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Abuso de poder econômico e corrupção na propaganda eleitoral

Agenda 31/07/2015 às 10:26

O presente artigo se propõe a analisar de forma sucinta o grave e recorrente problema do abuso do poder econômico e corrupção na propaganda eleitoral, por ocasião de nossas eleições.

 

 

 

 

 Abuso de poder econômico e corrupção na  propaganda eleitoral

 

 

 

Resumo: O presente artigo se propõe a analisar de forma sucinta o grave e recorrente problema do abuso do poder econômico e corrupção na propaganda eleitoral, por ocasião de nossas eleições; através de uma pequena análise da legislação eleitoral pátria, e uma não menos breve incursão comparativa com a ocorrência da mesma situação em outros países, em particular os EUA. Sem a mínima pretensão de apresentar qualquer solução mágica, busca-se através de um início de discussão, levar o leitor a diagnosticar e enfrentar o câncer da corrupção eleitoral em nosso país, a qual caminha a passos largos para a metástase.

 

          

 

 

Palavras-chave: Eleições, corrupção eleitoral, propaganda política, poder econômico.

 

                                             I- INTRODUÇÃO

       

           Winston Churchill disse certa feita: A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas[1]. E veja-se que o mesmo, ao proferir tal frase, participava de um sistema democrático parlamentarista, onde havia e ainda há uma sistema partidário “enxuto” com uma polaridade entre os partidos Conservador e Trabalhista, sendo que o partido Liberal Democrata, outrora forte, perdeu muito de sua influência e participação na vida política inglesa ano após ano, até o ponto de nos dias atuais, não ter a mesma representação de outrora. Além desses existem também alguns pequenos partidos que não conseguem se destacar em meio à política britânica. De qualquer forma, a exemplo de seu grande parceiro mundial os Estados Unidos, este sim, podemos afirmar, bi-partidário, nem mesmo diante de exemplos de sistemas consistentes; um dos maiores líderes mundiais de todos os tempos, conseguiu elogiar, sem ao mesmo tempo criticar a democracia.

           Imagine o que Churchill diria da democracia, se vivo fosse, com relação ao sistema pluripartidário Brasileiro com suas mazelas, as quais, não raro apresentam ao mundo uma imagem do Brasil, como um país com um sistema democrático esdrúxulo. Nossa democracia no modelo do pluripartidarismo é um celeiro de favorecimento a corrupção, ao fisiologismo político, aos conchavos, as trocas de favores entre o executivo e o legislativo, e via de conseqüência, com respingos freqüentes no judiciário. As leis eleitorais existem, e não são poucas, mas a impressão da maioria dos eleitores é de que as mesmas “são para inglês ver”. Para o povo brasileiro, o verdadeiro soberano da nação, já que os que ocupam os cargos eletivos, são e deveriam agir como funcionários da soberania popular; a democracia, a corrupção, e o poder econômico são sinônimos. Infelizmente.

           Se voltarmos vários séculos no tempo para analisar a invenção da democracia encontraremos maior facilidade de entender, o porque, o antigo premiê britânico, o qual foi juntamente com Roosevelt dois dos principais líderes dos aliados na segunda guerra mundial;formulou a supracitada frase, a meu ver, com toda propriedade e acerto. A democracia não nasceu perfeita, nunca foi, e nunca será, mas pode e deve estar sempre em aperfeiçoamento. A democracia foi inventada ou se preferirem descoberta, em Atenas. Não se pode afirmar que foram os atenienses os primeiros ou mesmo os únicos a utilizá-la, mas por milênios Atenas está relacionada á democracia. (DARTON-DUHAMEL,2001). Mais especificamente, podemos situar o surgimento desse sistema de governo no século VI a.C:

