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O direito da personalidade e a velocidade de informação.

O confronto entre as tecnologias da comunicação e o novo Código Civil Brasileiro

Agenda 24/08/2015 às 04:06

Com o avanço da tecnologia, a velocidade de comunicação aumentou e vem aumentando gradualmente. Com isso, vários problemas vêm surgindo, e um deles e não menos importante é o direito da privacidade, do sigilo e da segurança na comunicação virtual,

1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS: A PESSOA HUMANA E A PERSONALIDADE

A teoria dos direitos da personalidade surgiu no século XIX, foi atribuída a Otto Von Gierke, mas a ideia já era considerada desde os primórdios das civilizações. Particularmente, a teoria existe desde a Idade Média e foi remontada em Roma, com a existência de algumas tutelas destinadas à personalidade e mais tarde, com o advento do Cristianismo, a sociedade se deparou com a criação da dignidade da pessoa humana. E finalmente surge o Iluminismo, nos séculos XVII e XVIII, que se consagrou defendendo a tutela dos direitos fundamentais próprios e inerentes da pessoa humana.

A pessoa humana é o primeiro e crucial elemento da relação jurídica, sem a qual o direito não existe. A palavra pessoa vem do latim persona, que primitivamente significava máscara.

No entanto, não se deve confundir a pessoa humana com a capacidade, uma vez que a capacidade vem a ser um atributo. Para Roberto Senise Lisboa (2003, p.245), personalidade é a “capacidade de direito ou de gozo da pessoa de ser titular de direitos e obrigações, independente de seu grau de discernimento, em razão de direitos que são inerentes à natureza humana e sua projeção para o mundo exterior”.

O direito da personalidade pode ser classificado em três grupos: os direitos físicos, direitos psíquicos e os direitos morais. Os direitos físicos são os direitos do corpo físico da pessoa. Direitos psíquicos são os direitos relacionados a personalidade da pessoa, tais como o sigilo ou a integridade. E, por fim, os direitos morais são aqueles que integram valores à pessoa na sociedade em que ela vive, como direito à honra, identidade, educação etc.

A personalidade começa então desde a concepção do nascituro e do seu nascimento com vida, mas nem por isso são descurados os seus direitos (art 2º, CC). Afinal, mesmo que ainda não tenha se separado do ventre materno, é assegurado o direito à vida. Tanto é que o aborto é ilegal no Código Penal Brasileiro. Então, a personalidade vem a findar-se com a morte de seu titular, mas, ainda assim, são assegurados direitos post mortem. (arts. 209 a 2012, CP).

A pessoa jurídica também goza de seus direitos e, uma vez constituídos, esta adquire a sua identidade. Embora não possua os mesmos direitos da pessoa física, pode gozar dos direitos psíquicos (liberdade e intimidade) e morais (identidade, honra, sigilo, respeito etc.)

Ademais, algumas pessoas são incapazes de exercer o ato civil, como os loucos e os recém-nascidos (Arts 3º e 4º, CC), e, por isso, são protegidos pelo Estado, através dos representantes e assistentes legais (os pais, ou na falta deles, o tutor e o curador).

2. RECONHECIMENTO DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE

Todos os direitos da personalidade ganharam importância após as atrocidades ocorridas durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Foi então reconhecido pela ONU, através da Declaração Universal dos Direitos do Homem em 1948, um acordo universal em respeito à proteção da dignidade humana.

Mais tarde,  ainda mais em relevância, os direitos foram expostos na Constituição Alemã de 1949, na Constituição Portuguesa de 1976 e, em seguida, na Constituição Espanhola de 1978.

No Brasil, a Constituição Imperial possuiu alguns precedentes sobre os direitos da personalidade, como a liberdade, igualdade e o sigilo. Já a primeira Constituição Republicana de 1891, dispõe a tutela dos direitos da propriedade industrial e o direito autoral. Seus regimes foram ampliados nas Constituições de 1934 e 1946.

