Considerações Finais
Como visto, a Constituição Federal prevê que as pessoas jurídicas podem ser penalizadas criminalmente, sendo editada a Lei nº 9.605/98, para regulamentar tal dispositivo. Trata-se de uma tendência mundial que atingiu o direito brasileiro, pois não pode persistir a impunidade daqueles que, aproveitando-se de um ente coletivo, praticam crimes. Em síntese, meio ambiente é um bem jurídico tutelável pelo Direito Penal.
A problemática que se estabeleceu com o advento da citada lei é a incompatibilidade de diversos dispositivos seus com o sistema penal vigente, ou seja, o legislador brasileiro inseriu a responsabilidade penal da pessoa jurídica no ordenamento jurídico sem se preocupar com a necessária adequação com os institutos vigentes e que são incompatíveis, ensejando, como demonstrado, inúmeras críticas, muitas das quais insuperáveis, sendo que as mais contundentes referem-se à incompatibilidade da nova criminalização com o princípio da culpabilidade, bem como à aplicação de penas à pessoa jurídica.
Entende-se que, subscrevendo o entendimento de respeitáveis doutrinadores, o meio ambiente ecologicamente equilibrado é um bem jurídico passível de tutela penal e, à medida que pessoas jurídicas atentam contra este equilíbrio, devem também ser penalizadas, admitindo-se, inclusive, punições de índole criminal.
Entretanto, não há como deixar de reconhecer a total falta de adequação desta criminalização com o sistema penal vigente no Direito pátrio. O Direito Penal, inserto na Constituição Federal e no Código Penal, com efeito, prevê princípios e institutos cuja aplicabilidade só é viável para a pessoa física, ressaltando-se o princípio da culpabilidade, da personalidade das penas, a individualização das sanções penais.
Impunha-se, assim, a criação de um sistema próprio que viabilizasse a aplicação de sanções criminais à pessoa jurídica, a exemplo do trabalho legislativo feito na França para, antes de adotar a responsabilidade coletiva, compatibilizar o ordenamento jurídico penal com a inovação.
Por todos os aspectos destacados, evidencia-se que a aplicabilidade da Lei dos Crimes Ambientais, no tocante às pessoas jurídicas, está comprometida, esperando-se que o legislador penal, sempre tão ágil na tarefa criminalizadora, empenhe-se na criação de um subsistema próprio para a aplicação plena e efetiva desta Lei e tenha a sabedoria suficiente para não criar um monstro ainda maior. Enquanto isso não ocorrer, ela integra o infindável rol de leis penais sem efetividade, que apenas alimentam a impunidade e vulgarizam e banalizam o Direito Penal.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AZEVEDO, Tupinambá Pindo de. Pessoa Jurídica: ação penal e processo na lei ambiental. Revista de Direito Ambiental, n.12, São Paulo: out-dez/98.
BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra. Comentários à constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva, 1990.
BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Bauru: EDIPRO, 2000.
BENETI. Sidnei Agostinho. Responsabilidade penal da pessoa jurídica: notas diante da primeira condenação na justiça Francesa. São Paulo: RT 731, set. 1996.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal – parte geral. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1997.
. Teoria geral do delito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.
BULGARELLI, Waldirio. Tratado de direito empresarial. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1997.
CARVALHO, Ivan Lira de. A empresa e o meio ambiente. Revista de Direito Ambiental, n.13, São Paulo: jan-mar/1999.
CERNICCHIARO, Luiz Vicente. Direito Penal na Constituição. 2. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991.
CONDE, Francisco Muñoz. Teoria geral do delito. Tradução de Juarez Tavares e Luiz Regis Prado. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1988.
CONSTANTINO. Carlos Ernani. Meio ambiente – o artigo 3º da lei 9.605/98 cria o intolerável ‘bis in idem’. Juris Síntese – CD ROM – n. 16, mar-abr/99.
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Vol. 1, 7. ed.. São Paulo: Saraiva, 1989.
DOTTI, René Ariel. A incapacidade Penal da pessoa jurídica (uma perspectiva do direito brasileiro). Revista Brasileira de Ciências Criminais, ano 3, n. 11. São Paulo: Revista dos Tribunais, jul-set/1995.