[...] Mas a história de Atenas não foi nem de longe exclusivamente democrática. Houve um antes e um depois. Foi Clístenes, um aristocrata, quem “estabeleceu a democracia” em 507 a.C.,fazendo-o num contexto de luta pelo poder, depois da expulsão da família Pisístrato—tiranos (antes de ser pejorativa, a palavra designava inicialmente o poder de um só) que haviam dirigido Atenas no meio século anterior.[...] (DARTON-DUHAMEL, 2001,p. 90)

        Portanto, desde os primórdios a aristocracia desejou a democracia, não sendo incorreto concluirmos que não o povo, mas a elite deste, insatisfeita com o “governo de um só”, decidiu mudar o sistema. Ainda na antiguidade chegando ao século IV a.C, em Aristóteles, vemos uma idéia diferente de cidadania, na qual há uma exclusão para se definir aqueles aptos a governar o Estado, e só a estes o filósofo chama de cidadãos; o que tornava impossível, o conceito de governo representativo naquele tempo. (RUSSEL, 2003).

        O presente artigo foi desenvolvido basicamente através do método de revisão bibliográfica, dirigida a questionar um problema recorrente na democracia brasileira durante os pleitos eleitorais; os quais amiúde transcorrem com inúmeras denúncias de abuso do poder econômico e corrupção durante a propaganda política, no afã de apresentar um “messias” ao eleitorado. Algumas dessas infrações à legislação eleitoral ocorrendo de forma escancarada e, infelizmente, permanecendo impunes. Fazendo com que o eleitor, cada vez mais, fique descrente no sistema democrático. Daí, a razão de nesse intróito, o trabalho ter optado por iniciar com uma visão crítica da própria democracia (não de reprovação da mesma); mas com um sentido e objetivo prático de mostrar ao leitor, que o tão decantado melhor sistema de governo, por si só apresenta problemas em sua essência; o que nos leva a uma necessidade ainda maior de buscar soluções e/ou mecanismos para aparar as arestas e alcançar a melhor otimização quando de nossas eleições e daqueles que serão eleitos. Se este sucinto trabalho conseguir despertar nos leitores o desejo e a iniciativa de uma pró-atividade na discussão dos temas referentes aos pleitos eleitorais em nosso país, em especial no que tange a propaganda eleitoral, o objetivo terá sido alcançado. 

 

II-A LEGISLAÇÃO REGULATÓRIA DA PROPAGANDA ELEITORAL NO BRASIL

 

          Embora na legislação pátria tenhamos desde 1965, o Código Eleitoral ( Lei 4.737 de 15 de julho) que contempla em seu bojo do artigo 240 ao 256 regras tanto para a propaganda eleitoral intra-partidária quanto para a propaganda direcionada aos eleitores, podemos considerar que o principal instrumento legal para regular a propaganda política seja a Lei 9504/97( Lei das Eleições) a qual apresenta do artigo 36 ao 58-A,  um cabedal maior e mais adequado ás transformações ocorridas na sociedade desde o distante ano da entrada em vigor do Código Eleitoral; sendo que mudanças ocorreram não só no aspecto social mas também no tecnológico, principalmente no que tange ao acesso do cidadão a informação, cuja característica nos dias atuais é cada vez mais instantânea e globalizada.

          Ao compararmos as disposições relativas à propaganda política do Código Eleitoral de 1965 com a Lei 9504/97 verificamos que o primeiro abrange de forma bastante tímida e limitada as possíveis ocorrências que se verificam atualmente na divulgação dos candidatos e suas propostas em um pleito eleitoral. Podemos verificar também situações que caracterizariam infrações, as quais hoje apesar de vedadas são inoperantes na nova legislação. Vejamos por exemplo o art. 242 e seu parágrafo único do Código Eleitoral:

A propaganda, qualquer que seja a sua forma ou modalidade, mencionará sempre a legenda partidária e só poderá ser feita em língua nacional, não devendo empregar meios publicitários destinados a criar, artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais. (Redação dada pela Lei nº 7.476, de 15.5.1986)

 

Parágrafo único.