Com o advento da Constituição Federal de 1988, todos os direitos da personalidade foram então acolhidos, tutelados e sancionados, e, hoje em dia, encontram-se por escrito e positivados no art. 5º da Constituição Federal, que diz:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

No entanto, Orlando Gomes, tentou, antes mesmo da CF de 1988, disciplinar a matéria no Brasil, sendo o criador do anteprojeto do Código Civil em 1962. Esse projeto não chegou a ser legitimado, pois, em 1975, o jurista Miguel Reale assume um projeto de lei (projeto de Lei nº 635), que, embora tenha sido por um tempo esquecido, foi aprovado pelo Congresso Nacional por meio da Lei 10.406/2002, que instituiu o Novo Código Civil Brasileiro, que entrou em vigor em 11 de janeiro de 2002.

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3. O NOVO CÓDIGO CIVIL E OS DIREITOS DA PERSONALIDADE

O Novo Código Civil tem um capítulo especial dedicado à tutela dos direitos da personalidade (Capítulo II, arts. 11 a 21). Tais artigos se referem ao direito da proteção de inviolabilidade da pessoa natural, à integridade do seu corpo, nome e imagem.

É importante ressaltar o que o art. 11 diz: “com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis”. Esses casos previstos em lei são, por exemplo, os casos de transplante de órgãos, e assim o legislador criou mecanismos para evitar antinomias jurídicas.

O art. 12 tem finalidade de proteger não somente da lesão, mas também da ameaça da mesma, e, ainda, exigir que se cesse tais prejuízos à honra, a respeitabilidade e à boa fama do ameaçado. Para Washington de Barros Monteiro,

"[...] os danos decorrentes de ofensa aos direitos da personalidade dispensam comprovação, tão evidente em geral e sua ocorrência. A dor moral tem caráter eminentemente subjetivo, presumindo-se tenha efetivamente ocorrido em face das circunstancias verificadas e invocadas, não sendo de desconsiderar as condições pessoais do ofendido. No caso de óbito, perda do ente querido, se provocada por terceiro, impõe-se a compensação pecuniária, para que de forma mais reconfortante possam os familiares reverenciar a memória do falecido e mais facilmente mitigar a dor sofrida.".

O art. 13 impede a disposição de parte do corpo, salvo por exigência médica, desde que não traga inutilidade do órgão ou contrarie os bons costumes. Esse artigo pode ser enquadrado para casos de transexualismo, doação de órgãos e até mesmo barriga de aluguel, em alguns casos, tão comum nos dias atuais. Havendo exigência médica, as partes seguintes deste artigo são indiscutíveis. E, ainda assim, deve-se estar incluído o bem-estar da pessoa em questão.

O art. 14 trata especificamente da doação de órgãos com o objetivo científico, ou altruístico, sendo que é possível revogar o ato a qualquer momento durante a vida.

O art. 15 ressalta os direitos do paciente, uma vez que este não pode ser constrangido a se submeter a uma cirurgia médica quando for prejudicial à sua saúde, ou houver risco de vida. Este artigo em especial diz respeito a algumas convicções religiosas. Logicamente, se a pessoa estiver à beira da morte, deve ocorrer a intervenção sob pena de responsabilização do profissional, prevista no art. 951 do CC. Este artigo é no entanto perigoso, e como temos um estado que assegura a vida, o Tribunal de Justiça de São Paulo, defende que o direito à vida é superior ao direito à liberdade. Geralmente, a pessoa que sofreu intervenção médica contra sua vontade, é indenizada.

Beirando ainda este capítulo estão os arts. 16 ao 19, que protegem o nome da pessoa natural, e também seu pseudônimo. Tais artigos estão em sintonia com as leis Lei nº 6.015/73 (Lei dos Registros Públicos) e Lei nº 9.610/98 (Lei de Direito Autoral). A utilização do nome alheio só é permitida com a autorização do detentor (art. 18).

O art. 20 vem, então, defendendo os direitos das obras, das palavras e da imagem da pessoa, caso esse algum tipo de conduta fira a sua honra, boa fama ou respeitabilidade. E, em seu parágrafo único, ainda defende a divulgação que ofende o morto, podendo ser seus descendentes, ascendentes ou cônjuges também defendidos.

