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ITCMD: o quinto pode voltar

Agenda 26/08/2015 às 12:23

Comentário sobre a proposta de elevação da alíquota do ITCMD para 20% feita pelos Secretários de Fazenda dos Estados.

No ciclo do ouro brasileiro, no período colonial, o Código Mineiro admitia a livre exploração das minas, com a cobrança do quinto.  O quinto representava que 20% da produção deveriam ser entregues à coroa.

 Os portugueses decidiram, a partir de 1751, manter o quinto e fixaram uma finta, ou seja, uma quota anual mínima na região das minas, que depois de algumas oscilações ficou fixada em 100 arrobas (1.500kg) de ouro. Ou seja, quando o quinto arrecadado não chegasse a estas 100 arrobas procedia-se ao derrame, ou seja, a população seria obrigada a completar o total.

Não havia um processo especial para isso.

“Cada pessoa, minerador ou não, devia contribuir com alguma coisa, calculando-se mais ou menos ao acaso suas possibilidades. Criavam-se impostos especiais sobre o comércio, casas de negócio, escravos, trânsito pelas estradas, etc. Qualquer processo era lícito, contanto que se completassem as 100 arrobas do tributo. Pode-se imaginar o que isto significava de violência e abusos. Cada vez que se decretava um derrame, a capitania atingida entrava em polvorosa. A força armada se mobilizava, a população vivia sob o terror; casas particulares eram violadas a qualquer hora do dia ou da noite, as prisões se multiplicavam. Isto durava não raro muitos meses, durante os quais desaparecia toda e qualquer garantia pessoal. Todo mundo estava sujeito a perder de uma hora para outra seus bens, sua liberdade, quando não sua vida. Aliás, os derrames tomavam caráter de violência tão grande, e subversão tão grave da ordem que somente nos dias áureos da mineração se lançou mão deles. Quando começa a decadência, eles se tornavam cada vez mais espaçados, embora nunca mais depois de 1762 o quinto atingisse as 100 arrobas fixadas” (Prado Júnior, Caio. História Econômica do Brasil , Ed. Brasiliense , São Paulo , p. 59-60) .

O último derrame, marcado para 1788, foi suspenso na última hora devido à notícia de que uma insurreição estava marcada para o início da cobrança. Essa insurreição é a Inconfidência Mineira e depois disso nunca mais se recorreu a este expediente.

Pois, agora, em agosto de 2015, os secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal decidiram elaborar uma proposta a ser encaminhada ao Senado para abrir caminho para o aumento do ITCD (imposto sobre heranças) que iria da alíquota atual de 8% para um teto de 20%.

O ITCMD foi criado pela Constituição Federal de 1988 e é um imposto de competência estadual:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

I - transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

Mas a própria Constituição definiu no mesmo artigo a competência do Senado para fixar as alíquotas do ITCMD

§ 1º O imposto previsto no inciso I: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

IV - terá suas alíquotas máximas fixadas pelo Senado Federal;

O Senado fixou a alíquota máxima em 8%, mas, como ela é muito alta, muitos Estados adotaram alíquota menor, como o Estado de São Paulo, onde ela é de 4%.

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Agora, estamos voltando ao quinto da época colonial, mas em uma realidade com muitos outros tributos. Em um país com uma das maiores cargas tributárias do mundo e com a economia em depressão, surgem propostas de todos os lados, não para a economia no serviço público, mas para a criação de mais tributos ou aumento dos já existentes.

Aumentar o ITCMD para 20% significa o Estado se apropriar de 1/5 do patrimônio de alguém que falece e trabalhou a vida inteira para constituir este patrimônio.

A pessoa trabalha a vida inteira, paga seus impostos, IPI, ICMS, Imposto de Renda etc. e, fruto de sua diligência, consegue amealhar um patrimônio considerável. Já quanto ao que sobrou depois da tributação, e ao falecer, vem o Estado para se apropriar, como querem os secretários, de 20% do patrimônio do falecido.

Propor uma tributação desta ordem, em um país com uma carga tributária de 36% do PIB, é um descalabro total.  E pior, a esta proposta, soma-se outra, de políticos de esquerda de criação do Imposto sobre Grandes Fortunas.

Não se veem propostas para tornar o Estado mais eficiente, para racionalizar os gastos públicos, para diminuir ministérios etc. Somente mais gastos, mais benefícios, como se dinheiro caísse do céu.

O Brasil é um dos países com a mais alta carga tributária do mundo e com uma das menores taxas de investimento. Para crescer, o país precisa aumentar o investimento.

Para aumentar o investimento, é preciso aumentar a poupança. Para aumentar a poupança é preciso que sejam criados estímulos à sua ampliação.

Mas, as propostas que aparecem são todas em sentido contrário. Que estímulo tem um empresário para investir dinheiro, criar empregos e formar um patrimônio, pagando corretamente seus impostos, se no final de sua vida seria brindado com um derrame tributário de 20% a título de Imposto Transmissão Causa Mortis? Sem falar do Imposto sobre Grandes Fortunas.

O país está caminhando em sentido contrário. Administradores e políticos precisam buscar formas de aumentar a eficiência do setor público e não formas de aumentar impostos.

Aumentar a carga tributária no presente momento pode passar a falsa impressão de que irão aumentar os recursos do Estado via arrecadação. Não vão aumentar, ao contrário, vão diminuir, porque a tributação em excesso age como desestimuladora da atividade econômica, causando depressão, que tem como consequência imediata, como estamos vendo hoje, a queda da arrecadação.

Que os senhores senadores, que foram eleitos para representar a população, tenham bom senso e não aprovem uma proposta como a aqui comentada, para o bem do Brasil.

Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LEAL, Edson Pereira Bueno. ITCMD: o quinto pode voltar. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4438, 26 ago. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/42104. Acesso em: 22 dez. 2024.

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