 

Sem prejuízo do processo e das penas cominadas, a Justiça Eleitoral adotará medidas para fazer impedir ou cessar imediatamente a propaganda realizada com infração do disposto neste artigo. (grifos do autor)

 

          A nova redação dada a este artigo pela Lei nº 7.476/1986[2], apenas eliminou o parágrafo único, o qual previa a intervenção da Justiça Eleitoral para estancar a prática que mais existe hoje na nesse tipo de propaganda, a atuação do marketing político, a qual nada mais faz que criar artificialmente no eleitor, estados mentais, emocionais e passionais, para “venderem’ seus produtos, os candidatos. Ora, este artigo é letra morta em forma de lei, pois se tal dispositivo fosse aplicado durante as eleições; o marketing eleitoral não existiria. O que há na prática é uma revogação tácita do mesmo, e uma situação estranha, de se extinguir com a nova redação o parágrafo único, o qual previa sanção a prática prevista no artigo, mantendo o “caput”, cuja aplicação é inexistente.  

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         A Lei 9504/97 avançou no sentido de abarcar a nova realidade da sociedade e seu acesso a informação e interação nas redes sociais através dos meios de comunicação, em especial da internet. Houve também na confecção da nova lei uma preocupação de controlar, ou ao menos tentar, a disparidade econômica entre os candidatos, vedando o uso de trios elétricos, a não ser para a sonorização de comícios, e, principalmente,  proibindo a realização de “showmícios”, os quais literalmente promoviam um embate entre Davi e Golias, dos candidatos com poderio econômico elevado e os menos abastados; nesse caso com uma clara vantagem para os “Golias”, os quais traziam os artistas da moda a peso de ouro para atrair eleitores, os quais na ânsia de ver seus ídolos, compareciam para ouvir discursos, evidentemente proferidos antes das apresentações dos músicos.

       A Lei das Eleições (9504/97), procurou, de certa forma, abranger praticamente todas as situações possíveis durante a propaganda eleitoral nos dias atuais, regulando os debates entre candidatos, uso de bens públicos, proibição de “outdoors”, vedação de distribuição de brindes, previsão de gastos das campanhas, contas específicas para os recursos a serem gastos e regras para a prestação de contas, enfim, a legislação eleitoral evoluiu, o problema continua sendo o seu descumprimento e a impunidade para os infratores. E a evolução não parou por aí, pois com o advento da Lei 12.034/2009, chamada por muitos de Reforma Eleitoral, podemos dizer, para não sermos pessimistas demais, logrou algum êxito em trazer mudanças importantes no Código Eleitoral, Lei dos Partidos Políticos, e Lei das Eleições, dando á nossa legislação eleitoral ares de maior preocupação com a participação do cidadão, consciência de necessidade de alteração no cenário político e na gestão pública (MELO, 2010). Devido ao caráter sucinto desse artigo não é possível um detalhamento mais abrangente da referida Reforma, apenas para dar um exemplo vejamos a inclusão do §1º-A, ao artigo 6º da Lei 9504/97.

[...]

§ 1º-A. A denominação da coligação não poderá coincidir, incluir ou fazer referência ao nome ou número de candidato, nem conter pedido de voto para partido político.

        Por fim há que se considerar ainda a Mini-Reforma Eleitoral (Lei nº 12.891/20130, a qual por decisão do TSE não foi aplicada ao pleito de 2014). Entre as inclusões e alterações na redação do Código Eleitoral e da Lei das Eleições, houve um importante acréscimo referente a menção do posicionamento dos eleitores nas redes sociais (inciso V), por meio do artigo 36-A, na Lei 9504/97:

Art. 36-A.  Não serão consideradas propaganda antecipada e poderão ter cobertura dos  meios de comunicação social, inclusive via internet:        

I - a participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, observado pelas emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir tratamento isonômico

II - a realização de encontros, seminários ou congressos, em ambiente fechado e a expensas dos partidos políticos, para tratar da organização dos processos eleitorais, discussão de políticas públicas, planos de governo ou alianças partidárias visando às eleições, podendo tais atividades ser divulgadas pelos instrumentos de comunicação intra-partidária;         

III - a realização de prévias partidárias e sua divulgação pelos instrumentos de comunicação intra-partidária e pelas redes sociais

IV - a divulgação de atos de parlamentares e debates legislativos, desde que não se faça pedido de votos

V - a manifestação e o posicionamento pessoal sobre questões políticas nas redes sociais.         