Encerrando o capítulo em questão, está o art. 21, que resguarda a intimidade e a privacidade da pessoa natural. Também está previsto no art. 5º da CF, inciso X, disposto neste texto.

4. A PRIVACIDADE NA INTERNET

A Internet surgiu com a empresa norte-americana ARPA (Advanced Research Projects Agency), em 1957, que tinha intenções militares e era considerada uma importante arma durante a Guerra Fria. No entanto, a invenção se revolucionou e mostrou-se mais eficiente e foi, então, usada em universidades e departamento de defesas, passando a chamar-se Arpanet e enfim, em 1986, denominava-se INTERNET.

Com o advento da internet, muito na vida do ser humano tem mudado, desde sua maneira de comunicar-se até o modo de viver. No século em que vivemos, é comum ter a internet dentro de casa e fazer o uso dela. E não importa para o que seja, se usa a internet para os mais variados fins, como fazer compras, compartilhar momentos, escrever para alguém distante, ou mesmo falar ao vivo com a pessoa através de uma webcam. É possível ver notícias em tempo real, abrir empresas e vender negócios. É praticamente um mundo utópico a parte. E por tanta facilidade de se fazer atos lícitos, é também muito fácil fazer atos antijurídicos. Dá-se o exemplo do mercado negro, em que se traficam animais, pessoas, drogas, órgãos etc. E, principalmente, algo que em muito tem chocado a população do século XXI, a exposição consciente ou inconsciente da privacidade, e, além disso, o uso descontrolado do direito à liberdade de expressão.

Câmeras de alta qualidade capturam momentos íntimos e ordinários da vida social, os quais estão protegidos por lei, e são pouquíssimos respeitados. Perde-se a noção e o discernimento do certo e do errado. Tudo o que o ser humano agora precisa é de uma câmera na mão e a ajuda da Internet para exibir qualquer momento que seja. Chegamos à geração do exibicionismo. Mesmo que isso pareça comum, este meio tem prejudicado pessoas, desrespeitando sua boa fama e honra, e são assuntos que devem ser tratados a parte.

5. A COMUNICAÇÃO VIRTUAL E SEUS PROBLEMAS

A velocidade de comunicação tem contribuído e muito para a vida em sociedade. Quanto mais rápido acontece a comunicação, mais rápido os problemas são resolvidos. Os telefones celulares, e-mails e mensagens instantâneas são provas disso.

No entanto, tudo isso tem um lado péssimo para o consumidor: os spams e as tentativas de phishing.

Os spams são irritantes e levam as pessoas à loucura. Spams são mensagens eletrônicas não solicitadas e inconvenientes. São tão comuns que os serviços de mensagens eletrônicas possuem um lixo especial para esse tipo de mensagem. Mesmo sendo irritantes, são excelentes formas de propaganda e muitas pessoas têm adquirido produtos através de spams.

As tentativas de phishing são um problema mais sério. Phishing é um termo também em inglês que quer dizer pesca. Esta é uma forma de fraude eletrônica, que tem interesses específicos do usuário, como senhas de banco, dados pessoais, dados de cartão de crédito e etc. São muitíssimo comuns nos dias atuais.

E não nos esqueçamos também dos vírus e outros predadores de eletrônicos que têm por função simplesmente vasculhar a vida do usuário.

Não só a comunicação por e-mail tem seus problemas, como também a comunicação nas redes sociais, uma vez que um comentário, um vídeo compartilhado ou uma mensagem privada é exposta e se torna viral, podendo ferir a honra e a boa fama do indivíduo. Salientando, ainda, que os danos, às vezes, são irreparáveis, tendo como exemplo Amanda Todd, uma garota canadense que se expôs na internet e sofreu injúrias e calúnias por durante 3 anos até o seu suicídio em 2012.