FERREIRA, Pinto. Comentários à Constituição do Brasil. Vol. 7. São Paulo: Saraiva, 1990.
FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de; SILVA, Solange Teles da. Responsabilidade penal das pessoas jurídicas de direito público na Lei 9605/98. Revista de Direito Ambiental, n. 10, São Paulo: abr-jun/1998.
FILHO, Edward Ferreira. As pessoas jurídicas como sujeito ativo de crime na Lei 9.605/98. Revista de Direito Ambiental, n. 10, São Paulo: abr-jun/1998.
FREITAS, Gilberto Passos de; FREITAS, Vladimir Passos de. Crimes contra a natureza. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.
FREITAS, Vladimir Passos de. Competência nos crimes ambientais. Revista dos Tribunais, vol 759, São Paulo: jan/1999.
GOMES, Celeste Leitos dos Santos Pereira. Responsabilidade e sanção penal nos crimes contra o meio ambiente. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998.
GÜNTHER, Klaus. A culpabilidade no direito penal atual e no futuro. RBCCRIM, ano 6, n. 24, São Paulo: out/dez-98.
HASSEMER, Winfried. A preservação do ambiente através do direito penal. RBCCRIM, ano 6, n. 22, São Paulo: abr-jun/1998.
JUNIOR, Miguel Reale. A lei hedionda dos crimes ambientais. Folha de São Paulo, 1º caderno, São Paulo: 11/04/1998.
KIST, Ataides. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. São Paulo: Editora de Direito, 1999.
KIST, Dario José. Fundamentos do Direito Penal Democrático. Revista do Ministério Público do Rio Grande do Sul, nº 45, Porto Alegre, abril/agosto de 2001, p. 165/205.
KREBS, Pedro. A (ir)responsabilidade penal dos entes públicos. Estudos Jurídicos, vol. 33, n. 87, São Leopoldo: jan-abr/2000.
LECEY. Eládio, A proteção do meio ambiente e a responsabilidade penal da pessoa jurídica. Direito Ambiental em evolução. Curitiba: Juruá, 1998.
LUISI, Luiz: Os Princípios Constitucionais Penais. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1991.
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 1992.
MANSILHA, Eduardo Manuel Goçalves. Societas Delinquere Potest. Coimbra, 1998. Obra adquirida pela INTERNET em 25 de maio/2001 através do site http://members.xoom.com/verbojuridic/artigos/rp_pc.doc.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, 23. ed. São Paulo: Malheiros, 1998.
MILARÉ, Édis. A nova tutela penal do ambiente. Revista de Direito Ambiental, n. 16, São Paulo: out-dez/1999.
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil parte geral. Vol. 1, 35. ed. São Paulo: Saraiva: 1997.
MUKAI, Toshio. Direito Ambiental Sistematizado. Rio de Janeiro: Forense, 1992.
NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 1997.
OLIVEIRA, Abel Costa de. A pessoa jurídica no banco dos réus. Revista Jurídica da FIC-UNAES, Campo Grande: maio-out/1999.
PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de direito civil. Rio de Janeiro: Forense, 1997.
PRADO, Luiz Régis. Crime Ambiental: Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica. São Paulo: Boletim IBCCRIM, n. 65, 1998.
. Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica: o modelo francês. São Paulo: Boletim IBCCRIM, n. 46, 1996.
RIBEIRO, Lúcio Ronaldo Pereira. Da responsabilidade penal da pessoa jurídica. Artigo obtido pela INTERNET em 25 maio/2001 através do site http://www.infojus.com.br/area6/resppj.htm
RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil – parte geral. Vol. 1, 27. ed. São Paulo: Saraiva, 1997.
ROTHENBURG, Walter Claudius. A pessoa jurídica criminosa. Curitiba: Juruá, 1997.
SANCTIS, Fausto Martin de. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. São Paulo: Saraiva, 1999.
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.
SILVA, De Plácido E. Vocabulário Jurídico. 3. ed. São Paulo: Forense, 1973.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo, 9. ed. São Paulo: Malheiros, 1994.
SIRVINSKAS, Luís Paulo. Tutela penal do meio ambiente. São Paulo: Saraiva, 1998.
TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1994.
ZAFFARONI, Eugênio Raul; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro – parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.