Parágrafo único.  É vedada a transmissão ao vivo por emissoras de rádio e de televisão das prévias partidárias. (grifo nosso)

        Ao finalizar este tópico chamamos a atenção do leitor, para o   fato de que a legislação eleitoral no Brasil é extensa, evoluiu, abrange praticamente todas as questões comumente observadas em nossas eleições; o grande problema, e objeto desse artigo, o qual começaremos a tratar a seguir, refere-se á limitada aplicação das leis eleitorais, principalmente em face do abuso do poder  econômico e da corrupção, os quais ocorrem durante as campanhas, mesmo antes dos candidatos serem eleitos; o que nos traz de volta a uma análise da velha máxima: “no Brasil parece que as leis existem para não serem cumpridas”.

 

III- ABUSO DE PODER ECONÔMICO NA PROPAGANDA ELEITORAL.

 

        Ao abordarmos o abuso do poder econômico na propaganda eleitoral é necessário que se faça uma reflexão a respeito da relação deste tipo de comportamento, com o não menos nocivo, abuso de poder político. Entendo tratar-se de “irmãos siameses”. “O Barão de Montesquieu costumava salientar, a propósito, que “todo ser humano que dispõe de poder é levado a dele abusar”.( ALMEIDA, 2014, p. 463). O sistema pluripartidário existente em nosso universo político não só propicia tais abusos, como não raro, interligam partidos em atividades não ortodoxas, fazendo-os se associarem em prol de seus interesses obscuros em pleitos eleitorais. A distância  entre plataformas políticas e ideologias, por mais confrontantes que sejam no “fritar dos ovos” são separadas por uma película fina, capaz de ser rompida facilmente a bem de interesses comuns.

         É de se pasmar que nossa legislação eleitoral, ao estabelecer as penas a serem impostas aos crimes eleitorais, não obstante, a gama de crimes tipificados como abuso de poder econômico e político, havendo inclusive políticos “consagrados” com mandados de prisão pela Interpol; fixar em seu bojo, a exemplo da Lei 9.504/97( Lei das Eleições), a maior pena privativa de liberdade prevista para crimes eleitorais, não a corrupção, abuso de poder econômico e/ou político, os quais passam ao largo do referido dispositivo, mas sim um crime praticado por um eleitor:

  Art. 72. Constituem crimes, puníveis com reclusão, de cinco a dez anos:

        I - obter acesso a sistema de tratamento automático de dados usado pelo serviço eleitoral, a fim de alterar a apuração ou a contagem de votos;

        II - desenvolver ou introduzir comando, instrução, ou programa de computador capaz de destruir, apagar, eliminar, alterar, gravar ou transmitir dado, instrução ou programa ou provocar qualquer outro resultado diverso do esperado em sistema de tratamento automático de dados usados pelo serviço eleitoral;

        III - causar, propositadamente, dano físico ao equipamento usado na votação ou na totalização de votos ou a suas partes. (grifo nosso)

 

         Ou seja, caso um cidadão revoltado com os desmandos corriqueiros, cometidos pela classe política; os quais influem no bem estar de sua família, em seu salário, nos impostos que desintegram suas economias; “perder a cabeça” e “finalizar” uma urna eletrônica com uma marreta; sofrerá as conseqüências da pena mais severa prevista na legislação eleitoral vigente em nosso país. “Há algo de podre no reino da Dinamarca”, muitos podem dizer, tendo em vista que para um político condenado por corrupção, a pena é inferior à daquele cidadão que enfurecido com as notícias e as comprovações de roubo do dinheiro público por políticos; decidiu fazer justiça com as próprias mãos, pelo menos, com a urna eletrônica, para amenizar sua indignação. Atentemos para esta realidade:

Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita:

        Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa. ( Código Eleitoral. Lei 4.737/65).

