigo 44. O período de consulta pública será aquela determinado pela autoridade, em despacho motivado, seguindo o artigo 31.

          6.6.2. Trinta dias prorrogáveis em dobro.

Concluída a instrução processual, a matéria deve ser decidida pela Administração em trinta dias, artigo 49, prorrogáveis por igual período, quando expressamente motivada. Prazo esse, portanto, destinado à autoridade competente para decidir no processo.

          6.6.3. Dez dias.

A interposição de recurso, o prazo é contado a partir da ciência ou da divulgação oficial da decisão recorrida, por qualquer das formas e modalidades previstas para comunicação dos atos processuais, no artigo 26, parágrafo 3.

          6.6.4. Cinco dias.

Este é o prazo para reconsideração da decisão, pela autoridade recorrida, ou para encaminhamento do recurso à autoridade superior.

          6.6.5. Trinta dias prorrogáveis em dobro.

O prazo para decisão do recurso, salvo previsão legal em contrário será de 30 dias, conforme artigo 59, parágrafo 1º, e prorrogação máxima de 60 dias, previsto no parágrafo 2º.

          6.7 Prazo para Anulação de Atos Administrativos Favoráveis aos Destinatários.

O artigo 54, referente ao direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé, constitui-se em norma garantidora de direitos do administrado, prevendo prazo decadencial, para a Administração, para esta exercer a auto-tutela dos atos administrativos, que, embora nulos, tenham efeitos favoráveis para o administrado, inclusive patrimoniais, dentre estes aqueles contínuos, quando o prazo contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.

          6.8 Atendimento à Lei e ao Direito.

Outro ponto de bastante relevância na legislação em estudo é o dispositivo contido no inciso I, do artigo 2º. O "caput" deste artigo trata dos já mencionados princípios a serem observados pela Administração na aplicação da lei processual administrativa, realçando-se, no seu primeiro inciso, o norma segundo a qual a atuação deve ser "conforme a lei e o Direito".

Esse detalhe, que certamente passaria despercebido a olhos menos atentos, denota o espírito democrático que iluminou o ilustre professor CAIO TÁCITO na elaboração do anteprojeto, do qual resultou a Lei nº 9.784/99. Todos os que têm um mínimo conhecimento jurídico sabem, ou deveriam saber, ainda que perfunctoriamente, a distinção entre lei e Direito. Por se tratar de um debate mais afeito ao campo da Filosofia do Direito, e em razão da alta profundidade que o tema exige, ele não será tratado em minúcias neste trabalho.

Precisa ser considerado, pelo menos, que o Direito se situa em um plano de valor muito superior ao das leis. A norma jurídica, mesmo quando nascida sem quaisquer vícios, deriva de um parlamento heterogêneo, com interesses e critérios conflitantes, os quais nem sempre dão a merecida importância ao bem comum, ou à "vontade geral" de que tratou Rousseau. O mesmo pode ser dito em relação aos vetos presidenciais, que podem desvirtuar, no todo ou em parte, anteprojetos cuja finalidades seriam muito melhor atendidas sem os referidos vetos. Não há dúvidas, por outro lado, que esses mecanismos democráticos devam prevalecer, mesmo que causem a promulgação de leis imperfeitas.

O fato do Direito sobrepujar as leis remonta aos tempos da Grécia antiga, e foi muito bem retratado na tragédia Antígona, de Sóflocles, por volta de 600 anos antes de Cristo. A personagem e heroína Antígona, proibida pelo edito do Rei Creonte de sepultar seu irmão, desobedece ao comando imperial e, perguntada se "ousara violar essas leis?", responde, justificando-se com a seguinte afirmação:

          É que Zeus não as fez, nem as fez a Justiça que demora junto aos Deuses subterrâneos. Eu não pude acreditar que teus decretos, pois não és mais que um mortal, pudessem revogar a as leis não escritas e infalíveis do céu (...) Não é de hoje nem de ontem que elas são imutáveis, seu poderio é eterno e ninguém sabe há quanto tempo nasceram. (30)

Nos dias atuais, é certo que o respaldo para toda e qualquer norma jurídica está nas normas da Carta Maior. Por isso a importância em mencionar que a Administração deve atender à lei e ao Direito, entendendo-se este como a garantia de obediência aos cânones constitucionais e à Justiça. O professor MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO sintetizou com bastante propriedade essas concepções, ao grafar que:

          O primado da lei, por isso, nos regimes constitucionais pluralistas, é inspirado pela idéia do primado do Direito, ou seja, do ´justo´, como tal considerado, num dado momento, por determinada comunidade (...) A Supremacia do Direito, ou seja, a primazia do justo sobre os próprios comandos do legislador, as leis, ;é idéia profundamente arraigada no pensamento ocidental. De longínquas origens, esse primado, de uma forma ou de outra expresso, vem pelo menos dos gregos antigos até os nossos dias. [31]

Em razão disso, justificam-se a menção e os elogios ao dispositivo destacado, porque consagra não apenas o primado do Direito sobre as leis, mas, e principalmente, os princípios democráticos e a força de império da Constituição sobre todas as demais normas do ordenamento jurídico.

Sobre os autores
Alexandre Grassano F. Gouveia

bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Londrina (PR)

Francisco Cesar Salinet

bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Londrina (PR)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GOUVEIA, Alexandre Grassano F.; SALINET, Francisco Cesar. Comentários à nova Lei do Processo Administrativo Federal (Lei 9784/99). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 42, 1 jun. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/409. Acesso em: 25 nov. 2024.

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