Ainda mais sobre o assunto, o artigo 5º da Constituição Federal tem por objetivo salvaguardar também o direito à privacidade da pessoa pública, tal como políticos e artistas, em vista da exploração desenfreada da vida pessoal de ambos ,do abuso da imprensa em divulgar casos polêmicos como os extraconjugais, brigas, desentendimentos e até mesmo mortes. Mesmo que numa concepção sensacionalista, a imprensa torna-se aliada para divulgar a fama da pessoa pública, seja de maneira vexatória e indiscriminada, a lei defende os direitos da pessoa, que a qualquer momento pode recorrer à justiça a fim de resguardar sua privacidade (arts. 12 e 21, CC).

Tentativas de phishing, os problemas com vírus e a divulgação viral de informações íntimas estão intimamente ligados aos direitos da personalidade no artigo 21 do CC.

Os atos íntimos devem ser protegidos também virtualmente. Dados cadastrais, imagens, senhas e preferencias pessoais devem ser invioláveis. Controlar a internet e as pessoas que agem de má fé é praticamente impossível, mas é possível conscientizar a pessoa humana da sua valorização pessoal e proteção integral dos seus direitos.

6. BENEFICIOS DAS NOVAS TECNOLOGIAS

Se por um lado, a exposição desenfreada da privacidade vem a ser um problema, por outro lado torna-se uma grande aliada em investigações, por exemplo.

Os avanços da tecnologia da comunicação têm contribuído para denúncias e flagrantes de atos ilícitos. Afinal é comum encontrar alguém com algum aparelho eletrônico que filme, grave voz ou registre imagens que possam servir como provas no meio jurídico.

Além disso, a mídia eletrônica consegue transmitir uma certa simpatia ao leitor ou ao ouvinte. Dá-se exemplo de um cardápio de delivery online. Um cardápio que possui um belo design e que pode sofrer alterações no pedido, agrada muito mais um cliente e provavelmente dispensa troca da compra. Não só no delivery, como também na compra de roupas, acessórios, moveis para casa e até mesmo a própria casa.

Outro exemplo plausível são os e-mails de recebimento de ofertas, ajustes nos planos bancários, agendamento de entrevistas de emprego e etc.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do assunto então discutido, é fácil perceber que a informação, uma vez divulgada na internet, torna-se algo suscetível a violação dos direitos do indivíduo. E ainda as consequências podem ser um tanto quanto desastrosas e prejudiciais, afinal, diante de uma comunicação e veiculação de informações tão potente, alguns danos são irreversíveis.

É necessário que haja observação a esses direitos e que uma legislação seja eficaz a fim de proteger o cidadão, assim como, os métodos de sanções sejam eficientes a curto e longo prazo, sendo estimulante para frear os prejuízos e diminuir a impunidade dos crimes virtuais e de informações não autorizadas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E ELETRÔNICAS:

GOMES, Alessandra Aparecida Calvoso. Introdução, In. ALESSANDRA APARECIDA CALVOSO, Operações Bancárias Via Internet (Internet Banking) no Brasil e suas repercussões jurídicas. Revista dos Tribunais, outubro 2003, volume 816, ano 92, páginas 94-95 e 103-104.

LISBOA, Roberto Senise. Direitos da Personalidade, In. ROBERTO SENISE LISBOA, Manual de Direito Civil. São Paulo, 2003, p. 245

MONTEIRO, Washington de Barros. Das Pessoas Naturais, In. WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO, Curso de Direito Civil, São Paulo, 1997, p.56

NICODEMOS, Erika Cassandra de. Os direitos da personalidade e as novas tecnologias. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 22 ago. 2013. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.44858&seo=1>. Acesso em: 20 maio 2014. NICOLODI, Márcia. Os direitos da personalidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 134, 17 nov. 2003. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/4493>. Acesso em: 21 maio 2014.

PIOVESAN, Flávia. Considerações sobre o Spam, In. FLÁVIA PIOVESAN Direitos Humanos: O Princípio da Dignidade Humana e a Constituição Federal Brasileira de 1988. Revista dos Tribunais, setembro 2004, volume 827, ano 93, páginas 63-65.

Sobre a autora
Carolina Fernanda Silva

estudante de Direito na Faculdade de Ciências e Letras de Araras (UNAR),

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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