         É pertinente fazermos uma comparação com a maior democracia do mundo, os Estados Unidos, no que tange á corrupção na política. Será que não existe este tipo de crime na terra do “Tio Sam”? É claro que sim, e não pouca por sinal. No entanto quando comparamos a punição prevista pelas leis daquele país aos políticos corruptos, a diferença é enorme. A título de exemplo, tomemos o Estado de Illinois, cuja maior cidade, Chicago, é considerada a mais corrupta na seara política. Um estudo realizado conjuntamente pela Universidade de Illinois em Chicago e o Instituto de Assuntos Governamentais e Públicos da Universidade de Illinois, apontou que de 1976 a 2010, foram registradas 1531 condenações por corrupção entre políticos e agentes públicos.[3]

          Como podemos ver a corrupção no meio político não é exclusividade do Brasil, mas existe sim, uma grande diferença quando atentamos para as punições aplicadas aos condenados. Entre as principais diferenças quando comparamos com nosso sistema é o fato de não haver foro privilegiado, ou seja, não são julgados como aqui com competência exclusiva do STJ ou STF dependendo do caso, mas sim pelas cortes locais como qualquer crime comum. Naquele país, a corrupção não é vista apenas como desvio de recursos públicos, crime de peculato, mas também considerada questão que envolve a segurança nacional. A preocupação maior não é com um desvairado que destrói uma urna ou material destinado á eleição, mas sim com o político pego “com a boca na botija”, o qual enfrentará penas duras de prisão. É fato que não são enviados para presídios onde estão os piores criminosos, e que existe alguma regalia na prisão, mas não se livram do cumprimento da maior parte do tempo a que foram condenados a reclusão. Exemplo disso é o ex-governador de Illinois, Rod Blagojevich, o qual foi em 7/12/2011, condenado por fraude e tentativa de vender uma cadeira no Senado (exatamente a de Barack Obama), e amargou uma condenação a 14 anos de prisão, que começou a cumprir em 15/03/2012. Com certeza não cumprirá a totalidade da pena, mas no mínimo 85% do tempo determinado na sentença.[4]

          Tal quadro é impensável em terras tupiniquins, já voltando para nossa realidade abaixo da Linha do Equador. Ora, se considerarmos casos como de Paulo Maluf, Renan Calheiros, Jader Barbalho, entre outros, infratores compulsivos da legislação eleitoral; para não falar no caso dos “mensaleiros”, a maioria, não obstante, a condenação à prisão na AP470, ou estão em prisão domiciliar no caso destes últimos, ou nem sequer enfrentaram julgamento judicial como os primeiros citados ( com exceção de Maluf, que após poucos dias de recolhimento, logrou a soltura). Atualizando a questão, o que se dizer dos diretores da Petrobrás e empreiteiras, recentemente soltos, ou privilegiados pela prisão domiciliar; ainda que não ocupantes de cargos políticos nesse caso, envolvidos com desvio de dinheiro público.

           Não estamos fugindo ao objetivo principal desse tópico, proposto para tratar do abuso econômico na propaganda eleitoral, haja vista, que estes mesmos personagens do meio político, conseguem se eleger após envolvimento em escândalos escabrosos, exatamente, pelo poderio econômico que lhes proporcionam bancar campanhas milionárias, através de caixa dois dos partidos políticos e de apoio de empresas privadas, no famoso ‘toma lá dá cá”, que será cobrado após a investidura e diplomação no cargo político.

           A Lei das Eleições (9.504/97), teve acrescentada ao seu texto através da Lei 9.840/99, o art. 41-A, principalmente em razão de iniciativa da OAB, CNBB, CUT, entre outras entidades  (BARRETO,2004), vejamos:

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990.

          Há que se notar que em meio a uma legislação eleitoral fragmentada, pouco  modificou a inclusão deste artigo na contenção do abuso do poder econômico na propaganda eleitoral, atendo-se o mesmo a ilícitos do candidato no transcurso da campanha, se esquecendo de prever possível tipificação de corrupção de apoiadores do mesmo ( BARRETO, 2004).

         Lauro Barreto, comentando[5] artigo do desembargador do TJRJ, Paulo César Salomão, reproduz trecho do mesmo, esclarecedor e muito de como é a “caixa de pandora” de nossa legislação eleitoral em relação ao combate á corrupção nas eleições:

O estardalhaço com que os políticos divulgaram que a Lei nº 9.840, de 28.9.1999, é moralizadora da “compra de votos” por candidatos ao próximo pleito, estabelecendo punições rigorosas tais como a cassação de seus registros, não passa de um caso típico de propaganda enganosa.

A legislação citada não traz nenhuma inovação.

Seus dizeres encontram-se reproduzidos tanto no vetusto Código Eleitoral de 1965 como na Lei Complementar nº 64, de 1990.

Obviamente esses “defensores do moralismo eleitoral” sabem disso e editam uma legislação inócua com o intuito claro de enganar a mídia e a população de um modo geral, a fim de cobrar, futuramente, da Justiça Eleitoral a sua não aplicação.

O cerne da questão não é a edição de leis demagógicas e inteiramente desnecessárias, mas a efetividade e agilização do processo de apuração e julgamento dos graves casos do abuso de poder político e econômico na propaganda eleitoral.

Com efeito, o grande entrave para a atuação eficaz da Justiça Eleitoral é a existência de leis que protelam ao máximo o afastamento dos candidatos pilhados nas irregularidades.

Exemplifica-se com o disposto no art. 15 da citada Lei Complementar nº 64/1990, de hierarquia superior à Lei nº 9.840, que exige o trânsito em julgado da decisão que declara inelegibilidade do candidato do candidato para que ela seja aplicada.

A decisão com trânsito em julgado é aquela contra qual não cabe mais qualquer recurso.

Nas próximas eleições municipais, para as quais estão previstos inúmeros casos de abusos devido à aprovação da reeleição sem desincompatibilização, a competência é do juiz eleitoral de cada comarca para a declaração de inelegibilidade. Supondo que os fatos sejam simples e o juiz extremamente rápido, mesmo assim, com os recursos que a lei faculta aos réus- lei feita pelos próprios interessados na procrastinação-, a decisão final, com trânsito em julgado, será protelada, indefinidamente e o “ comprador de votos” exercer o seu mandato tranqüilamente.

São incontáveis os recursos cabíveis no processo para apuração e punição de abuso do poder e, pelo sistema atual, o procedimento só se esgota no Supremo Tribunal Federal, sem mencionar que, se o político for importante, pode-se engendrar mais um obstáculo, como se fez no triste episódio do ex-senador Lucena, que, cassado, foi beneficiado casuísticamente com a criação de uma esdrúxula ação rescisória com efeito suspensivo.

Vale dizer, nada mudou, pois o ponto crucial não foi atacado...

 

          È difícil vermos uma luz no fim do túnel em relação à contenção do abuso do poder econômico nas campanhas eleitorais e por óbvio na propaganda eleitoral. Como bem se pode notar, a quantidade de leis não resolve a questão, posto que, não encontram efetividade, mesmo porque, ao serem confeccionadas já vêm com o vício de terem sido urdidas por políticos interessados em burlá-las em suas campanhas de aves de rapina em busca do voto. Não há como não constatar: é “a raposa tomando conta do galinheiro”.

          Roberto Moreira de Almeida, em seu Curso de Direito Eleitoral, apresenta jurisprudência selecionada sobre a temática em questão, capaz de assustar os mais corajosos. Trata-se do Informativo do STF nº 732/2013-ADI e financiamento de campanha eleitoral-01. Refere-se o mesmo a um julgamento de ação direta de inconstitucionalidade contra os arts. 23, § 1º, I e II; 24; 81,“caput” e § 1º, da Lei 9.504/1997 (Lei das Eleições), tratando de doações a campanhas eleitorais por pessoas físicas e jurídicas.

          Foi questionado ainda, na referida ação a constitucionalidade dos arts. 31; 38, III; 39, caput e § 5º, da Lei 9.096/1995 (Lei Orgânica dos Partidos Políticos), que regulam a forma e os limites em que serão efetivadas as doações aos partidos políticos.

          O Ministro Luiz Fux, relator da ADI, julgou procedente o pedido que pedia a declaração da inconstitucionalidade das normas impugnadas.

          Após destacar os pontos principais referentes às doações e financiamentos das campanhas, inclusive abordando audiência pública sobre o tema e a constatação do aumento de gastos nas campanhas eleitorais, o ministro enfatizou a influência crescente do poder econômico no processo político em nosso país, fruto do aumento expressivo dos gastos nas referidas campanhas. Luiz Fux, apontou que em 2002, os candidatos gastaram 798 milhões de reais, em 2012, já superaram 4,5 bilhões, um aumento de 471%.

          Em uma verdadeira radiografia do problema demonstrou que no Brasil o gasto per capita seria da ordem de R$ 10,93; na França, R$ 0,45; no Reino Unido, R$ 0,77; e na Alemanha, R$ 2,21. Em uma comparação proporcional ao PIB, o Brasil estaria no primeiro lugar do ranking dos países que mais gastaram com campanhas eleitorais. Destacou o ministro, que 0,89% de toda a riqueza gerada no país seria destinada a financiar candidaturas de cargos representativos, superando os Estados Unidos, cujo gasto seria da ordem de 0,38% do PIB ( STF, ADI 4650/DF, rel. Min. Luiz Fux, 11 e 12.12.2013). [6]

         A pergunta que não quer calar: Qual a solução para tamanho exagero e abuso? Seria a tão propalada reforma política? Sinceramente não sabemos como responder. Até porque, há que ser otimista demais para crer que os mesmos que gastam tanto para se agarrar ao poder e aos cargos políticos, iriam mexer nessa ferida; sendo muito mais provável que achem um ungüento capaz de cicatrizar por fora o que está á vista do eleitor; sem curar a úlcera interior e a “emenda ficar pior que o soneto”.  Talvez um caminho que poderia ser trilhado para solucionar, ou, ao menos amenizar um problema que macula todo o processo eleitoral e com isso a legitimidade daqueles que são escolhidos como representantes do povo; está na educação do cidadão, em especial dos jovens, quem sabe, com a inclusão na grade curricular do ensino médio, mesmo que dentro de outras disciplinas, como história, por exemplo, de aulas sobre o sistema político brasileiro, suas leis, deveres e proibições às quais estão sujeitos os candidatos a cargos políticos. Em sentido mais amplo com vistas a atingir toda a população, nos mesmos moldes da propaganda política gratuita, fosse incluído a obrigatoriedade de durante tempo estipulado, tornar conhecido dos eleitores a essência da legislação eleitoral, para que ao votarem, já tenham condições de formar um melhor juízo de valor, e mais apropriado da qualidade moral e da lisura dos candidatos.

É oportuno também que se registre que nas investigações judiciais eleitorais e ações de impugnação de mandato eletivo, houve um avanço com o art. 23 da LC 64/90, o qual aumenta a amplitude do campo de convencimento do juiz, ou seja prevendo um valor probatório de fatos públicos e notórios, indícios e presunções; igualando-os com a prova produzida, o que configura uma grande diferença com o previsão antes limitada do art. 237 do Código Eleitoral.[7]

 

IV-CONCLUSÃO.

 

          Longe de pretender, e, ousar, apresentar uma solução para o problema, objeto deste sucinto artigo, o que se almejou foi fomentar a discussão a respeito do abuso de poder econômico e corrupção na propaganda eleitoral. Em meio a uma legislação atinente ao tema, cujo fato de ser extensa, não significa necessariamente eficaz, ao contrário, apresenta inúmeras previsões legais, senão, prolixas, com certeza, utópicas. O cidadão convive com inúmeras denúncias pós-pleito eleitoral no que tange à lisura das eleições, muitas destas confirmadas e levadas à justiça, a qual mesmo em casos de condenação, parece ser incapaz de coibir as práticas criminosas durante as campanhas, e também de conseguir que as sentenças sejam cumpridas; levando o cidadão a concluir, infelizmente, que político corrupto, pode até ser retirado do cargo, mas jamais cumprirá a pena a que foi condenado.

          De certa forma, todo o eleitorado brasileiro teria direito à indenização por sofrer um dano moral coletivo, haja vista, o fato de a globalização e o instantâneo acesso á informação demonstrar que apesar da corrupção na política não ser exclusividade de nosso país, existem nações onde tal prática é punida exemplarmente; o que traz ao eleitor a segurança, de que pode até errar na sua escolha; mas caso isso ocorra, seu voto será ainda respeitado ao ver que aqueles nos quais acreditou e escolheu para representá-lo, pagarão caro, por terem maculado o sagrado direito da democracia representativa: o voto.

          Como a esperança é a última que morre, no caso das eleições brasileiras, resta-nos resignar em otimismo, e exigir mudanças e cumprimento da legislação existente. Como já dizia Ulisses Guimarães na campanha pelas "diretas já" no início dos anos 80: “ o que os políticos mais temem é o povo nas ruas”. Para se acabar com a corrupção e abuso do poder econômico em nossas eleições, faz-se urgente uma queda da “Bastilha” da impunidade que protege os corruptos.

E não é que Churchill tinha razão............

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


[1] Frase proferida por Churchill em discurso na Casa dos Lordes em 11 de novembro de 1947.

[2] Art 1º O artigo 242 da Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965 - Código Eleitoral, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 242. A propaganda, qualquer que seja a sua forma ou modalidade, mencionará sempre a legenda partidária e só poderá ser feita em língua nacional, não devendo empregar meios publicitários destinados a criar, artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais".

 

[3]Fonte:Disponível,em:http://www.huffingtonpost.com/2012/02/25/corrupt-illinois-politici_n_1299478.html,   consulta realizada em 04/05/2015.

[4] Fonte: Disponível em:http://en.wikipedia.org/wiki/Rod_Blagojevich,consulta realizada em 04/05/2015

[5] BARRETO, Lauro. Propaganda Política & Direito Processual Eleitoral, Bauru-SP: EDIPRO, 2004, pp. 122-124.

[6] ALMEIDA, Roberto Moreira de, Curso de Direito Eleitoral, 8 ed.rev. ampl. e atual.Salvador: JusPODIUM, 2014, p. 721.

[7] BARRETTO, 1999, p.28

Sobre o autor
Mario Caldonazzo de Castro

Advogado, pós-graduado em Direito Eleitoral(Centro Universitário Claretiano), pós-graduando em Direito Material e Processual do Trabalho(PUC-Minas/Poços de Caldas), Delegado de Prerrogativas dos Advogados(20ª Subseção, OAB/Varginha-MG)

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Artigo apresentado e aprovado como TCC na pós-graduação em Direito Material e Processual Eleitoral para Banca do Centro Universitário Claretiano- Batatais-SP.

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